Rombo nas contas públicas cresce 278% e derruba meta de déficit zero

Publicado em 29/12/2009 07:00
Governo projetava déficit nominal zero para 2010, mas rombo cresceu de R$ 36,4 bi para R$ 137,9 bi em 12 meses




Foi para o arquivo a expectativa de a equipe econômica atingir o déficit nominal zero em 2010, último ano do segundo mandato do governo Lula. De outubro de 2008 para outubro passado, o déficit nominal cresceu 278%, de R$ 36,4 bilhões para R$ 137,9 bilhões. Em proporção do Produto Interno Bruto (PIB), o índice saltou de 1,27% para 4,61% do PIB no período. 

Em meados do ano passado, com a arrecadação batendo recordes e a crise global ainda restrita a um problema em bancos financiadores do setor imobiliário dos EUA, a equipe econômica anunciou, mais de uma vez, a intenção de levar as contas a atingir em 2010 o déficit nominal zero, isto é, com receitas suficientes para cobrir todas as despesas públicas, inclusive gastos com juros da dívida. Em novembro de 2008, o secretário do Tesouro, Arno Augustin, chegou a dizer que a meta - ainda que informal - poderia até ser atingida "antes de 2010". 

"Os resultados de 2008 mostram que o País está caminhando para o déficit nominal zero, e o resultado pode ser atingido antes de 2010", disse Augustin após uma audiência na Comissão Mista de Orçamento do Congresso. De 2007 para 2008, ante o ritmo da evolução da saúde fiscal, até o ministro da Fazenda, Guido Mantega, alinhou-se à ideia que ele criticara anos antes, no início do governo Lula, quando o assunto foi discutido pelo então ministro Antonio Palocci, pelo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e pelo ex-ministro Delfim Netto. 

O MENOR DA HISTÓRIA 

Há pouco mais de um ano, em outubro de 2008, as contas públicas não haviam sentido o impacto brutal da crise financeira, que ganhara proporções globais. Naquele mês, o Brasil apresentou o menor déficit nominal da história: o equivalente a 1,27% do PIB no acumulado em 12 meses. Isso quer dizer que o setor público economizou dinheiro, pagou todos os compromissos e juros da dívida e as contas fecharam com déficit de R$ 36,4 bilhões em um ano. 

Pode parecer muito, mas o governo comemorava a cifra porque o crescimento da economia - que aumentara a arrecadação de impostos - reduziu o rombo à metade, já que em outubro de 2007 o buraco era de R$ 73,3 bilhões, ou 2,85% do PIB. No início daquele mês, Mantega disse que havia possibilidade de o Brasil atingir o déficit nominal zero a partir de 2010. 

Com o gasto público em ritmo acelerado nos últimos meses, o objetivo deve ser postergado em pelo menos cinco anos, dizem analistas. O efeito da turbulência global sobre as contas foi nefasto: pouco mais de um ano após o agravamento da crise, em outubro passado, o déficit nominal já somava R$ 137,9 bilhões, 278% mais do que um ano antes. Diante do impacto da crise na arrecadação e bem antes do resultado das contas no trimestre passado, Mantega admitiu: "Teremos de esperar um pouco mais (para atingir o déficit nominal zero)". 

"As contas públicas foram afetadas porque a receita diminuiu pela menor atividade econômica, o que reduziu a arrecadação de impostos. Ao mesmo tempo, o governo passou a tomar medidas para amenizar o efeito da crise e, por isso, começou a gastar mais e a desonerar impostos", diz o economista-chefe do Banco Schahin, Silvio Campos Neto. "As desonerações não são ruins, mas houve uma mudança no perfil do gasto com aumento do valor destinado ao pagamento de pessoal e custeio. Esse é um gasto que não tem como reverter." 

"SÓ EM 2016"

Para Felipe Salto, economista da Tendências Consultoria, o Brasil perdeu pelo menos meia década de esforço fiscal. "O déficit nominal zero só vai, agora, ser atingido em 2016, nas atuais condições da economia", afirma Salto. "Se o governo fizer reformas estruturais, será possível acelerar a obtenção dessa marca. Mas, se as bases continuarem as mesmas, será difícil antes de 2016." A previsão é reforçada por Campos Neto: "No mínimo, serão cinco anos para atingir o déficit nominal zero". 

Salto avalia que a equipe econômica fez escolhas equivocadas na crise, como o aumento das despesas correntes - salários de servidores públicos e Previdência Social. "Se o governo tivesse usado a maior parte da redução do superávit primário para investir em infraestrutura, o cenário seria muito mais benéfico porque daria espaço para a economia continuar crescendo sem pressão inflacionária. Mas foi feito o contrário." 

No governo, o tema é tratado com discrição. Para a equipe econômica, o tema saiu da pauta porque a situação exigia medidas anticíclicas e, agora, não existe prognóstico sobre quando esse nível deve ser atingido. O uso de metas flexíveis de superávit primário e a mudança de governo em 2011 deixam o tema "congelado" até que haja um cenário mais claro sobre como será a recuperação brasileira em 2010 e nos anos seguintes. 
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Fonte:
O Estado de S. Paulo

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