Com aumento na produção produção nas indústrias e consumo estagnado, setor leiteiro encerra 2025 com forte perda de rentabilidade
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O ano de 2025 começou com otimismo para a pecuária leiteira brasileira. Os produtores viviam ainda o reflexo das margens mais favoráveis registradas em 2024 e entraram no novo ciclo acreditando em espaço para investimento, estabilidade e crescimento da oferta. Mas, conforme os meses avançaram, o cenário se inverteu: a combinação entre produção elevada, consumo interno fraco, importações persistentes e custos ainda altos resultou em um quadro de receita em queda e margens negativas. Para o Cepea, o setor encerra o ano em “modo defensivo”.
De acordo com a pesquisadora Natália Grigol, do Cepea/Esalq-USP, os primeiros meses de 2025 ainda trouxeram algum alívio para o produtor, com preços reagindo e margem operacional positiva. No entanto, a partir de abril, o mercado iniciou uma trajetória de queda contínua.
Tradicionalmente, o mercado lácteo segue um padrão conhecido como “U invertido”: preços sobem no início do ano, atingem pico no meio e desaceleram no final. Mas 2025 quebrou a sazonalidade. Depois de um primeiro trimestre positivo, o leite ao produtor caiu mês a mês até dezembro.
Em média, o litro pago ao produtor ficou em R$ 2,65 entre janeiro e outubro, recuo real de 3,3% em relação ao mesmo período de 2024. Mas esse número médio esconde a gravidade da curva: no quarto trimestre, a queda acumulada já superava 23% na comparação anual.
Oferta em alta pressiona preços em todas as pontas
O principal fator para o recuo dos preços foi a elevada oferta de leite ao longo de 2025. O setor vinha de um ciclo de margens favoráveis em 2024, que estimularam investimentos dentro da porteira. O clima também ajudou, favorecendo a produção de volumoso.
A pecuária leiteira brasileira registrou avanço significativo em 2025, segundo estimativas do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada). Os dados indicam que a produção total nas fazendas cresceu 3,5% no ano, impulsionada principalmente por condições climáticas favoráveis, maior disponibilidade de volumoso e investimentos realizados pelos produtores ainda em 2024, quando as margens eram mais positivas.
Além disso, o levantamento mostra que a coleta formal das indústrias aumentou 7%, alcançando aproximadamente 27 bilhões de litros no acumulado de 2025. O crescimento expressivo na captação reforça a maior oferta de matéria-prima disponível no mercado, resultado tanto do aumento na produção quanto da maior presença das indústrias na busca por leite no campo.
Esse avanço na oferta, porém, também trouxe desafios ao setor. Com mais leite disponível, as indústrias enfrentaram dificuldade para repassar preços ao varejo, ampliando a pressão sobre os valores pagos ao produtor ao longo do ano.
Os números refletem um mercado marcado pelo excesso de oferta e margens apertadas, cenário que exige cautela e atenção para 2026, especialmente diante da concorrência com importados e da desaceleração do consumo interno.
Com o mercado amplamente abastecido, as indústrias encontraram forte dificuldade em repassar preços ao varejo, e os laticínios acabaram comprando leite mais barato, repassando a pressão ao produtor.
Importações seguem fortes e elevam competição com Mercosul
Mesmo com o aumento da produção nacional, as importações permaneceram em patamar elevado, somando cerca de 2,3 bilhões de litros em equivalente-leite ao longo do ano. Houve recuo de apenas 3% frente a 2024.
Os principais fornecedores — Argentina e Uruguai — continuaram oferecendo produtos a preços mais baixos que o mercado doméstico, reforçando a concorrência com o leite brasileiro. Para muitas indústrias, importar leite em pó ainda foi mais econômico do que comprar a matéria-prima no país.
Essa competição direta dificultou qualquer recuperação de preços internos.
Custos se mantêm relativamente estáveis, mas renda cai rápido
No campo, o problema não foi apenas o preço. Ainda que os insumos não tenham sofrido explosões como em anos anteriores, os custos permaneceram altos o suficiente para limitar a margem.
O Custo Operacional Efetivo (COE) subiu 1,1% no acumulado do ano até novembro. No entanto, o que mais pesou foi a perda de poder de compra do produtor.
A relação de troca entre leite e milho deteriorou ao longo de 2025 e pressionou ainda mais as margens do produtor. Na média do ano, foram necessários 28,5 litros de leite para comprar uma saca de milho, mas o cenário piorou significativamente no final do período. No quarto trimestre, a relação subiu para 31 litros por saca, o pior patamar registrado em 2025.
O movimento reflete a combinação de queda no preço do leite ao produtor e custos ainda firmes na alimentação do rebanho, reforçando o cenário de rentabilidade apertada que marcou o segundo semestre da pecuária leiteira.
Com a receita despencando e os custos resistentes, a rentabilidade ficou negativa em boa parte das regiões monitoradas pelo Cepea.
Consumo interno não reage e exportações recuam
Se no lado da oferta o movimento foi de aumento, no lado da demanda a situação não avançou. A recuperação do consumo brasileiro de lácteos foi fraca, mesmo com o repasse das quedas de preços para produtos como leite UHT, que ficou até 15% mais barato no varejo.
As exportações, que poderiam aliviar o excedente interno, tiveram queda superior a 30% no ano. Ou seja, todo o volume produzido precisou ser absorvido no mercado doméstico, que não cresceu.
Um ano que termina com alerta: confiança abalada e ajuste inevitável em 2026
O saldo de 2025 para a pecuária leiteira é de desaceleração e cautela. Com oferta elevada, preços em queda, importações competitivas e custos ainda altos, o produtor encerra o ano com margens comprimidas e pouca segurança para investir.
Para 2026, analistas avaliam que parte desses ajustes pode ocorrer naturalmente, com redução gradual da oferta caso os preços sigam desestimulantes. Mas, sem uma estratégia nacional para competitividade, o setor pode continuar vulnerável à pressão de importações e depender quase exclusivamente do consumo doméstico — um mercado que tem crescido pouco.
A confiança do produtor foi abalada em 2025, e o setor inicia 2026 em busca de estabilidade, previsibilidade e condições que permitam recuperar margens e planejar o longo prazo.
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