Soja: De volta ao passado

Publicado em 20/03/2013 09:24 e atualizado em 20/03/2013 12:12
Por Liones Severo, consultor de mercado da SIM Consult.
Ainda na década de 1960, fizemos as primeiras exportações de parcelas (lotes) de soja. Primeiro um parcela de 200 t, depois 500 t,  que levavam de 10 a 20 dias para carregar os grãos nos porões dos navios convencionais, com até 3  cobertas. Com estradas praticamente inexistentes, pequenas embarcações traziam as bolsas (sacas) de soja, desde do porto de Estrela (pelo Rio Jacuí) até o cais do Porto de Porto Alegre. Dia e noite estivadores coqueavam os sacos das pequenas embarcações até os caminhões e dali para o costado do navio, depois de passar pela balança. Uma lingada (tipo funda de Davi) alçavam 25 sacos através de um guindaste para dentro dos porões dos pequenos navios, onde 2 ternos de estivadores cortavam os sacos de soja e derramavam os grãos nos porões, numa operação que se chamava "corte na boca da escotilha".
 
Varavam-se as noites frias daqueles invernos rigorosos, agravado pelo minuano frio e insistente da beira do Guaíba que nos congelava até alma. Era ainda menino, mas compreendia o sofrimento daqueles estivadores e os abastecia com alguma garrafas de cachaça para que os trabalhos não fossem interrompidos, porque naquela época os navios já custavam por dia.  Enquanto controlava as operações de descarga e carga de soja, preenchendo os romaneios de pesagem, controlava, logo `a frente, outras operacoes onde embarcávamos também sementes de girassol e linhaça. Sem contar com as pequenas parcelas de 30 até 50 t de óleo de soja, que carregavamos em pequenos tanques do próprio navio (na época eram as caixas fortes dos pequenos navios que singravam os oceanos). Depositávamos o óleo de soja nos tanques do porto de Rotterdam, de onde mercadores viajavam pelos canais dos países baixos para a distribuição em muitos mercados da Europa.  Naquela época já existia a exportação de arroz e quebrados para muitos países africanos, principalmente para os portos de Lagos e Apapa na Costa do Marfim, operações que depois de 40 anos foram suspensas,  e que voltaram nos últimos anos e são um grande impulso para o mercado de arroz do nosso Estado (RS).
 
Findada as operações, portava documentos de embarque em mãos até Geneva (Suiça) para negociação com os Bancos Europeus. Não havia correio competente naquela época. Eram aquelas demoradas viagens em aviões da Varig que precisavam fazer escala para abastecimento em Abidjan no Senegal. Pela pouca altura da rotas internacionais da época, era possível contemplar a cidade de Casablanca, o estreito de Gilbraltar e logo a seguir uma visão estupenda do mar Mediterrâneo e dos Alpes suíços. Ficava a imaginar  a epopeia de Anibal saindo de Alexandria  para invadir a Europa, passando com seus elefantes por aquelas adversidades para atacar o Império Romano.
 
Hoje, com tristeza, assisto milhões de dólares sendo perdidos em sobre-estadia (demurrage) nos portos brasileiros por ineficiência de nossa logística, em detrimento de uma melhor remuneração para quem produz...., pelo tanto que assisti, continuo vendo a luta insana e incompreendida de nossos agricultores para produzir e sobreviver, tentando superar as adversidades para desenvolver nossa agricultura --, o único segmento econômico que poderá libertar nosso povo da miséria em que vivemos, se compararmos aos imensos recursos naturais existentes em  nosso país.
 
Tanto a história se repete que as milhares de pessoas que compraram o meu livro (Como Lucrar Negociando Soja),  se quiserem saber o que acontece no mercado atual, basta reler a partir da página 84 (etapa 9), que terão uma atualizada percepção do desenvolvimento do mercado atual, embora escrito há alguns anos atrás.
 
Na vida,assim como nos negócios, tudo é consequente.... Infelizmente muitos prejuízos advirão da situação atual. Já escrevi num outro livro que todos os padrões comerciais são vencidos no tempo. Enfrentaremos um nova escalada de lutas para reposicionar as conquistas que já havíamos adquirido.
 
Todos somos culpados por permitir que em muitos dos grandes eventos de agronegócios que acontecem em nosso país, grandes espaços são ocupados pelos  Encantadores de Serpentes"... Talvez nunca tenham lido "O Homem que Calculava", de Malba Tahan.
 
(texto inspirado e dedicado ao amigo e escritor Osvaldo Piccinin)
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Fonte:
Liones Severo

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2 comentários

  • Marcelo De Baco Viamão - RS

    Liones Severo, grande escritor e historiador, um Paracelso moderno!"Todos são interligados. O céu e a terra, ar e água. Todos são, uma só coisa; não quatro, e não duas, e não três, mas um. Se não estiverem juntos, há apenas uma peça incompleta." A logística é a moda do vocabulário mercadológico. Precisamos de planejamento, sem isto teremos sempre uma " peça incompleta" sucesso a todos!

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  • Luciane Possan Weber guaíra - PR

    Bom ler Liones Severo, como eram as exportações na década de 60.Uma história que eu desconhecia !

    Obrigada.

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