Brasil desperdiça potencial hidroviário, 20 vezes mais barato que o transporte por rodovias
A hidrovia é o modelo de transporte menos oneroso que qualquer outra modalidade disponível no mundo. Mas, no Brasil, onde há condições geográficas bastante favoráveis a esse tipo de operação, os investimentos no setor andam na contramão. O meio mais utilizado é o rodoviário, que chega a ser 20 vezes mais caro que o fluvial. Estudos indicam que, caso o Brasil cresca uma média de 5% durante três anos consecutivos, o país pode entrar em colapso logístico.
Para uma nação reconhecida internacionalmente pela produção de alimentos, o risco de uma estagnação dos transportes é preocupante. Segundo Luciano Rocha, presidente da ABEPL (Associação Brasileira de Empresas e Profissionais de Logística), o transporte hidroviário é mais econômico porque cada unidade de condução tem capacidade de armazenar muito mais cargas. Além disso, não há perdas relacionadas ao desgaste da via, assim como uma menor utilização de combustíveis, o que ainda é uma vantagem para o meio ambiente.
Uma barcaça (unidade que compõe a embarcação) pode transportar até 1.500 toneladas em cargas. Na comparação com o transporte rodoviário, cada barcaça equivale a 60 carretas, que podem transportar no máximo até 25 toneladas. “Nas hidrovias não há pedágios, estradas esburacadas que causam danos à unidade de transporte e desperdício da carga, e o risco de roubo também é menor”, destaca Rocha.
Quando o comparativo é com as ferrovias, o sistema hidroviário também é mais vantajoso. Cada barcaça pode substituir até 15 vagões, com capacidade para carregar até 100 toneladas. Considerando a degradação da malha ferroviária brasileira, abandonada há cerca de 50 anos, a hidrovia se mostra ainda mais viável, por não oferecer riscos.
No estado de São Paulo, o modal hidroviário representa apenas 0,5% de todo o transporte feito, contra o percentual de 70 a 75% que representa o transporte rodoviário. De acordo com o presidente da ABEPL, os principais motivos estão relacionados ao fato de que as hidrovias começaram a ser exploradas há apenas 30 anos e os investimentos feitos pelos governos no sistema ainda são escassos.
Infraestrutura
Apesar da abundância de rios, que abrem amplas oportunidades para o transporte hidroviário no país, há problemas de infraestrutura nas rotas fluviais do Brasil. A profundidade dos rios é insuficiente para grandes embarcações, sem contar que há pontes muito estreitas que dificultam a passagem em determinados pontos. Outro problema é o acesso, pois ainda há poucas possibilidades de envio da carga até a margem dos rios. “As empresas, agora, estão construindo suas plantas próximas aos leitos dos rios para facilitar o transbordo até as barcaças”, informa o presidente da ABEPL, Luciano Rocha.
Os desafios são grandes, mas o potencial de desenvolvimento tem a mesma dimensão. Só o sistema Tietê-Paraná tem 2.400 quilômetros, interligando os cinco estados com maior produção de soja no país. “O número de rios é grande, mas temos de adaptar essa pujança ao sistema de transporte hidroviário”, destaca Rocha.
Cenário brasileiro
Mesmo sendo uma matriz modal pouco utilizada, a hidrovia cresce cerca de 20% ao ano e tem uma boa perspectiva para o futuro. Segundo Luciano Rocha, o governo do estado de São Paulo criou o PDDT (Plano Diretor de Desenvolvimento do Transporte), que visa acelerar o desenvolvimento das hidrovias. A idéia é elevar a participação do transporte hidroviário de 0,5% para 6% até 2020, com investimentos de cerca de R$ 180 bilhões nos próximos quatro anos.
Além disso, o Brasil começa a despertar para a necessidade de uma integração de todas as matrizes de transportes existentes no país que, segundo Rocha, seria o estágio ideal. Ele ressalta que o lançamento do PNLT (Plano Nacional de Logística do Transporte) visa estimular outras matrizes modais para diminuir a dependência brasileira do transporte rodoviário.
“A integração entre os vários modais podem fazer dos produtos brasileiros mais competitivos no mercado internacional”, destaca o presidente da ABEPL, lembrando da dependência entre a eficiência dos transportes e a qualidade e rentabilidade dos produtos.
Rocha faz um comparativo entre os cenários brasileiro e chinês. “A China pratica investimentos de 4% a 5% do PIB (Produto Interno Bruto) em infraestrutura, por isso conseguiu crescer tranquilamente uma média de 13%, nos últimos seis anos. No Brasil, os investimentos são da ordem de 0,3% a 0,4% do PIB, fazendo com que o crescimento constante se transforme numa ameaça de pane logística. Nenhum país cresce sem investimentos em infra-estrutura”, enfatiza.
O exemplo mais recente da pane que o Brasil corre o risco de enfrentar, segundo Rocha, foi a incapacidade que as empresas de veículos para transportes rodoviários demonstraram em 2007, quando o país teve um crescimento na casa dos 5% e a indústria foi incapaz de atender às demandas. “Isso demonstra o quanto o país é vulnerável em relação ao transporte rodoviário de cargas, o que pode gerar atrasos e cancelamentos de pedidos, e prejuízos à economia do Brasil”, destaca Rocha.
O presidente da ABEPL faz a ressalva de que o modal rodoviário continuará sendo muito importante, já que além de empregar mais pessoas, é o único capaz de buscar a carga onde é produzida. “O desafio é buscar alternativas para acrescentar outros modais aos sistemas de transportes”, observa, destacando a necessidade das interligações para evitar os gargalos.
