Petrolão: nova fase da Lava Jato atinge o clube do bilhão

Publicado em 15/11/2014 03:59 e atualizado em 17/11/2014 10:14
Escândalo de corrupção na Petrobras leva à cadeia representantes de oito das maiores empreiteiras do país e mais um ex-diretor da estatal ligado ao PT (veja.com)

Petrolão: nova fase da Lava Jato atinge o clube do bilhão

Escândalo de corrupção na Petrobras leva à cadeia representantes de oito das maiores empreiteiras do país e mais um ex-diretor da estatal ligado ao PT

Rodrigo Rangel e Hugo Marques
CHEFE – Ricardo Pessoa, dono da empreiteira UTC, preso na sexta-feira passada: o

CHEFE – Ricardo Pessoa, dono da empreiteira UTC, preso na sexta-feira passada: o "capo" do cartel da Petrobras gostava de repetir que tinha um único amigo no governo – "o Lula" (Marcos Bezerra/Futura Press/Estadão Conteúdo)

Em um país de instituições mais frágeis, a prisão por suspeita de corrupção de altos executivos das maio­­res empresas nacionais não se efetivaria nunca ou produziria uma crise institucional profunda. Antes, portanto, de entrarmos nos detalhes dessa pescaria da Polícia Federal em águas sujas da elite empresarial, celebremos a maturidade institucional do Brasil — a mesma que foi posta à prova e passou com louvor quando o Supremo Tribunal Federal (STF) mandou para a penitenciária a cúpula do partido no poder responsável pelo escândalo do mensalão.

Esse senhor pesadão, bem vestido, puxando uma maleta com algumas mudas de roupa e itens de higiene pessoal, não está se dirigindo a um hangar de jatos executivos para mais uma viagem de negócios. Ele está sendo conduzido por policiais para uma temporada na cadeia. A foto ao lado mostra o engenheiro Ricardo Pessoa, dono da empreiteira UTC, apontado por investigações da Operação Lava-Jato como o “chefe do clube”. Um clube muito exclusivo, diga-se. Dele só podiam fazer parte grandes empresas que aceitassem as regras do jogo de corrupção na Petrobras. Por mais de uma década, os membros desse clube se associaram secretamente a diretores da estatal e a políticos da base aliada do governo para operar um dos maiores esquemas de corrupção já desvendados no Brasil — e, por sua duração, volume de dinheiro e penetração na mais alta hierarquia política do país, talvez um dos maiores do mundo.

Dono de uma holding que controla investimentos bilionários nas áreas industrial, imobiliária, de infraestrutura e de óleo e gás, Pessoa foi trancafiado numa cela da carceragem da Polícia Federal. Ele e outros representantes de grandes empreiteiras que se juntaram para saquear a maior estatal brasileira e, com o dinheiro, sustentar uma milionária rede de propinas que abasteceu a campanha de deputados, senadores e governadores — e, mais grave ainda, segundo declaração do doleiro Alberto Youssef à Justiça, tudo isso teria se passado sob o olhar complacente do ex-presidente Lula e de sua sucessora reeleita, Dilma Rousseff.

Na ação policial de sexta-feira foram presos dirigentes de empresas que formam entre as maiores e politicamente mais influentes do Brasil: OAS, Camargo Corrêa, Mendes Júnior, Queiroz Galvão, UTC, Engevix, Iesa e Galvão Engenharia. Essas companhias são responsáveis por quase todas as grandes obras do país. Os policiais federais vasculharam as salas das empresas ocupadas pelos suspeitos presos e também suas casas. Embora tendo executivos seus citados por Youssef e Paulo Roberto Costa, o e­­x-diretor da Petrobras preso em março, que está contribuindo nas investigações, não foram alvos das investidas policiais da sexta-feira passada dirigentes de outros dois gigantes do ramo: a Odebrecht e a Andrade Gutierrez. O juiz Sergio Moro recebeu pedido dos procuradores para emitir ordem de prisão contra dois altos executivos da Odebrecht. Negou os dois, mas autorizou uma incursão na sede da empresa em busca de provas.

Márcia Poletto/Agência o Globo

O ELO – Renato Duque, ex-diretor da Petrobras, que cobrava 3% de propina para o PT: preso depois que a Polícia Federal descobriu que ele tinha contas secretas no exterior

“Hoje é um dia republicano. Não há rosto e bolso na República”, declarou o procurador Carlos Fernando Lima, integrante da força-tarefa encarregada da Lava-Jato, a origem da investigação.

No rol dos empreiteiros caçados pela polícia estavam megaempresários, como Sérgio Mendes, da Mendes Júnior, João Auler e Eduardo Hermelino Leite, da Camargo Corrêa, Ildefonso Colares Filho e Othon Zanoide, da Queiroz Galvão, Léo Pinheiro, da OAS, e Gerson Almada, da Engevix. Uma parte dos alvos não havia sido localizada pela polícia até o fim da tarde de sexta. Alguns estavam em viagem no exterior e foram incluídos na lista de procurados da Interpol. O juiz Moro bloqueou 720 milhões de reais em bens dos investigados.

