PT usa paralisação de caminhoneiros para reforçar candidatura de Lula, diz a FOLHA

Publicado em 27/05/2018 09:13
Existe o risco de queda do presidente Temer?, perguntou a Folha. "Eu tendo a crer que sim", responde o economista EDUARDO GIANETTI (por Érica Fraga)

De carona com o caos O PT vai tentar surfar ao máximo na nova onda de críticas ao governo Michel Temer após a paralisação dos caminhoneiros. A sigla pretende usar o levante como mote para defender a participação do ex-presidente Lula na disputa pela Presidência. A ideia é que o tema apareça nos atos que o partido fará neste domingo (27) para reafirmar o lançamento do petista. Os discursos devem dizer que “os brasileiros lembram qual era o preço do botijão de gás e da gasolina na era Lula”.

Memória seletiva Desde que a crise dos caminhoneiros explodiu, o PT faz forte campanha nas redes sociais para alardear que combustíveis e gás eram mais baratos sob a batuta da legenda. As mensagens ignoram o revés da Petrobras no segundo mandato de Dilma Rousseff. Em 2015, a estatal registrou seu primeiro prejuízo desde 1991.

Memória seletiva 2 A Petrobras fechou o ano que antecedeu a queda de Dilma com rombo de R$ 34,8 bilhões.

Sintonize Seis meses antes de a Câmara autorizar seu impeachment, Dilma enfrentou uma paralisação de caminhoneiros em rodovias de 14 estados. Ministros que atuaram ao lado dela dizem que o governo hoje erra feio na comunicação.

AM-FM Sob o PT, as propostas para dar fim aos protestos foram alardeadas por ministros em entrevistas a cerca de 300 rádios do interior. Falas à TV não eram prioridade.

Buscar em casa Integrantes do primeiro escalão do governo receberam vídeos de caminhoneiros pedindo apoio ao levante em frente a comandos militares. Em um filme, o manifestante fala para uma plateia de cima de um tanque que estava exposto no local.

Pedra sobre pedra “Nós, povo brasileiro, queremos o apoio do Exército. Nós não queremos o presidente mais, não queremos o Senado, não queremos o STF. Queremos intervenção militar já“, diz o caminhoneiro. O filme foi feito diante do comando da brigada de cavalaria mecanizada de Santiago (RS).

Sonho meu Apesar dos acenos a uma intervenção, ministros minimizam qualquer desconfiança e dizem que o presidente espera um arrefecimento forte da paralisação até esta segunda (28).

Comédia de erros (por SAMUEL PESSOA, na FOLHA)

Crédito barato para comprar caminhão provocou excesso de oferta e reduziu frete

Logo após a crise de 2009, os formuladores de política econômica passaram a estimular a compra de caminhões com empréstimos subsidiados do BNDES.

Achava-se que seria política contracíclica eficaz para ajudar a economia a sair da crise iniciada em 2008.

O programa de crédito muito barato persistiu até o primeiro mandato da presidente Dilma. De 2009 até hoje a frota de caminhões aumentou 40%. A economia, no mesmo período, cresceu 11%.

Não havia necessidade de tanto caminhão.

Evidentemente, o excesso de oferta de caminhões pressiona o frete para baixo.

A situação é especialmente difícil para o motorista autônomo. Os grandes operadores expandiram muito a oferta e podem contratar outros motoristas. Mesmo porque o mercado de trabalho muito fraco, com elevado desemprego, facilita as coisas para os grandes operadores.

A movimentação de veículos pesados nas estradas pedagiadas encontra-se quase 12% abaixo do pico de fevereiro de 2014.

As montadoras, por sua vez, trabalharam anos a plena carga para, em seguida, ficar anos com elevada ociosidade.

Em que pesem todos os estímulos para a compra de caminhões entre novembro de 2008 e novembro de 2013, a produção de caminhões excedeu os licenciamentos domésticos e a exportação em 40 mil unidades.

É claro que a reversão de cenário foi brutal. Para as montadoras e para os caminhoneiros.

O governo, na tentativa de amenizar a situação para os caminhoneiros, reduziu o pedágio em 2015, quebrando contrato com as concessionárias de rodovias. Tudo está na Justiça.

Entrementes as economias centrais vão se recuperando do estrago da crise de 2008, e os juros de dez anos pagos pelos títulos do Tesouro americano sobem e ultrapassam a marca fatídica de 3% ao ano. O real e demais moedas das economias emergentes perdem valor.

