A diferença entre torcer e analisar, por Flávio França Jr.

Publicado em 17/10/2014 17:44
Flávio Roberto de França Junior é analista de Mercado, Consultor em Agribusiness e Diretor da França Junior Consultoria.

Prezados amigos. Como era de se esperar em assunto tão polêmico, houve grande repercussão entre os leitores do Notícias Agrícolas o meu texto escrito na semana passada sob o título “Porque o Agronegócio prefere Aécio”. E a julgar pelas manifestações de apoio, ou mesmo de discordância, o objetivo maior de meu comentário foi atingido, ou seja, elevar o nível do debate e fazer uma discussão civilizada e democrática sobre um tema de relevância para a vida de todos nós. Especialmente considerando que nos próximos dias estaremos definindo o futuro do país nesses próximos anos. Afinal, ao se pronunciar sobre determinado assunto, temos que estar preparados para contrapontos e argumentos contrários, pois é exatamente assim que a nossa sociedade poderá evoluir. Desde, é claro, que eles aconteçam de forma respeitosa, como a que observei nessa última semana em nosso fórum de debates. A esse processo podemos chamar de maturidade. Portanto, ponto para o nosso setor. 

Tinha imaginado comentar esta semana sobre um assunto diverso, quando fui convidado por nossos amigos leitores a comentar outro texto escrito neste espaço. Nele, meu colega colunista comentou da necessidade dos preços da soja subirem de novo a US$ 15.00/bushel na Bolsa de Chicago para que a oferta seja elevada e a disponibilidade global seja abundante. Pelo menos foi essa a minha interpretação, uma vez que a forma em que o texto foi escrito pode gerar algumas mais. Evidentemente, que por uma questão ética, não o farei. Não me cabe dizer se um texto foi bem ou mal escrito, se tem ideias claras ou contraditórias, se está bem fundamentado ou se é tendencioso. Se está somando para a discussão ou se está prestando um desserviço ao setor. Esse papel é seu, meu amigo leitor do Notícias Agrícolas, seja produtor ou qualquer outro agente desse nosso imenso segmento. 

Vou me ater aqui a dar uma opinião sobre como enxergo o mercado de soja neste momento. Deixando os detalhes técnicos e argumentos numéricos para as análises que você pode encontrar em nosso site, acredito que por mais que tenhamos a nossa preferência, ou torcida, o mercado é sempre soberano.

E esse mercado se movimenta de acordo com uma enorme gama de variáveis, fundamentais, técnicas e psicológicas. Passamos vários anos com os preços na CBOT no alto, bem acima da média. Apesar dos inúmeros momentos de flutuação, e outras variáveis adicionais, se mantiveram predominantemente aquecidos basicamente porque os estoques norte-americanos permaneceram muito apertados nas últimas sete temporadas. Inclusive culminando com a safra 2013/14, que atingiu o mais baixo patamar desde 1973. Esse aperto foi resultado da combinação de firme demanda mundial e sequenciais problemas de oferta (quatro anos seguidos nos EUA e alternados no Brasil e Argentina). 

Numa espécie de morte anunciada, as cotações vieram recuando durante este ano, até se aproximarem dos US$ 9.00 recentemente. E entre outros motivos adicionais, essencialmente por conta da supersafra que os norte-americanos vão colhendo e o consequente aumento dos estoques para patamar muito superior à média. Junta-se a isso a expectativa de aumento de área e produção na América do Sul, e temos consolidado o movimento baixista atual para os preços. E que arrisca se estender até 2016 caso as primeiras sinalizações de novo aumento de área e produção nos EUA em 2015 se confirmem.

E contra essa overdose esperada de oferta não há muito o que fazer, pois a expectativa de favorável crescimento da demanda, já turbinada pelo recuo dos preços, não deve impedir o aumento generoso das posições de estoques nos EUA e no mundo. 

