FOLHA (exclusivo): Ciro fala e diz que foi "miseravelmente traído" por Lula

Publicado em 31/10/2018 04:56
por GUSTAVO URIBE, na Folha de S. Paulo

Terceiro colocado na eleição presidencial, Ciro Gomes (PDT) afirmou, em entrevista à Folha, que foi "miseravelmente traído" pelo ex-presidente Lula e seus "asseclas".

Em seu apartamento, onde concedeu nesta terça-feira (30) sua primeira entrevista desde a eleição de Jair Bolsonaro (PSL), Ciro nega ter lavado as mãos ao ter viajado para a Europa depois do primeiro turno. "A gente trai quando dá a palavra e faz o oposto".

"Não declarei voto ao Haddad porque não quero mais fazer campanha com o PT", disse.

O senhor disse que deixaria a vida pública porque a razão de estar na política é confiar no povo brasileiro. Deixou de confiar? Não, procurei entender o que aconteceu. Esse distanciamento me permitiu isso. O que aconteceu foi uma reação impensada, espécie de histeria coletiva a um conjunto muito grave de fatores que dão razão a uma fração importante dessa maioria que votou no Bolsonaro. O lulopetismo virou um caudilhismo corrupto e corruptor que criou uma força antagônica que é a maior força política no Brasil hoje. E o Bolsonaro estava no lugar certo, na hora certa. Só o petismo fanático vai chamar os 60% do povo brasileiro de fascista. Eu não, de forma nenhuma.

Naquele momento do país, uma viagem à Europa não passou uma impressão de descaso? [Ciro viajou para Portugal, Itália e França após o 1º turno] Descaso não, rapaz, é de impotência. De absoluta impotência. Se tem um brasileiro que lutou, fui eu. Passei três anos lutando.

Com a sua postura de neutralidade, não lavou as mãos em um momento importante para o país? Não foi neutralidade. Quem declara o que eu declarei não está neutro. Agora, o que estava dizendo, por uma razão prática, não iria com eles se fossem vitoriosos, já estaria na oposição. Mas estava flagrante que já estava perdida a eleição.

Por não ter declarado voto, não teme ser visto como um traidor pelos eleitores de esquerda? A gente trai quando dá a palavra e faz o oposto. Quem tiver prestado a atenção no que falei, está muito clara a minha posição de que com o PT eu não iria.

Não se aliará mais ao PT? Não, se eu puder, não quero mais fazer campanha para o PT. Evidente, você acha que eu votei em quem?

No Haddad? Vou continuar calado, mas você acha que votei em quem com a minha história? Eles podem inventar o que quiserem. Pega um bosta como esse Leonardo Boff [que criticou Ciro por não declarar voto a Haddad]. Estou com texto dele aqui. Aí porque não atendo o apelo dele, vai pelo lado inverso. Qual a opinião do Boff sobre o mensalão e petrolão? Ou ele achava que o Lula também não sabia da roubalheira da Petrobras? O Lula sabia porque eu disse a ele que, na Transpetro, Sérgio Machado estava roubando para Renan Calheiros. O Lula se corrompeu por isso, porque hoje está cercado de bajulador, com todo tipo de condescendências.

Quem são os bajuladores? É tudo. Gleisi Hoffmann, Leonardo Boff, Frei Betto. Só a turma dele. Cadê os críticos? Quem disse a ele que não pode fazer o que ele fez? Que não pode fraudar a opinião pública do país, mentindo que era candidato?

Por que o senhor não aceitou ser candidato a vice-presidente de Lula? Porque isso é uma fraude. Para essa fraude, fui convidado a praticá-la. Esses fanáticos do PT não sabem, mas o Lula, em momento de vacilação, me chamou para cumprir esse papelão que o Haddad cumpriu. E não aceitei. Me considerei insultado.

Por que não declarou voto em Haddad? Aquilo era trivial. O meu irmão foi a um ato de apoio a Haddad, depois de tudo o que viu acontecendo de mesquinho, pusilânime e inescrupuloso. É muito engraçado o petismo ululante. É igual o bolsominion, rigorosamente a mesma coisa. O Cid está lá tentando elaborar uma fórmula de subverter o quadro e é vaiado. Estou devendo o que ao PT?