Simultaneamente, os problemas da Venezuela e as "trumpices" com o Irã pressionam o preço do petróleo em um momento de real fraco. O preço do petróleo em reais explode. Não há muito espaço para que a Petrobras não repasse os aumentos, pois ela foi muito machucada no período das vacas gordas para a economia brasileira, durante o qual foi instrumentalizada e mal gerida. Precisa reduzir seu endividamento.

A péssima situação fiscal e a incapacidade de Temer em aprovar a reforma da Previdência após o evento Joesley obrigam o governo a procurar receita onde dá. Eleva-se a tributação dos impostos federais sobre gasolina e óleo diesel.

Em meio a uma recuperação frustrada da economia, os fretes, pressionados pelos custos do diesel, nas rotas agrícolas, subiram de janeiro até abril algo como 40% em termos reais. Em geral, nessa época do ano, os fretes agrícolas sobem uns 20%. Caminhões perdem espaço para ferrovias, o que não é ruim. Mas com tanto caminhão...

Um conjunto incrível de intervenções totalmente desastradas explica movimento grevista muito rápido e que desorganizou a vida das pessoas como poucas vezes ocorreu.

Bom momento para nós voltarmos à agenda que estava posta em 2002: construirmos as condições para que a regulação do setor de comercialização dos subprodutos do petróleo ocorra de forma competitiva por empresas privadas.

Será necessário privatizar com sabedoria o setor de refino. Melhorar o marco regulatório e criar condições para que o comércio internacional ajude a disciplinar o mercado.

Para esse setor, no Brasil, as falhas de governo ultrapassam as falhas de mercado por larga margem. (por Samuel Pessôa, Físico com doutorado em economia, ambos pela USP, sócio da consultoria Reliance e pesquisador do Ibre-FGV).

'Ato de caminhoneiros pode ser o embrião de uma rebelião tributária', diz EDUARDO GIANETTI (na FOLHA)

As paralisações dos caminhoneiros podem ser o embrião de uma rebelião tributária, que ocorre quando a população deixa de aceitar a legitimidade do governo para cobrar impostos.

O diagnóstico é do economista e filósofo Eduardo Giannetti da Fonseca, para quem a má condução da crise pelo governo de Michel Temer levou outros setores organizados da sociedade a perceberem sua vulnerabilidade.

Para ele, um dos riscos criados por essa situação é que a disseminação do movimento dos caminhoneiros force a saída do presidente antes da eleição marcada para outubro.

“Esse desgaste foi muito grande. Não estou prevendo isso, mas não descarto.”

Outro temor do economista é que uma radicalização dos ânimos impeça a realização do pleito presidencial em “um clima minimamente civilizado”.

Para evitar isso, na opinião de Giannetti, o governo precisa garantir que o acordo que foi feito com os caminhoneiros seja cumprido e restabelecer a normalidade do funcionamento da economia.

O economista concedeu a entrevista na sexta-feira (25) à noite, após enfrentar o que ele classificou como um “pesadelo logístico” para voltar do Nordeste, onde estava a trabalho, para São Paulo.

Ao ter um voo cancelado de Natal para Maceió, Giannetti precisou alugar um carro, chegou a ficar sem gasolina e se surpreendeu com faixas pedindo intervenção militar nos bloqueios da estrada.

“Eu fiquei chocado”.

 

Há dois anos, o senhor disse que se perguntava até onde o tecido social brasileiro suportaria as consequências da crise econômica. A confusão atual pode ser o início de ruptura do tecido social? 

Não vou declarar que é o início, mas a situação é muito característica de rápida disseminação, porque as pessoas estão com os nervos à flor da pele e a situação é muito instável, qualquer faísca pode deflagrar um movimento de grandes proporções. Em 2013, foram os R$ 0,20 [do reajuste das passagens de ônibus], que acabaram se tornando uma outra coisa, e agora foi a questão da precificação dos derivados de petróleo. 

Surpreende que não tenha ocorrido antes? 

Uma das coisas mais imprevisíveis é como se inicia um processo desses. É um sistema caótico. Eu tenho usado a imagem de um físico quântico que tem um experimento em que você constrói uma torre delgada de areia e joga um único grão no topo. Três coisas podem acontecer: ou o grão de areia repousa no local exato onde caiu, ou o grão de areia escorrega suavemente até a base da torre, ou o grão de areia cai num ponto exato da torre e ela desaba.

