Avanço da tecnologia quadruplicou o valor da agricultura em 10 anos, aponta estudo da FGV

Publicado em 26/07/2010 09:15 e atualizado em 26/07/2010 15:35
Participação da agricultura na riqueza do campo aumentou de 45% para 75% entre 1996 e 2006; a da pecuária caiu de 35% para 20%

A participação da lavoura na riqueza do campo no Brasil deu um grande salto entre 1996 e 2006, saindo de 45,4% para 75,1% do valor bruto da produção rural. O dado inclui a silvicultura. Já a participação da pecuária recuou de 35,6% para 20% no mesmo período.

Em termos absolutos, o valor nominal da lavoura mais do que quadruplicou em dez anos, saindo de R$ 23,3 bilhões em 1996 para R$ 108,1 bilhões em 2006. A pecuária, por sua vez, teve um aumento bem menor no período, de R$ 18,3 bilhões para R$ 28,8 bilhões.

Esses números fazem parte de análise dos economistas Mauro de Resende Lopes, Ignez Vidigal Lopes e Daniela de Paula Rocha, do Centro de Economia Agrícola (CEA)da Fundação Getúlio Vargas (FGV), com base em dois estudos por eles realizados em cima dos Censos Agropecuários de 1995/1996 e de 2006.

"O que deu uma força muito grande para a produtividade na lavoura foi a combinação dos avanços da tecnologia biológica e mecânica", diz Mauro Lopes. 
Entre 1996 e 2006, a área plantada total de grãos no Brasil teve um aumento de 24,2%, de 38,5 milhões para 47,9 milhões de hectares, enquanto a produção cresceu 95,9%, de 73,6 milhões para 144,1 milhões de hectares.

Esse aumento de produtividade fica muito claro em algumas culturas, como a do milho, na qual houve um recuo de 5,9% na área plantada entre as safras 1995/1996 e a estimativa para 2009/2010, mas com um aumento de 65% na produção - de 32,4 milhões para 53,5 milhões de toneladas.

Lopes cita diversos avanços na agricultura brasileira nas últimas décadas, que impactaram produtos como soja, algodão, arroz, feijão e cana-de-açúcar.

Já no caso da pecuária, Lopes observa que, "apesar de grandes avanços na genética e no manejo, a taxa de abate, ligada à produtividade, quase não aumentou". A taxa de abate mede a relação entre os animais abatidos e o total do rebanho. Segundo tabela elaborada pelo Fórum Nacional Permanente da Pecuária de Corte da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), a taxa de abate brasileira foi de 20,25% em 1996, e de 20,56% em 2006, permanecendo quase inalterada.

O pesquisador destaca que está havendo um aumento muito expressivo no confinamento dos bois, o que reduz a idade média dos animais abatidos e aumenta a produtividade. Ele nota, porém, que os bois confinados ainda correspondem a menos de 10% das cerca de 40 milhões de cabeças que são abatidas anualmente no Brasil. "Não dá um impacto muito grande na taxa de abate", diz Lopes.

O Centro de Economia Agrícola produziu, para a CNA, duas versões do estudo Quem Produz o Que no Campo: Quanto e Onde, com base nos microdados do Censo Agropecuário.

O primeiro, realizado em 2004, foi baseado no Censo de 1995/1996. O segundo, divulgado este ano, é baseado no Censo de 2006.

Venda de máquinas agrícolas cresceu a um ritmo anual de 8,7% entre 1996 e 2006, enquanto a área cultivada aumentou 1.2% ao ano


Uma série de avanços técnicos, abrangendo os principais produtos agrícolas brasileiros, contribuiu para que as lavouras quadruplicassem o valor nominal da sua produção de 1996 a 2006, e aumentassem a sua participação na riqueza do campo. Além disso, houve um grande aumento dos preços das principais commodities agrícolas na última década, puxado pela demanda chinesa e asiática.

