Carta oficial da Conferência Mundial do IFAMA Brasil à COP-30

Publicado em 08/07/2025 18:02 e atualizado em 22/07/2025 18:13
“O Agronegócio como parte da solução para as mudanças climáticas”

Aos Exmo Senhores:
André Aranha Correa do Lago, Embaixador COP
Roberto Rodrigues

1. Problema: a necessidade de aumentar a produção de alimentos e bioenergia para atender ao crescimento populacional, combater a fome e preservar o meio ambiente

Em 2024, a população mundial atingiu 8,2 mil milhões de habitantes, e algumas regiões continuam registrando um rápido crescimento populacional e de urbanização. De acordo com projeções das Nações Unidas, em 2050 o número de pessoas no mundo deverá atingir 9,6 mil milhões. O crescimento populacional (a), o aumento da renda per capita (b), o envelhecimento da população (c) e a urbanização (d) resultam em um crescimento significativo da demanda global por alimentos, fibras e energia.

Um estudo publicado pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, USDA (2025), mostra que as importações das principais commodities agrícolas devem crescer significativamente nos próximos 10 anos, com destaque para o arroz (+30,7%), carne suína (+26,6%), soja (+25,6%), carne de frango (+25,3%), milho (+22,1%), algodão (+21,0%), carne bovina (+17,8%) e trigo (+12,1%).

Além disso, em 2024, mais de 295 milhões de pessoas em 53 países enfrentaram níveis agudos de fome, de acordo com o “Relatório Global sobre a Crise Alimentar”, o que representa um aumento de quase 14 milhões de pessoas em relação a 2023.

Resumindo, o mundo precisa aumentar a produção, protegendo o meio ambiente e otimizando o uso dos recursos. Esse é o grande desafio. E como pode o agronegócio ajudar nesse processo?

2. O agronegócio como solução para as mudanças climáticas: tecnologias e inovações para aumentar a eficiência e a sustentabilidade na produção de alimentos, bioenergia e fibras

Existem duas frentes possíveis para expandir a produção de alimentos, bioenergia e outros produtos agrícolas de forma sustentável. São elas:

a) Crescimento horizontal da produção: aumento de uso da terra para cultivo agrícola, alocando áreas subutilizadas ou com baixos níveis de produtividade, tais como áreas de pastagem degradadas;

b) Aumento da produtividade por área: desenvolvimento de inovações e tecnologias que possibilitem ganhos de produtividade e reduzam o desperdício de recursos.

Para crescer de forma sustentável, é necessário fazer um inventário das tecnologias e inovações que foram desenvolvidas e utilizadas pelos agentes do agronegócio, a fim de demonstrar que o setor pode ser a principal solução para o desafio apresentado. O inventário está segmentado em 5 categorias, de acordo com áreas e funções e foram resumidos abaixo.

1) O uso de sistemas de produção sustentáveis e agricultura regenerativa

Recuperação de áreas de pastagem degradadas e conversão para a agricultura e silvicultura;

Rotação de culturas e adubação verde: utilização de espécies que melhoram as características físicas, químicas e biológicas do solo e do ambiente de produção;

Sistema de plantio direto na palha: manutenção da cobertura vegetal sobre o solo para prevenir a erosão, favorecer a microbiota do solo e reduzir revolvimentos e/ou melhorar preparação do solo;

Sistemas integrados: Agricultura-Pecuária-Silvicultura (APPS), sistemas agroflorestais e consórcios de culturas;

Cultivo de florestas plantadas: aumento da captura de carbono e produção de papel/celulose, principal substituto do plástico; produto reciclável e biodegradável.

Cultivo vertical: plantas cultivadas em camadas verticais, uma solução específica para grandes cidades e ambientes urbanos, facilitando a logística;

Cultivo protegido, hidroponia e aeroponia: uso de ambientes protegidos e equipamentos que permitem o cultivo de plantas sem a necessidade de terra/solo.

Cultivo biológico: redução ou não utilização de produtos químicos na produção agrícola;

Possibilidade de converter áreas áridas, desérticas ou de savana em ambientes adequados para a agricultura;

Economia circular: integração de produtos e subprodutos de diferentes cadeias de produção para gerar novos produtos e/ou insumos, aumentando a eficiência e reduzindo a eliminação de resíduos.