A política brasileira está jogando o grãozinho de areia todos os dias nessa torre e ela é extremamente frágil. O sistema de poder se tornou extremamente frágil por tudo que vem acontecendo e por tudo que a Operação Lava Jato escancarou. 

É possível identificar o início desse processo? 

Acho que o primeiro ponto que chamou realmente a atenção para essa realidade brasileira foram as manifestações de junho de 2013. Eu me lembro que, quando as manifestações ganharam as ruas, o então secretário de Dilma Rousseff, Gilberto Carvalho, declarou que o povo estava sendo ingrato.

O Brasil não passou por algo equivalente à Revolução Francesa e à Americana. Ainda estamos vivendo numa espécie de antigo regime em que os governantes acreditam que as pessoas existem para servi-los, e não o contrário. Eles lidam com a sociedade civil como se ela fosse um ente servil e tutelar, que existe para render tributos e prestígio.

E acho que estamos caminhando para uma situação, que eu espero que seja resolvida nas urnas, quando vamos questionar a prevalência desse antigo regime caracterizado por duas realidades que foram muito bem explicitadas pela Lava Jato. 

A primeira é um patronato político que usa o poder para se perpetuar nele e age como se o poder fosse um patrimônio. Aí entra a noção de patrimonialismo de Raymundo Faoro [1925-2003]. E isso vale para todos os grupos políticos que passaram pelo Palácio do Planalto.

Aliado a esse grupo existe um segmento muito relevante do setor privado, do empresariado brasileiro, que, em vez de buscar o crescimento de seus negócios no mercado, criando valor pela inovação e pela eficiência, busca crescer por meio de acesso privilegiado a governantes, num jogo de caça às rendas.

Duas empresas brasileiras colocaram o Estado brasileiro na sua folha de pagamentos. A aliança desses dois grupos constitui o estado patrimonialista no Brasil. A Lava Jato escancarou essa realidade, e grãos de areia estão caindo nessa torre de poder.

O que ameaça a torre despencar agora? 

Lava Jato e o esgotamento do ciclo de expansão fiscal que começou em 1988. Naquele ano, tínhamos uma carga tributária normal para um país de renda média de 24% do PIB [Produto Interno Bruto]. De lá para cá, todos os governos, sem exceção, aumentaram a carga tributária no Brasil. Hoje, ela está em torno de 34% do PIB. 

Além disso, o Estado tem um déficit nominal de 6% do PIB. Então, estamos em um país em que 40% da renda nacional transita pelo setor público. 

A população não sente que isso a beneficiou? 

A capacidade de investimento do Estado caiu de 1988 pra cá. Metade dos domicílios não tem coleta de esgoto. Nossos indicadores de saúde, educação, segurança são deploráveis. O Bolsa Família, que é o principal programa de transferência de renda do governo, representa 0,5% do PIB. É praticamente a migalha que cai da mesa. E olha o impacto que tem para dezenas de milhões de famílias.

Então, realmente tem algo profundamente errado nas finanças públicas brasileiras. Esta revolta dos caminhoneiros é o embrião de rebelião tributária.

O que é uma rebelião tributária? 

É uma insubordinação que começa quando a população não aceita mais a legitimidade do governo para tributá-la. A revolução americana começou com o lema “no taxation without representantion” [não há tributação sem representação].

Qual foi o grão de areia que detonou esse possível início de rebelião tributária? 

Eu admiro a melhoria da governança das estatais brasileiras a partir do governo Temer. Acho que Petrobras, Eletrobras, Infraero melhoraram significativamente em governança e seriedade de gestão. Mas a Petrobras cometeu um erro grave na metodologia de fixação dos preços dos derivados de petróleo. 

Fomos de um extremo ao outro, o que é muito comum no Brasil. Fomos do extremo de uma mão muito pesada no governo Dilma —que represou a correção dos derivados de petróleo para segurar a inflação no curto prazo e acabou gerando um enorme desequilíbrio— para outro extremo de fundamentalismo de mercado, equivocado nesse caso.

Por que esse mecanismo é equivocado? 

