No ESTADÃO: Cresce risco de inflação acima dos 6,5%

Publicado em 09/07/2014 10:16
Para evitar que o IPCA supere o teto da meta no ano, governo deve torcer para que o índice não passe dos 2,65% acumulados no 2º semestre

O governo federal precisa torcer para que a inflação se comporte de julho a setembro - situação improvável na visão de analistas, por causa da recomposição parcial da conta de energia e do impacto do clima na produção de hortifrutigranjeiros - para que o índice não feche o ano acima do teto da meta.

Se ultrapassar, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, será obrigado a escrever uma carta aberta ao ministro da Fazenda dando explicações: o IPCA terá estourado o teto da meta, de 6,5%.A alta do IPCA neste primeiro semestre, que ultrapassou em 0,5 ponto porcentual a inflação do mesmo período de 2013, deixou o governo sem margem. Ele precisa torcer para que a inflação não ultrapasse os 2,65% de alta acumulada nos próximos seis meses.

Esse cenário, pelos cálculos do BC, não é impossível: o risco de a inflação superar o limite é de 46%. O desempenho da inflação do primeiro semestre de 2014 foi o segundo pior do governo Dilma Rousseff, atrás apenas do primeiro ano, quando a carestia do período ficou em 3,87%. Esse resultado, no entanto, foi puxado pelo forte crescimento de 2010, quando o País avançou 7,5% e houve pressão sobre o preço dos serviços.

Estagflação. Os dados reforçam a tese de estagflação, uma combinação de economia praticamente estagnada e inflação alta. O custo de vida continua elevado em meio a uma previsão de crescimento anual, feita por economistas consultados pelo Banco Central, de apenas 1%.

A equipe econômica torce para que não ocorram novos choques de alimentos. O IPCA também não pode repetir os resultados de 2012 e de 2013 no segundo semestre, quando acumulou inflação de 2,68% e de 3% respectivamente.

“O BC espera uma desaceleração modesta e que está em linha com a do mercado. Mesmo comportado no mês a mês, as projeções para o IPCA estão perto do teto da meta, em 6,5%”, disse Mauro Schneider, economista-chefe da CGD Securities.

Copa. A avaliação de integrantes da equipe econômica é de que “boa parte” dessa inflação de junho foi provocada pela Copa e deve ser revertida em julho e agosto. Os técnicos do governo chamam a atenção para o boletim Focus, do BC, que semanalmente reúne projeções de analistas, para subsidiar a argumentação de que o custo de vida vai ceder. Eles lembram que o IPCA 12 meses à frente está em 5,89%, abaixo de 6%.

Para Carlos Thadeu de Freitas, economista-chefe da CNC, o dólar é a variável chave para a inflação. Ele pondera que com os programa de swap do BC e com a política de juros baixos nos EUA, a divisa não deve gerar pressões adicionais.

Na folha: 

Goleada: inflação 6% x PIB 1%

Inflação estoura o teto da meta, deve ficar por aí, mesmo com economia perto da estagnação

A INFLAÇÃO PASSOU do limite maior da folgada meta brasileira de variação de preços, soube-se ontem. Foi a 6,52%, dois centésimos além. Está por aí faz tempo, não faz lá grande diferença prática. Deve terminar o ano perto disso, 6,5%, assim como o crescimento da economia, do PIB, deve ficar perto de 1%.

Os resultados do último ano do governo de Dilma podem ser atribuídos à política econômica da presidente. Para o bem ou para o mal, nem sempre os governos são capazes de influenciar o desempenho da economia de modo relevante, no curto prazo (um, dois anos), a não ser em casos de incompetência extrema ou de fraude inesperada (estímulos econômicos loucamente insustentáveis).

Governos sobem no bonde andando, caso de 2011, para Dilma. Enfrentam infortúnios de crises externas, como a piora mundial de 2012. Em 2014, porém, não há como não dizer que Dilma colheu o que plantou: uma espécie algo exótica de estagflação (inflação relativamente alta com crescimento baixo). Exótica porque o desemprego é baixo.

