Na FOLHA: A conta da Olimpíada ficará no Brasil (ELIO GASPARI)

Publicado em 07/08/2016 17:14
na edição da FOLHA DE S. PAULO deste domingo

Daqui até o fim dos jogos, centenas de jovens subirão nos pódios, baixarão a cabeça e receberão as medalhas de ouro da Olimpíada do Rio. Serão momentos de sonho, felicidade e alegria. Da alegria dos jovens que sorriam para o mundo durante o desfile dos atletas na festa da abertura. Nada reduzirá a beleza dessas cenas. Para os brasileiros, ficarão os momentos de sonho e a conta. Alguém ainda fará o cálculo da fatura dos custos diretos e indiretos transferidos à Viúva. Chutando para cima, poderá chegar a R$ 500 milhões.

  Eduardo Knapp - 5.ago.16/Folhapress  
Rio de Janeiro, RJ, BRASIL, 05-08-2016: Abertura das Olimpiadas no Estadio do Maracana (Foto: Eduardo Knapp/Folhapress, ESPORTES).
Abertura da Olimpíada do Rio no Maracanã

O Maracanã, joia da privataria do governo do Rio e da Odebrecht, tornou-se um magnífico elefante branco, incomparável em noites de festa. A manutenção das instalações olímpicas custará R$ 59 milhões anuais num Estado cuja rede de saúde pública entrou em colapso. A máquina de marquetagem que prometeu Olimpíada sem dinheiro público voava nas asas dos jatinhos de Eike Batista, o homem mais rico do Brasil, candidato ao pódio mundial. Era o tempo em que os governantes torravam o dinheiro achando que o pré-sal cobriria qualquer projeto.

Nos dias em que os problemas da Vila Olímpica dominaram o noticiário, foi frequente o argumento de que os críticos da festa carregavam o eterno "complexo de vira-lata".

Criação de Nelson Rodrigues, ele refletia "a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo". Bola dentro, mas às vezes a questão é mais complicada. Há cães de raça, mas há também adoráveis vira-latas.

A sorte, essa trapaceira, fez com que o repórter José Maria Tomazela mostrasse uma nova dimensão da problemática canina. Ele expôs a ação de uma quadrilha de Sorocaba (SP) que mutilava e pintava filhotes de vira-latas, transformando-os em chihuahuas e pinschers. Vendiam chihuahuas por R$ 300.

Viu-se assim outro ângulo da questão: há gente que vende chihuahuas e entrega vira-latas maquiados a pessoas que resolveram acreditar neles.

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POTÊNCIA NUCLEAR

A condenação a 43 anos de prisão do almirante da reserva Othon Luiz Pinheiro da Silva, presidente da Eletronuclear, colocou a burocracia nacional no pódio das potencias atômicas. Não pela posse da bomba, mas porque em nenhum outro país aconteceu coisa igual.

Como se trata de um negócio parcialmente militarizado e sempre protegido pelo sigilo, o Brasil já torrou dezenas de bilhões de dólares com aventuras nucleares. Pela primeira vez, o contubérnio de autoridades com empreiteiras e fornecedores deu cadeia.

No século passado, um programa de cooperação com a Alemanha construiria oito usinas, mais uma de reprocessamento e outra de enriquecimento de urânio. Houve até burocrata prometendo que hoje o Brasil teria 41 usinas nucleares.

JOGO SUJO

Domingo passado, o desembargador gaúcho José Antonio Hirt Preiss esclareceu que o salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal não era de R$ 39,3 mil. Esse é valor estabelecido num projeto que "está aguardando no fim da fila". O valor correto seria de R$ 33,7 mil.

Na quarta-feira (3), o projeto foi aprovado pela Comissão de Justiça do Senado. Antes de chegar ao plenário, o texto deve passar pela Comissão de Assunto Econômicos.

O senador Ricardo Ferraço, crítico da iniciativa, não gostou da pressa: "Estou estarrecido com essa manobra. Quando fui avisado de que votariam, foi o tempo de eu chegar lá, mas já tinham votado. É um escárnio aprovar isso. O efeito cascata chegará a R$ 3 bilhões".

