Ações do documento Perdas e ganhos na venda de carne para a UE

Publicado em 17/03/2010 13:53

Na sempre conturbada relação comercial com a União Europeia, os exportadores de carne bovina têm atualmente uma razão para comemorar e outra para lamentar. Ao mesmo tempo em que decidiram afrouxar as exigências para exportação de carne ao bloco, os europeus mantêm, desde 2009, critérios para vendas de cortes nobres da Cota Hilton que estão causando mais prejuízos aos exportadores brasileiros.

Em reunião na segunda-feira, a missão técnica da UE, que visitou o país para inspecionar o sistema de defesa agropecuária, informou às autoridades brasileiras, a disposição de revogar a exigência de uma lista prévia de propriedades habilitadas a fornecer gado para abate e exportação de carne ao bloco. A relação continuaria a existir, mas passaria a ser administrada pelo Ministério da Agricultura, e não mais pelas autoridades europeias como atualmente exigido.

O governo estima que a imposição da lista, há dois anos, reduziu de 20 mil para apenas 2 mil toneladas mensais os embarques de carne bovina à UE. Recentemente, as exportações cresceram a 4 mil toneladas. O prejuízo ultrapassaria US$ 1 bilhão nesse período. Hoje, existem 1,8 mil fazendas habilitadas a exportar ao bloco.

As regras para a habilitação de novas propriedades seriam afrouxadas, com um "check list" menos extenso e burocrático. Em relato preliminar, a missão europeia elogiou o sistema brasileiro. E concordou em revogar a Diretiva n º 61, editada em 2008 pela UE para apertar as regras de rastreamento do gado vivo. "Hoje, é cabível a revogação", afirma o secretário de Defesa Agropecuária do ministério, Inácio Kroetz. "A questão era o rastreamento dos animais, mas isso está harmonizado. É página virada. Eles transferem a responsabilidade e nós fazemos jus à confiança".

Kroetz afirmou que a reunião, ocorrida na sede do ministério, teve até palmas para o sistema. "Disseram que confiavam nas garantias brasileiras e houve palmas", diz. Mais duro crítico do sistema, o belga Andre Evers teria sido o mais efusivo.

Sob pressão dos pecuaristas irlandeses, os técnicos europeus devem justificar internamente o fim da lista dizendo que o Brasil "aprendeu a lição", inclusive com "professores" da própria UE. Desde 2008, os europeus treinaram veterinários brasileiros a adotar um sistema mais exigente no rastreamento do gado. Mesmo assim, deve haver críticas na UE. "Mas, no momento, ficam sem razão", argumenta Inácio Kroetz. "Vieram seis técnicos e não há mais argumento para justificar. Os irlandeses não vão negar isso".

O secretário afirmou, ainda, que a fraude detectada em lotes exportados pelo frigorífico Arantes acabou beneficiando o sistema. "Foi lamentável, mas não arranhou o serviço porque fomos nós que detectamos, comunicamos e tomamos as providências", avalia. A fraude ocorreu em certificados sanitários internacionais emitidos pelo ministério. "Eles vão ter dificuldades para voltar a exportar".

A missão europeia ficou satisfeita com o que viu no Brasil, mas uma das razões para afrouxar as regras é também a oferta restrita de carne na Europa, o que tem feito os preços subirem. No bimestre janeiro-fevereiro, o preço da carne in natura exportada pelo Brasil ficou em US$ 7.398 por tonelada, 33% mais do que em igual período de 2009. Na primeira semana de março, já alcançava US$ 7.900, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Carne (Abiec).

A flexibilização por parte da UE pode reduzir as perdas dos exportadores de carne bovina, mas o setor ainda enfrenta outro problema: o bloco alterou critérios para as vendas dentro da chamada Cota Hilton, de cortes nobres, o que está levando o Brasil a um prejuízo estimado de US$ 120 milhões.

O país tem um volume de 10 mil toneladas na Cota Hilton, mas desde julho do ano passado, quando começou o ano-cota 2009/2010, só conseguiu exportar 8% disso, de acordo com Otávio Cançado, diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Carne Bovina (Abiec). O ano-cota termina no dia 30 de junho e se a UE mantiver os critérios atuais dificilmente os frigoríficos brasileiros conseguirão cumprir a cota de 10 mil toneladas.

Dentro da cota de carne nobre para a UE, os cortes bovinos pagam tarifa de 20%, enquanto no extracota há imposto de 12, 8 %, mais € 3.041 por tonelada. Com tarifa menor, é possível obter prêmio de cerca de US$ 3 mil por tonelada sobre o extracota. Assim, não conseguir cumprir a cota significa perder receita.

O que está limitando as exportações brasileiras dentro da Hilton é um critério alterado em janeiro do ano passado pela UE. Ele prevê identificação eletrônica dos animais destinados ao abate para atender à cota na desmama ou até 11 meses de idade. Antes, a identificação era feita pela dentição do animal, quando sua idade também era definida. Para o abate na Cota Hilton, um dos critérios é de que o animal deve ter menos de 36 meses.

Ocorre que no Brasil, não há identificação eletrônica e muito menos nessa fase da vida do bovino. Conforme prevê o sistema de rastreabilidade no país, os animais são identificados nos últimos três meses de vida - quando ficam 90 dias nas áreas habilitadas à exportação para a UE e na última propriedade.

Para tentar driblar a exigência, o Brasil pediu à UE que permita o confinamento do gado destinado à cota nos últimos 100 dias de vida do animal - hoje os animais com esse fim têm de ser alimentados apenas a pasto. Essa mudança garantiria a identificação dos bovinos, como quer a UE. No entanto, o bloco ainda não respondeu ao pedido brasileiro, segundo Cançado. Ele diz que o país precisaria de um tempo maior para se adequar às exigências.

 

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Fonte:
Valor Econômico

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