Durante os anos de Dilma Rousseff, portanto, a tendência terá sido de piora do PIB e da inflação. Nos anos de Lula da Silva, a tendência foi de melhora do PIB e melhora da inflação, mesmo ainda quando os resultados eram horríveis, em meados de 2003. Esse progresso foi interrompido, temporariamente, apenas pelo colapso mundial de 2008.

Apesar do mau estado da economia mundial e de seus efeitos nocivos no Brasil, Dilma não teve de lidar com os efeitos de colapsos externos, como secas de capital e desvalorizações extremas da moeda. Evidente foi a deterioração lenta, gradual e seguramente daninha da administração macroeconômica que solapou as bases do crescimento possível, que era pouco e se acabou.

A poupança do governo baixou a cada ano (o deficit nominal subiu progressivamente). Em suma, o governo gastou além da conta.

O consumo do país cresceu continuamente, o que em parte se refletiu no aumento do deficit externo (a diferença entre o que o Brasil exporta e importa, vende e compra no exterior, em bens e serviços).

O consumo cresceu continuamente por causa de gastos diretos do governo e endividamento extra, dívida feita para carrear dinheiro para que os bancos públicos emprestassem mais dinheiro, quando os bancos privados julgavam mais prudente pisar no freio. O investimento do governo não cresceu, o investimento privado foi crescendo cada vez mais devagar e passou a minguar.

Sim, o desemprego está baixo (embora a quantidade de gente empregada cresça de modo cada vez menor), mas a produção brasileira não cresce, não oferta produtos a bom preço --a produtividade não cresce. Ou compramos lá fora (deficit externo) ou temos inflação. O PIB não cresce.

No entanto, difundiu-se a ideia entre demagógica, oportunista e ignorante que "não se come PIB, mas alimentos". Mas o PIB é simplesmente a renda nacional. Sem renda não se consome nada, a não ser com empréstimos, dívidas.

Toda a agitação desordenada do governo Dilma Rousseff produziu, em termos macroeconômicos, sinais de estresse e dissipação inútil de energia, inflação, déficits, dívidas, descrédito, empecilhos à retomada do crescimento nos próximos anos.

(por VINICIUS TORRES FREIRE)

 

A tendência é que a inflação permaneça bastante pressionada

Em junho, o IPCA subiu 0,40%, o suficiente para romper o teto da meta (6,5%) no resultado acumulado em 12 meses, chegando a 6,52%. O grande destaque foi a elevação na categoria Hotel (25,33%), sob um claro efeito Copa e adicionando, sozinho, 0,11 ponto porcentual. Se tivesse repetido o valor já elevado do IPCA-15 (de variação de 4,15%), a inflação de junho seria de 0,31%.

À parte o efeito Copa, houve boas notícias, como a deflação em Alimentação, de 0,11%, a primeira desde julho de 2013 (de -0,33%). Movimento em grande parte sazonal, porém começando a refletir o recuo dos preços internacionais das commodities agrícolas. Ainda no rol das boas notícias, a taxa de difusão (porcentagem de itens que registraram alta de preço no mês) desacelerou de 66,8% para 61,4%.

Apesar do tom mais otimista trazido pela alimentação e pelo caráter temporário do efeito Copa, a inflação permanece bastante pressionada. A média dos núcleos voltou a acelerar de 0,54% para 0,61%, ao mesmo tempo em que a variação dos preços livres passou de 0,41% para 0,45% (em 12 meses, foi de 7,04% para 7,28%, muito acima do teto da meta). O que ainda segura a inflação é o grupo dos preços administrados, com inflação em 12 meses acumulada em 3,93%. Com o início da recomposição das tarifas de energia elétrica - com o aumento de 18,06% nas contas de São Paulo - é apenas questão de tempo para que a inflação total se aproxime de 7%. Após atingir esse patamar, deve recuar, situando-se ligeiramente abaixo do teto da meta no fim do ano.

