JOSIAS DE SOUZA: Congresso muda Orçamento em clima de botequim de favela e o caso vai ao STF
— Sai da frente, gritou o líder do governo, deputado Henrique Fontana (PT-RS), para os colegas de oposição que se postavam defronte da mesa diretora da Comissão de Orçamento do Congresso.
— Não saio! Se vocês querem estabelecer a zona, a gente não vai respeitar, respondeu o líder do DEM, Mendonça Filho (PE).
O Parlamento é uma coisa, um botequim de favela é outra coisa. Num ambiente, os conflitos são solucionados por meio de negociações que terminam no voto. Noutro, as desavenças resultam em rififis que evoluem para a pancadaria. Pois nesta terça-feira (18), o Parlamento brasileiro viveu uma noite típica das piores biroscas da periferia.
Deputados e senadores votaram o projeto que desobriga o governo Dilma Rousseff de conter gastos para pagar a dívida pública como se estivessem com a barriga encostada no balcão de um boteco de quinta categoria. Ou com os cotovelos recostados numa mesa de ferro —dessas que têm os pés em formato de ‘X’ e o tampo apinhado de garrafas de cerveja vazias.
Passava de 23h. Transmitida ao vivo pela internet, a sessão da Comissão de Orçamento, a mais nobre e importante do Legislativo, já durava três horas e meia. Um tempo que havia sido 100% consumido em manobras regimentais, puxadas de tapete, palavras em riste e descortesias. Armada do regimento, a oposição tentava protelar a decisão. Os governistas tinham pressa.
De repente, o relator do projeto, senador Romero Jucá (PMDB-RR), e o presidente da comissão, deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), decidiram fechar a conta. Interessados em postergar a deliberação, os líderes da oposição postam-se defronte da dupla, para bloquear-lhes a visão.
Devanir pediu ao relator que apresentasse o seu relatório. Jucá respondeu que a matéria, já sobejamente conhecida, dispensava apresentações. E sugeriu que fosse realizada a votação.
“Os senhores parlamentares que forem a favor da aprovação permaneçam como se acham”, declarou Devanir. Mesmo sem enxergar a reação do plenário, o deputado proclamou o resultado: “Aprovado”. Em pouco mais de três minutos, a fatura estava liquidada. A proposta seguiu para o plenário do Congresso.
“Foi como se estivéssemos jogando uma partida de dominó”, comparou o deputado Mendonça Filho. “Ao pressentir que podia não obter o resultado que desejava, os apoiadores de Dilma embaralharam as peças para melar o jogo.” Líder do PSDB, Antonio Imbassahy sentiu um cheiro de “bolivarianismo” na sessão.
Jucá, por sua vez, sorriu de orelha a orelha. Os governistas abraçaram-no. Abespinhado, o tucano Domingos Sávio (PSDB-MG) pôs-se a gritar: “Vergonha. Vocês são vendidos. Vendidos!” A praxe de tratar os contrários por “excelência” e “nobre colega” foi para as cucuias.
Deixados falando sozinhos, os oposicionistas dirigiram-se à sala da secretaria da Comissão de Orçamento. Encomendaram à assessoria: 1) as notas taquigráficas da sessão; 2) o áudio; e 3) as imagens da sessão. Munidos desse material, os líderes do PSDB, DEM e PPS protocolarão no STF um pedido de anulação da sessão.
Antes, os rivais de Dilma irão à sala do presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), para pedir-lhe que tome, ele próprio, a iniciativa de passar uma borracha na noite das garrafadas. É improvável que sejam atendidos. Nessa hipótese, além de ir ao Supremo, a oposição tentará bloquear todas as votações do Legislativo.
A eficácia do bloqueio será testada já nesta quarta-feira (19), numa sessão do Congresso convocada por Renan para apreciar 38 vetos presidenciais. A análise desses vetos é pré-condição para a votação final do projeto que permite ao governo fechar suas contas no vermelho sem sofrer as sanções previstas em lei.
O Parlamento ainda é o melhor entreposto que a sociedade civilizada encontrou para dissolver seus conflitos de forma negociada e pacífica. Nesse universo, vigora a máxima segundo a qual as regras são menos perigosas do que a imaginação. E a tática protelatória da oposição, quando escorada no regimento, é um direito da minoria.
Para transpor esse tipo de obstáculo, basta que o governo exiba paciência e votos. Na sessão da noite passada, o Planalto prevaleceu sem método. A truculência e as garrafadas não ornam com uma usina de fazer política. Quando a pendenga que desce à mesa de boteco envolve questões orçamentárias, é sinal de que a política se desobrigou de fazer sentido.
- Atualização feita às 14h13 desta quarta-feira (19): Renan Calheiros e Henrique Eduardo Alves, presidentes do Senado e da Câmara, reuniram-se com os líderes dos oposicionistas PSDB, DEM e PPS. Para evitar que a sessão em que a Comissão de Orçamento se confundiu com um boteco fosse parar no STF, o bloco governista deu meia-volta. Concordou em repetir nesta quarta a votação do projeto que autoriza Dilma a fechar as contas de 2014 no vermelho. Veja os detalhes aqui eaqui.
Na FOLHA: Governistas recuam e farão nova votação de manobra fiscal no Congresso
Pressionada pelos partidos de oposição, a base governista no Congresso recuou e decidiu reabrir a votação da manobra fiscal que permite ao governo fechar as contas de 2014.
Uma nova discussão do projeto de lei que autoriza o governo a descumprir a meta de economia para pagamento de juros da dívida pública em 2014, o chamado superavit primário, deve ocorrer na tarde desta quarta-feira (19) na Comissão Mista de Orçamento.