Inclusive, em cima desse argumento de influência positiva da demanda é que trabalho com cotações mais para o lado dos US$ 10/11.00 no próximo ano, do que os US$ 8/9.00 como sinalizam os analistas da inércia (aqueles que sempre apontam para a direção corrente dos preços: se está caindo, apostam que vai continuar caindo mais; mas se está subindo, acreditam que vai continuar subindo para sempre...). Mas sobreoferta só se resolve de duas maneiras: corte na produção ou aumento da demanda. Ou, é claro, com a combinação de ambos. Como a demanda não se multiplica do dia para a noite, acaba atuando mais no longo prazo dos preços. Por isso para invertermos a curva das cotações de forma significativa no curto e médio prazos, fato novo precisa acontecer para conter essa multiplicação dos estoques. E neste caso, essencialmente pelo lado da oferta. Por isso, em minha humilde opinião, falar hoje de soja na CBOT a US$ 15.00/bushel é torcida, e não análise. 

Um “AgroAbraço” a todos!!!
www.francajunior.com.br e [email protected] 

Já segue nosso Canal oficial no WhatsApp? Clique Aqui para receber em primeira mão as principais notícias do agronegócio
Tags:
Fonte:
França Junior Consultoria

RECEBA NOSSAS NOTÍCIAS DE DESTAQUE NO SEU E-MAIL CADASTRE-SE NA NOSSA NEWSLETTER

Ao continuar com o cadastro, você concorda com nosso Termo de Privacidade e Consentimento e a Política de Privacidade.

9 comentários

  • João Castaldo Umuarama - PR

    Produtor também deve ser analista antes de tudo. Analista de informações. Quando o Dejneka andou pelo Paraná recomendando os produtores a vender soja a R$ 50,00 - R$ 52,00 na época, a perspectiva era de queda brutal pela área plantada nos USA e pelo grande movimento que os fundos faziam na bolsa naquele momento (vendendo muito na expectativa de notícias de safra recorde). Produtores que viram cotações de 80,00 um ano antes estavam desesperados no momento. Recordo de um na sala que não havia fixado em 55 dois dias antes e já contabilizava "uma caminhonete" de prejuízo naquele dia.

    O comentário do Dejneka sempre foi "se não houver nada de novo, o cenário é este!". Pois bem, veio a seca nos USA, os preços viraram, subiram a patamares ótimos novamente e o Dejneka pagou o pato, pois quem se lembrava do "se não houver nada de novo" ?!.

    Quem acompanhou os programas do canal e assistiu o encontro dos analistas este ano ouviu de tudo. Soja a 10, soja a 11, soja a 13, soja a 15. Quem acreditou fielmente a alguma dessas posições pode ou não ter "lavado a alma".

    O grande problema está no "acreditar fielmente". Analistas fazem análise e não adivinhações, produtor tem de sempre lembrar disso. Grande parte da análise momentânea é correta e quase todas dizem a mesma coisa. É fato! Americanos plantaram muito, nós vamos plantar mais ainda. "Se nada de novo aparecer, o cenário é este!".

    Cabe lembrar também dois fatores muito importante. Primeiro, o mercado é formado numa bolsa onde o próprio produto não importa tanto assim para os participantes e talvez o mais importante, que o investidor dessa bolsa ganha tanto na alta como na baixa!. Visto isso, observe que quando em tendência de alta, os movimentos geralmente são mais cadenciados, com retornos antes de novos picos, testando e quebrando resistências com o passar dos dias, em busca de certezas se aquele movimento é mesmo sustentado. Já o movimento de queda, este é rápido, ligeiro e pode gerar ENORMES lucro em apenas um dia de comercialização para os investidores vendidos.

    Portanto, antes de abrirmos nosso armazéns por qualquer informação ou análise surpreendente que apareça do dia para a noite, devemos ter cautela e paciência para ponderar tudo oque foi dito e escrito antes de ações precipitadas. Analisemos as análises em primeiro lugar.