O papel central de Ricardo Pessoa, da UTC, no esquema foi detectado logo no princípio das investigações. Não demorou muito para que os policiais e procuradores não tivessem mais dúvida. Aos curiosos com sua prosperidade crescente nos últimos anos, Ricardo Pessoa dava uma explicação que, até o estouro do escândalo, parecia apenas garganta: “Só tenho um amigo no governo: o Lula”. Pessoa coordenava o cartel, do qual participavam treze empreiteiras. Esse grupo de privilegiados se encontrava para decidir o preço das obras na Petrobras, dividir as responsabilidades pela execução de cada uma delas — e, o principal, o valor da propina que deveria sobrar para abastecer os escalões políticos. Tecnicamente, esse era o grupo dos corruptores. Os diretores da Petrobras participantes do esquema eram os corruptos. De cada contrato firmado com a Petrobras, os empresários recolhiam 3% do valor, que se destinava a um caixa clandestino. O pagamento era feito de diversas maneiras: em dinheiro vivo e em depósitos no exterior ou no Brasil mesmo, em operações maquiadas como prestação de serviços, principalmente de consultoria — um termo vazio de significado, mas que transmite um certo ar de austeridade e necessidade.

As empreiteiras do esquema firmavam contratos de consultoria com empresas de fachada que embolsavam o dinheiro e davam notas fiscais para “limpar” as operações, que pareciam protegidas por uma inexpugnável confraria de amigos posicionados nos lugares certos em Brasília e na Petrobras. Os recursos desviados abasteciam o PT, o PMDB e o PP, os três principais partidos da base de apoio do governo federal. A investigação mapeou o caminho da propina paga por várias das integrantes do clube. Entre 2005 e 2014, o grupo OAS, por exemplo, repassou pelo menos 17 milhões em propinas apenas por meio do doleiro Alberto Youssef.

Além dos empreiteiros e de seus principais executivos, também foi preso o ex-diretor da Petrobras Renato Duque, apontado como o homem que, no fatiamento da propina, cuidava da parte que cabia ao PT. Esse elo que a polícia começa a fechar entre o diretor corrupto e a empresa corruptora tem atormentado deputados, senadores petistas e altos dirigentes do governo. Funcionário de carreira, Duque entrou na Petrobras em 1978 — um ano depois de Paulo Roberto Costa — por concurso. Galgou alguns postos ao longo de sua trajetória, mas sua nomeação como diretor, em 2003, surpreendeu a todos. Duque era, então, chefe de setor, alguns níveis hierárquicos abaixo da diretoria. Nunca antes na história da Petrobras um chefe de setor havia ascendido sem escalas à cúpula. A explicação logo se tornou pública. Duque era o escolhido de José Dirceu, com quem tinha um relacionamento antigo. Discreto e de temperamento afável, Duque procurava não ostentar. Entre 2003 e 2012, ele reinou absoluto na diretoria de Serviços. Paulo Roberto Costa revelou à Justiça que, por lá, 3% do valor dos contratos era repassado exclusivamente ao PT.

VEJA

EXPLOSÃO – Fernando Baiano: o lobista, que está foragido, ameaça contar o que sabe e elaborou uma lista com beneficiários de propina ligados ao PMDB

A polícia já descobriu onde estão as contas bancárias que receberam parte desses recursos. Elas foram identificadas por Julio Camargo, dirigente da Toyo, outra empreiteira envolvida no escândalo, que também fez acordo com a Justiça para contar o que sabe. E ele sabe muito, principalmente sobre a distribuição de dinheiro ao partido que está no governo há doze anos e a alguns de seus altos dirigentes. Foi com base no depoimento de Julio que a polícia decidiu pedir a prisão temporária de Duque e colocar outro funcionário da Petrobras no radar: Pedro José Barusco, que atuou como gerente de engenharia. Barusco só não foi preso porque propôs um acordo de delação premiada. Os policiais também chegaram a uma personagem que leva o escândalo ao coração do PT: Marice Correa de Lima, cunhada de João Vaccari, tesoureiro do partido, outro investigado. Marice lidava com o que o doleiro Youssef chama de “reais vivos”. Em dezembro do ano passado, a cunhada do tesoureiro do PT recebeu no apartamento onde mora, em São Paulo, 110 000 reais. Origem das cédulas: a construtora OAS. Marice é também mais um elo a ligar o petrolão ao mensalão. A petista apareceu nas investigações do grande escândalo do governo Lula como encarregada de pagamentos. Outro alvo da operação de sextafeira, o lobista Fernando Soares, o Baiano, é apontado como o arrecadador do PMDB na Petrobras. Baiano estava foragido. Sua prisão vai ajudar a esclarecer outras frentes de corrupção na estatal — entre elas, a rede de propinodutos instalada no negócio da compra da refinaria de Pasadena, no Texas. E os resultados da Operação Lava-Jato estão apenas começando a aparecer.  

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Outros destaques de VEJA desta semana

 

Caro Francis, você tinha que estar aqui pra ver isso

No final de sua vida, o jornalista Paulo Francis foi atormentado por um processo judicial.

Francis havia dito no programa “Manhattan Connection” que “os diretores da Petrobras todos têm conta na Suíça.”Paulo Francis

O então presidente da Petrobras, Joel Rennó, resolveu mover-lhe um processo nos EUA, usando, claro, advogados pagos pela empresa. E como tudo na Petrobras sempre tendeu ao superfaturamento, a estatal pediu logo 100 milhões de dólares de indenização, um dinheiro que Francis nunca teve nem jamais teria.

