Mudanças no Manual de Crédito Rural, em vigor desde maio, dificultam renegociação de dívidas com bancos
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Entrevista com Francisco Torma - Advogado Agrarista sobre as Nova Prorrogação do Crédito Rural
DownloadA nova prorrogação do crédito rural, por Francisco Torma*
O Manual do Crédito Rural passou recentemente por uma das mais profundas alterações de todos os tempos, que alterou significativamente suas regras.
A Resolução 4.833, de 23 de dezembro de 2020, do Conselho Monetário Nacional e a Resolução 4.905, de 29 de abril de 2021, do Bacen, entraram em vigor em 1° de maio deste ano, e, entre outras alterações, modificaram por inteiro a Seção 6 do Capítulo 2 do MCR.
Isto significa que a tradicional prorrogação automática do crédito rural do item 2.6.9 foi alterada pela primeira vez na sua história.
A alteração foi tão profunda que a prorrogação saiu do item 9 para o item 4, de modo que seu número dentro do MCR agora é 2.6.4.
Para fins de comparação, assim era o caput do item 2.6.9:
Independentemente de consulta ao Banco Central do Brasil, é devida a prorrogação da dívida, aos mesmos encargos financeiros antes pactuados no instrumento de crédito, desde que se comprove incapacidade de pagamento do mutuário, em conseqüência de: (Circ 1.536)
Agora a nova redação, no item 2.6.4:
Fica a instituição financeira autorizada a prorrogar a dívida, aos mesmos encargos financeiros pactuados no instrumento de crédito, desde que o mutuário comprove a dificuldade temporária para reembolso do crédito em razão de uma ou mais entre as situações abaixo, e que a instituição financeira ateste a necessidade de prorrogação e demonstre a capacidade de pagamento do mutuário: (Res CMN 4.883 art 1º; Res CMN 4.905 art 1º)
Os casos de prorrogação elencados nos incisos (dificuldade de comercialização, frustração de safras e outros fatores adversos seguem inalterados.
De inicio, observamos a semelhança da nova redação com recentes ferramentas de renegociação de dívidas, como a Resolução 4.755 do Bacen e a linha de refinanciamento Pro-CDD Agro do BNDES, em clara demonstração do maior endurecimento das possibilidades de prorrogação de dívidas rurais.
Quanto ao caput, a primeira grande alteração é que a prorrogação antes era devida, agora é autorizada. Ou seja, de imperativa passou a ser opcional, a critério da instituição financeira.
Evidentemente que não se desconhece o teor da Súmula 298 do STJ que afirma ser direito do produtor rural o alongamento das suas dívidas, e não faculdade da instituição financeira. Neste passo é importante destacar que a referida Súmula foi baseada nas discussões decorrentes da Lei 9.138/1995, que assim dizia:
Art. 5º São as instituições e os agentes financeiros do Sistema Nacional de Crédito Rural, instituído pela Lei nº 4.829, de 5 de novembro de 1965, autorizados a proceder ao alongamento de dívidas originárias de crédito rural, contraídas por produtores rurais, suas associações, cooperativas e condomínios, inclusive as já renegociadas, relativas às seguintes operações, realizadas até 20 de junho de 1995:
Ou seja, naquela oportunidade o STJ sumulou o entendimento de que o termo “autorizados” constante na referida lei deveria ser interpretado como “obrigados, desde que demonstrados os requisitos“.
Esta interpretação é favorável à relativização do termo “autorizada” no novo item 2.9.4 do MCR, com uma pequena observação: A Súmula expressamente refere que a prorrogação é direito do devedor nos termos da lei. O MCR não é lei e o novo texto decorre de resolução do CMN. Certamente discussões existirão.
Por outro lado, como novo elemento, temos agora o requisito de que a própria instituição financeira deverá a) atestar a necessidade da prorrogação e b) demonstrar a capacidade de pagamento do mutuário.
Este elemento é inovador no MCR e certamente reduzirá substancialmente as efetivações de prorrogação do crédito rural no atual cenário.
Isto porque agora a prorrogação só é exigível se a instituição financeira entender ela como necessária. E o MCR não disciplina nenhum critério que a instituição deve levar em conta na sua análise.
Além disso, agora cabe à própria instituição financeira comprovar a capacidade de pagamento do tomador do crédito rural, encargo este que antes era do próprio produtor.
Ou seja, daqui para a frente, temos a convicção de que somente produtores rurais que possuem um bom histórico de relacionamento com as instituições operadoras do crédito rural e que primam seus negócios pela lealdade, boa-fé e adequada gestão é que poderão utilizar-se desta ferramenta emergencial de fôlego momentâneo em relação aos seus contratos de crédito rural.
*FRANCISCO TORMA é advogado agrarista, especialista em direito tributário, pós-graduando no MBA em Agronegócio ESALQ/USP, coordenador do portal AgroLei, membro da UBAU, professor de direito agrário, palestrante, colunista e escritor. Co-fundador do projeto “Direito Agrário Levado a Sério“.
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