Não declarou voto no Haddad por causa do Lula? Não declarei voto ao Haddad porque não quero mais fazer campanha com o PT. Agora, em uma eleição que tem só dois candidatos, na noite do primeiro turno, disse à imprensa: "Ele não". O que ele quer mais agora?

Cid Gomes cobrou uma autocrítica dos petistas. E quais foram os erros cometidos pelos pedetistas? Devemos ter cometido algum erro e merecemos a crítica. Mas, nesse contexto, simplesmente multiplicamos por um milhão as energias que nos restaram para trabalhar. Fomos miseravelmente traídos. Aí, é traição, traição mesmo. Palavra dada e não cumprida, clandestinidade, acertos espúrios, grana.

Isso por Lula? Pelo ex-presidente Lula e seus asseclas. Você imagina conseguir do PSB neutralidade trocando o governo de Pernambuco e de Minas? Em nome de que foi feito isso? De qual espírito público, razão nacional, interesse popular? Projeto de poder miúdo. De poder e de ladroeira. O PT elegeu Bolsonaro.

Todas as pesquisas, não sou eu quem estou dizendo, dizem isso. O Haddad é uma boa pessoa, mas ele, jamais, se fosse uma pessoa que tivesse mais fibra, deveria ter aceito esse papelão. Toda segunda ir lá [visitar Lula], rapaz. Quem acha que o povo vai eleger pessoa assim? Lula nunca permitiu nascer ninguém perto dele. E eles empurram para a direita, que é o querem fazer comigo.

A postura do senhor não inviabiliza uma reaglutinação das siglas de esquerda? Não quero participar dessa aglutinação de esquerda. Isso sempre foi sinônimo oportunista de hegemonia petista. Quero fundar um novo campo, onde para ser de esquerda não tem de tapar o nariz com ladroeira, corrupção, falta de escrúpulo, oportunismo. Isso não é esquerda. É o velho caudilhismo populista sul-americano.

A liberdade de imprensa está ameaçada? É muito epidérmica a nossa sensibilidade. Não acho que tem havido nenhuma ameaça à liberdade de imprensa até aqui. Por isso que digo que uma das centralidades do mundo político brasileiro deveria ser um entendimento amplo o suficiente para cumprir a guarda da institucionalidade democrática. E um dos elementos centrais disso é a liberdade de imprensa. A imprensa brasileira nepotista e plutocrata como é parte responsável também por essa tragédia.

A imprensa ajudou a eleger Bolsonaro? A arrogância do [William] Bonner achando que podia tutelar a nação brasileira, falar pela nação brasileira. A Folha que repercute uma calúnia contra uma cidade inteira que é reconhecida mundialmente como um elemento de referência de educação para me alcançar [Ele se refere a reportagem sobre relatos de estudantes de fraudes em avaliações nas escolas de Sobral, no Ceará].

E os ataques feitos pelo Bolsonaro à Folha? É uma ameaça? Não considero, não. A Folha tem capacidade de reagir a isso e precisa ter também um pouco de humildade, de respeitar a crítica dos outros.

"Revolução pelo voto" muda os rumos do Brasil (Lucas Berlanza, do Instituto Liberal)

Jair Bolsonaro será o 38º presidente da República Federativa do Brasil. O país viveu uma tarde-noite de catarse – naturalmente, a maior parte dos cerca de 55%, de acordo com o TSE, que votaram no próximo líder nacional. As ruas se coloriram de manifestações em verde e amarelo, cornetas soaram e fogos iluminaram as orlas.

É para tanto? A comemoração é justa. Sabemos muito bem o quanto lutamos para destronar o império de mediocridade, tirania e corrupção sistêmica do Partido dos Trabalhadores e sua gangue socialista, populista e cleptocrática. Depois de aturá-los, com redobrada paciência, seduzindo os incautos e degradando a dignidade nacional, obtivemos uma primeira grande vitória com o impeachment. Agora, conseguimos impedir que reassumissem o controle do Poder Executivo, derrotando-os por respeitável margem em uma eleição geral.

Revolução Conservadora

Pode ser que os historiadores do futuro digam que uma “revolução conservadora”, isto é, uma grande transformação calcada no rechaço da destruição “revolucionária”, no sentido esquerdista e totalizante do termo – e, diga-se, uma “revolução pelo voto”, como Carlos Lacerda chamava a eleição de Jânio Quadros -, se deu no Brasil a partir da penetração de ideias liberais e conservadoras no imaginário nacional, do trabalho de formiguinha que instituições como o nosso Instituto Liberal fizeram e, principalmente, da absoluta saturação a que chegou o estado de coisas da Nova República deteriorada.