Atordoado pelo ‘assédio jurídico’, Francis perdeu o sono e, coincidência ou não, acabou tendo um ataque cardíaco que o matou em fevereiro de 1997.

Há vasta literatura contra e a favor da tese de que o processo foi o fator determinante para sua morte, mas pelo menos uma coisa já pode ser pacificada: as descobertas da operação Lava Jato e os mandados de prisão executados nesta sexta-feira mostram que Francis pôs o dedo na ferida certa.

De lá pra cá, a corrupção na Petrobras passou de endêmica a epidêmica, mas a empresa continua vivendo das boas graças do contribuinte brasileiro — não se esqueça, é o “orgulho nacional” — enquanto é usada para servir a interesses políticos e particulares.

Paulo Francis não está vivo para ver as entranhas da Petrobras expostas à sociedade, mas a sociedade já deveria estar madura o suficiente para discutir se as empresas estatais deveriam ser as vacas sagradas que ainda são — enquanto o contribuinte é a vaquinha de presépio da maior estatal de todas, a Roubobrás.

Com agradecimentos à GNT, a coluna dá a palavra a Paulo Francis, in memoriam.

Por Geraldo Samor

 

Avanço da Lava Jato tira o sono de Gabrielli e Vaccari

José Sérgio Gabrielli (esq.), ex-presidente da Petrobrás, e João Vaccari Neto (dir.), tesoureiro do PT

José Sérgio Gabrielli (esq.), ex-presidente da Petrobras, e João Vaccari Neto (dir.), tesoureiro do PT(Divulgação/VEJA.com)

avanço da Operação Lava Jato da Polícia Federal tem tirado o sono de uma série de petistas e políticos que orbitam o governo federal há meses, mas dois nomes despontam na fila dos aflitos: o ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli e o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto. Não faltam depoimentos relatando a participação de Gabrielli e de Vaccari no maior esquema de lavagem de dinheiro e sangria nos cofres da estatal já descoberto pela PF. Nesta sexta-feira, a cunhada de Vaccari, Marice Correa de Lima, teve de prestar depoimento pelo envolvimento com o doleiro Alberto Youssef, apontado como "uma espécie de banco" de políticos e partidos para pagamento de propina. Em sua delação, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa afirmou que o então diretor de Serviços da petroleira, Renato Duque, entregava a fatia do PT no rateio da propina diretamente para Vaccari. Renato Duque foi preso hoje. (Daniel Haidar, de Curitiba)

 

Se isso não é compra de votos, o que é então?

A exploração da miséria foi a marca dessa reeleição de Dilma

Vou insistir no ponto que já fiz aqui: a grande divisão política hoje não é entre esquerda e direita, mas entre populistas e republicanos. Populistas não ligam para o fortalecimento das instituições, e nunca pensam nas próximas gerações, apenas nas próximas eleições. Por isso usam e abusam da máquina estatal para se manter no poder, seu único projeto verdadeiro.

Quando descobrimos que às vésperas das eleições o governo triplicou as verbas de um programa social, o que devemos concluir? Que se trata de uma grande coincidência? Que os governantes se preocupam com os mais pobres? Ou que usam essa gente como massa de manobra para ficar no poder, mamando nas tetas estatais?

Nos meses que antecederam as eleições deste ano, o governo federal triplicou o pagamento às famílias de baixa renda no âmbito do Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais. De junho a outubro de 2014, foram pagos R$ 121,37 milhões aos beneficiários do programa, uma das iniciativas do Plano Brasil Sem Miséria, voltado para a população em situação de pobreza ou extrema pobreza. No segundo semestre do ano passado, entre julho e dezembro, o valor pago foi de R$ 43,2 milhões.

O valor dos benefícios e o número de famílias alcançadas pelo programa foram crescendo à medida que se aproximavam as eleições. O número de famílias beneficiadas em outubro, mês da eleição, dobrou em relação aos meses anteriores. Ao todo, 36.569 famílias que receberam parcelas do benefício, contra 18.777 em setembro, 18.520 em agosto e 16.867 em julho, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS).

Além disso, quase 70 mil famílias foram cadastradas só em 2014 para receber o programa de fomento de atividades rurais:

O número de famílias atendidas pelo Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais também cresceu exponencialmente este ano. De janeiro de 2012, quando o programa foi criado, até dezembro de 2013, foram atendidas 55,2 mil famílias. Somente em 2014, entre janeiro e outubro, mais 68,4 mil famílias começaram a receber o apoio financeiro, de acordo com dados do MDS.

Informações do Siafi mostram que os valores também cresceram em ano eleitoral. Nos dois primeiros anos do programa, de janeiro de 2012 a dezembro de 2013, o programa liberou R$ 77 milhões em benefícios. Só neste ano, de janeiro até outubro de 2014, mês do segundo turno da eleição para presidente, foram R$ 173,7 milhões.