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DILMA 3.0

Quem conviveu com Dilma Rousseff na cadeia assegura que ela demonstrou uma rara capacidade de adaptação à vida no cárcere.

Dentro de algumas semanas, Dilma passará por uma nova provação, devendo adaptar-se a uma vida na qual as portas não se abrem sozinhas e a geladeira precisa ser abastecida.

É muito provável que depois de passar um tempo em Porto Alegre ela siga para um período de descompressão no exterior. Se ela quiser conforto e não tiver juízo, pousará em Cuba.

FOGOS PETISTAS

As divergências entre Dilma e comissários petistas refletem a crise de um partido que está pronto para explodir.

Será fácil para os comissários jogar Dilma ao mar (como vão jogar), mas isso não resolverá as diferenças mais fundas. A charanga irá unida até a eleição municipal. Daí em diante, cada um seguirá sua vocação. A banda ideológica, imunizada em relação à Lava Jato, ralará. Enquanto a fisiológica já começou a se aninhar nos partidos que bicavam o mensalão e as petrorroubalheiras.

O MURO DO TUCANO

O Instituto Teotônio Vilela, do PSDB, publicou um texto criticando (corretamente) a gastança do governo de Temer e disse que é necessário "fechar a torneira dos gastos".

É o tucanato no seu melhor estilo. O PSDB tem dois ministros no governo, mais o líder no Senado. Se isso fosse pouco, o governador tucano Geraldo Alckmin foi um grande beneficiado pela renegociação das dívidas dos Estados, não só porque o espeto paulista era o maior, mas também porque tirou bom proveito das gambiarras aceitas por Temer.-

TEMER IRÁ À CHINA ASSOMBRADO POR LOROTAS

Michel Temer pretende visitar a China na sua primeira viagem ao exterior. Será uma boa oportunidade para evitar os desastres e papagaiadas que acompanharam três visitas oficiais de caciques dos dois países.

Em 2004, o presidente Hu Jintao visitou Brasília e o Itamaraty contratou um intérprete terceirizado. Hu disse que a China pretendia aumentar o fluxo comercial (maoy) com a América Latina para US$ 100 bilhões. O moço traduziu anunciando um aumento dos investimentos (touzi). A bobagem foi notícia pelo mundo afora, e os chineses foram discretos ao corrigi-la.

Em 2011, Dilma Rousseff foi a Pequim e anunciou que a empresa Foxconn faria um retumbante investimento de US$ 12 bilhões para fabricar equipamentos e produtos da Apple no Brasil. Geraria 100 mil empregos, dos quais 20 mil seriam engenheiros. A megalomania foi prontamente desmentida pelo dono da empresa. Em 2015 haviam sido criados 3.000 empregos de baixa qualificação em Jundiaí, produzindo os iPhones que chegam ao consumidor com os preços mais caros do mundo. (Parte dessa anomalia está nos impostos nacionais.)

Em 2015, o primeiro-ministro Li Keqiang passou por Brasília, e o comissariado anunciou que ele traria um pacote de US$ 53 bilhões em investimentos. A joia dessa coroa seria a construção de uma ferrovia Transoceânica, ligando os litorais do Atlântico e do Pacífico da América do Sul. Era lorota.

Nenhuma dessas fantasias saiu da diplomacia ou da máquina de propaganda chinesas. 

A andorinha e o verão (CARLOS HEITOR CONY)

De grão em grão, a galinha enche o papo. Pancada de amor não dói. Uma andorinha não faz verão... 

Não sou contra os ditados populares que antigamente os eruditos chamavam de anexins. Reconheço que eles expressam o "veredicto dos séculos".

Penso nisso quando são comemoradas as festas coletivas como o Natal, o Carnaval e o Ano Novo, que unem a humanidade numa só razão positiva e benéfica. Podem ser ponto de partida para um mundo melhor.

Estamos vivendo mais uma Olimpíada, talvez a celebração mais antiga que os homens inventaram. Antes de mais nada, é uma festa de homens e mulheres, inclusive de países que formam o gênero humano em sua maior acepção.

Elas não se realizam em tempos de guerra ou de grandes conflitos e tragédias universais. Apesar dos pesares é uma festa de paz e até mesmo de alegria, por pior que esteja a política, a economia e outros conflitos localizados, entre os quais o pior é o terrorismo, seja de que lado for.