Poder é da Nova Direita 

Bolsonaro, um candidato sem dinheiro, sem máquina partidária e absolutamente improvável, conquistou o que, em seus sete mandatos como deputado, não era sequer um sonho distante. O Legislativo e os governos estaduais apresentaram renovação maior que a prevista, em especial com a posse de representantes impulsionados pela ascensão das ideias da chamada “Nova Direita” nas mídias alternativas e pela influência pessoal do capitão da reserva, capazes de facilitar a governabilidade e a relação do presidente com os diversos cantos do país.

Porém, depois da festa, que é legítima para os apoiadores do presidente e dos demais candidatos eleitos, a realidade terá de bater à porta. Assim como a “revolução pelo voto” de Jânio Quadros mostrou-se frustrada devido às suas deficiências e à força das limitações e defeitos do sistema político da época, nada está garantido. Um fracasso do governo Bolsonaro põe todas as expectativas positivas a perder.

Excelente discurso da vitória

Sim, expectativas positivas, porque, não custa repetir, elas têm motivos para existir. Já ponderei os defeitos e qualidades da candidatura de Bolsonaro. Posso dizer hoje que seu discurso da vitória foi excelente. O presidente eleito tocou em diversos pontos fundamentais para o resgate da respeitabilidade, da dignidade e das esperanças de prosperidade do Brasil.

Defesa da liberdade

O texto, como não poderia deixar de ser, enfatiza o irrestrito respeito aos limites constitucionais, às leis, à democracia representativa e às liberdades individuais. Disse Bolsonaro que sustentará a “liberdade de ir e vir, andar nas ruas em todos os lugares deste país, liberdade de empreender, liberdade política e religiosa, liberdade de fazer, formar e ter opinião, liberdade de escolhas e ser respeitado por elas”. Em suma, as premissas mais sagradas que este Instituto Liberal, que hoje tenho a honra de presidir, tem o dever de defender incondicionalmente.

Redução da máquina do Estado

Prometeu atenção à responsabilidade fiscal, à desburocratização, à redução da máquina do Estado. Reafirmou todas as boas bandeiras liberais que, sobretudo através da figura da equipe econômica de seu provável futuro ministro Paulo Guedes, havia apresentado durante a campanha eleitoral e em seu programa de governo.

Novo rumo ao Itamaraty

Enfatizou ainda a reorientação das relações internacionais, citando especificamente o Itamaraty e sinalizando para o abandono do viés ideológico, que vinculava o Brasil em especial a ditaduras africanas e socialistas latino-americanas. Líderes internacionais que tendem a construir relações mais íntimas (e alvissareiras) com o governo Bolsonaro, como o presidente americano Donald Trump e o italiano Matteo Salvini, já o parabenizaram – da mesma forma que a Venezuela de Maduro, que, no entanto, fez uma cobrança por uma retomada de boas relações supostamente perdidas, quando a primeira atitude que o tiranete deveria tomar seria respeitar o seu próprio povo.

Reforma da Federação, como queria Lacerda

Um detalhe, porém, chamou a atenção muito particularmente: o apelo à reforma da Federação. Essa era uma pauta cara à UDN de Carlos Lacerda, que defendeu essa bandeira durante toda a sua carreira política. É provável que um presidente nunca tenha feito um aceno tão enfático a ela em seu discurso de vitória desde a ditadura Vargas. Disse Bolsonaro: “o governo respeitará de verdade a Federação. As pessoas vivem nos municípios, portanto os recursos irão para os estados e municípios. Colocaremos de pé a Federação brasileira. Nesse sentido, repetimos que precisamos de mais Brasil e menos Brasília”. Depois de acabar com o imposto sindical, outra excrescência do varguismo, podemos ter no governo Bolsonaro mais essa vitória histórica de fortalecer o localismo. Essa seria uma das mais relevantes entre várias reformas estruturais fundamentais que Bolsonaro sinaliza realizar.

