Aumento da aversão ao risco já afeta captações no exterior

Publicado em 20/09/2011 08:45
Os mercados globais enfrentaram ontem nova rodada de deterioração, com reflexos diretos para a economia brasileira. A tão aguardada janela de captações externas, que tradicionalmente se abre em setembro para as empresas brasileiras, pode ficar comprometida com a recente piora da aversão ao risco, especialmente para emissões em reais. Ao mesmo tempo, a moeda brasileira acentuou o movimento de queda em relação ao dólar, resultado de um movimento de aversão ao risco e fuga para a qualidade, com investidores correndo para os títulos do governo americano.

O dólar operou em forte alta ao longo de todo o dia, com a cotação beirando o R$ 1,80, antes de fechar cotado a R$ 1,780, valorização de 2,71%. Em parte, a volta dos temores de um calote da dívida soberana da Grécia elevou a aversão ao risco e puxou o preço da moeda americana ao redor do mundo. Internamente, a perspectiva de desvalorização continuada da moeda brasileira intensificou a especulação contra o real, com bancos e investidores estrangeiros reforçando a aposta nessa direção e fazendo com que a divisa local perdesse mais valor do que outras moedas.

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Há também um movimento de saída de investidores estrangeiros, que desmontam suas operações em reais para correr para o dólar. O próprio presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, afirmou ontem que o fluxo de capital continua forte, mas o Brasil está preparado caso esses ingressos sejam interrompidos, "um cenário que nós não gostaríamos de ver", acrescentou Tombini que participou do XXI Encontro entre as Delegações dos Bancos Centrais dos Países de Língua Portuguesa, em Lisboa.

À medida que o real perde valor, na esteira das preocupações com a Europa, as perspectivas para as empresas brasileiras que buscam recursos no mercado externo começam a mudar. Os preços mais elevados dos papéis denominados em reais foram puxados pelo título soberano brasileiro. Os papéis com vencimento em 2022, por exemplo, subiram mais de 100 pontos básicos nas últimas semanas, voltando ao patamar de maio, com rendimento em torno de 9% ao ano.

O Tesouro Nacional chegou a sondar o mercado para uma emissão em reais no exterior. O próprio secretário Arno Augustin disse que o país conseguiria realizar a operação mesmo com a volatilidade dos mercados. Mas os preços elevados no secundário inibiram uma eventual oferta, ao menos por enquanto.

Há duas semanas, a Brasil Telecom chegou a abrir o mercado, com uma captação de R$ 1,1 bilhão, em reais, mas o prazo, de cinco anos, ficou menor do que o esperado - sete anos, segundos fontes que participaram da operação.

Nesse cenário de maior volatilidade, analistas ouvidos pelo Valor acreditam que neste fim de ano apenas grandes empresas, preferencialmente com grau de investimento, terão espaço para colocar títulos no exterior. Havia uma perspectiva mais positiva em agosto, com possibilidade de abertura para uma "fila de empresas", mas o cenário mudou.

"As janelas vão se abrir, com certeza, mas os prêmios estão elevados por enquanto", diz Alexei Remizov, diretor-gerente de Mercado de Capitais do HSBC. Segundo ele, o investidor está exigindo mais prêmio para as novas emissões mesmo de empresas com classificação elevada.

Como os preços dos papéis são balizados pelos títulos do governo americano - que estão nos pisos históricos -, o custo final continua atrativo para as companhias brasileiras, explica Remizov, o que deve permitir algumas operações. "Há apetite para papéis de qualidade. Em três ou quatro semanas vão acontecer algumas emissões", completa. "Mas as janelas serão mais curtas", diz.

Segundo fontes de mercado, há cinco empresas brasileiras com interesse em captar recursos no exterior neste momento. Entre elas está a Petrobras, cujo presidente, José Sergio Gabrielli, afirmou na semana passada que estuda uma operação em reais. A Eletrobras e a Minerva também conversaram com bancos de investimentos para acessar o mercado internacional de dívida.

Mesmo esses processos terão de esperar por uma melhora do humor dos mercados. Na avaliação de investidores estrangeiros, que estão na ponta compradora, o momento não é o mais adequado, já que a perspectiva de piora das condições, especialmente na Europa, é concreta. "Neste momento, o mercado não quer saber de nada, a não ser proteger o capital, a menos que o preço seja altíssimo", disse uma fonte que opera no exterior.

Ao longo do primeiro semestre, diversas empresas brasileiras conseguiram colocar papéis no exterior, com forte demanda por títulos brasileiros, inclusive em reais - em parte pela tributação que limitou a aplicação diretamente no mercado doméstico. Mas a perspectiva hoje se apresenta mais difícil, diz Filippe Goossens, vice-presidente sênior de crédito corporativo para América Latina da Moody's.

Goossens não acredita em novos emissores fazendo captações, nem mesmo operações em reais, já que nesse momento a janela está, segundo ele, provavelmente fechada. A perspectiva deve mudar, acredita ele, se os problemas na Europa encontrarem uma saída, já que as economias da América Latina continuaram atrativas.

"Nesse caso, podemos voltar a ver tanto emissões de empresas iniciantes quanto operações em reais". A perspectiva de mais longo prazo permanece positiva, tanto pela expectativa de crescimento da economia brasileira superior aos países desenvolvidos, quanto pelas taxas de juros mais elevadas do que no restante do mercado, completa Goossens.

A piora na aversão ao risco também teve efeito no mercado doméstico, com forte elevação dos juros mais longos negociados na BM&FBovespa, puxados pela saída de estrangeiros e pela piora na expectativa da inflação. Na avaliação do banco japonês Nomura, as notícias do dia não foram favoráveis como, por exemplo, a informação antecipada pelo Valor de que o governo pretende retomar os concursos públicos a partir do próximo ano.

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Fonte:
Valor Econômico

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