Medida que prejudique o crescimento será adiada

Publicado em 20/02/2011 17:46
Dilma vai reavaliar economia em março
A presidente Dilma Rousseff, segundo assessores, orientou sua equipe a evitar medidas que possam derrubar o crescimento da economia além do necessário, como ocorreu durante o primeiro mandato do governo Lula.
Por esse motivo, ela decidiu segurar a adoção de novas medidas nas áreas de contenção de crédito e de apreciação cambial nos primeiros meses de governo, marcando para março uma reunião de avaliação sobre o cenário econômico.
A seu pedido, a equipe econômica elaborou um conjunto de medidas nessas duas áreas levando em conta o aumento da inflação e do endividamento das famílias.
Assessores relatam que Dilma deseja um crescimento econômico de pelo menos 4% em seu primeiro ano de governo e não quer tomar decisões que possam comprometer esse desempenho.
Além das medidas para conter o crédito já anunciadas e da alta de juros, há o corte de R$ 50 bilhões no Orçamento, cujo impacto ainda precisa ser avaliado.

 

VINICIUS TORRES FREIRE

Sai por uma porta, entra por outra


Governo promete corte de gastos para conter inflação, mas estimula a economia por meio de bancos estatais

O GOVERNO aumentou o capital da CEF e o do BNDES. Esses bancos públicos terão assim mais dinheiro para financiar investimentos. Em breve, o governo deve ainda emprestar mais dinheiro para o BNDES, algo em torno de R$ 50 bilhões. Nesse caso, o governo vai fazer dívida, tomar dinheiro no mercado a uma taxa de uns 12% (a Selic) e vai emprestá-lo a uns 8%. Parece bom. Para quem?
Esse mesmo governo prometeu que não vai gastar R$ 50 bilhões do Orçamento autorizado pelo Congresso. Os motivos básicos do corte são: 1) poupar um pouco do dinheiro dos impostos a fim de evitar o aumento da dívida pública (ou reduzi-la um tico mais); 2) reduzir o consumo total na economia, que anda excessivo e ajuda a causar inflação.
Contendo gastos e, pois, mais pressão sobre a inflação, o governo pretende evitar que o Banco Central eleve ainda muito mais a taxa de juros "básica" da economia (a Selic).
Mas o empréstimo do governo ao BNDES vai elevar a dívida pública e vai estimular a demanda e, de algum modo, a inflação.
Economistas mais liberais insistem no fato de que o BNDES emprestar dinheiro a juro baixo, subsidiado pelo governo, leva o BC a elevar mais os juros "básicos" -como a economia é estimulada por um lado, via juro do BNDES, o BC precisa apertar a corda no outro lado.
Não se provou tal coisa na ponta do lápis, mas é difícil contestar o argumento. Tanto que economistas não liberais nem tentam bater de frente com tal ideia. Dizem porém que, no médio e longo prazo, o investimento bancado pelo BNDES cria capacidade produtiva na economia, mais oferta, o que permite aumentos de consumo sem inflação.
Em suma, "tudo mais constante", a alta de juros do BC reprime algum consumo e induz empresas a conter investimentos, pois a economia vai crescer menos e o rendimento financeiro fica mais atraente que o retorno de um novo empreendimento. O pessoal com acesso ao BNDES continua a investir, a juro subsidiado.
O emprego cai um pouco ou cresce menos. A inflação mais alta por mais tempo corrói parte da renda do assalariado comum. Quem empresta dinheiro ao governo (classe média alta e ricos, empresas capitalizadas, instituições financeiras) leva mais dinheiro para casa. Há transferências de renda aí: do Tesouro (nós todos) para empresas, via BNDES, e para cidadãos e empresas capitalizados, via juros mais altos.
Note-se que é difícil o governo cortar R$ 50 bilhões sem recorrer justamente a um talho nos investimentos. Mas empresas na parceria público-privada com o BNDES terão dinheiro. Sim, não emprestar dinheiro extra ao BNDES provocaria um tranco talvez nocivo na economia. Mas os juros do BC subiriam menos.
Durante anos ainda o governo não terá muito mais como cortar gasto. Há muita despesa obrigatória; Lula contratou gastos permanentes, como aumento de salários; Dilma acaba de contratar outros mais, com a política de reajuste real do salário mínimo até 2014. A dívida e o deficit cairão, pois, devagar, assim como a taxa de juros; o investimento público crescerá devagar.
No conjunto, trata-se de uma política econômica incoerente, de morde aqui, assopra ali, café com leite, meio empurrada com a barriga, feita para amoldar muito interesse díspar, mas não interesses mais gerais. Não é coerente nem é neutra.

Com a previsão de que a inflação fique ao redor de 5,5% neste ano, um crescimento da economia de 4,5% é considerado mais realista, na visão do Palácio do Planalto. O Ministério da Fazenda fala em 4,5% a 5%. O Banco Central, até aqui, prevê 4,5% de expansão do PIB.
Nas estimativas discutidas de forma mais reservada pelo governo, no entanto, há um risco de o crescimento ficar abaixo de 4%. Com base nisso, definiu-se que esse seria o piso a ser administrado, com a adoção de medidas para evitar um esfriamento maior.

BOM SINAL
Apesar de 4% ser um recuo forte, já que o crescimento de 2010 deverá ficar em torno de 7,5%, a avaliação do economista Roberto Padovani, do banco WestLB, é de que essa taxa de expansão será um bom sinal.
"Mostra que o país é responsável, tem uma gestão econômica racional, buscando uma taxa de equilíbrio, e isso ajudará a manter o ciclo de investimentos."
Segundo Padovani, mesmo com 4% de crescimento, o Brasil deve enfrentar problemas de falta de mão de obra em várias áreas. Se a economia crescer 5% neste ano, isso levará a inflação para perto de 6,5%, o teto da meta do ano, afirma ele.
Nas projeções de Gustavo Loyola, ex-presidente do BC, a inflação só deve convergir para a meta em 2012. "As extravagâncias [de gastos] dos últimos dois anos estão dando ressaca." Para ele, Dilma está ciente da necessidade de desacelerar a economia neste ano para não comprometer a estabilidade de preços.
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Fonte:
Folha de S. Paulo

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