Autêntica agenda  privatizante

Diante disso, como acredito que devemos agir? Em primeiro lugar, aqueles que porventura manifestam rejeições de ordem estética ao presidente eleito deveriam compreender o ineditismo do conjunto programático apresentado por ele. É indiscutível que a agenda é uma autêntica agenda privatizante, descentralizadora, acompanhada de um compromisso com as liberdades políticas e individuais que a Constituição, com todos os seus defeitos, garante. Não há motivo para não apoiar essas medidas e esses aspectos do programa.

Apoiar acertos, criticar erros

Desde que, naturalmente, as atitudes condigam com as palavras. Nesse sentido, nossa atitude tem de ser a mesma que deve existir para com qualquer político. Político não se cultua, não se idolatra, se cobra e fiscaliza. Bolsonaro certamente vai errar. Quando acertar, apoiemos. Quando errar, questionemos, critiquemos, deixemos clara a nossa posição. Exerçamos as liberdades que não admitiremos sejam aviltadas.

Oposição será um inferno

Mesmo assim, sobretudo, saibamos fazer oposição ao que estiver errado com inteligência. Faço esse alerta porque o lulopetismo e a extrema esquerda tentarão transformar o governo Bolsonaro em um Inferno. A governabilidade hoje tem boas perspectivas, mas haverá sempre dificuldades e, mesmo que Bolsonaro colecione mais acertos do que erros, eles tentarão atrapalhar e farão um grande escarcéu a respeito de detalhes, quiçá detalhes meramente retóricos, como sempre fazem, para impedir transformações que ameacem seus projetos de poder.

Largá-lo sozinho???

Não adianta também eleger Bolsonaro e largá-lo sozinho. Se, e somente se, ele seguir demonstrando sincera disposição por levar adiante os aspectos salutares de sua agenda, ele precisará do nosso apoio para defendê-los, para apoiar seus esforços, quando os destrutivos e sistemáticos esquerdistas atuarem para detê-lo, e eles o farão. A luta está apenas começando. Saibamos o lugar que compete a cada um de nós no encalço dos nossos melhores propósitos.

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Fonte:
Folha/Blog Rodrigo Constantino

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3 comentários

  • Vilson Vitorino Stedile Lagoa Vermelha - RS

    Muito interessante e conclusiva a manifestação do CIRO GOMES. Ah...se todos os fanáticos seguirdores do PT, especialmente minhas primas queridas, tivessem a oportunidade, paciência e interesse em ler essa entrevista até o final, certamente pediriam desculpas pelo comportamento no período eleitoral.

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    • Érico Batista da Silva Soledade - RS

      É CARO VILSON, EU TAMBÉM TENHO ALGUNS PARENTES PT, QUE SÃO CEGOS, E PELO JEITO COM ALGUNS NEURÔNIOS A MENOS, MAS COMO DIZ O DITADO, PARENTES A GENTE NÃO ESCOLHE, NOS SÃO IMPOSTOS.

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    • antonio carlos pereira Jaboticabal - SP

      Érico, vc eo Ciro deveriam comprarem o livro que o FHC escreveu onde afirmou que sabia da corrupção na Petrobras, alegou que estava esperando um Lei ser aprovada, mas nunca fez nada, deixou a corrupção correr solta, quem é inteligente sabe muito bem sobre o livro. Ciro quer ser da esquerda mas nunca tera voto para ser Presidente, quanto mais ele bate em Lula mais ele perde. Bolsonaro vai sim ter dificuldade para governar, só se ele der ministérios para o DEM, PSDB e PMDB meter a mão no dinheiro dos Ministérios, todo arrogante mete a mão sim, tenta impor, mas precisamos ficar de olho. Segundo o MPF o Guedes esta envolvido em fraudes com fundo de pensão milionária e o Bolsonaro já falou que seu Ministérios não tem ninguém condenado, Bolsonaro demostrou que sabe das fraudes e mesmo assim o Guedes sera o ministro ! Estar envolvido em fraudes é a mesma coisa por a raposa no galinheiro, tem um ditado que diz, diga com quem tu andas que eu direi quem tu és !

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  • Rafael Antonio Tauffer Passo Fundo - RS

    Ciro Gomes é farinha do mesmo saco, ele viu que o PT iria perder a eleição. Ele falou que o Lula traiu ele, por que esse cara na campanha nunca bateu no PT?

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