Agronegócio mostra seus dados na COP30 e desmonta o empoeirado discurso ambientalista
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A COP30 — a tão anunciada “COP da Amazônia” — terminou neste fim de semana em Belém, no Pará, deixando no ar uma mistura de potencial imenso e realidade dura. O Pará recebeu o mundo com aquilo que tem de mais grandioso e mais contraditório. E poucos conhecem tão bem essas nuances quanto os próprios líderes do agronegócio, particularmente, do agronegócio amazônico.
O presidente da Faepa (Federação de Agricultura do Estado do Pará), Carlos Xavier, descreveu de sua perspectiva potencial. “O Pará tem uma situação diferenciada. Temos 30% do território antropizado, estabilidade climática — média de 26°C — e 3,2% da água doce do mundo”. É quase irônico que tamanha abundância conviva com carências tão profundas.
Mas é impossível ignorar os contrastes, como detalhou Vinícius Borba, advogado e presidente da APRIA (Associação dos Produtores Rurais da Amazônia). “O Pará é um estado rico pobre”. O abandono da capital, com seus pouco mais de 12% de saneamento básico, de problemas acumulados, de infraestrutura insuficiente, de uma população descontente - mas ainda assim incrivelmente lutadora e trabalhadora, com o calor humano tão intenso como o amazônico — tomou manchetes internacionais, enquanto o potencial agroambiental, que poderia ter brilhado, ficou em segundo plano, mais uma vez.
A COP terminou com consenso pela metade: nada de acordo sobre combustíveis fósseis, e o velho impasse do financiamento climático — quem paga, quem gere, quem decide. Nada muito novo. Dinheiro, como sempre, chega menos rápido que as promessas.
A IDADE AVANÇADA DOS DISCURSOS X O INCÔMODO DA VERDADE DOS DADOS
No meio dessa repetição de argumentos, o engenheiro agrônomo Almir Rebelo, veterano nas discussões sobre as mudanças climáticas e o papel do setor produtivo, trouxe a lucidez de quem acompanha esse debate desde os anos 1990. As acusações têm idade avançada e Rebelo explica o que já está claro nas pesquisas mais recentes: é preciso parar de remunerar apenas o “não desmatamento” e começar a enxergar a floresta produtiva como aliada do clima.
“O cacau, por exemplo, gera dois créditos de carbono: um porque não desmatou, outro porque sequestrou CO₂”, detalhou. Segundo seu estudo, “somente as folhas que caem por ano geram 38 toneladas de crédito por hectare, mais 10 t/ha do fruto”. E ele foi além, provocando um debate que deveria estar na mesa da COP: “Não podemos discutir pecuária emissora de metano sem fazer a conexão com o pasto, sem lembrar que a braquiária sequestra mais de 100 t de carbono. (...) A carne é produto do sequestro de carbono”.
ENQUANTO ISSO, A AMAZÔNIA REAL SEGUIA TRABALHANDO
A distância entre o discurso na COP e o chão amazônico ficou ainda mais evidente nas falas de quem vive na ponta. Borba desabafou, com a franqueza de quem luta todo dia. "Eu continuo aqui, no estado do Pará, produzindo alimento, com medo do Estado, do governo tomar as minhas terras, destruir meu curral e apreender meu gado. Eu continuo advogando para milhares de produtores rurais que são a grande maioria do setor produtivo do estado do Pará que sequer têm o título da sua propriedade, que foram invadidos por terras indígenas, que sofrem com o rastreamento bovino, com a TAC da carne, só que a COP30 esqueceu que essa turma existe".
E o presidente da Faepa complementa com algo que pesa como alerta: "A minha maior dificuldade, como presidente da federação que representa o agronegócio paraense, é consciência política. Tenho uma angústia imensa porque quando o Pará recebeu o convite para que brasileiros viessem ocupar a Amazônia - e o lema era integrar para não entregar - nós éramos 2,9 milhões de habitantes, hoje somos 9 milhões. É o estado brasileiro mais impactado pelo fluxo migratório, enquanto os piores índices de desenvolvimento humano estão aqui. Então, precisamos trabalhar, o agro está avançando, temos toda essa potencialidade e agora precisamos dessa consciência de que a transformação da sociedade passa, necessariamente, pela produção e é isso que estamos incentivando".
AGRIZONE: UMA PORTA ESTREITA, MAS QUE FINALMENTE SE ABRIU
Pela primeira vez na história das COPs, o agro ganhou um espaço do tamanho de sua importância: a AgriZone. Idealizado pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) e o Sistema Senar, o espaço recebeu líderes nacionais e internacionais, que viram de perto e na prática a surpresa muito positiva da tropicalização bem sucedida da agricultura, vanguardista e referência para o mundo todo. E o enviado especial do agro à conferência, Dr. Roberto Rodrigues, um dos maiores brasileiros vivos e um dos líderes da revolução agropecuária que o país registrou nas últimas décadas, costurou as discussões e o que pode virar ações com maestria.
Foto: CNA
Para Muni Lourenço, vice-presidente da CNA, presidente da Comissão Nacional de Meio Ambiente da confederação e presidente da Faea (Federação de Agricultura do Estado do Amazonas), a estreia foi simbólica. "Eu, como produtor rural na Amazônia, me sinto contemplado considerando esta iniciativa inédita e bem sucedida da AgriZone. Na 30ª COP, o Brasil inaugura um espaço com esta envergadura, trazendo a produção de alimentos para o centro desta conferência mundial que debate a questão climática, mas que tem ligação direta com a produção de alimentos. Nosso setor é o mais vulnerável à questão climática, mas, por outro lado, é o que melhor se apresenta como solução para essa questão".
