A boa e a Má Ocupação do Agro Brasileiro, por Prof. Dr. Marcos Fava Neves

Publicado em 17/11/2017 16:15

Minha Leitura dos Fatos e Impactos do Agro em Novembro de 2017

Dedico este artigo mensal para falar sobre “ocupação”, destacando muitas boas e algumas ruins acontecendo no agro. Começando pelas boas ocupações, na segunda projeção da CONAB para a safra 2017/18 estima-se uma produção entre 223,3 a 227,5 milhões de toneladas, sendo 4,4 a 6,2% menor que a atual safra recorde.

Seguiremos ocupando áreas, quase 2% a mais, atingindo entre 61 e 62 milhões de hectares. Espera-se produtividade entre 5 a 10% menor devido a questões climáticas favoráveis que podem não se repetir.

Na soja são estimadas entre 106,4 e 108,6 milhões de toneladas, numa área 3% maior (entre 34,6 e 35,3 milhões de hectares) e a de milho entre 91,6 e 93,1 milhões, produzidos numa área de 7,5 a 11,5% menor, representando as duas quase 90% da nossa produção de grãos.

Esta perda deve derrubar em 5,1% o valor bruto da produção, estimado pelo Ministério da Agricultura em R$ 506,2 bilhões, contra os R$ 533,2 bilhões que ocuparam restaurantes, hotéis, academias, lojas de construção, carros, entre muitos outros setores que se beneficiam da renda do agro neste ano.

Estamos ocupando mais espaço internacional também. As exportações de outubro foram de US$ 8 bilhões, 40% acima de outubro de 2016, deixando um superávit de US$ 6,9 bilhões.

No acumulado de janeiro a outubro o agro trouxe US$ 82 bilhões, 12,2% acima de 2016. O superávit deixado (tirando importações), já esta em US$ 63,3 bilhões (9,9% acima).

A soja trouxe US$ 1,5 bilhão no mês, as carnes US$ 1,4 bilhão e açúcar/etanol algo próximo a US$ 1,1 bilhão.  Vale destacar o milho, que junto com outros cereais trouxeram US$ 824 milhões.

No acumulado do ano, as carnes estão 8,8% acima trazendo US$ 13 bilhões e superando qualquer crise ligada à operação carne fraca e, finalmente, o complexo soja já nos brindou desde janeiro com praticamente US$ 30 bilhões. Dólares para ocuparem nossos negócios.

O índice mensal de preços da FAO/ONU chegou a 176,4 pontos, 1,3% abaixo de setembro e 4% acima de outubro de 2016. Cereais ficaram estáveis enquanto os óleos vegetais caíram 1,1%, os lácteos 4,2%, carnes 0,9% e o açúcar 0,7%.

A FAO estima que a produção de grãos em 2017 vai atingir recorde de 2,612 bilhões de toneladas e utilizar 2,589 bilhões, jogando também os estoques para 720 milhões de toneladas (27% do consumo, o maior valor em 15 anos).

A produção brasileira vem sendo semeada em bom ritmo, a dos EUA chegando à fase final da colheita, e a última estimativa do USDA pouco variou com a soja permanecendo em 120,5 milhões de toneladas (3,5 milhões a mais que o ciclo 2016/17) e o milho em 370 milhões de toneladas, 8 milhões acima da última previsão e 14,5 milhões abaixo da última safra).

Quando comparamos os preços atuais das commodities mais exportadas com um ano atrás, o tombo é grande. No açúcar, é de quase 36%, no suco 22% e no café 18%. A soja está praticamente com o mesmo preço e o milho cerca de 1% acima, e assim devem ficar.

Pelo menos tivemos neste mês uma inesperada desvalorização do real, o que significa mais reais pela mesma quantidade vendida.

Na linha de ocupação de espaços agro nos tanques dos carros temos três boas notícias.

A primeira veio do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) que antecipou em uma ano a obrigatoriedade de passar de 8 a 10% de mistura de biodiesel no diesel, tendo que ser atingida em março de 2018.

Como a soja representa 80% do biodiesel, estes dois pontos percentuais dão um processamento de mais 1,5 milhões de toneladas de soja e 20 mil empregos, segundo a ABIOVE. Vem em boa hora para reduzirmos importações de diesel (em cerca de US$ 2,2 bilhões) e ocuparmos mais o interior do país.

