E agora, o que vamos fazer com tanto milho?
O Brasil caminha para a maior safra de milho de sua história, 84 milhões de toneladas, o dobro do que produzíamos há 10 anos. E neste período houve uma quebra de paradigma e uma inversão no que se fazia antes. A segunda safra de milho, antes chamada de safrinha, superou a primeira, e hoje representa mais de 50% da produção do cereal. Isto demonstra, acima de tudo, a capacidade do produtor de aproveitar melhor sua propriedade, de ser mais competitivo, mais sustentável, produzindo mais na mesma área. Entretanto, temos um novo desafio: precisamos escoar e armazenar com eficiência todo este milho.
Sabemos que a capacidade de armazenagem de grãos, sobretudo soja e milho no Centro-Oeste, está longe da real necessidade. E vimos isso piorar ao longo do tempo, já que se produz cada vez mais, onde houve muito pouco investimento para ampliar e instalar novas unidades armazenadoras. Com isso, ter uma capacidade de armazenar de 75% da produção agrícola, a menor entre nossos competidores, passou a ser um problema real no escoamento da safra. Como parâmetro, os EUA têm capacidade para 130% da sua produção.
Se considerarmos o critério da FAO, a capacidade estática ideal seria de 1,2 vezes a produção do país ou região. Isso garantiria um bom gerenciamento da comercialização e com benefícios, acima de tudo, para o produtor. No caso do Brasil, utilizando os dados da Conab, para esta safra de 184 milhões de t, ao invés de 143 milhões a capacidade de armazenagem deveria ser de 221 milhões de t. Ou seja, o déficit aparente de 41 milhões de t, saltaria para 78 milhões e assim precisaríamos aumentar em 54% a capacidade atual.
Mas, para que o produtor tivesse um benefício real, o aumento da capacidade de armazenagem deveria ocorrer nas propriedades. E infelizmente, os mesmos dados da Conab apontam que, apenas 13,6% da safra brasileira é armazenada na fazenda, enquanto nos Estados Unidos são 65% e Argentina 40%. Se adotarmos o número dos EUA como ideal, significa que o Brasil deveria estar armazenando 100 milhões de t de grãos nas fazendas e não as atuais 25 milhões de t.
Este déficit de estocagem gera ágio tanto na armazenagem de terceiros como no transporte. E como o produtor fica sem alternativa, seus custos com armazenagem e transporte sobem. E uma safra que deveria gerar rentabilidade, começa a se corroer em prejuízos. Em estudo recente, a Agroconsult demonstra que em 2007, o gasto com logística de armazenagem e transporte do milho que era de 4,8 dólares por saca, nesta safra deve ser de 7,0 dólares.
Com isso, houve um crescimento nos custos fora da fazenda de 46% em apenas cinco anos. É importante ressaltar que hoje o custo para se produzir milho no MT é em média de seis dólares a saca e a logística custa sete dólares. Como o milho é uma commodity e seu preço é definido em bolsa, todo esse custo ao invés de ser compensado, vira rentabilidade negativa, calculada pela Agroconsult em cerca de 200 reais por hectare plantado.
Vejam a gravidade disso. Esta rentabilidade perdida, mesmo em um ano de preços mais baixos, deveria ser positiva em 200 reais se investimentos em armazenagem, logística de transporte e portos, tivessem sido feitos. Com isso, produtores pagam um custo alto pela falta de planejamento do governo e investimentos adequados em armazenagem em nível de propriedade e modais de transporte mais competitivos.
Segundo a Agroconsult, para atender a necessidade da soja e milho, deveriam ser feitos de imediato, investimentos de 9 bilhões de reais em armazéns e até 2023 mais 20 bilhões. O governo pretende lançar uma nova linha de armazenagem no Plano Safra. Mas, liberar recurso não basta, é preciso implementar uma política para que o recurso seja aplicado de forma eficiente, sobretudo nas propriedades?
Enquanto o mundo demanda maiores produções a custos mais competitivos, o Brasil tem um enorme potencial principalmente na produção de milho, produzimos em média 88 sacas/ha enquanto os EUA produzem 160 sacas/ha. E se por um lado temos um enorme espaço para ganhar em produtividade, o que é muito positivo, os produtores precisam de um direcionamento do governo para que isso seja feito de forma competitiva. O Brasil quer ou não se consolidar como um grande fornecedor de alimentos ao mundo?
Porque com a realidade atual, podemos concluir que a eficiência dos produtores brasileiros se voltou contra ele mesmo, pois se produzem mais pressionam os custos de armazenagem e transporte. Com os atuais problemas de logística e armazenagem, se não forem intensificados e acelerados os investimentos para solucioná-los, a cada tonelada a mais produzida veremos o quadro se agravar. E por isso, o governo precisa decidir se tem ou não um compromisso com o crescimento do país.
4 comentários
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Ricardo Luz da Cunha Monte Santo de Minas - MG
Fazer cerveja, vodca ou álcool que os alimentos passaram a ter valor quando os EUA resolveram fazer combustível com milho.
José Carlos Dias do Prado Sinop - MT
Glauber,òtima matéria nós aqui em Sinop Mt, vivemos uma situação frequente toda safra não há espaço fisico suficiente para armazenar a safra e o Milho é depositado a céu aberto este ano preocupa parece que a chuva tem mudado seu comportamento chovendo fora de época isto pode comprometer a safra que esta inciando as colheitas e daqui 30 dias é o forte da colheita onde vamos depositar estes grãos...?Os produtores ja começam a fazer ameaças em plantar na safrinha de 13/14,milheto feijão cawpea ou crotalaria por cuasa de falta de preços minímo, armazenagem e logistica...
RODRIGO LEANDRO GUZZO Quedas do Iguaçu - PR
Parabéns pela matéria Glauber. Sou diretor da ACEBRA(Associação das Empresas Cerealistas do Brasil) e membro da Câmara Temática de Milho e Sorgo em Brasília. Também compartilho a mesma opinião quanto aos problemas de armazenagem e logística que enfrentamos no Brasil e estamos pressionando muito o governo para que no Programa PSI seja contemplado também obra civil e elétrica nas mesmas taxas de juros para que o produtor, cooperativas e no Sul do Brasil em especial, as CEREALISTAS possam aumentar suas estruturas afim de sanar problemas que todo ano enfrentamos com a logística e o aumento de produção. Saliento que para o produtor rural investir em estrutura, ou é agricultor grande ou deve trabalhar em forma de associações pois temos levantamento de dados onde constatamos que se torna inviável uma estrutura completa de armazenagem com menos de 250 mil sacas de recebimento, ao menos no Sul do País.
Pedro H Dejneka Chicago/Londrina - PR
PARABENS pelo excelente artigo Glauber... um dia, quem sabe, finalmente entenderemos que ser o maior produtor de seja qual for a commodity nada importa se nao temos a estrutura necessaria para suportar tal avanco de producao... repito: "O Brasil esta com a faca e o queijo na mao, so falta querer cortar o queijo"...
Novamente, o parabenizo por excelente artigo e espero que este seja lido e apreciado por muitos... Abs, PHD