O impacto anunciado da agricultura convencional, por Afonso Peche
A agricultura brasileira, reconhecida mundialmente por sua produtividade, enfrenta um paradoxo histórico: o avanço tecnológico e o aumento de produção em sistemas produtivos convencionais, têm ocorrido à custa da degradação dos solos, da erosão da biodiversidade e do esgotamento hídrico. O que antes simbolizava progresso revela, hoje, sinais evidentes de colapso ecológico.
Na década de 1930, o centro dos Estados Unidos viveu a maior catástrofe ambiental de sua história agrícola. As tempestades de poeira (Dust Bowl), consequência da mecanização intensiva, da monocultura, da mobilização profunda e da exposição excessiva do solo, devastaram milhões de hectares. O impacto humano e econômico foi tão severo que levou o governo à criação do Soil Conservation Service (SCS) em 1935, sob a liderança de Hugh Hammond Bennett, marco fundador do movimento global de conservação do solo.
O cenário brasileiro contemporâneo repete, em escala e complexidade maiores, as lições do Dust Bowl: uma sucessão de eventos climáticos extremos amplificados pela perda da cobertura vegetal, pela simplificação dos ecossistemas agrícolas e pela fragilidade estrutural dos solos.
A degradação manifesta-se de múltiplas formas, erosão laminar e em sulcos, compactação, acidificação, perda de matéria orgânica, salinização e processos de desertificação. Trata-se de um fenômeno difuso, cumulativo e de reversão difícil, agravado por práticas convencionais que priorizam o curto prazo em detrimento da resiliência ecológica.
A superação desse quadro demanda mais que novas tecnologias, exige uma transformação de mentalidade. O futuro da agricultura brasileira dependerá menos de insumos e máquinas e mais da capacidade de compreender o solo como organismo vivo.
O sistema plantio direto, manejo regenerativo, a agroecologia e os sistemas conservacionistas não representam modismos, mas o amadurecimento científico diante dos limites planetários. São práticas que restituem a fertilidade natural do solo, reforçam sua funcionalidade ecológica e devolvem autonomia às comunidades agrícolas.
O impacto anunciado da agricultura convencional é o colapso progressivo da fertilidade e da integridade dos ecossistemas produtivos. O Brasil, que reúne as condições ideais para liderar uma agricultura regenerativa tropical, encontra-se, contudo, aprisionado a um modelo anacrônico, exaustivo e autodestrutivo. Resgatar o solo é resgatar a base física e moral da própria agricultura.
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