Isso é apenas a reedição do velho voto de cabresto, típico do coronelismo nordestino. O PT usa recursos públicos para se manter no poder. Justamente por isso não quer transformar os programas sociais em projetos de estado, para não perder essa oportunidade de fazer chantagem com os carentes, explorados eleitoralmente pelo partido.

A decisão do pleito pode até ter sido legal, se bem que há controvérsias, pois existem denúncias e testemunhas de fraudes nas urnas eletrônicas, e o PT reagiu com muito receio ao pedido do PSDB para auditoria, levantando suspeitas. Mas mesmo se foi legal, sem dúvida não foi legítimo. Qual a legitimidade, afinal, em se vencer apelando tanto, comprando tantos eleitores de forma tão escancarada?

Os populistas, ao contrário dos republicanos, não ligam para os pilares de uma sólida democracia. Só querem saber do poder pelo poder!

Rodrigo Constantino

 

De Adam Smith para Dilma. Ou: A maldição do ouriço: um paralelo entre Eike Batista e Dilma

Eike e Dilma: vítimas da própria arrogância

Adam Smith nasceu em 1723 na Escócia, e é conhecido pelo seu estudo sobre a riqueza das nações. Entretanto, não foi apenas a economia que despertou o interesse do autor. Ele dedicou boa parte do seu tempo às reflexões sobre a natureza humana e seus aspectos morais. Em 1759, publicou Teoria dos Sentimentos Morais, sua obra-prima em termos filosóficos.

Os ensinamentos de Smith sobre economia seriam fundamentais para a presidente Dilma, que ignora inúmeras lições já disponíveis naqueles tempos. Mas é sobre o aspecto moral que Smith mais teria a falar com Dilma atualmente. Esse texto pode ser encarado como um recado de Adam Smith para Dilma.

“Nas cortes de príncipes, nos salões dos grandes, onde sucesso e privilégios dependem, não da estima de inteligentes e bem informados iguais, mas do favor fantasioso e tolo de presunçosos e arrogantes superiores ignorantes; a adulação e falsidade muito freqüentemente prevalecem sobre mérito e habilidades. Em tais círculos sociais, as habilidades em agradar são mais consideradas do que as habilidades em servir”.

Não há como ler esta passagem e ignorar que o governo Dilma loteou milhares de cargos levando em conta somente fatores ideológicos ou mesquinhos, distribuiu privilégios aos montes, garantiu o emprego de seus “camaradas” abandonando completamente os critérios de capacidade de gestão.

Dilma se cerca de bajuladores, aponta para cargos importantes figuras inexpressivas, alia-se aos “caciques” da velha política, aparelha o estado com seus companheiros de ideologia, acabando com o único critério que realmente deveria ser levado em conta: a meritocracia.

A presidente tem fama de durona, de intragável até, o que dificulta o diálogo com seus pares e também as críticas dos subalternos. O bom líder, porém, deve dar abertura para ouvir, para absorver críticas e sugestões, pois ninguém é onisciente. Quando equivocado, o líder deve ter humildade o suficiente para poder acatar recomendações e mudar.

Pessoas próximas dizem que esse foi o grande erro de Eike Batista. A hubris, a arrogância de quem realmente passou a se considerar um Midas, um gênio. Com tal postura, o empresário teria se arrogado um saber que não possui, e se cercado de bajuladores. Os críticos foram sendo eliminados, um a um. Restaram os puxa-sacos, aqueles que só elogiam o chefe, mesmo quando claramente errado.

Os líderes que se fecham como ouriços e atacam todos os críticos estão fadados ao insucesso. Um líder precisa ter a humildade para admitir equívocos, e jamais deve se cercar dos piores só para proteger seu ego, com medo da comparação. O bom líder, ao contrário, quer os melhores em torno de si, e por isso é um líder de verdade: pois sabe reconhecer o talento alheio que não possui.

Se Dilma não mudar – e é difícil mudar algo tão estrutural – é provável que vá cada vez se fechando mais, criando um “círculo de confiança” seleto, em que somente aqueles que concordam totalmente com ela podem entrar. Com tal atitude, vai insistir nos erros, dobrar a aposta, e afundar de vez nossa economia, como fez Eike Batista com seu “império”. Quem viver, verá…

Rodrigo Constantino

 

O iPhone 6 mais caro do mundo: o que isso significa?

Milhares de pessoas de várias nacionalidades no mundo todo estarão formando filas enormes hoje para comprar o novo iPhone 6, da Apple. Só que os brasileiros precisarão levar o dobro da quantia que os americanos levarão na carteira, para comprar o mesmo produto. Em nosso país, a novidade chegará bem mais cara do que no resto do mundo:

O que isso significa? Por que é assim? Devemos dar importância a isso, ou é coisa que interessa apenas aos mais ricos da elite, que querem usufruir do luxo capitalista?

Em primeiro lugar, entendo a crítica dos intelectuais de esquerda sobre o consumismo descontrolado da modernidade, e cheguei a escrever um texto sobre a seita da Apple. Dito isso, e rejeitando alguns excessos, é claro que todos têm direito de desejar comprar o que bem entendem, e se isso lhes traz a sensação de felicidade, ainda que efêmera, quem somos nós para condená-los? Até porque muitos desses intelectuais criticam esse consumismo com seus próprios iPhones ou bolsas da Louis Vitton.