O texto foi aprovado na noite desta terça (18), em meio a insultos, bata-boca e dedos em riste. Na prática, a nova votação não deve mudar a aprovação pela comissão, que é formada por maioria governista.
A movimentação atrasa os planos do Palácio do Planalto que mobilizava aliados para tentar aprovar a proposta ainda nesta quarta no plenário do Congresso. Com isso, a análise final do texto só deve ocorrer na próxima semana.
Relator da proposta, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), reconheceu que não houve discussão do projeto devido ao clima de guerra provocado pela oposição.
"Quem tiver maioria leva", resumiu Jucá. "A ideia é não ter animosidade, é ter discussão técnica porque essa é uma matéria séria para o país", afirmou o peemedebista.
O líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), afirmou que a base governista faz um gesto ao regimento e aos oposicionistas. "É um recuou importante do governo, gesto de respeito ao regimento do Congresso e ao que propõe a Constituição".
A votação instalou um clima de guerra nos corredores do Congresso e provocou uma reunião de emergência dos presidentes sdo Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), com a oposição para tentar acalmar os ânimos.
PSDB, DEM, PPS e PSB, no entanto, cobraram uma nova votação do projeto de lei que autoriza o governo a descumprir a meta de economia para pagamento de juros da dívida pública em 2014, o chamado superavit primário. Os oposicionistas argumentam que a base governista lançou mão de manobras que ferem o regimento e a Constituição para aprovar a matéria na Comissão Mista de Orçamento.
A votação da brecha que permite o governo descumprir a meta de superavit elevou a temperatura entre governistas e oposicionistas na noite desta terça, produzindo embates acalorados e cenas inusitadas.
Para impedir o avanço da discussão, enquanto Jucá fazia uma leitura acelerada das atas da última reunião, o líder do DEM na Câmara chegou a tomar o papel das mãos do peemedebista.
Jucá não retrucou. Ele pegou outro relatório e prosseguiu a leitura. Segundo parlamentares, foi possível ouvir xingamentos e insultos dos oposicionistas fora dos microfones.
Vários parlamentares da oposição também foram de dedo em riste em cima de Jucá e do presidente da comissão, o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), cercando a mesa do comando da comissão.
Segundo os parlamentares oposicionistas, houve irregularidade na votação, que teria ocorrido sem as fases de discussão, apresentação de destaques e votação, e sem que tivesse havido requerimento aprovado para supressão dessas fases.
RESULTADO
O texto de Jucá aprovado pela Comissão traz uma mudança em relação ao projeto enviado pelo Planalto. O relator trocou a expressão "meta de superavit", do projeto, por "meta de resultado", o que foi interpretado pela oposição como um indicativo de que o governo fechará com deficit.
O projeto, enviado ao Congresso na semana passada, permite ao Executivo descontar do resultado primário todo o valor gasto no ano com obras do Programa de Aceleração do Crescimento e com as desonerações tributárias.
Isso significa um valor que pode chegar próximo a R$ 140 bilhões. Na prática, mesmo que chegue ao final do ano com deficit primário, ainda assim o governo não terá descumprido a meta fiscal de 2014. A meta é definida pela Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Mercadante prevê recessão e desemprego sem mudanças no superavit
O ministro da Casa Civil, Aloísio Mercadante, agradeceu nesta quarta-feira (19) à Comissão Mista de Orçamento do Congresso pela aprovação do projeto que afrouxa o controle do cumprimento da meta de economia do governo para abatimento de juros da dívida –o chamado superavit primário.
Durante evento no Palácio do Planalto nesta manhã sobre produtividade e competitividade da indústria brasileira, Mercadante apresentou um cenário catastrófico caso o plenário do Congresso, para onde segue o projeto, não aprove a matéria.
"Se o Congresso não aprovar essa flexibilização, o que nos resta é parar investimentos e entregar o superavit, mas com recessão e desemprego. Empresas não pagariam o 13º aos funcionários", disse.
Depois de uma sessão conturbada, que durou mais de oito horas, a comissão votou o texto, à revelia da oposição, que tentou várias manobras para obstruir a votação. A oposição deve pedir a anulação da votação ao STF (Supremo Tribunal Federal).
Mercadante afirmou que o governo precisou "flexibilizar" o superavit por ter feito esforços para conter os efeitos da crise econômica, fazendo desonerações, investimentos e gastos com o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
"Como fomos muito ampliados do ponto de fiscal ao longo da crise, estamos projetando um quadro da estabilização da divida pública, acelerando investimento e desonerando a economia e flexibilizando nosso superavit primário, que continua sendo objetivo fundamental no ano que vem."
Ele afirmou que o governo terá de fazer ajuste fiscal sim no próximo ano, e que sempre tem gasto para cortar. "Precisamos aumentar a eficiência do Estado brasileiro, fazer mais com menos. Mas tivemos que tomar essa decisão [de flexibilizar o superavit]."
INVESTIDORES
O empresário Jorge Gerdau, presidente da Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade (órgão consultivo ligada ao governo), afirmou que a manobra fiscal executada pelo governo pode ser feita num ano, mas não pode virar um "modo de trabalhar", o que afastaria investimentos.
"É indiscutível, se olhar o cenário mundial, há riscos de acontecer esse tipo de problema. Mas o mercado financeiro tem muitas opções no mundo e ele vai se alocar onde o risco e a rentabilidade se conjuguem da melhor forma."
"Precisamos do investimento internacional para atender essa lacuna de atraso na infraestrutura, e isso só irá acontecer se houver indicações de que há espaço para os investimentos. Por isso precisamos trilhar um caminho que dê confiança ao empresário, ao investidor internacional", concluiu
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