De maneira geral, temos um importante realinhamento dos preços relativos com o favorecimento dos serviços e, ao mesmo tempo, o realinhamento progressivo dos preços administrados. Some-se a isso um passado recente de hiperinflação, cujos escombros em forma de indexação ainda persistem. Não é à toa que o Copom reconhece que a inflação vai subir antes de recuar, porém, apesar da inflação pressionada, dada a forte desaceleração da atividade econômica, o Banco Central deve manter a taxa de juros em 11% até o fim do ano, pelo menos.

 

*Thaís M. Zara é economista-chefe da Rosenberg Associados, mestre em teoria econômica pela USP e 

Leonardo F. Costa é economista da Rosenberg Associados, é economista pela USP

 

Teto furado

POR CELSO MING, DE O ESTADO DE S. PAULO

Está mais do que na hora de cair na real. A inflação em 12 meses agora estourou o teto da meta (os 4,5% mais os 2 pontos porcentuais de tolerância) e nesses níveis tende a ficar instalada pelo menos nos próximos cinco meses. Em setembro e outubro, muito provavelmente rondará a altura dos 6,9%.

Se o próprio Banco Central (BC), que sempre se empenha em passar melado nas projeções sobre desempenhos ruins, já admite uma inflação de 6,4% para todo este ano, ficou mais provável o estouro do teto da meta ao final de 2014.

Essa inflação bem mais alta em 12 meses deverá agora colocar em marcha mecanismos de defesa contra perdas de patrimônio, mais do que habitualmente. E este é um fator autônomo de aumento de preços.

O governo Dilma vacilou muito entre combater a inflação e combater a estagnação. Não conseguiu nem uma coisa nem outra. Agora terá de enfrentar a campanha eleitoral tendo de explicar o mau desempenho da economia, sem argumentos convincentes para isso, e não tendo outras caras a expor na vitrine que não seja a dos administradores da economia com credibilidade fortemente desgastada até mesmo dentro do PT, como Guido Mantega e Arno Augustin.

O efeito Copa pode ter concorrido para a aceleração da alta em junho, como nesta terça-feira observou a coordenadora de Pesquisas de Preços do IBGE, Eulina Nunes dos Santos. Mas esse tipo de avaliação não leva muito adiante. Cada mês aparece um imponderável assim.

Para não ir mais longe, as verdadeiras causas da inflação estão lá no Relatório da Inflação, ainda que algumas delas venham sendo propositalmente disfarçadas pelo BC, como é o caso da frouxidão na administração das contas públicas.

Entre as causas estão a disparada dos custos trabalhistas muito acima da produtividade da economia e uma demanda que, embora algo mais fraca, continua sancionando a alta. Não dá para evitar outra fonte recorrente de pressão que é o represamento dos preços administrados (combustíveis, energia elétrica e transportes urbanos). É um fator que leva os remarcadores de preços a antecipar os reajustes.

Boa pergunta consiste em saber se a desaceleração das vendas e da produção não passa a concorrer para segurar a escalada inflacionária. Às vezes o governo dá a impressão de que conta com isso. O ministro Mantega tem insistido na aposta de que o afrouxamento do consumo se deve aos estragos no poder aquisitivo provocados pela inflação e, assim, deixa implícito que a menor demanda se encarregará de conter a aceleração dos preços. E, desse ponto de vista, ele está certo.

O diabo é que os radares também apontam para o inevitável desrepresamento dos preços administrados e do câmbio, hoje usado para conter a alta dos preços dos importados. Não se sabe em que ritmo acontecerá, até mesmo porque isso também depende do resultado das eleições.

Inflação alta demais e crescimento perto de zero serão os temas da campanha eleitoral, que será curta, mas intensa. É cair na real.

CONFIRA:

Para uma comparação, aí está o comportamento tanto dos preços livres quanto dos administrados. Estes detêm um peso próximo dos 25% na cesta de preços do custo de vida.

Concentração

A redução de 66,6% (em maio) para 61,4% (em junho) do índice de difusão é suficientemente significativa para afirmar que a inflação ficou muito mais concentrada. O efeito Copa (alta das passagens aéreas, dos aluguéis e das refeições fora de casa), que deverá diluir-se, não chega a pesar significativamente no orçamento do consumidor comum.

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ESTADÃO E FOLHA DE S. PAULO

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