Planalto usa canal oficial para divulgar vídeo em defesa do movimento militar de 64

Publicado em 31/03/2019 18:14

BRASÍLIA (Reuters) - O Palácio do Planalto distribuiu neste domingo, através de um dos canais oficiais de WhatsApp da Presidência da República, um vídeo sem assinatura em defesa do movimento militar de 1964.

O texto, sem assinatura, usa a mesma justificativa empregada pelo presidente Jair Bolsonaro para defender a intervenção, a de que o Brasil "caminhava para o comunismo". No vídeo, com narrativa truncada, o narrador diz aos jovens para pesquisar o que realmente aconteceu e que 1964 era um tempo de "medo e ameaças" vindas do risco de comunismo.

"Foi aí, conclamado por jornais, rádios, TVs e principalmente pelo povo na rua --povo de verdade, pais, mães, igreja-- que o Brasil lembrou que possuía o Exército nacional e apelou a ele. Foi só aí que a escuridão graças a Deus foi passando e fez-se a luz", diz o narrador, não identificado, que acrescenta: "O Exército nos salvou, o Exército. Não há como negar".

A Secretaria de Comunicação da Previdência (Secom) confirmou à Reuters que o canal usado, um contato de WhatsApp criado ainda no governo do ex-presidente Michel Temer para distribuir notícias à população, é um número oficial do Planalto. No entanto, afirmou que o vídeo não é uma criação da Secom e a distribuição não foi uma ação oficial.

Perguntada sobre quem controlava atualmente o canal, a Secom não soube informar.

O mesmo vídeo foi publicado na manhã deste domingo pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, junto a uma sequência de outros vídeos em defesa do movimento militar.

Na semana passada, Bolsonaro instruiu os comandos militares a voltarem a comemorar o 31 de março, dia em que os militares iniciaram o movimento de 1964 que derrubou o presidente João Goulart, iniciando os 21 anos de governo militar no país.

A posição do presidente, um defensor ardoroso do período militar, foi criticada por diversas entidades nacionais e internacionais, incluindo o Ministério Público e o relator especial sobre a promoção da verdade, justiça, reparação e garantias de não-repetição das Nações Unidas, Fabián Salvioli.

Diante das reações negativas, Bolsonaro recuou e afirmou que não se trataria de comemorar, mas de rememorar o 31 de março.

Exército brasileiro comemora movimento militar de 64 a pedido de Bolsonaro

SÃO PAULO (Reuters) - As Forças Armadas do Brasil prestaram homenagem neste domingo ao movimento de 1964 que levou a duas décadas de governo militar no País, após o presidente Jair Bolsonaro – que argumenta que a intervenção militar salvou o país do comunismo – reverter uma proibição de 8 anos às celebrações.

A medida gerou debate e sublinhou o apoio de Bolsonaro a um governo militar que executou centenas, torturou milhares, fechou o Congresso Nacional e deixou a maioria do brasileiros com memórias obscuras do período.

O Exército não podia comemorar o movimento de 1964 desde 2011, quando a ex-presidente Dilma Rousseff, ex-guerrilheira de esquerda que foi presa e diz ter sido torturada sob a ditadura, ordenou um fim aos eventos que marcavam a data.

O Ministério da Defesa afirmou que as Forças Armadas não realizarão comemorações públicas neste domingo. Bolsonaro está em viagem internacional, mas agendou um evento no palácio presidencial na sexta-feira para marcar o aniversário com o alto escalão militar.

Bolsonaro, um capitão do Exército aposentado, tem há tempos exaltado o governo militar de 1964 a 1985. O presidente já afirmou, inclusive, que o maior erro da época foi não ter matado esquerdistas o suficiente. Mais cedo em sua carreira política, ele disse no Congresso que era “a favor da intervenção” e que o Brasil “nunca resolveria seus graves problemas nacionais com essa democracia irresponsável”.

Como muitos no Exército e parte da população, Bolsonaro considera o movimento de 1964 uma salvação. Ele apontou o colapso da economia venezuelana sob um governo socialista como prova de que o Exército salvou o Brasil de destino semelhante.

Ao invés de celebrações públicas, as Forças Armadas brasileiras afirmam que irão realizar programas internos e painéis que examinem eventos que levaram ao golpe no Brasil, o que aconteceu durante o regime militar e a importância do retorno à democracia em 1985.

Apesar da abordagem mais sóbria por parte do Exército, o encorajamento público de Bolsonaro decepcionou muitos.

“Ao insistir no tom de celebração, o presidente mostra-se mais uma vez ambíguo quanto aos princípios democráticos que diz defender”, escreveu o jornal Folha de S. Paulo em editorial nesta semana.

“Parece evidente sua inclinação a atiçar setores mais extremados da opinião pública, que estiveram entre os primeiros apoiadores de sua candidatura presidencial", acrescentou.

Promotores federais atacaram a decisão de Bolsonaro, afirmando em comunicado por escrito que permitir a celebração vai contra o juramento do presidente de defender a Constituição.

Enquanto uma maioria de brasileiros vê o movimento militar com maus olhos, alguns lembram do período como um tempo de ordem e relativa segurança, comparado com o aumento de crimes violentos nas últimas décadas. Em 2017, o Brasil registrou 64 mil assassinatos, um número muito maior que qualquer outro país.

Cinquenta e um por cento dos brasileiros, segundo pesquisa publicada pelo Datafolha em outubro, sentem que a ditadura deixou um legado negativo, enquanto 32 por cento dizem que o período foi bom pra o Brasil. Os 17 por cento restantes afirmam não ter opinião.

A pesquisa com 9.137 pessoas em todo o país tem uma margem de erro de 2 pontos percentuais.

O Brasil, diferente de seus vizinhos sul-americanos Argentina e Chile, que também tiveram regimes militares brutais e apoiados pelos EUA durante a Guerra Fria, nunca julgou ninguém pelos assassinatos, tortura e outros abusos realizados durante o período.

Em 2014, um relatório da Comissão da Verdade apresentou evidências de que o regime militar brasileiro havia assassinado ou “desaparecido” com 434 dissidentes políticos e torturado mais de 50 mil outros.

Uma lei de anistia de 1979, no entanto, continua em vigor, o que significa que nem os militares nem os guerrilheiros de esquerda da época foram responsabilizados por seus atos.

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Fonte:
Reuters

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