Mas óbvio que o iPhone não é apenas isso. Ele é lazer legítimo, comodidade, e também produtividade. É um aparelho fantástico que reúne inúmeros aplicativos úteis. Eu, por exemplo, aposentei o GPS do carro com o Waze no telefone. Câmeras fotográficas foram abandonadas. Gravadores digitais idem. Tem tudo nele, e muito mais. Torna nossa vida mais prática, aumenta a eficiência de muita gente trabalhadora.

Portanto, já temos aqui a primeira enorme desvantagem para o Brasil, que todos deveriam levar em conta, não apenas os viciados em Apple: insumo tecnológico serve para aumentar a produtividade de nossa economia, e quanto mais caro for, menos eficiente seremos. O que acontece com o iPhone é replicado para todos os demais aparelhos eletrônicos. Pagamos mais caro por tudo, e isso prejudica nossa produtividade.

Além disso, comparar o preço de produtos iguais ou similares no mundo todo serve para se ter uma ideia do valor de nossa moeda, se está cara ou barata. A revista britânica The Economist todo ano divulga o Índice BigMac, que compara o preço do sanduíche do McDonald’s no mundo. Existem diversos fatores que devem ser levados em conta, mas sendo uma commodity, isso dá uma boa noção do valor relativo das moedas.

No caso dos produtos eletrônicos, há um agravante: não é apenas o real valorizado artificialmente pelas intervenções do Banco Central que torna o iPhone tão caro para os brasileiros, mas a carga tributária também. Nossos impostos são absurdamente altos para importar esses produtos. O consumidor de classe média ou alta paga o dobro do que paga o americano pelo mesmo produto, sendo que aquele é cinco vezes mais rico na média. E faz isso para financiar o governo!

Pergunto: vale a pena? Compensa? Será que nosso governo é mais eficiente que o americano, para ter que arrecadar mais impostos? Será que o retorno em nossos serviços públicos é tão espetacular assim? Nossas estradas são melhores do que as americanas? Nosso metrô? Nossos aeroportos? Isso sem levar em conta que os Estados Unidos agem como a polícia do mundo ainda por cima…

Por fim, há um último aspecto ignorado por aqueles esquerdistas que não dão importância ao preço mais caro do iPhone, como se fosse algo que prejudicasse apenas os mais ricos: o recurso extra destinado ao mesmo produto deixa de ir para outros destinos. É aquilo que não se vê, como falava Bastiat.

Se o consumidor de classe alta pudesse pagar os mesmos R$ 1.672 que os americanos pagam pelo novo iPhone, em vez de R$ 3.199, ele economizaria R$ 1.527. Para onde iria tal economia? Ora, cada um tem uma resposta, pois é subjetiva. Alguns comprariam mais produtos, estimulando o comércio. Outros poderiam contratar uma diarista por mais um dia. Outros poupariam, o que seria mais oferta de capital para investimentos, pressionando o juro para baixo.

Eis o que esses críticos de esquerda não levam em conta: o preço mais caro pago pelo iPhone não pune somente os “ricos da elite”, mas toda a economia brasileira. Favorece apenas os consumidores de impostos, os governantes e burocratas, aquela categoria mais rejeitada pela população em geral. Provavelmente, o consumidor paga mais caro para financiar a corrupção do governo. Será que é uma boa troca? Ou será que faria mais sentido cada um ter o direito de escolher o que fazer com o recurso extra?

Rodrigo Constantino

 

 

A fábula das abelhas

“Aquilo que de pior existe em cada um, contribuiu alguma coisa para o bem comum.” (Bernard Mandeville)

Publicado em 1714 pela primeira vez e em 1723 numa versão mais completa, A Fábula das Abelhas,de Bernard Mandeville, causaria uma reação tamanha que vários pensadores importantes comentaram a obra e ainda o fazem. O outro título usado pelo autor foiVícios Privados, Benefícios Públicos, o que já dá uma idéia melhor do seu conteúdo central. Mandeville defendia que aquilo entendido como vício pelos homens – como a ganância, inveja, vaidade e orgulho – era fundamental para a prosperidade da nação.

O desejo humano na busca do auto-interesse teria como conseqüência não intencional um caráter estabilizador para a sociedade. O “bem comum” não seria um produto da retidão das pessoas, de suas virtudes, mas sim dos seus vícios individuais. Mandeville tentou explicar a origem da moral como uma domesticação da mente selvagem. O comportamento dito moral teria surgido das reações de criaturas egoístas às opiniões de outros porque essas opiniões têm conseqüências tangíveis importantes ao seu próprio bem-estar. Para Mandeville, uma das maiores razões de por que tão poucas pessoas se compreendem é porque os escritores estão sempre ensinando como os homens deveriam ser, enquanto poucos se dão ao trabalho de mostrar como eles realmente são.

Fábula conta, de forma irônica, como os vícios de cada abelha em particular eram vitais para a pujança econômica da colméia como um todo. No entanto, pregando como ideal as virtudes e condenando os vícios, as abelhas acabaram tendo seu pedido atendido, e seu deus colocou um fim nos vícios. Todos eram virtuosos agora. Mas não foi preciso muito tempo para que o desemprego começasse a surgir em larga escala, e a economia da colméia ficasse totalmente estagnada.