    0
  • Eduardo Lima Porto Porto Alegre - RS

    Prezados, estou longe de ser um Analista com a experiência e conhecimento técnico acumulado, como os Senhores França Junior e Liones Severo. Tenho observado com atenção os movimentos do mercado de Soja nos últimos anos e noto que a memória histórica é pouco levada em conta, quando se trata de analisar os fatores que influenciaram os preços em determinados momentos críticos. Nos atemos apenas aos valores que ficaram registrados e perdemos os fundamentos subjacentes. Os comentários do Sr. França Júnior são extremamente coerentes, assim como as análises proferidas pelo Liones Severo (que em minha opinião é um dos maiores conhecedores do Mercado Mundial de Soja). Conheço profundamente a China e há anos viajo para lá. Não vi até hoje os comentários daqui aludirem os preços praticados na China, tendo em vista que esse País é o verdadeiro direcionador da demanda mundial. Importante destacar que nas ultimas semanas o mercado de Soja na China operou em tendência contrária a Chicago. Lá existem 2 tipos de Contratos de Soja, o tipo "1" que é o Grão Convencional voltado para a Alimentação Humana e o tipo "2" que é o Transgênico. O Contrato com vencimento em Maio/2015 no dia de hoje aponta para as seguintes cotações, já convertidas para R$/Sc de 60kg para facilitar o entendimento: 1) Convencional = R$ 108,57/sc; 2) Transgênico = R$ 75,30/Sc. Esses valores estão relacionados aos locais de produção que se situam no Noroeste do País, podendo atingir valores com até USD 100,00/ton a mais no Sul da China onde se concentra uma produção significativa de Ração Animal. Essa discrepância de valores se justifica pela pressão de demanda na China e outros fatores que podem ser coincidentes ou não com o que está acontecendo no Ocidente. Por esse motivo, é que tenho acompanhado com muita atenção aos comentários do Liones Severo nos últimos anos e posso dizer-lhes que o percentual de acerto dele é bastante elevado. A tendência altista dos preços do Soja se verifica numa análise dos últimos 20 anos, onde ocorreu uma subida vigorosa em 16 anos da série. O USDA está indicando que as exportações americanas esse ano já estão em patamar 11% superior em relação ao ano passado, além da industrialização estar maior também. Se tivermos uma frustração de Safra na América do Sul, ainda que pequena, a lógica indica que os preços do Soja estarão bastante pressionados. Se posso manifestar algo para os Produtores de Soja é que estudem e estudem, busquem sair da mesmice e deixem de seguir a Manada por simpatia ou porque é mais conveniente. Produtor Profissional busca alternativas, analisa com olhos críticos e fundamentalmente não fica chorando aos 4 ventos que perdeu Dinheiro por ter ouvido uma opinião. Os mesmos que reclamam ter perdido "Dinheiro" com as opiniões que ouviram gratuitamente de Analistas, não aparecem para dividir o "Lucro" quando a essa opinião se mostra acertada. Deixemos de nos escorar nas costas alheias para justificar erros de nossa exclusiva responsabilidade.

    0
  • RUDIMAR PALHARINI jatai go - GO

    Vejo, alguns ataques ao Sr Liones, tendo em vista sua defesa que os preços do soja estao abaixo do que deveriam e acho que disso ninguem duvida, pois hoje alem da produção existente nos EUA, ha uma forte atuação de fundos de investimentos, que em algum momento/hora precisam recompor suas carteiras. Quero salientar que entre abril e maio deste ano em varios posts, o mesmo recomendava a venda da safra velha o que fiz e obtive resultados melhores do que ficar com a soja em mãos. Tambem lembro que em varios comentarios quando abriu o mercado para safra futura 2014/2015 na faixa em Goias de preços entre R$53,00 a R$ 54,00 o mesmo acoselhou vendas futuras para pelo menos cobrir os custos ja conhecidos da safra futura, diga-se de passagem que nao segui a recomendação, o que nesse momento me arrependo.Quem se expõem corre mais riscos, os que ficam em cima do muro, nao nos agregam nada, pois o basico sabemos e as vezes entendo que também deveriamos seguir nossos instintos e deixar a ganancia um pouco de lado. Agora seguir ou não a orientação dependem de nosso discernimento. Abraços

    0
  • João Biermann Tapera - RS

    Os comentários que vejo aqui é ranço de quem perdeu dinheiro sonhando, mas não é de todo culpa do produtor, algum tempo atrás o Pedro Dejneka falou em soja podendo ir a 20 (na época que tava 18), como não se confirmou o site deu uma cortada em seus comentários, o mesmo aconteceu com Liones, que foi na minha opinião mal interpretado, ele tem uma visão de longo prazo. Enquanto o analista do texto acima fala o que todos sabemos, se tiver mais demanda e quebra de safra o preço sobe, mas quem não sabe isso? Esse tipo de "análise" é realmente necessário?