2) O uso de tecnologias aplicadas às cadeias de produção de alimentos

Irrigação de precisão: uso da água para aumentar a produtividade por área e reduzir o desperdício;

Tecnologias para previsão do tempo: estações de monitoramento, software e bancos de dados para previsão de chuva, seca, geada e outros eventos; melhor gestão das mudanças climáticas;

Máquinas e equipamentos de última geração: tratores, colheitadeiras, plantadeiras, pulverizadores, distribuidores de fertilizantes e outras máquinas como robôs e veículos autônomos, ajudando a otimizar as operações e movidos a combustíveis renováveis;

Drones e veículos não tripulados (UAVs): mapeamento de áreas, pulverização direcionada e outras operações agrícolas;

Agricultura por m²: uso de imagens de satélite, mapas ou sensores para realizar operações direcionadas, aumentando a produtividade (assertividade) e reduzindo o uso de insumos.

Aumento da cobertura de internet pelas empresas tradicionais e desenvolvimento de redes próprias para operação integrada com centros de controle. Big Data, IoT e armazenamento de dados em nuvem: captura e processamento permanente de dados sobre culturas, clima, pragas, doenças e outros aspectos, para melhorar a assertividade do agricultor usando dados para a tomada de decisões.

Inteligência artificial: análise de mapas, identificação de pragas e doenças, otimização da irrigação, previsão do tempo, análise de mercado e muitos outros usos;

Blockchain e rastreabilidade: registro de todas as etapas e fluxos de um produto ao longo de uma cadeia produtiva, garantindo transparência e segurança para o consumidor final e reduzindo o desperdício;

Marketplaces e ambientes online: uso de plataformas online para venda de alimentos, negociação de insumos agrícolas e outros produtos relacionados ao setor, reduzindo os custos de transação;

Comunicação digital: ampliar o acesso à informação, partilhar a rotina dos players do setor e aproximar os consumidores e os diferentes elos da cadeia produtiva;

Impressão 3D e cultura celular: tecnologias para produzir alimentos usando impressoras ou cultura celular em laboratório; uma solução ainda em desenvolvimento e com potencial para alguns nichos;

Educação digital e uso do multiverso: usar a tecnologia digital para a formação profissional no setor e melhorar a eficiência das pessoas e a produtividade dos recursos;

Todas as tecnologias envolvidas na pós-colheita, conservação de alimentos, armazenamento de alimentos e outras para reduzir o desperdício alimentar.

3) O uso de bioinsumos e técnicas genéticas

Biodefensivos: inseticidas, fungicidas, nematicidas, biofertilizantes e bioestimulantes utilizados para controlar pragas, doenças, nematoides e outros problemas fitossanitários, reduzindo o uso de produtos químicos e fertilizantes minerais e químicos;

Bioinsumos em saúde animal e alimentação animal: vacinas, medicamentos e outros de origem biológica;

Fitoquímicos e semioquímicos: substâncias repelentes ou atrativas naturais utilizadas na agricultura;
Melhoria genética: melhoria das plantas para se adaptarem a diferentes características do solo e do clima (solo, temperatura, precipitação e outros); e maior resistência às mudanças climáticas;

Biotecnologias: uso de organismos vivos na modificação genética de plantas, para otimizar o controle de pragas, doenças e ervas daninhas, aumentar a produtividade e reduzir a necessidade do uso de produtos químicos na agricultura. Biologia sintética e celular, edição de genes CRISPR e nanotecnologia em plantas e animais.

4) O uso de tecnologias para geração de energia

Etanol: uso de cana-de-açúcar, milho, cereais, beterraba e outras culturas agrícolas para produção. Potencial para reduzir as emissões em até 70% em comparação com a gasolina;

Biodiesel: uso de soja, palma, canola, óleo de mamona e outras culturas agrícolas, além de óleos animais. Potencial para reduzir as emissões em até 90% em comparação com o diesel;

Biogás: produzido através da digestão anaeróbica de matéria orgânica, como vinhaça, torta de filtro e bagaço de cana-de-açúcar. Há também grande potencial para o uso de resíduos da produção animal;

Biometano: digestão anaeróbica de resíduos orgânicos, como esterco animal, resíduos agroindustriais e outros. Redução em até 90% das emissões em comparação com o gás natural;

Combustível de aviação sustentável: produzido a partir de matéria orgânica de origem vegetal ou animal, tendo o etanol como uma das principais matérias-primas para a sua produção, com potencial de redução de emissões de gases em até 80%;

Hidrogênio verde integrado às agroindústrias: produzido através da eletrólise da água;
Eletricidade a partir da biomassa: produzida a partir do bagaço da cana-de-açúcar e do licor negro, um subproduto da indústria de papel e celulose. Outros produtos incluem resíduos de madeira, casca de arroz e plantas forrageiras;

Energia solar e eólica: utilização de propriedades rurais para a instalação de equipamentos solares ou eólicos com o objetivo de produzir eletricidade.