Uma Olimpíada pode revelar um instinto perverso. Assim foi quando Nero, na Antiguidade, mandou construir um Arco do Triunfo para ele, que ganhara absurdamente uma medalha de ouro numa competição de poesia, modalidade que não mais existe nos tempos modernos. Foi um detalhe esclarecedor do que viria depois, com Nero incendiando Roma e matando cristãos.

Outra Olimpíada, mais recente, revelou o instinto assassino de Adolf Hitler. No início da ascensão do nazismo, em 1936, construiu um magnífico estádio e tentou convencer o mundo de seus propósitos humanitários. No entanto, fazendo do racismo o único valor da raça humana, recusou-se a apertar a mão de Jesse Owens, um negro americano que ganhou quatro medalhas de ouro, sendo considerado o maior atleta de todos os tempos, derrubando o mito da superioridade ariana.

É próprio de um governo populista convencer de que oposição odeia pobres (por FERREIRA GULLAR)

Ao contrário dos outros partidos, que buscam convencer o eleitorado de que nasceram para governar em benefício de toda a sociedade, o Partido dos Trabalhadores afirma que veio para governar em benefício dos que são explorados e oprimidos pelos ricos.

A realidade mostrou que a coisa não é bem assim. De fato, os governos petistas, tanto o de Lula quanto o de Dilma, implementaram programas em benefício da parte mais carente da população. Ao mesmo tempo, aliaram-se a grande empresários com o propósito de usar recursos públicos para permanecer no poder.

  Rubem Grillo/Editoria de Arte/Folhapress  
Ilustração Ferreira Gullar de 7.ago.2016
 

Esse é um projeto fadado, cedo ou tarde, ao fracasso, uma vez que não investe nos setores fundamentais da economia e, sim, num projeto demagógico que termina por levar à carência do crescimento e à crise econômica, como ocorreu aqui no Brasil. É próprio desse tipo de governo populista convencer, sobretudo os setores carentes do eleitorado, de que toda a crítica que lhe fazem advém daqueles que odeiam os pobres e querem manter a desigualdade social.

Seria essa a razão das críticas aos governos petistas. Lula chegou ao ponto de afirmar que o mensalão nunca houve, foi uma invenção as imprensa. Disse isso muito embora José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares –altos dirigentes do PT– tenham sido julgados e condenados pelo Supremo Tribunal Federal.

Não por acaso o PT tornou-se conhecido como o partido da mentira, mesmo porque não encontra outro modo de escafeder-se das sucessivas acusações que lhe são feitas –não pela imprensa, que apenas as divulga–, mas pelos órgãos do Estado brasileiro, encarregados de apurar a corrupção e punir os corruptos.

Pode alguém, em sã consciência, acreditar que, da Polícia Federal à Procuradoria Geral da República, o Ministério Público e até mesmo o Supremo Tribunal Federal, enfim, todos os órgãos policiais e judiciais, todos, sem exceção, participem de um conluio para perseguir a Lula, Dilma e os petistas em geral? Pode alguém acreditar nisso?

Claro que não. Sucede que não é isso o que preocupa Lula e sua turma. Eles não pretendem convencer o povo brasileiro em geral: tudo o que dizem e fazem tem por objetivo o seu eleitorado, os aliciados pelo PT, pois sabem muito bem que, com suas mentiras, não convencem o povo em geral, mas convencem os que rezam por sua cartilha.

Por isso, não importa se você ou eu não acreditamos que o impeachment seja ou não um golpe: importa, isso sim, que seu eleitorado acredite no que dizem e continue votando no PT. Sim, porque, se ele muda de ideia e acredita na verdade, será o fim de Lula e seu partido.

E é com esse mesmo propósito que, para surpresa geral, Lula recorreu à Organização das Nações Unidas, alegando ser vítima de abuso de poder da parte do juiz Sérgio Moro. A rigor, o que significa semelhante recurso a um órgão internacional da importância da ONU?

Significa, implicitamente, afirmar que os órgãos responsáveis pela aplicação da Justiça, no Brasil, não têm isenção para aplicá-la. Consequentemente, para que Lula tenha seus direitos de cidadão respeitados, torna-se necessária a intervenção daquela entidade internacional. Ou seja, como no caso do mensalão e do petrolão, ele continua sendo acusado injustamente.

