Brasil lidera a ascensão dos bioinsumos em um modelo de agricultura mais sustentável
O agronegócio brasileiro vive uma transformação silenciosa, porém profunda: a ascensão dos bioinsumos. Em poucos anos, o país se consolidou como um dos mercados mais promissores do mundo para essas tecnologias, com crescimento mais acelerado do que o observado em outras grandes potências agrícolas. A combinação entre escala produtiva, ambiente regulatório favorável e demanda crescente por sustentabilidade coloca o Brasil em posição estratégica para liderar essa nova era da agricultura.
Segundo levantamento da Kynetec, o controle biológico já representa 7% do mercado total de proteção de cultivos — mais que o dobro do registrado em 2019/2020, quando era de 3%. Em área tratada, os produtos biológicos já cobrem 78 milhões de hectares, frente aos 2 bilhões ainda dominados por defensivos químicos. A adoção pelos produtores cresce rapidamente: 31% na safra 2022/2023, saltando para 43% em 2024/2025. O movimento reflete tanto a busca por eficiência quanto a pressão do consumidor por alimentos mais saudáveis e com menor impacto ambiental.
O Brasil também tem se beneficiado de um processo de registro mais ágil. Enquanto na Europa o tempo médio de aprovação de novos produtos é de dez anos, por aqui ele gira em torno de dois. A aprovação da Lei de Bioinsumos (Lei nº 15.070/2024) reforça esse ambiente de incentivo, ainda que o setor aguarde o decreto regulamentador. O marco legal sinaliza um caminho sem volta: a integração dos bioinsumos às práticas agrícolas como política de Estado e vetor de inovação.
Os números mostram tanto o avanço quanto os desafios. Atualmente, o país conta com 800 produtos registrados para controle de pragas e 755 inoculantes, segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária. O gênero Bacillus domina o cenário, presente em 30% dos registros. Já entre os inoculantes, cinco espécies concentram 81% dos produtos, evidenciando uma base biológica ainda restrita, mas com grande potencial de diversificação.
As lavouras de soja são o principal destino dos bioinsumos, pois metade dos registros se concentra nessa cultura. Isso reforça a necessidade de ampliar o portfólio para outras cadeias produtivas. Outro dado relevante é que 77% dos inoculantes atuam na fixação de nitrogênio, o que indica espaço para novas soluções voltadas à absorção de outros nutrientes e à eficiência no uso de fertilizantes.
Embora mais de 150 empresas possuam produtos registrados, o setor ainda passa por uma fase de consolidação. Startups e companhias menores têm sido adquiridas por grandes grupos, o que tende a aumentar a competitividade e acelerar a escala de produção. Diferentemente de uma bolha, trata-se de um mercado com base sólida, que representa apenas uma pequena fatia do potencial total de proteção de cultivos — e que tende a crescer especialmente em bioinseticidas e biofungicidas.
A venture builder WBGI por exemplo, concentra seus esforços em startups oriundas das pesquisas acadêmicas e tem em seu portfólio empresas de insumos biológicos como a Ideelab, Demetra e Life Biological Control.
Há, contudo, entraves regulatórios e técnicos a superar. Hoje, um produto não pode ser registrado simultaneamente como bioestimulante e controle biológico, ainda que apresente ambas as funções, exigindo um segundo registro com outro nome. Falta também padronização de testes de compatibilidade entre produtos de diferentes fabricantes — o que pode comprometer resultados no campo e a confiança do produtor. Além disso, a carência de conhecimento técnico e de capacitação ainda é um gargalo para ampliar o uso responsável e eficiente dessas soluções.
O cenário global também pressiona por mudanças. O uso de herbicidas no Brasil cresceu 128% entre 2010 e 2020, segundo estudo da Embrapa, devido à resistência de plantas daninhas. Essa realidade reforça a urgência de investir em bioherbicidas eficazes. Ao mesmo tempo, crises internacionais e guerras comerciais têm elevado o custo dos insumos químicos importados, fortalecendo a necessidade de reduzir dependências externas e desenvolver alternativas locais.
O avanço dos bioinsumos não é apenas uma tendência de mercado: é uma resposta estratégica a desafios econômicos, ambientais e produtivos. O Brasil, com sua base agrícola sólida, capacidade científica e agilidade regulatória, reúne as condições ideais para transformar essa revolução silenciosa em um novo marco de competitividade global. Investir em bioinsumos é investir em soberania tecnológica, sustentabilidade e no futuro da agricultura brasileira.
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