DATAFOLHA publica análise da reprovação de Dilma após manifestação do dia 15

Publicado em 26/03/2015 08:45
Análise de MAURO PAULINO, DIRETOR-GERAL DO DATAFOLHA, e ALESSANDRO JANONI, DIRETOR DE PESQUISAS DO DATAFOLHA: "Frustração e rejeição do eleitor deixam Dilma com pouca margem de manobra"...

Por trás da reprovação majoritária da população ao governo Dilma Rousseff, revelada pelo Datafolha após as manifestações de 15 de março, há diferenças importantes entre os eleitores que se posicionam contra a presidente.

Por meio de uma análise combinatória de duas variáveis –o voto declarado no segundo turno da eleição presidencial de 2014 e a avaliação que os entrevistados fazem do governo Dilma hoje–, o Datafolha dividiu a amostra de sua última pesquisa nacional em seis subgrupos.

Os três primeiros reúnem aqueles eleitores que optaram por Dilma no ano passado e que agora têm visões diferentes sobre o desempenho da presidente. São os eleitores "satisfeitos", os "apreensivos" e os "frustrados".

Os outros três grupos são compostos por pessoas que não votaram na petista, isto é, escolheram o senador Aécio Neves (PSDB-MG), votaram nulo ou em branco nas últimas eleições. São subdivididos em "surpresos", "atentos" e "refratários".

Os eleitores "satisfeitos" avaliam positivamente o início do segundo mandato da candidata que elegeram. Atribuem à presidente nota 8,3 –a média na população é 3,7. Eles correspondem a 11% dos brasileiros, são mais velhos e muito mais petistas do que a média. Vivem principalmente no interior do país, estão mais otimistas com a economia e são os que menos acreditam em omissão de Dilma diante da corrupção na Petrobras. É o segmento mais fiel à presidente.

Os eleitores "apreensivos" não aprovam, mas também não reprovam o governo Dilma. Avaliam sua gestão como regular ou não souberam opinar. Totalizam 15% da amostra e, entre os que votaram na petista, são o grupo com mais moradores das capitais. Dão nota 6,1 à presidente e estão pessimistas com os rumos da economia, mas em proporção menor do que a média.

Em comum com os grupos que não rejeitam Dilma, os "apreensivos" estão mais otimistas em relação à sua situação econômica pessoal do que com as condições do país. Se sentirem em sua rotina os efeitos dos ajustes na economia, tendem a se frustrar. Caso contrário, podem voltar a apoiar a presidente.

Os eleitores "frustrados" votaram em Dilma, mas agora a consideram uma presidente ruim ou péssima. De todos os seis subconjuntos, é o que tem menor renda e mais moradores no Nordeste. Somam 16% e atribuem média 2,4 à petista, nota superior apenas à dos "refratários".

É um estrato que demonstra bastante pessimismo com a economia e o mais inseguro com o emprego. Para reconquistá-los, o governo deveria minimizar os efeitos da recessão no mercado de trabalho e em benefícios sociais.

No universo dos que não votaram em Dilma na eleição, dois pequenos subconjuntos destacam-se pela avaliação que fazem da presidente.

Os "surpresos" representam apenas 2% do total, são menos escolarizados e mais pobres, e dão nota 7,1 à gestão da petista. Os "atentos", que somam 10%, a consideram regular, com média 5,4. São mais jovens, a maioria tem ensino médio e é do sexo masculino, estão pessimistas com a economia do país, mas nem tanto em relação à situação econômica pessoal.

O maior grupo de todos é o dos "refratários". Corresponde a quase metade da população (47%). É um contingente que não votou em Dilma e a reprova totalmente. Entre eles, a nota média obtida pela petista fica em 1,7. É o segmento mais escolarizado e com mais gente no Sudeste.

Exibe grande pessimismo na economia e é o que mais condena a presidente por omissão diante da corrupção na Petrobras. Foi o estrato mais presente nos protestos do dia 15 e parece blindado contra iniciativas do governo.

IMPACTO DO AJUSTE

As variações na opinião pública daqui em diante dependerão principalmente do impacto do ajuste econômico no dia a dia dos brasileiros, especialmente nos segmentos "apreensivos" e "atentos" da população.

São estratos que percebem a gravidade da situação do país, mas ainda não o projetam para a vida prática. Para os "atentos", ações ou confusões na área da educação, como a que aconteceu com o FIES, podem pesar bastante.

Para os "frustrados", a questão é saber se o fantasma do desemprego se materializará. Isso pode ser determinante para a adesão desse segmento às manifestações de rua. Entre os eleitores "refratários", o governo não encontra, por enquanto, espaço para manobras.