Mandeville pretende mostrar a importância dos vícios, mas deixa claro que, apesar destes serem inseparáveis das grandes sociedades, e que é impossível a riqueza sobreviver sem eles, os membros particulares da sociedade que são culpados de algum vício devem ser reprovados ou mesmo punidos quando viram crimes. Ou seja: se aceita que os vícios são a força motora do crescimento econômico, mas nem por isso deixa-se de combater seus excessos. O alvo de Mandeville era aparentemente os moralistas que pintavam o homem como anjos. Seu texto pode até ser visto como um reductio ad absurdum desse moralismo, mostrando como seria na prática uma sociedade habitada somente por “santos” que abdicam de seus próprios interesses, de sua ganância.

Um dos grandes pensadores que criticou a obra de Mandeville foi Adam Smith. Em Teoria dos Sentimentos Morais, ele diz: “O Dr. Mandeville considera que tudo o que se faz por senso de conveniência, por respeito ao que é recomendável e louvável, se faz por amor ao louvor e à aprovação, ou, como ele diz, por vaidade. Observa que o homem naturalmente está muito mais interessado em sua própria felicidade do que na de outros, e que é impossível, em seu foro íntimo, preferir realmente a prosperidade destes à sua própria. Quando aparenta preferir a de outros, podemos estar certos de que nos ludibria, e de que está agindo pelos mesmos motivos egoístas e todas as outras vezes. Dentre todas as suas outras paixões egoístas, a vaidade é uma das mais fortes, e sempre fica facilmente lisonjeado e intensamente deliciado com os aplausos dos que o rodeiam”.

Mas Adam Smith afirma que o desejo de fazer o que é honroso e nobre, de nos convertermos em objetos apropriados de estima e aprovação, não pode ser chamado de vaidade. O amor à verdadeira glória, segundo Adam Smith, é diferente da paixão da vaidade simples, pois é uma paixão “justa, razoável e eqüitativa, enquanto a outra é injusta, absurda e ridícula”. Ele explica: “O homem que deseja estima por algo realmente estimável nada mais deseja senão aquilo a que com justiça tem direito, e aquilo que não lhe pode ser recusado sem que se cometa alguma espécie de ofensa”. Nesse sentido, até o que finge merecer estima está reconhecendo o que é estimável. A frase de La Rochefoucauld expressa com perfeição isso: “A hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude”.

Adam Smith coloca o dedo no nervo da questão: “É a grande falácia do livro do Dr. Mandeville representar cada paixão como inteiramente viciosa, em qualquer grau de sentido. É assim que trata como vaidade tudo o que guarde alguma referência com o que são ou deveriam ser os sentimentos alheios; e é por meio desse sofisma que estabelece sua conclusão favorita, de que vícios privados são benefícios públicos”. No entanto, após a mordida, o filósofo escocês assopra, afirmando que “por mais destrutivo que esse sistema possa parecer, jamais poderia ter ludibriado tão grande número de pessoas, nem provocado um alarma tão generalizado entre os amigos dos melhores princípios, se não tivesse em alguns aspectos bordejado a verdade”.

Hayek foi um dos grandes pensadores modernos que resgatou a obra de Mandeville. Um dos pontos mais importantes que merece ser destacado é o fato de que ações individuais geram resultados não intencionais. Não é preciso chegar ao ponto de defender vícios como virtudes, pois basta reconhecer que ações voltadas para a própria felicidade podem acarretar em bem-comum. Mas nada impede que esses indivíduos sejam virtuosos, seguindo um parâmetro ético de comportamento. A ética lida com aquilo que pode ser, diferente daquilo que é. Falar em ética é falar em escolha individual.

Como diz Eduardo Giannetti, em seu livro Vícios Privados, Benefícios Públicos?, “as regras do jogo e a qualidade dos jogadores são os dois elementos essenciais de qualquer sistema econômico”. Giannetti acredita que é uma “ilusão supor que o auto-interesse dentro da lei é tudo o que o mercado precisa para mostrar do que ele é capaz na criação de riqueza”. Afinal, “nenhum ordenamento moral conseguiria manter-se baseado apenas na imposição, por parte da autoridade estatal, de leis coercitivas sobre um conjunto de indivíduos isolados e recalcitrantes”. O medo não basta. A punição não é suficiente. O caráter da população importa. O capital humano é fundamental. A confiança mútua facilita muito. A ética conta. Como disse Benjamin Disraeli, “quando os homens são puros, as leis são inúteis; quando os homens são corruptos, as leis são quebradas”.

Isso não quer dizer, de forma alguma, que a tentativa de se “corrigir” a natureza humana, imposta de cima para baixo, seja desejável. O século XX já mostrou com os horrores do nazismo e comunismo o que a “engenharia” do caráter faz. David Hume já havia alertado que “todos os planos de governo que pressupõem uma grande reforma na conduta da humanidade são claramente fantasiosos”. Isso não nos impede, entretanto, de buscar enaltecer as virtudes humanas num ambiente de liberdade individual. Para Giannetti, seria a volta do senso comum: “virtudes privadas, benefícios públicos”.

Texto presente em “Uma luz na escuridão”, minha coletânea de resenhas de 2008. 