A segunda boa notícia veio da EPA (agência ambiental americana) que deve manter em 2018 os volumes obrigatórios para biocombustíveis nos EUA.

Os convencionais, onde o milho é o principal, ficam em 15 bilhões de galões e os avançados, onde está a cana, ficariam em 4,24 bilhões de galões.

O setor reivindica o aumento da mistura de 10 para 15% de etanol de milho na gasolina, o que para o agronegócio brasileiro seria excelente notícia, abrindo mais possibilidades de “ocupações”.

Para finalizar, o RenovaBio que criará muitas ocupações para o etanol de cana e milho e o biodiesel de soja e outros, virou projeto de lei no Congresso.

Os fatos de novembro foram bons ao agro com a desvalorização do real, exportações firmes e as chuvas que finalmente chegaram e possibilitaram os plantios em estados que nos preocupavam bastante, além de mais espaço para colocarmos grãos nos combustíveis. Mas a vida não é feita apenas de “boas ocupações”.

O fato triste do mês foi a lamentável e criminosa invasão da Fazenda Igarashi (em Correntina, Bahia) por centenas de pessoas que, manipuladas por nocivos líderes, se transformaram em selvagens e destruíram tudo o que viram pela frente nesta bela propriedade de descendentes de japoneses que faz comida diversificada de forma completamente legalizada.

Para humilhar mais ainda esta família e a nós todos deste ato terrorista, soma-se uma nota publicada pelo Sr. Prefeito Municipal tentando encontrar justificativas para esta, como diz ele, “ocupação”, típica da postura já conhecida de vitimização e “coitadização” que reina nas ideias destes políticos com este espectro ideológico.

Postura esta que a sociedade brasileira já sabe onde leva por experiência própria destas últimas gestões no Brasil e que já exauriu nossa paciência.

Fiquei satisfeito pois a postagem que fiz menos de dois dias depois desta invasão denunciando esta atrocidade com fotos tornou-se viral na rede (16 mil compartilhamentos e mais de 2.500 comentários, que não tive condições de acompanhar) e pode ter contribuído para gerar alguma reação das autoridades e cobertura da grande mídia.

Grandes partes desta postagem foram lidas pela Senadora Ana Amélia, do Rio Grande do Sul, no Plenário do Senado e importante rede de TV fez matéria, não como deveria ter sido feita, sobre a invasão e destruição mais de quatro dias após. Acompanhemos as investigações e punições, uma vez que provas concretas deste ato são fartas. A sociedade que produz se cansou de baderna e da postura vitimizadora.

A outra “ocupação” negativa recebi de diversas fontes, um vídeo de um famoso e ruidoso economista líder do antigo, porém ainda ilegal “movimento de pessoas que querem ganhar terra”, nos convidando a um debate na ESALQ/USP.

Evento para supostamente prestar solidariedade a um professor que foi responsabilizado por atos realizados no último encontro lá ocorrido com este mesmo grupo, organizado por ele, pois neste os que querem ganhar terra desrespeitaram a nobre figura de Luiz de Queiroz, armando barracas sobre suas cinzas, promovendo a “ocupação” de seu túmulo, além de outros desrespeitos.

Ofenderam justamente Luiz de Queiroz, que conquistou e posteriormente doou suas terras para termos a quinta melhor escola de Agronomia do mundo cumprindo a nobre missão de espalhar ensinamentos para que muitos jovens “sem terras” vindos das mais diversas origens sociais, pudessem ter oportunidades para, com seu estudo, esforço e mérito, “conquistar suas terras”.

Apesar dos apelos, não atenderei a este convite pelo fato deste economista e outros a ele ligados já terem cabeças “ocupadas” com suas ideias românticas, jamais se rendendo à obviedade da simples observação do dinamismo do agro e do mundo real.

O mundo do agro fala em economia circular, economia do compartilhamento, sustentabilidade, bioeconomia, bioengenharia, tecnologias digitais, fazer mais com menos, inclusão sustentável via criação, captura e compartilhamento de valor, comércio justo, produtos locais, cooperativismo de nova geração, entre outros.