A rejeição que perdura desde as eleições, intensificada pela derrota do antipetismo nas urnas, anula, pelo menos por enquanto, qualquer tentativa de aproximação de Dilma com esse segmento. Resta saber quem da oposição preencherá essa lacuna.

 

 

  Editoria de Arte/Folhapress  

 

 

ANÁLISE DE VINICIUS TORRES FREIRE:

Dilma sob a regência do PMDB

Congresso e PMDB dão mais ultimatos à presidente e ao regente da economia e do ajuste fiscal

"SARNEYZAÇÃO", "parlamentarismo branco" ou "regência trina provisória". A gente pode se divertir, se irritar ou se deprimir na discussão dos nomes disso em que se vai transformando o governo do Brasil. Mas nesta semana fica explícito que parte do governo foi confiscado de Dilma Rousseff.

Renan Calheiros (PMDB), presidente do Senado, exigiu ontem que o ministro da Fazenda não apenas apresente na terça-feira um último recurso contra decisões que o Senado está para tomar, contra o interesse do Executivo. Joaquim Levy teria de levar um programa econômico com "começo, meio e fim": que ofereça medidas alternativas de ajuste fiscal dentro de um plano maior de "retomada do desenvolvimento". Levy e Dilma não podem ser "inflexíveis, fundamentalistas".

Em outros tempos, com menos sopapos e fraturas expostas, com negociações organizadas de bancadas bem definidas (ao menos entre situação e oposição), seria um embate animador e razoável. Afinal, para que temos um Congresso? Nestas semanas, não se trata de debate sobre equilíbrio de Poderes (ou não apenas disso).

Trata-se de uma presidente sem bancada, sem coalizão de apoio ou até porta-vozes, que vê seu poder ser talhado a machadadas porque não tem escudo, porque não há anteparos, forças políticas para defender seus projetos e interesses, para nem dizer coisa pior.

Calheiros quer levar à prática a lei de renegociação de dívidas de Estados e municípios com a União e legalizar os incentivos concedidos ilegalmente por Estados e municípios na "guerra fiscal" (redução de impostos com o objetivo de atrair empresas e negócios).

No primeiro caso, o governo federal perde dinheiro, quase R$ 3 bilhões, em ano de pindaíba horrenda; no outro, vê avançar uma concessão a Estados e cidades sem obter progresso na reforma do lunático ICMS. São objeções sérias, se não fosse pelo fato de que o governo enrola faz anos esses assuntos, sem negociar nada direito.

Se a apelação de Levy não for convincente, na terça, o Senado ameaça aprovar o que quiser contra o governo. Calheiros tem o apoio do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e de quase todos os governadores, prefeitos e empresários interessados. Ao bater em pontos centrais do ajuste, que afetam empresários e benefícios sociais, Calheiros e Cunha já haviam encostado o governo no canto ringue. O governo ora se enrola sangrando nas cordas.

Delcídio Amaral (PT-MS), presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, agiu como bombeiro, mas ainda assim Calheiros teve apoio e/ou força para mandar um ultimato ao governo, anunciado por um dos parlamentares mais influentes e sensatos do PT, o senador Walter Pinheiro, da Bahia. Como reação, o governo estuda levar o caso da renegociação da dívida de Estados e municípios à Justiça. Isso não vai prestar.

"Sarneyzação" é a síndrome de um governo impotente, de poderes cassados, em tempos de crise econômica sem solução. Regência trina provisória foi o nome do governo do Império depois da abdicação de Pedro 1º; talvez seja o nome do arranjo destas semanas em que o PMDB manda na política, Levy, na economia, e Dilma se debate com o que restou.

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REINALDO AZEVEDO (de VEJA): Faz sentido o Supremo legislar quando acha que o Congresso não o fez a seu gosto? Ou: O STF, os precatórios e a usurpação das prerrogativas do Legislativo pelo Judiciário. Ou ainda: se um município não tiver dinheiro para pagar, faz o quê? Vende uma praça pública?