 

Quando a arte imita a vida é que o bicho pega

Muitos acham que a vida imita a arte, mas não seria o contrário? Quando temos uma profusão de acontecimentos incríveis e surreais na própria vida, o artista precisa apenas dar contornos fantásticos e, com o talento da narrativa, criar um livro e tanto, um livraço. Foi o que fez Alexandre Fraga em Oeste: a guerra do jogo do bicho (Ed. Record). É o Poderoso Chefão brasileiro.

É romance, mas que exala cheiro de realidade a cada página. É ficção, mas claramente inspirada em fatos reais, sem escondê-los. Conta a vida dos “capos” do mundo da contravenção, as sagas familiares, as intrigas, disputas por poder, dinheiro, muita corrupção policial e política, tudo em uma narrativa eletrizante. Dará um filmaço também, não tenho dúvidas (já está em produção para o cinema).

Fraga, que é policial federal há 18 anos, mergulha e nos leva junto no submundo do crime, onde as leis oficiais não valem, mas que nem por isso deixa de ter as suas próprias regras, tradições e códigos de honra. As famílias disputam território de forma sanguinária, mas ao mesmo tempo se respeitam. Há hierarquia, e ai de quem se esquece disso…

Nabor Cavalcante era o grande chefão, com seu filho Saulo, seu sobrinho Roger e seu genro Plácido. A morte do líder desencadeia uma série de ações que vão mudar completamente a configuração de poder, incluindo o novo pote de ouro que faria do jogo escrito um negócio sem tanto charme: os caças-níqueis, máquinas de tilintar de moedas para os banqueiros do bicho, na mesma proporção em que sonhos se transformam em pesadelo para os apostadores.

O autor, que como já disse é policial federal, afirmou em entrevista à CBN que considera a proibição ao jogo uma hipocrisia e que é favorável à legalização. Isso não muda o fato de que, uma vez ilegal, ou justamente por ser ilegal, o jogo venha junto com um rastro de sangue e mortes. Sem os devidos processos legais, resta a lei do mais forte: manda quem pode, obedece quem tem juízo.

O glamour ou a inocência de uma aposta simples no animal sonhado ou na máquina dão lugar a um complexo e milionário esquema de subvenção e violência, que culminou até em ato terrorista – na ficção em Angra, na realidade na Barra, zona oeste carioca – matando o alvo errado, um jovem inocente, filho de um dos poderosos contraventores. Não há limites na guerra pelo poder.

Enfim, são muitos interesses contra a legalização do jogo do bicho e dos cassinos. Há argumentos bons sustentando sua proibição, mas estou convencido de que o melhor seria liberar mesmo, trazer para a luz da legalidade e da formalidade tal entretenimento, que, afinal, o próprio governo pode oferecer em forma de loterias. Cheguei a escrever um artigo para a revista Voto sobre o assunto:

Os Jogos de Azar

“Os governos existem para nos proteger uns contra os outros; o governo vai além de seus limites quando decide proteger-nos de nós mesmos.” (Ronald Reagan)

Os jogos de bingo estão proibidos no Brasil desde 2004, por conta de um escândalo envolvendo o governo Lula. Homem de extrema confiança do então ministro José Dirceu, Waldomiro Diniz foi pego numa gravação de vídeo cobrando propina do bicheiro Carlinhos Cachoeira, ligado à atividade dos bingos. Waldomiro era subchefe de Assuntos Parlamentares da Presidência da República, e pelas evidências apresentadas extorquia dinheiro dos contraventores para engordar o caixa do partido. O PT se mobilizou na época para evitar a “CPI dos Bingos” e, em vez de estimular o avanço das investigações, decidiu simplesmente fechar as casas de jogo. A postura do governo Lula foi análoga a do marido traído que, ao flagrar a esposa com outro no sofá da sala, resolve jogar fora o sofá.

Agora o debate sobre o bingo retornou, com a recente aprovação de sua legalização pela Comissão de Constituição e Justiça. O projeto ainda terá que tramitar na Câmara e no Senado, mas a polêmica já foi instaurada. Os defensores da legalização do jogo argumentam em prol da criação de empregos, e os opositores afirmam que o jogo é prejudicial e serve para atividades criminosas, como lavagem de dinheiro. Ambos os lados erram o foco.

O argumento de que há muita corrupção associada aos bingos, incluindo lavagem de dinheiro, e que por isso eles devem ser vetados, é totalmente absurdo. Por essa “lógica”, teríamos que acabar com quase todas as atividades. A fiscalização deve conter os abusos, mas estes não devem tolher o uso. E o uso do jogo como entretenimento é uma escolha individual. Não há crime no ato de participar de algum jogo de azar. E não é porque alguns exploram esse negócio de forma irresponsável que os demais devem perder o direito de manter sua diversão.

Além disso, é preciso ter em mente que os crimes que acompanham a atividade dos jogos de azar são, em boa parte, resultado justamente de sua proibição pelo governo. Quando este decide que certa atividade é ilegal, mesmo que se trate de uma troca voluntária sem vítimas, ele está empurrando para os verdadeiros crimes todos os envolvidos no setor. Basta pensar quais são os setores com maior grau de corrupção e criminalidade. Prostituição, jogos de azar e consumo de drogas, esses são os inimigos públicos número um, não por sua própria natureza, mas sim porque o governo resolveu que são todos ilegais.