Porque você não pode mudar o preço dos derivados de petróleo nas refinarias todos os dias, usando uma metodologia que é calcada em dois preços de alta frequência e de muita volatilidade, que são o preço do petróleo no mercado internacional e a taxa e câmbio em um regime flutuante.

Transmitir para o consumidor a volatilidade do mercado de petróleo mundial e da variação da taxa de câmbio no Brasil todos os dias é uma maluquice. Primeiro porque cria uma enorme imprevisibilidade e depois porque tem situações de volatilidade transitórias que levam a traumas na população.

Se até o Banco Central, no câmbio flutuante, utiliza instrumentos para atenuar a volatilidade do câmbio, como no derivado de petróleo, que é tão sensível para tanta gente na população, você vai transmitir essa volatilidade diariamente para o consumidor final? 

É lógico que tem que ter realismo tarifário. Agora, você acoplar a isso, numa base diária, a volatilidade do mercado internacional de petróleo e do câmbio é um erro grave.

O senhor acha que a população tende a repudiar ou se solidarizar com os caminhoneiros? 

A minha impressão é que a população, de modo geral, apoia. Agora, o que não dá para aceitar é que o direito de greve, que é legítimo, intocável, se transforme no direito de parar e chantagear o país, bloqueando as vias públicas. Isso não é previsto dentro da ordem democrática de um Estado ordenado.

Como o senhor avalia a reação do governo? 

Chamou a atenção que o governo tenha deixado chegar a esse ponto antes de começar a agir. A reação do governo foi atrasada, lenta e excessiva. Estão concedendo coisas que não deveriam estar na negociação. Eles, realmente, estão muito assustados com a situação que se criou. Fizeram aquela confusão inexplicável do PIS/Cofins na Câmara. Não dá para entender aquilo. Foi muito atabalhoado e mostra um governo que está completamente rendido, à mercê dos fatos. 

Isso aumenta o risco de que uma rebelião tributária ocorra de fato? 

Você usou a palavra certa, é um risco. O risco é que outros setores percebendo a fragilidade do governo fiquem animados a tentar chantageá-lo também. Eu acho que os setores organizados da sociedade sentiram o gosto de sangue, porque perceberam a vulnerabilidade deste final de governo Temer.

A disseminação desse movimento poderia ter consequências desestabilizadoras? O senhor disse ter se assustado com as faixas pedindo intervenção militar nos bloqueios. 

Acho que tem dois riscos neste momento. Um deles é que o desencantamento com a política leve a uma posição de indiferença e de abandono de qualquer pretensão de mudança por meio da democracia, do voto. O outro é a violência. A ideia de que precisa haver uma ruptura, um tipo de ação violenta, de ação transgressiva. O que também terminaria mal. 

A democracia existe para permitir correções de voto e mudanças, alternância de poder. Estamos a quatro meses da eleição. Acho perigoso que o quadro se complique a tal ponto que coloque em risco até mesmo a realização de eleições em um clima minimamente civilizado, que permita o debate e o uso dessa oportunidade para tentar melhorar o país.

Como a situação pode ser controlada para evitar esses desfechos? 

Acho que o primeiro ponto é garantir o cumprimento do acordo que foi feito. Embora ele esteja mal desenhado, é o que se tem. E acho que é preciso reestabelecer a normalidade do funcionamento do sistema econômico.

Senão vamos para uma situação de desorganização aguda do sistema produtivo e da própria organização social. Você tem o desabastecimento de hospitais, de alimentos e população reage querendo se proteger. 

Estava lembrando hoje que essa questão dos caminhoneiros esteve muito presente no período que antecedeu a queda de [Augusto] Pinochet [ditador que governou entre 1973 e 1990] no Chile. É um grupo com enorme potencial disruptivo. É muito preocupante. 

Existe o risco de um desfecho semelhante no Brasil, com a queda do presidente Temer? 

Eu tendo a crer que sim. Esse desgaste foi muito grande. Não estou prevendo isso, mas não descarto. E acho que, se a situação continuar se agravando e ele se mostrar impotente para cumprir o acordo que firmou com os representantes do movimento, a situação dele caminhará para a insustentabilidade.

A imprensa foi atropelada, Folha não conseguiu responder à pergunta fundamental: Quem parou o país?

