Do prato ao campo: Como a queda no consumo de arroz e feijão afeta a saúde e a renda do produtor rural

Publicado em 23/12/2025 09:23 e atualizado em 23/12/2025 10:04
Diante do atual cenário, entidades que representam as culturas promoveram campanhas de consumo durante este ano

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O brasileiro está comendo cada vez menos arroz e feijão. Uma pesquisa realizada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) aponta que os níveis de consumo per capita dos produtos se encontram entre os menores patamares da história, desde os anos 1960. Os dados destacam que, em 2024, o consumo médio de arroz por pessoa ao ano foi de 34 kg, enquanto o de feijão foi de 13,56 kg. 

Mesmo mais baratos nas prateleiras dos supermercados do país, os produtos seguem perdendo espaço no prato dos brasileiros. Dados divulgados pela CNN Brasil em 30 de julho de 2025 apontaram para uma retração de 4,2% no consumo de feijão, apesar de uma redução de 17,5% no preço, e o arroz seguiu a mesma tendência, caindo 4,7% no volume consumido, mesmo com preços 14,2% menores.

Em contrapartida a esse cenário, estudos liderados por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) mostram que em 2025, o consumo de ultraprocessados no Brasil atingiu cerca de 23% da dieta da população, mais que o dobro desde os anos 1980 (ano que representava apenas 10%). As evidências científicas apontam que dietas ricas em ultraprocessados estão associadas à ingestão excessiva de calorias, pior qualidade nutricional e maior exposição a aditivos e substâncias químicas nocivas.

Ainda segundo dados da pesquisa, a rotina corrida da população brasileira (que exige mais praticidade), a urbanização e a diminuição do tamanho das famílias são algumas das razões apontadas para essa mudança alimentar, em que a substituição do preparo de comidas caseiras pelas industrializadas se torna mais viável. 

Para valorizar, conscientizar e revitalizar o consumo de arroz e feijão no Brasil, durante este ano, instituições ligadas aos setores agrícolas das culturas se mobilizaram em campanhas nacionais, como uma alternativa para levar o famoso "prato tipicamente brasileiro" de volta à rotina alimentar da população. 

Em agosto deste ano, o IBRAFE (Intituto Brasileiro do Feijão e Pulses) lançou a campanha "Viva Feijão", composta por vídeos, redes sociais e engajamento com influenciadores, focando em resgatar a tradição e sabor do grão, incentivando assim o consumo. 

Já em outubro, a campanha principal foi voltada para o consumo de arroz. Chamada "Arroz Combina", promovida pela ABiarroz (Associação Brasileira da Indústria do Arroz), a iniciativa tem como foco a valorização do cereal como alimento completo, acessível, nutritivo e parte da cultura brasileira. Utilizando influenciadores e o meio digital para combater fake news sobre carboidratos.

A queda no preço de varejo pesou no bolso do produtor

Diante da baixa demanda, o excesso de oferta acabou pressionando os preços dos produtos, que chegaram este ano a patamares bem inferiores aos custos de produção, comprometendo significativamente a rentabilidade do produtor rural. 

Levantamento do Cepea apontou que os preços do arroz caíram quase 40% em 2025, uma queda recorde. Informações da Safras & Mercado destacam que o risco econômico do setor arrozeiro cresce à medida que os produtores reduzem o uso de insumos em resposta à queda acentuada dos preços de comercialização e à escassez de crédito, o que está ameaçando a produtividade futura. 

Segundo o analista da Safras & Mercado, Evandro Oliveira, o setor arrozeiro passou por momentos de alta demanda, impulsionado primeiramente pela pandemia, e depois pelo incentivo do governo para o aumento da produção do grão em regiões como Centro-Oeste e Nordeste.  

“Diante deste cenário, muitos investiram no arroz com o interesse de surfar nessa boa onda do mercado. Só que, agora, chegou a conta. Este ano já se avisava que seria um ano de muita dificuldade, porque a demanda voltaria à sua normalidade”, explicou o analista.

Evandro destaca que vivemos um momento em que o mundo inteiro está produzindo mais arroz do que consumindo. “O custo total do arroz hoje fica em torno de R$ 90 por saca. Então, enquanto o custo variável, que a gente chama, em regiões mais tradicionais fica em torno de R$ 75. Esse é o tamanho do prejuízo nesse momento. Lembrando que o preço mínimo oficial do arroz fica em torno de R$ 62 por saca. Nesse momento, estamos mais de R$ 10 abaixo disso. Estamos abaixo do custo de produção, abaixo do mínimo oficial e ainda com um cenário de pressão. 2026 ainda tende a ser um ano de muitos desafios. É cedo para se falar em recuperação de preços para o arroz. Então, o produtor tem que ter o pé no chão, os custos de produção na ponta do lápis”, completou. 

O consultor de mercado da Brandalizze Consulting, Vlamir Brandalizze, conta ainda que em anos anteriores, o Brasil trabalhava sempre com safras que não atendiam a demanda, suprindo as necessidades com bastante importação do Paraguai, Argentina e Uruguai. Já nessa safra, o país veio com uma produção de 12,8 milhões/toneladas, ou seja, uma produção muito maior para o consumo, mas encontrou um cenário onde a demanda recuou, resultando assim em uma sobra arroz no mercado. “Mesmo sobrando arroz, o Brasil continuou tendo importações de países que também colheram safras recordes. Porém, a demanda interna seguiu limitada, diante mudança no consumo dos brasileiros, e mesmo com o arroz muito barato, não conseguimos estimular para voltar a ter uma demanda crescente, e continuamos recebendo muito arroz de fora. Com isso, o preço caiu para níveis baixos, com a saca de 50 kg sendo vendida a R$ 50-55 no Rio Grande do Sul, valor muito abaixo do custo de produção. Então, temos um prejuízo muito grande. Provavelmente, vamos ter um problema com muitos produtores não conseguindo sobreviver nessa virada de temporada, de nova safra”, alertou o consultor.

No que diz respeito ao mercado de feijão, Brandalizze explica que o início do ano apresentou um cenário mais favorável para o setor, diante de uma safra maior, especialmente na 2ª safra, mas apesar da disponibilidade abundante e dos preços relativamente baixos, o poder de compra do consumidor foi impactado e afetou a demanda. “Essa situação não se deve apenas aos preços baixos. Uma parcela significativa da população, consumidora de alimentos básicos como arroz e feijão, enfrenta endividamento.  A relação de troca com o frango, por exemplo, que é outra fonte de proteína, revela essa dificuldade. Atualmente, são necessários quase três quilos de feijão para adquirir um quilo de frango”, completou.

Já de acordo com o presidente do Ibrafe, Marcelo Lüders, essa redução do consumo de feijão trouxe insegurança financeira para o mercado da leguminosa, atingindo muitas regiões produtoras do Brasil. "Em algumas regiões estávamos vendendo o feijão por R$ 120,00, R$ 130,00, diante de um custo de produção de R$ 180,00 ou R$ 190,00. Isso afetou demais o produtor e poderá chegar a impactar também o consumidor", explicou. 

Para 2026, Lüders projeta que existe sim a perspectiva de preços melhores para o feijão Carioca e Preto em comparação a 2025, com uma produção podendo chegar a 500 mil toneladas, “claro que dependemos de fatores como clima, disposição do produtor e informações estratégicas sobre o mercado. Mas, a comunicação entre os produtores será e é fundamental para definir o que plantar nas três safras do ano. Uma das formas que nós vamos atingir nosso objetivo é colocando o feijão em discussão na sociedade”, afirmou.

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Por:
Raphaela Ribeiro
Fonte:
Notícias Agrícolas

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