Veículos leves movidos a biocombustíveis: tecnologias da indústria automotiva para conversão de motores ao uso de biocombustíveis, híbridos e outras fontes energéticas. Veículos pesados movidos a biocombustíveis: indústrias de tratores, camiões, ônibus e outras indústrias convergindo para motores movidos a biodiesel, biogás e etanol.

Carro elétrico movido a etanol: utilização do etanol como matéria-prima para a produção de bioeletricidade, que alimentará veículos elétricos com baixas emissões;

5) Políticas Públicas

Pagamento por serviços ambientais: incentivo à manutenção de áreas preservadas nas propriedades rurais, com o apoio financeiro de empresas comprometidas com a conservação e o manejo sustentável das florestas;

Pagamento por descarbonização nas propriedades rurais: mecanismos que reconhecem e remuneram o estoque de carbono no solo, bem como práticas agrícolas de baixo carbono que contribuem para a neutralidade climática;

Programas de descarbonização da bioenergia: fomento à comercialização de créditos de carbono gerados por empresas produtoras de bioenergia, incentivando a redução efetiva das emissões;

Programas internacionais de incentivo aos biocombustíveis: exemplos como o Renewable Fuel Standard (RFS) nos Estados Unidos, Proálcool, Renovabio e Combustível do Futuro no Brasil, as Diretrizes de Energia Renovável na União Europeia, a Política Nacional de Biocombustíveis na Índia e o Clean Fuel Regulations (CFR) no Canadá, demonstram o compromisso global com fontes renováveis e limpas de energia;

Políticas ambientais robustas: códigos florestais que asseguram a preservação de áreas naturais nas propriedades rurais, proteção dos recursos hídricos, além da proibição de queimadas e de atividades que resultem em elevadas emissões de carbono.

3. Conclusão

Os cinco tópicos acima foram discutidos e elaborados por cientistas, políticos, professores, pesquisadores, estudantes, profissionais e demais agentes do agronegócio global, durante a 35ª edição do mais importante congresso mundial de agronegócio – a Conferência Mundial IFAMA – realizada em Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil.

Existem tecnologias e inovações em diversos produtos e soluções que vêm sendo desenvolvidas e aplicadas pelo agronegócio global na busca por ampliar a produção de forma sustentável.

O objetivo ao apresentar este inventário à COP 30, que será realizada em Belém em 2025, é demonstrar, de maneira sólida e consistente, que a agricultura pode ser parte da solução para as mudanças climáticas, desde que políticas públicas e estratégias privadas sejam direcionadas para a ampliação do uso dessas tecnologias economizadoras de recursos, propulsoras da produtividade e da conservação ambiental. É esta a direção a ser tomada. 

Ribeirão Preto, Brasil - 26 de junho de 2025

Atenciosamente,

Aidan Connoly
IFAMA President

Marcos Fava Neves
Chair da Conferência, Chanceler da Harven Agribusiness School e professor da Universidade de São Paulo

Nota: esta carta foi elaborada durante a conferência com a participação de 600 representantes de 40 países:
Angola
Argentina
Armênia
Austrália
Bangladesh
Bolívia
Botswana
Brasil
Canadá
República Central Africana
Chile
China
Congo
Costa Rica
Egito
França
Georgia
Alemanha
Gana
Índia
Irã
Irlanda
Itália
Quênia
México
Nepal
Países Baixos
Nova Zelândia
Nigéria
Peru
Polônia
Portugal
África do Sul
Coreia do Sul
Espanha
Suíça
Tanzânia
Uganda
Reino Unido
Estados Unidos da América

Sobre o IFAMA

A International Food and Agribusiness Management Association (IFAMA) é uma organização global que reúne líderes do agronegócio e das cadeias alimentares mundiais. Fundada em 1990, seus membros fundadores incluem Ray Goldberg (Universidade de Harvard), criador do conceito de “agronegócio”. Com representantes em mais de 50 países, a IFAMA realiza anualmente a “Conferência Mundial IFAMA”, evento que, em sua 35ª edição, foi sediado no Brasil pela primeira vez, em Ribeirão Preto, São Paulo, sob a coordenação da Harven Agribusiness School.
 

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Fonte:
IFAMA

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