A semana terminou com mais de 500 obstruções em estradas do país. Postos de combustível fecharam, ônibus deixaram de circular, aviões ficaram em terra, produtos sumiram das prateleiras, indústrias pararam, hospitais interromperam tratamentos ambulâncias e carros de polícia racionaram. A distribuição de jornais e revistas foi afetada.

Esse foi o cenário provocado por caminhoneiros e/ou empresas de transporte que decidiram realizar paralisação para forçar a redução do preço do diesel. O preço do diesel subiu 12,3% em maio e já é um dos mais altos da história.

A manifestação surpreendeu a maioria dos brasileiros. Desde o início do mês, no entanto, o governo recebera avisos de entidades ligadas a caminhoneiros de que havia indicativos de paralisações.

Em 7 de maio, o Blog dos Caminhoneiros informava que os protestos contra os seguidos aumentos de diesel tinham começado, em Barra Mansa (RJ), na via Dutra, e iriam se intensificar. Dava a dica de que a articulação estava sendo feita por meio de redes sociais.

No dia 14, a Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam) protocolou ofício na Presidência da República exigindo a redução dos impostos sobre os combustíveis, com prazo até dia 20. No dia 18, a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA) lançou comunicado em que mencionava a possibilidade de paralisação a partir de segunda-feira, 21, o que de fato ocorreu.

Os jornais não souberam dos alertas ou não deram importância a eles. O governo demorou a reagir. Interrupções em várias estradas do país, incluindo vias importantes e próximas do leitor da Folha como Anhanguera e Anchieta/Imigrantes, foram registradas de forma discreta no site e ignoradas na versão impressa. Até terça-feira, 22, ninguém atentou para a dimensão que o movimento poderia adquirir.

A categoria dos caminhoneiros reúne cerca de 600 mil profissionais sindicalizados. Ao todo, há no país 1 milhão de caminhoneiros autônomos.

Quando dezenas de estradas foram bloqueadas ficou evidente o despreparo da imprensa em geral, não só da Folha, para cobrir e explicar as origens, os personagens e os desdobramentos do movimento.

Não se sabia com quem falar. Não se explicava como tinha sido organizado de forma tão ampla. Eram raras as vozes e os rostos dos que estavam à frente do movimento. Ou não havia líderes? Era um movimento só de autônomos? Havia empresários por trás? Os jornais demoraram a começar a entender. E a explicar para seu leitor.

A edição da Folha de quinta-feira (24) cita a CNTA só ao mencionar o alcance da greve. Reportagem e análise tratavam apenas do lado oficial: governo, Congresso e Petrobras. Evidenciam o olhar viciado do jornal no poder e o distanciamento e a pouca informação de setores organizados da sociedade. Nenhum repórter demonstrou ter entre suas fontes um líder dos transportadores.

Não era tarefa simples. É uma categoria pulverizada, sem liderança única, com sindicatos concorrentes, muitos autônomos e com grandes empresas de transporte organizadas. E a articulação se deu essencialmente por aplicativos de mensagem instantânea, estratégia cada vez mais comum e que dificulta a apuração.

A Folha demorou para conseguir dar a seu leitor um mínimo de informações sobre os protagonistas dos atos que pararam o Brasil. No final da noite do dia 24, colocou no ar reportagem interessante sobre caminhoneira que havia criado três grupos de WhatsApp, pelos quais convocava apoiadores para o ato. Não foi publicada na versão impressa.

A editora de Mercado, Alexa Salomão, foi transparente ao explicar que tinha três repórteres dedicados a essa apuração, mas que, até o início da noite de sexta, a história não estava pronta para ser publicada.

"Como essa mobilização está parando o país e há suspeita de locaute, seria leviano atribuir a esta ou àquela entidade ou empresa a liderança da mobilização sem que tivéssemos mais detalhes", afirmou.

A incapacidade dos jornais de identificar, mensurar e explicar como o país chegou à crise que afetou a rotina de todos é preocupante. Em um momento crucial para mostrar sua relevância, a Folha deu indicações de despreparo, desnorteamento e fragilidade de análise.

Para além dos atos em si, toda a questão legal e política da reação do governo, que anunciou o uso das Forças Armadas contra manifestantes e expedientes temerários como a requisição de bens, era por demais confusa e foi pouco questionada e analisada

Os jornais foram atropelados pela greve dos caminhoneiros e empresas de transporte. (PAULA CESARINO COSTA)

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Fonte:
Folha de S. Paulo/Estadão

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