O caso do jogo do bicho é sintomático. O jogo recebeu esse nome quando foi lançado, em julho de 1892, por João Batista Vieira Drummond, o barão de Drummond, dono de uma chácara com um pequeno jardim zoológico localizado em Vila Isabel, Rio de Janeiro. Antes do bicho, havia outros jogos semelhantes no Brasil, como os jogos das flores, das frutas e dos pássaros. Manuel Zevada, um mexicano e influente banqueiro do jogo das flores, propôs ao barão a criação de uma réplica de tal jogo, só que usando bichos. O objetivo era conseguir recursos para manter os animais e toda a estrutura do zoológico. Os visitantes eram estimulados a participar de sorteios. Cada bilhete trazia o desenho de um bicho. Tratava-se claramente de um empreendimento criativo. Mas o governo não gosta de competição, e condenou os “banqueiros do bicho” à ilegalidade, ainda que o próprio governo ofereça loterias, “raspadinhas” e até mesmo um bingo! O convite ao crime foi feito pelo próprio governo.

Na mesma linha, temos o exemplo do ramo de bebidas. Em Chicago, durante a Lei Seca, tivemos o famoso Al Capone, um criminoso que se meteu em diversos negócios ilegais, uma vez que seu contrabando de bebidas proibidas já tinha aberto o caminho para o resto. O governo havia decidido, através de uma lei, que a demanda existente da população por bebidas com álcool não mais poderia ser atendida pelo livre mercado. Mas papel e caneta nunca foram capazes de alterar as leis da natureza, e a demanda continuou existindo. Alguém iria atendê-la, e este foi Al Capone. O governo foi o verdadeiro responsável pelo surgimento de alguém como ele. Quando a proibição acabou, tivemos o nascimento de grandes e importantes empresas, como a Coors e Imbev, fornecendo pacificamente seus produtos no mercado.

Aqueles que defendem a legalização do jogo com base no argumento da criação de empregos também estão errando o alvo. Afinal, não é pelo simples fato de que uma atividade pode gerar empregos que ela deve ser desejável. Criar um novo órgão burocrático, por exemplo, pode gerar alguns empregos, mas nem por isso ele será vantajoso ou justo. É verdade que a legalização do bingo pode gerar novos empregos, mas não é por isso que ele deve ser legal, e sim pelo fato de que seria injusto o governo impedir esta atividade. Cada um deve ser livre para jogar, assumindo a responsabilidade pelos seus atos, naturalmente.

Por fim, resta o argumento de que o próprio indivíduo deve ser protegido dele mesmo pelo governo. Mas quem somos nós para decidir o que cada indivíduo fará da sua própria vida? Que direito tem a maioria, ou o Estado, de intervir numa decisão pessoal que diz respeito somente ao indivíduo? Liberdade pressupõe responsabilidade. Não podemos defender o direito de voto – infelizmente um dever no Brasil – e logo depois considerar os cidadãos como mentecaptos, incapazes de decidir o rumo de suas vidas. Não faz sentido algum. É uma enorme contradição pregar o sufrágio universal da democracia e o paternalismo estatal. E um Estado que proíbe o jogo porque os pobres cidadãos seriam vítimas de uma irresistível tentação é extremamente paternalista. Cidadãos não são súditos. Ao contrário, o governante é empregado do povo, e não tem o direito de jogar na ilegalidade um setor que atende uma demanda que afeta somente o indivíduo em si.

Enquanto a legalização não ocorre e travamos o bom debate, recomendo a leitura de Oeste, um livro de tirar o fôlego e prender o leitor à poltrona até a última gota de sangue escorrer, até a cabeça de alguém rolar, até a última das 300 páginas, que parecem deslizar no tempo. Seu Carnaval nunca mais será o mesmo…

Rodrigo Constantino

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Fonte:
veja.com

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1 comentário

  • Paulo Roberto Rensi Bandeirantes - PR

    Sr. João Olivi, esta última viagem da presidenta tem uma detalhe que me intrigava: A parada técnica no Qatar.

    Lendo as noticias referentes à BELA Operação Lava Jato, sim BELA, pois nunca na história deste país, um evento tem provocado tantos sentimentos prazerosos; onde citam que o governo vai reforçar o discurso que foi a presidente quem demitiu os corruptos da Petrobrás e defende as investigações “doa a quem doer”. Penso que está aí o motivo da visita a Doha, capital do Qatar, ela foi até Doha para ver se seria abalada!

    Brincadeiras são consequências do estado de espírito e, já que o “estado” está propicio. O atual governo é especialista em eufemismo, venho cooperar e “criar” um novo eufemismo: Neste segundo mandato a presidenta prometeu incrementar as mudanças e sem seu consentimento, surgiu o “PAI” de todas as mudanças:

    SÉRGIO MORO, juiz titular da vara federal especializada em lavagem de dinheiro e crime organizado de Curitiba, ou seja, o “eufemismo” que arrepia qualquer psicopata incompetente é: “SÉRGIO MORO”!

    ....”E VAMOS EM FRENTE” ! ! !....

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