    0
  • Luiz Alfredo Viganó Marmeleiro - PR

    O sojicultor se comporta como eleitor: Acredita naquilo que quer ouvir, ou seja, o "analista" ou o "político" normalmente fala aquilo que a platéia anseia em escutar. Acho que na hora de negociar seu produto, seja qual for, o agricultor tem de julgar todas as variáveis possíveis, desde as análises isentas ou interesseiras até avaliar o juro que o banco lhe cobra. Segurar o soja esperando uma alta e pagando juro caro no banco ou nos fornecedores é bom pra você? Compensa esse risco? Somos bons em plantar e colher, mas na hora de negociar a safra somos extremamente amadores, ai vem a choradeira do "deixei de ganhar". Acredito que cada um tem de saber onde dói o seu calo, e deixar a especulação pros especuladores profissionais, coisa que nós agricultores não somos.

    0
  • alexandre fraga Londrina - PR

    Enfim alguns estão percebendo que nem tudo que se fala, em palestras ou na internet, é a mais pura verdade. Adorar alguém por ouvir dele o que se quer ouvir é no mínimo perigoso. Atentar a opiniões distintas, inclusive contrárias às nossas, permite enriquecer nossas crenças. Além do Flávio, temos importantes analistas como Pedro Dejneka, Marcos Araújo e tantos outros. Mas cabe a cada um de nós tirar suas próprias conclusões sobre o mercado.

    0
  • augusto hammerstein Belo Horizonte - MG

    Flávio, não lhe conheço, mas gostaria de lhe parabenizar pelo texto coerente, equilibrado, e sobretudo antenado com o que realmente está acontecendo no mercado.

    Hoje, infelizmente, vemos muitos analistas "torcedores" de tendências, ao invés de analistas imparciais. O dr Liones Severo gosta muito de tendência altista. Eu também gosto, mas não é assim que funciona.

    Sou produtor, mas não sou tolo. Infelizmente (para nós, produtores) os preços caíram.

    O mercado é feito de ciclos, sempre foi assim, sempre será. Passamos por "vacas gordas" nos últimos 4 anos. Não será uma catástrofe passar 1 ou 2 anos de vacas magras... Pra quem não está alavancado, vai ser tranquilo. Mas quem deu passo maior que a pena, vai ter problemas...

    0
  • joao hertinger Assis - PR

    Quem dera eu tivesse escutado vc, Flavio França Jr. Um analista de verdade.

    Sabe, um dia fui escutar uma palestra aqui em Assis, em maio desse ano, e teve um cidadão que falou para a gente segurar a soja, porque os preços iam só subir, e iam atingir máximas em junho. Pensei que ia ganhar dinheiro. A soja tava em 15,00 o bushel na bolsa... e ainda teve a pachorra de falar que soja nunca mais voltaria para 10,00 o bushel. Tá até gravado aqui nesse site pra ninguém dizer que tô mentindo.

    E olha só, a soja veio pra 9,00 o bushel e agora fala que os compradores tem que ser gente boa e pagar 15,00 o bushel, pra garantir oferta.

    Como vc disse, uma coisa é ser "torcedor", outra é ser analista de verdade. Isso é um desserviço para os produtores, que ficam iludidos escutando aquilo que querem escutar.

    0
  • Miguel Biegai Jr Genebra - Switzerland

    Excelente texto, Flávio.

    Concordo com sua análise. Nem tanto o Céu, nem tanto a Terra, mas acima de tudo, uma análise ponderada são coisas que precisamos neste espaço.

    0