PPPs
Na opinião de Rocha, a principal saída seriam as PPPs (parcerias público-privadas), que são uma oportunidade para o governo viabilizar a infraestrutura, com baixo investimento e alguma rentabilidade. “Infelizmente, a inoperância do governo acaba sendo repassada aos consumidores, com pedágios e outros encargos decorrentes da busca das empresas privadas pelo lucro”, pondera.
Mas a grande contrapartida da ampliação do sistema hidroviário de transporte é a maior competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional, bem como o desenvolvimento regional das diversas áreas envolvidas no processo. “Quando há uma estrutura de transporte mais organizada, os custos diminuem, aumentando a competitividade brasileira, gerando mais desenvolvimento para o país”, destaca Rocha.
Ferrovia
Investimentos em ferrovias também são escassos no país, para se tornar uma alternativa viável, a malha ferroviária precisa de mais investimentos. “Para tornar o setor mais atrativo, o ideal seriam mais investimentos na malha, com a construção de novas linhas, contornos ferroviários e infraestrutura de carga e descarga”, diz. Essa realidade já está sendo modificada com as concessões a empresas privadas, que iniciaram nos últimos anos a recuperação de trechos significativos da malha ferroviária.
A ferrovia recuperada, interligada às outras matrizes modais existentes no Brasil, abriria a possibilidade de um melhor trabalho logístico no país, defende o gerente. “Mas os gargalos da ferrovia estão na infraestrutura de carga e descarga de produtos, além do grande número de passagens de nível, o que provoca a redução na velocidade das composições”, informa Fares.
Alto custo
Apesar de ser o meio de transporte de cargas mais utilizado no país, o modal rodoviário tem custo elevado, gerado principalmente pelo preço do combustível.
Transporte rodoviário, o mais utilizado no Brasil, tem o custo mais elevado entre todos os tiposO diretor operacional da Milho & Grãos Comércio Representações e Transporte, Jerônimo Afonso Costa, conta que o combustível é hoje responsável por 50% do valor do frete. “Um dos maiores problemas é o preço alto do combustível, principalmente o óleo diesel, porque todo dia nós temos que abastecer”, diz. Em um dos trechos mais percorridos pela empresa, a rodovia que liga Goiânia (GO) a Belém (PA), são gastos R$ 2 mil por caminhão, apenas com a compra de óleo diesel.
Além disso, a segurança nas estradas é outro fator preocupante, já que principalmente nas regiões norte e centro-oeste do país, os grãos são escoados em estrada de chão, sem asfalto.
Para Costa, o transporte hidroviário deveria ser mais utilizado, mas ele alerta que é preciso planejamento, já que as empresas têm pressa no recebimento da carga. “Se por um lado você tem economia, por outro, você tem as empresas que precisam fazer um estoque devido à demora (do transporte hidroviário), o que não compensa”, afirma. Além disso, ele alerta que algumas dificuldades podem ser encontradas no transporte hidroviário. “Dependendo da época do ano, se houver seca, os rios ficam rasos e a navegação se torna inviável”, explica.
Investimentos
O último levantamento feito pelo Ministério dos Transportes através do PNLT (Plano Nacional de Logística e Transportes), em 2005, mostra que as hidrovias representam 13% do transporte de carga no Brasil, ante os 58% do meio rodoviário, 25% do ferroviário, 3,6% do dutoviário e 0,4% do aéreo.
A mesma pesquisa aponta que os fretes hidroviários podem ser 62% mais baratos do que os rodoviários, gerando economia para os cofres públicos. Mas, segundo o Ministério, os projetos propostos pelo PNLT para aumentar a utilização desse meio, devem trazer resultados somente dentro de 20 anos, aumentando de 13% para apenas 29% as cargas brasileiras transportadas pelo sistema aquaviário.
Para que isso aconteça, o Ministério afirma ter incluído no PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) projetos de investimento para o setor hidroviário brasileiro. A prioridade é para os eixos considerados mais importantes para a economia, que são as hidrovias do Rio Madeira (corredor Oeste-Norte), do Rio Guamá-Capim (corredor Araguaia-Tocantins); hidrovia Tietê-Paraná (corredores Transmetropolitano do Mercosul e do Sudoeste), hidrovia do Paraguai (corredor do Sudoeste), do São Francisco e as eclusas de Tucuruí e de Lajeado.
Na região amazônica, o Ministério afirma que o PAC prevê, além da manutenção da navegabilidade nas hidrovias, a construção e reforma de 67 terminais hidroviários para atender embarcações fluviais. O custo total estimado desses investimentos é de aproximadamente R$ 700 milhões.
Além de mais eficiente e econômico, o transporte por hidrovias também gera menor impacto ambiental. A informação é da bióloga do Instituto Vidágua, de Bauru (SP), Fernanda Ribeiro de Franco. De acordo com ela, o maior dano possível é a poluição do lençol freático pelo óleo derramado de embarcações mal conservadas, o que pode ser evitado através de manutenções periódicas.
O meio ambiente também pode ser afetado por falhas em modificações, como o aumento da profundidade dos rios ou a ligação de um rio com outro. “Mas esses danos acontecem muito pouco e são relativamente baixos se comparados aos danos causados por uma rodovia”, afirma Fernanda.
Segundo a bióloga, através do transporte hidroviário é possível transportar maior quantidade de carga por embarcação, reduzindo os gastos e o impacto ao meio ambiente, além de ter um menor índice de acidentes. “Temos que considerar também o grande impacto gerado pela construção das rodovias, quando temos os rios que já estão prontos para serem usados”, ressalta.
Com a manutenção periódica nas embarcações, o nível de poluição pode chegar a
quase zero, afirma a bióloga.
Fonte: Campo News
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