Lá indo, ouviremos o corolário conhecido de... latifundiário, monocultura, reforma agrária, agrotóxico, socialismo, excluídos, companheiro, campesino, patrão, exploração, ocupação, coletivos, entre outros termos que foram ou estão sendo substituídos nos debates mundiais da nova agricultura inclusiva de pequeno, médio e grande porte.

Fazendo uma analogia, estes termos são como o Chevette, Monza, Logus, Del Rey no atual debate do mercado de automóveis. Merecem respeito, mas já não são as soluções para o futuro... ficaram obsoletos.

Concluo esta análise mensal sonhando que sejamos brindados de boas ocupações, como as evidenciadas pelos números do agro e presto mais uma vez minha solidariedade à família Igarashi, pois o Brasil precisa muito mais de vocês do que dos indivíduos de comportamentos selvagens que os invadiram fisicamente e nos invadiram moralmente.

Vocês são o exemplo de geração de oportunidades e inclusão sustentável de pessoas que precisamos.

Sigam produzindo, incluindo e gerando toda esta ocupação do agro brasileiro no mundo e colocando comida na mesa dos brasileiros.

Marcos Fava Neves é Professor Titular da FEA/USP, Campus de Ribeirão Preto. Desde 2013 é Professor Visitante Internacional da Purdue University (EUA) e desde 2006 é Professor Visitante Internacional da Universidade de Buenos Aires. Este material é um resumo mensal feito sobre assuntos nacionais e internacionais de relevância ao agro. ([email protected]

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Dr. Marcos Fava Neves

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4 comentários

  • Eduardo Lima Porto Porto Alegre - RS

    Excelente artigo do Professor Marcos.

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  • LEONARDO ZUCON Itapeva - SP

    Professor Marcos, nosso país sempre foi palco de troca de valores, como diz um grande escritor que aprecio muito (Eduardo Almeida Reis) país grande e bobo , mas com pessoas sérias também, e realmente concordo com seus comentários,e você esqueceu de citar os bandidos da JBS que parecem nem ter a mínima vergonha do comportamento explicitamente apresentado a todo Brasil, e vendo o poder e força do agronegócio, também vejo que muitas pessoas ligadas a atividade estão nas redes sociais, porém não vejo as mesmas se manifestarem em canais como estes. Espero que a família do Grupo Igarashi, possa de alguma forma superar esta cena lamentável que deve ocorrer em muitos lugares do Brasil e que certamente nem são de conhecimento da maioria.

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  • armelindo corte dos reis Enagenheir Bel trão - PR

    Olá Professor Marcos, bom dia, sou professor hoje aposentado pelo estado do Paraná, e também produtor rural, e sei mais do que ninguém a dura vida do homem do campo, e a insegurança do mesmo!

    Quando vejo tamanhas atrocidades sobre pessoas, aterrorizando quem trabalha e produz, fico muito triste e desencorajado de alavancar novos projeto! Até que ponto... Vejo bando de bandoleiros fazendo o que querem, sem punição. Que caminho o cidadão de bem deve tomar?

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  • Marcelo E Luders Curitiba - PR

    Dr Marcos Fava, tenho sempre acompanhado suas análises e admiro a sua capacidade de síntese do que acontece no Agro. Ainda estamos chocados com o caso Igarashi. Venho de uma cidade na divisa do Sul do Paraná com o planalto Norte de Santa Catarina. Lá na região de Canoinhas testemunhei de perto a saga desta família. Sempre foram e são referencia de civilidade. Além de alimentos geram muitos empregos. A saga desta família começou arrendando terras e não foi sem enorme sacrifício e trabalho que conquistaram o respeito por onde andam. Que vergonha. A que ponto chegamos. Eles são o símbolo da insegurança que ha no campo, de pequenos chacareiros próximos as cidades, que sofrem assaltos e roubos constantes até estes empresários. Nos grupos de whatsapp não passam mais de 2 ou 3 dias sem relatos de violência contra produtores. Roubo de defensivos, de partes de pivôs de irrigação, cabos de transmissão de energia maquinas e caminhões e ainda fiscais de todos naipes muitas vezes achacando os que alimentam o país.. Nunca saberemos quanto investimento de quantos produtores empreendedores deixaremos de ter por esta falta de segurança. Vamos nos lembrar quando houver disparada de preços dos alimentos que estes produtores produziriam, que poderiam em parte ser minimizados se estes estivessem seguros para investir.

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