A AgriZone ainda é pequena para tudo o que precisa ser dito, mas abriu uma trilha.
OS NÚMEROS QUE DEVERIAM MUDAR O DEBATE
Os dados do setor produtivo nacional ganharam os corredores, telões e microfones da COP logo no primeiro dia e derrubaram o discurso empoeirado do ambientalismo. A Embrapa apresentou seus dados atualizados de atribuição, ocupação e uso das terra no Brasil mostrando que 65,6% do território do país é preservado. E o mais importante, 29% destas áreas estão dentro de propriedades rurais.
No bioma Amazônia, os dados impressionam ainda mais. Dados da Embrapa mostram que 83,7% do território está preservado e que o uso agropecuário das terras alcança apenas 14,1% - sendo 12,1% para pastagens e 2% ocupados por lavouras.
"Unidades de Conservação, Terras Indígenas e áreas militares totalizam 34,9%. As outras grandes parcelas provêm das áreas registradas no Cadastro Ambiental Rural como dedicadas à preservação dentro dos imóveis rurais, que ocupam 27,4%", afirma a Embrapa.
E o vice-presidente da CNA destacou a importância do Brasil para a segurança alimentar, com auxílio na alimentação de um bilhão de pessoas em todo mundo com aquilo que o Brasil exporta atualmente, sendo, ao mesmo tempo, uma potência ambiental. Ele pondera, no entanto, a necessidade ainda constante de fazer com que a realidade continue a ser difundida, atuando como a principal ferramenta de combate às ideologias empoeiradas e enferrujadas que ainda permeiam os discursos romantizados sobre e a Amazônia.
"O Brasil, ao mesmo tempo em que é uma potência agroambiental, é uma referência mundial em práticas sustentáveis para a produção de alimentos aliando inovação tecnológica, alta produtividade, responsabilidade ambiental atendendo à legislação mais rigorosa que existe no mundo. E é importante que isso se apresente em uma das conferências mais importantes, no coração da Amazônia, para que assim possamos superar determinadas narrativas, entendimentos equivocados sobre a realidade do produtor brasileiro", diz.
O DESENVOLVIMENTO DA AMAZÔNIA DEPENDE DO DESENVOLVIMENTO DOS AMAZÔNIDAS
O conceito que for não se firma sem pessoas. Uma ideia precisa de gente para que se desenvolva e para a preservação do meio ambiente ou a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas não é diferente, e este é um ponto de convergência entre os líderes do agronegócio que passaram pela COP30, principalmente do agronegócio amazônico. Eles foram, afinal, os porta-vozes de números importantes sobre o bioma em que atuam.
"No estado do Pará, 30% das áreas de preservação estão dentro das propriedades rurais, portanto em áreas de florestas nativas, áreas de Reserva Legal e de preservação. É preciso que o mundo conheça isso, essa condição diferenciada que temos do restante do planeta. O produtor rural brasileiro produz e preserva ao mesmo tempo, até porque ele também é vítima das mudanças climáticas. Eu me sinto representado, porém, acho que precisaríamos avançar no pré-COP. Nas discussões, na elaboração dos textos, onde o setor produtivo precisaria ser mais ouvido", traz o consultor para Assuntos da COP30 da FAEPA e ex-Secretário de Agricultura do Pará, Hildegardo Nunes.
O especialista acredita que a semente da informação responsável foi lançada, mas precisa ser trabalhada. "O recente estudo que a Embrapa lançou que mostra a participação da agropecuária neste equilíbrio ambiental, já que as propriedades de produção deixam de ser as vilãs do aquecimento global e passa a ser ferramenta importante no combate. Acredito que o agro como um todo vai ganhar um pouco mais de espaço nas próximas discussões, com dados da ciência mostrando que o agro brasileiro e do mundo todo podem contribuir para enfrentar as mudanças que estamos vivendo".
O CUSTO DE PRESERVAR E QUEM PAGA POR ELE
Nos debates internacionais, uma verdade desconfortável se repetiu: sustentabilidade é cara — e mais cara ainda para quem mora em regiões pobres. O secretário-geral da WFO (World Farmers Organisation ), Andrea Porro, foi direto. “Produtores de tamanhos diferentes reagem de formas diferentes, com níveis distintos de capacitação e ferramentas. Isso deveria ser prioridade de solução. (...) Precisamos de simplificação e melhor definição dos alvos para que os objetivos possam ser alcançados pelos produtores rurais e para que eles possam ser estimulados no que fazem de melhor".
O consultor da FAEPA concorda e reforça com um retrato que ninguém gosta de encarar. "É importante a gente reforçar - e quando vejo a União Europeia se manifestar nesta direção me impressiona - que eles saibam que preservar custa caro. O maior retrato de que custa caro são os índices de pobreza na Amazônia. Temos a maior floresta tropical do mundo, mais de 70% de preservação de floresta nativa na região, com os menores IDHs (Índice de Desenvolvimento Humano) do Brasil, ou seja, pobreza latente. É preciso preservar, mas é preciso produzir para gerar renda, emprego e a qualidade de vida das pessoas".
No fim, a sensação é de que a COP passou, mas a Amazônia continua — produzindo, preservando, sofrendo pressões antigas e carregando o futuro nas mãos de um milhão de famílias que quase nunca têm voz. O que se espera agora é que a partir daqui — seja numa próxima COP ou fora dela — os dados substituam o romantismo, a ciência supere o oportunismo e a Amazônia possa finalmente ser o que sempre teve potencial para ser: a região mais próspera do Brasil.
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