Mauro Lopes, pesquisador do Centro de Economia Agrícola (CEA) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio, nota que a venda de máquinas agrícolas cresceu a um ritmo anual de 8,7% durante dez anos, enquanto a área cultivada expandiu-se a uma taxa de 1,2% ao ano. Essa mecanização intensa combinou-se com diversos avanços biológicos para, na visão dele, criar "uma das agricultura mais competitivas do mundo".

Um dos principais avanços, ele observa, foi a chamada "soja tropical" da Embrapa, que permitiu que o seu cultivo se espraiasse a partir do norte do Paraná, chegando ao cerrado do Centro-Oeste e hoje já atingindo a Bahia, o Maranhão, Piauí e as bordas da Amazônia. O pesquisador nota ainda que a variante transgênica, ao trazer redução de custo de defensivos agrícolas, "salvou a soja no Rio Grande do Sul".

Outra conquista da Embrapa foi a adaptação do algodão ao cerrado. Com isso, como explica Ignez Vidigal Lopes, esposa de Mauro Lopes, e também pesquisadora do CEA, "o algodão mudou de fronteira, saindo do Sul e indo para o Centro-Oeste".

Os pesquisadores citam também, como desenvolvimentos importantes da agricultura brasileira, a "safrinha", a segunda safra anual de milho, plantada em fevereiro, e que hoje já é maior que a safra de verão em Mato Grosso; o arroz longo-fino irrigado do Rio Grande do Sul, que permitiu se passar de 5 mil para 8 mil quilos por hectare, e o pré-germinado, que chega a dez mil quilos por hectare; o milho saracura de raiz profunda, mais resistente à seca; o aumento de produtividade da cana, que saiu de 85 para 140 toneladas por hectare em São Paulo; e o feijão irrigado com pivô central; entre outros.

Agricultura familiar. O trabalho "Quem Produz o Que no Campo: Quanto e Onde II", que teve como principais pesquisadores Ignez, Mauro e Daniela de Paula Rocha, do CEA, e foi divulgado este ano, mostra ainda que a agricultura familiar perdeu participação nos principais produtos agrícolas.

A pesquisa, com base no Censo Agropecuário de 2006, mostra que 3,3 milhões de propriedades rurais no Brasil podem ser consideradas de agricultura familiar, como base nos critérios de enquadramento no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). Os estabelecimentos não enquadráveis são 1,6 milhão, perfazendo um total de 4,9 milhões de propriedades rurais no Brasil.

As propriedades enquadráveis no Pronaf são responsáveis por 19,5% da produção rural, e as não enquadráveis, por 80,1%. A participação da agricultura familiar (enquadrável) na produção, entre os Censos Agropecuários de 1995/1996, caiu de 22,5% para 20% em grãos; de 42,2% para 36,1% na horticultura; de 73,2% para 48,7% na mandioca; de 23,7% para 19,5% na batata; de 19,8% para 0,5% no algodão; de 14,4% para 8% na laranja; e de 86,3% para 74% no fumo. A participação aumentou no período de 4,3% para 4,5% na cana; e de 4,8% para 8,5% na silvicultura.

Os desembolsos do Pronaf quadruplicaram entre as safras 2002-2003 e 2009-2010.

Enquadramento
Pelos critérios do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, 3,3 milhões de propriedades rurais no Brasil podem ser consideradas de agricultura familiar.


No interior paulista, menos gado e lavoura mais diversificada


Dona de quatro pequenas propriedades, a família Nebuya, de Guararapes, a 560 quilômetros da capital paulista, teve de fazer sua revolução interna para se adaptar às mudanças ocorridas no campo nos últimos anos. Ao invés de grãos e tomate, passou a produzir frutas, cebola e cana.

Deixou de ser grande contratadora de mão de obra para priorizar lavouras mecanizadas. Os Nebuyas também não estão mais sujeitos às intempéries do tempo - hoje, os pivôs de irrigação são essenciais no plantio. Para completar, um profissional com MBA na Fundação Getúlio Vargas assumiu a administração dos negócios, com um dos filhos, o agrônomo Fábio Nebuya.