Trata-se, na verdade, de um disparate, mesmo porque a ONU só intervém em tais casos depois que são esgotados todos os recursos judiciais do país onde o problema ocorre. O que não é o caso de Lula, que nem réu ainda era quando impetrou o tal recurso.

A conclusão a que inevitavelmente temos de chegar é que Lula, sabendo da improcedência de tal recurso, usou-o para se fazer de vítima em vez de culpado, o que o obrigaria a explicar-se diante de seus eleitores. Em suma, não importa se é tudo uma farsa e que você e eu saibamos disso: importa é que os petistas acreditem nele e continuem a tê-lo como o defensor dos explorados. E do Marcelo Odebrecht também?

Lula na ONU: direito de defesa ou intimidação?

POR FREDERICO VASCONCELOS

“A Associação dos Magistrados Brasileiros manifesta repúdio à petição encaminhada pelo ex-presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva, ao Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) na qual denuncia o juiz Sergio Moro e os procuradores da República que atuam na Operação Lava Jato por ‘falta de imparcialidade’ e ‘abuso de poder’.

Para a entidade, a Corte Internacional não deve ser utilizada para constranger o andamento de quaisquer investigações em curso no País e, principalmente, aquelas que têm como prioridade o combate à corrupção. A AMB vê com perplexidade as diversas tentativas de paralisar o trabalho da Justiça brasileira.”

(…)

A AMB reitera sua preocupação, externada em diversas oportunidades, às reiteradas manobras para intimidar a atividade desempenhada pelos juízes brasileiros.”

[Nota Oficial da AMB, divulgada em 29/7, reproduzida neste Blog]

***

“Esta é uma crítica absurda, e é triste que uma associação de magistrados reaja de maneira tão defensiva. Eles deveriam acolher a discussão sobre seus procedimentos. O que eles têm a esconder?

Sergio Moro debate e fala ao Parlamento sobre formas de combater a corrupção, então ele deveria estar disposto a discutir sobre como tornar essas formas justas e efetivas. Ele é um grande admirador da Operação Mãos Limpas, na Itália, mas muitos advogados italianos acreditam que ela foi um desastre.

Quanto à alegação infantil de intimidação, qualquer juiz que se sinta intimidado por uma petição levada à ONU não está apto para ser um juiz.”

[Geoffrey Robertson, advogado britânico-australiano contratado para representar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva perante o Comitê de Direitos Humanos da ONU, em entrevista a Isabel Fleck, neste sábado (6/8) na Folha].

***

“Um dia, no passado já distante, Lula clamou contra ‘300 picaretas’ do Congresso. (…) Com seu novo gesto, Lula converte-se no porta-bandeira dos políticos corruptos: o chefe dos ‘300 picaretas’.

Por que Lula não arguiu a suspeição de Moro no Conselho Nacional de Justiça? Por que, alternativamente, não confia na reversão, pelas instâncias judiciais superiores, de uma futura sentença que imagina desfavorável?

(…)

O recurso de Lula à ONU é um gesto inédito, uma anomalia. Seu alvo real não é Moro, mas o Poder Judiciário. Sua finalidade é proteger o ‘direito à impunidade’, um bem precioso da elite política brasileira posto em xeque desde o julgamento do mensalão.

[Demétrio Magnoli, colunista da Folha, em artigo publicado neste sábado (6/8)]

***

“Se o país acha que não se pode recorrer à ONU, por que subescreveu um tratado internacional com essa previsão?

(…)

Lula não praticou qualquer crime. Não há evidência real da ocorrência de um ilícito. O que existe é uma verdadeira caçada promovida por alguns agentes do Estado.

(…)

Lula mostrou que qualquer cidadão que tenha, como ele, seus direitos fundamentais violados pode ir à ONU. Há um debate sério a ser feito.

[Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Z. Martins, advogados do escritório Teixeira, Martins & Advogados, que assinam com Geoffrey Robertson a petição de Lula perante o Comitê de Direitos Humanos da ONU, em artigo na Folha, no dia 3/8]

 

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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