A questão é meio cheia de tecnicalidades, bem chatinha, mas acho que consigo destrinchar aqui. O Supremo determinou, nesta quarta, que os precatórios de Estados e municípios sejam integralmente quitados até 2020. Parece bom? Com a devida vênia, trata-se de uma evidente usurpação das prerrogativas de Poder por outro. Esses entes da Federação têm agora menos de cinco anos para resolver um espeto de R$ 94 bilhões. E se não aparecer o dinheiro? Ah, sei lá, talvez seja preciso expropriar alguma praça pública…

Vamos aos fatos. O Congresso havia aprovado em 2009 uma emenda constitucional disciplinando o pagamento dos precatórios: estabeleceu-se um prazo de 15 anos, corrigindo-se os títulos pela TR e abrindo a possibilidade do leilão inverso: o credor que aceitasse um desconto maior teria prioridade no pagamento. Em 2013, a OAB entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a emenda, que foi acatada pelo relator, Luiz Fux. O homem estabeleceu um prazo de cinco anos — até 2018! — para o pagamento e decidiu que o próprio Supremo criaria os critérios.

Deu-se, então, algo fabuloso: alguns Tribunais de Justiça pensaram o óbvio: se o texto legal que disciplina a questão é inconstitucional e se um novo será criado, suspendam-se todos os pagamentos. A gritaria foi geral. A OAB voltou à carga e arrancou do ministro Fux, pasmem!, uma liminar determinando que os pagamentos continuassem a ser feitos com base na lei que ele mesmo declarara… inconstitucional!!! Não os censuro, leitores, se vocês acharem que a coisa se parece com um hospício.

E, desde essa data, por artes do ministro Fux e da OAB, os pagamentos de precatórios eram feitos com base numa liminar de Fux que, na prática, contestava uma decisão de… Fux!

Nesta quarta, o tribunal botou um pouco de ordem na bagunça — mas, a meu ver, feriu a independência entre os Poderes. Além de decidir que tudo deve ser quitado até 2020, substituiu a TR na correção dos títulos pelo IPCA-E (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial). A partir de 2020, as dívidas reconhecidas até julho terão de entrar no Orçamento do ano seguinte. Os ministros decidiram ainda validar as negociações feitas até agora, para evitar futuras ações judiciais, mantendo a permissão do pagamento com desconto, mas limitado a 40% da dívida.

O ministro Marco Aurélio fez uma consideração absolutamente correta. Segundo ele, cabia ao tribunal apenas dizer que emenda de 2009 era constitucional ou não, sem estabelecer a forma como deve se dar o pagamento: “Estamos a substituir o Congresso Nacional. Estamos a reescrever a Constituição Federal (…) Quando o STF avança e extravasa limites, lança um bumerangue que pode voltar à respectiva testa”.

É evidente que não cabe a uma corte constitucional decidir se o pagamento deve ser feito assim ou assado. É um despropósito. Pensemos na questão do desconto de 40%. Ora, se um ente da federação tem uma dívida gigantesca e pode negociá-la com desconto de até 60%, 70% ou 99% — e se a parte que vai receber concorda —, com que autoridade e segundo qual princípio um tribunal constitucional vai dizer que não pode? Pergunta óbvia: há algum artigo na Constituição que proíbe descontos acima de 40%? Ou ainda: descontos acima de 40% ferem alguma cláusula pétrea da Carta?

Finalmente, uma pergunta: o tribunal estudou a economicidade da decisão? Por que é até 2020, não até 2019 ou 2025? Há de haver uma razão que não seja o puro arbítrio, uma vez que, até onde sei, a Carta também é omissa sobre o prazo do pagamento de precatórios. Tanto a decisão é arbitrária que, originalmente, Fux havia definido o ano de 2018. Nunca entendi por que a PEC de 2009 era inconstitucional. E agora não entendo por que o Supremo tem de entrar nessas minudências.

O ministro Gilmar Mendes sugeriu, o que foi acatado pelos outros ministros, que a questão seja remetida pelo CNJ para que se possam analisar especificidades dos Estados. Saibam: há estudos demonstrando que alguns deles não conseguiriam pagar seus precatórios nem em 20 anos — é o caso do Rio Grande do Sul, por exemplo.

A propósito: esse foi o primeiro malefício à constitucionalidade e à independência entre os Poderes causado pela dupla Fux-OAB. O outra diz respeito à ADI que quer proibir a doação de empresas privadas a campanhas eleitorais, também relatada por Fux, também por iniciativa da OAB. Se a tese prosperar e se o Congresso não a corrigir com uma emenda constitucional, a política brasileira mergulhará na clandestinidade de vez.

E volto ao ponto com uma última pergunta, que vale tanto para a questão dos precatórios como para a do financiamento de campanhas eleitorais: faz sentido o Supremo legislar quando acha que o Congresso não o fez a seu gosto?

Por Reinaldo Azevedo

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Fonte:
Folha de S. Paulo + VEJA

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