Entre a década de 1970 e início dos anos 2000, o patriarca Makoto Nebuya plantava tomate rasteiro, milho e feijão e tocava gado de corte em quatro propriedades, com total de 430 hectares. Na década de 90, os Nebuyas eram os maiores produtores de tomate rasteiro de São Paulo.

O aumento dos custos de produção, a baixa remuneração e a redução da margem de lucro apertaram os Nebuyas, e a família foi obrigada a buscar alternativas . A mudança ocorreu há seis anos, quando decidiram reduzir as grandes plantações de tomate e acabar com as de feijões e soja, passaram a usar pivôs de irrigação, aumentaram a diversidade de lavouras e introduziram um sistema mais eficiente de gestão.

Para fazer a mudança usaram os recursos da venda da criação de 600 cabeças de gado de corte e de leite. "A pecuária, além de não dar lucro, ainda aumentava as despesas", diz o administrador da propriedade, Ricardo Mayehashy.

Diante das dificuldades com a agricultura tradicional, Nebuya usou uma parte do dinheiro para elevar a tecnologia em busca de melhores índices de produtividade: diversificou as lavouras, introduziu novos manejos e profissionalizou a gestão.

Fábio Nebuya, o único filho da família que decidiu seguir na agricultura, lembra que os custos de produção hoje são bem maiores que há 10 anos. "A tonelada do adubo custava R$ 180,00; hoje está em R$ 600,00; o óleo diesel custava R$ 0,36 e hoje R$ 1,56 o litro", diz.

Produtividade. A produtividade do milho, que era de 160 sacas por hectare, atinge hoje 415 sacas, porque o grão, que era sequeiro, passou a ser irrigado. A produtividade da pecuária não acompanhou.

Com cada boi gordo vendido, o pecuarista comprava dois bezerros e meio. Hoje, essa relação não chega a dois bezerros. Por causa da baixa remuneração, os plantéis foram desmontados e até as matrizes foram descartadas por alguns pecuaristas.

Os Nebuyas seguiram o ritmo. Desfizeram-se do gado para investir na diversificação agrícola. "Hoje não temos gado nem para doar para os leilões da Igreja. A gente sempre ajuda a comunidade, mas hoje teremos de comprar gado se quisermos ajudar", diz Fábio. "Não sobrou uma cabeça no pasto."

Em compensação, os Nebuyas plantam atualmente, além de tomate e milho, cana, banana, lichia, manga, cebola e seringueira. "Se a gente não acompanhasse essa modernização, ficava para trás, como você pode ver aqui na região", diz Fábio, enquanto aponta para sítios que foram abandonados na zona rural de Guararapes, porque os pequenos produtores não acompanharam o desenvolvimento da agricultura brasileira.

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Fonte:
O Estado de S. Paulo

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1 comentário

  • Telmo Heinen Formosa - GO

    É só procurar os ERROS. Sempre tem. Naquilo que você entende, tem e certamente naquilo que você não entende tão bem, também tem. Olhe esta parte do texto: "Entre 1996 e 2006, a área plantada total de grãos no Brasil teve um aumento de 24,2%, de 38,5 milhões para 47,9 milhões de hectares, enquanto a produção cresceu 95,9%, de 73,6 milhões para 144,1 milhões de <hectares>" - Em vez de 144,1 milhões de toneladas, tem hectares. Além disto é preciso notar que a área fisica realmente ocupada pelos grãos não atinge nem 37 milhões de hectares mas eles são tão BURROS que somam um hectare de soja com um de trigo, fazendo dois quando foram plantados no mesmo lugar. Idem com milho safrinha, feijão, amendoim, cevada, centeio, triticale etc... etc.. as irrigações do Brasil Central e assim por diante. Abobalhamento midiático é isso aí... confundir mais do que esclarecer. Eita nóis...

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