Açúcar: Mercado rompe, finalmente. Mas do lado que menos se esperava (Archer)

Publicado em 04/05/2019 12:36
por Arnaldo Luiz Correa, da Archer Consulting

Alguns leitores “reclamaram”, com razão, na semana passada, da falta de inspiração deste escriba nos últimos comentários semanais. Estava mesmo muito difícil escrever sobre um mercado que persistia em negociar num intervalo tedioso de preços por intermináveis sete semanas consecutivas. Observamos que ele (o mercado) estava à espera de uma ruptura. E ela acabou vindo no início da semana, de maneira surpreendente.

Diz o Manual do Trading que quando um grande volume de uma commodity é entregue na bolsa por ocasião do vencimento de um contrato futuro, o mercado entende isso como um sinal baixista, pois se um grande volume foi entregue na bolsa isso significa que não havia melhor comprador no mercado e, portanto, a bolsa era o último recurso que o vendedor tinha para se desfazer do seu produto.

O oposto deve ser verdadeiro. Ou seja, quando um volume pequeno de uma commodity é entregue contra a expiração de um contrato futuro, isso então é um sinal altista, certo? Não, é baixista também porque não há demanda. Parece piada, mas não é. Independentemente das notícias, dos fundamentos ou do comportamento do mercado, parece que qualquer movimento será considerado baixista a partir de agora. E não se fala mais nisso.

As bruxas do açúcar estão soltas e um simples espirro no mercado transforma-se imediatamente em pneumonia dupla. E não tem antibiótico que cure essa doença. O mercado futuro de açúcar em NY encerrou a semana em acentuada baixa, finalmente quebrando o intervalo de preços de 12 e 13 centavos de dólar por libra-peso, dentro do qual o mercado estivera por sete semanas. O fechamento de sexta-feira, com o julho/2019 negociando a 11.98 centavos de dólar por libra-peso aumentou ainda mais a preocupação das usinas que rolaram suas posições não fixadas contra maio para o vencimento julho na esperança de dias melhores. Essa dúvida coloca o pânico no centro da mesa de decisões, novamente. E o mercado pode sofrer mais.

A entrega de maio pode ter tido influência? Pode ter ajudado aos fundos a aumentarem suas posições confortavelmente vendidas acima do mercado. E pode ter acionado vendas stops ou mesmo operações estruturadas com derivativos que possuíam níveis de desaparecimento (Knock-outs).

Um pouco de história sobre entregas em maio. Em 1997, portanto há exatos 22 anos, a Copersucar fazia sua primeira entrega de açúcar físico na bolsa de NY. Foi a primeira vez que um produtor brasileiro tinha essa “ousadia”. Outros produtores brasileiros já haviam entregue açúcar na bolsa, é verdade, mas por meio das tradings. Do outro lado do balcão, o recebedor (uma trading americana) tinha plena convicção de que o açúcar que receberia por meio do contrato de NY viria da Tailândia e já preparara toda a sua logística para receber o açúcar tailandês e então atender a demanda de açúcar naquele continente. À época comentava-se que o açúcar tailandês que a multinacional americana ia receber destinava-se à Rússia. Findado o pregão de 30 de abril, como manda o contrato, a bolsa publicava o entregador e porto de origem e o mercado recebera a notícia boquiaberto: um produtor brasileiro entregando mais de 5,200 contratos na bolsa, um volume alto na época em que a posição em aberto girava em 180,000 contratos. Proporcionalmente ao volume, é como se hoje a entrega fosse de 26,000 contratos.

A trading americana - estupefata - estava com o mico preto na mão. Não tinha açúcar para honrar seus compromissos na Rússia, já fechara o frete para buscar o agora inexistente açúcar tailandês e não tinha o que fazer com o açúcar que iria receber do produtor brasileiro no porto de Paranaguá. Na época, o mercado estimava um prejuízo (talvez exagerado) da trading na casa dos US$ 10 milhões. O fato é que a entrega da Copersucar entrou nos anais do mercado e projetou definitivamente o nome da empresa no cenário mundial, ganhando enorme respeitabilidade como importante negociador de açúcar.

A entrega de açúcar no vencimento do contrato maio/2019 em NY também teve enredo novelesco. Primeiro, há alguns pregões, o mercado se assustava com o comportamento errático do spread maio/julho que se desvalorizava de maneira rápida em completa desarmonia com o sentimento geral de que haverá menor disponibilidade de açúcar por parte do Brasil. Depois, nos últimos pregões de abril, o spread maio/julho se desvalorizou ainda mais chegando a negociar com um desconto de 70 pontos. O que estaria por trás desse movimento?

O mercado especula que uma grande trading apostara fortemente que receberia açúcar do Centro-Sul na expiração do contrato futuro de maio. Quando os traders envolvidos no negócio perceberam que a movimentação no contrato de NY indicava que o açúcar a ser entregue na bolsa provinha de contratos de vendedores espalhados na Argentina, México e América Central, os potenciais recebedores do açúcar acionaram a operação “me tira daqui”. Um experiente trader do mercado comenta que “o problema de receber um monte de açúcar picado, de diversos portos, aumenta enormemente o custo do frete” e a operação deve ter custado no mínimo 6 milhões de dólares. Para outro trader, ocupante constante na classe executiva dos voos para a Europa, “os caras [traders envolvidos na operação] devem estar no soro, agora”, comentou com seu habitual bom humor.

E agora, para onde vai o mercado? A Índia informou que produziu safra recorde. Sobra açúcar na Tailândia e Índia e, como observaram alguns outros leitores, este escriba parece ignorar isso e mantem o discurso de que o Brasil vai dar as cartas. Pode ser que eu seja mesmo um teimoso inveterado, mas quando se olha os números de consumo de etanol, a perspectiva positiva para o petróleo lá fora, a limitação na produção de ATR por parte do Centro-Sul, a falta de cuidados culturais e a situação de estagnação da indústria, eu não iria vendido açúcar a 12 centavos de dólar por libra-peso.

Gasolina e real são dois pontos importantes a observar. Aumento da gasolina lá fora, independentemente da trajetória do real, não estimula a produção de mais açúcar. Queda da gasolina e valorização da moeda brasileira podem mudar o mix. A valorização do real apenas não é suficiente para as usinas produzirem mais açúcar. Ficar vendido a descoberto a 12 centavos de dólar por libra-peso, parece-lhes uma boa aposta?

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Bom final de semana,

Arnaldo Luiz Corrêa

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Fonte:
Archer Consulting

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