Julgamento do Mensalao: Marcos Valério despachava dinheiro do mensalão em carro-forte, diz procurador

Publicado em 03/08/2012 18:59
Roberto Gurgel acusa: perador do mensalão era presença frequente em reuniões do PT e tinha carta branca para negociar a formação da base governista... por Veja.com.br


Apontado como o braço operacional do esquema do mensalão, o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza era “presença frequente” em reuniões do PT e chegou a utilizar carros-fortes para movimentar os recursos que abasteceram o projeto de compra de parlamentares. As informações constam da acusação apresentada nesta sexta-feira pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, durante o julgamento da ação penal do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF).

“José Dirceu foi o mentor do esquema e Marcos Valério foi seu principal operador”, disse o procurador-geral. Valério, que responde no STF pelos crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, passou, na versão do Ministério Público, de mero financiador a personagem influente na política, com carta branca para negociar a formação da base aliada do governo.

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De acordo com Roberto Gurgel, os recursos movimentados por Valério e por instituições financeiras, como o Banco Rural, chegaram a impor a contratação de policiais para a escolta dos malotes destinados à propina. “Alguns dos saques feitos pela quadrilha impuseram que policiais e carros-fortes fossem contratados, tamanho o volume de recursos”, relatou.

“Convenhamos, fossem lícitas essas operações, por que fazê-las ao largo do nosso sistema financeira, do nosso sistema bancário?”, questionou o procurador.

Núcleo operacional - Ao defender a condenação de Valério e de seus funcionários por participação no mensalão – eles integram o “núcleo operacional” na denúncia – Roberto Gurgel citou, por exemplo, e-mails trocados entre funcionários de Marcos Valério e servidores do banco. Foram anexados à peça da acusação quatro mensagens eletrônicas em que a então gerente financeira da agência da publicidade SMP&B, Geiza Dias, informa ao Banco Rural as pessoas que iriam sacar os recursos, a maior parte deles intermediários dos verdadeiros participantes do esquema.

“Geiza encaminhava os nomes dos destinatários (dos recursos), uma função de natureza mais interna no funcionamento da quadrilha. Cabia a ela encaminhar principalmente, por correio eletrônico, a qualificação dos receptadores. Geiza controlava os depósitos ilícitos”, relator o procurador-geral. 

Para ele, a ex-diretora financeira da SMP&B, Simone Vasconcellos, também ré no processo do mensalão, tinha a responsabilidade de avisar aos beneficiários do esquema do mensalão que o dinheiro já estava disponível. “Na divisão de tarefas próprias de grupos criminosos, Simone Vasconcellos era responsável por avisar os beneficiários da disponibilidade do dinheiro”, disse. “Simone tinha uma habitual e sistemática atuação no pagamento de vantagens indevidas a parlamentares federais”, afirmou.

Banco Rural - O papel do Banco Rural no esquema também foi detalhado por Gurgel. De acordo com o procurador, a organização financeira consentia com as fraudes de Marcos Valério desde 1998. Com o esquema do mensalão, a entidade passou a liberar um grande volume de empréstimos falsos para as companhias do publicitário, que se encarregava de redistribuir os recursos a parlamentares da base aliada do governo Lula.

Para ceder os empréstimos irregulares, diretores do banco ignoravam as normas que exigem garantias para a concessão de crédito. "O banco não tinha preocupação de receber os empréstimos. Por isso, não se preocupavam coma garantia", explicou o chefe do Ministério Público. Em troca, o Banco Rural pretendia obter vantagens estatais: o alvo era a liquidação do Banco Mercantil de Pernambuco, que poderia render ganhos bilionários para a entidade aliada de Marcos Valério.

PGR: Dirceu montou e foi o 'protagonista' do mensalão

Em seu parecer, Roberto Gurgel disse que existem provas suficientes para comprovar o esquema e ironizou advogados que falam em 'obra de ficção'

Laryssa Borges e Gabriel Castro
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, apresenta seus argumentos de acusação no julgamento da AP 470, em 03/08/2012

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel (STF)

Responsável por defender a condenação de políticos, empresários e dirigentes partidários que faziam parte do mensalão, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, afirmou nesta sexta-feira, durante o julgamento do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), que o ex-ministro da Casa Civil do governo Lula, José Dirceu, foi o idealizador e grande gerente do esquema. O chefe do Ministério Público (MP), que vai defender nesta tarde a condenação de 36 dos 38 réus do mensalão, direcionou o foco principal da acusação ao ex-todo-poderoso do governo Lula. “José Dirceu foi o mentor da ação do grupo, seu grande protagonista”, resumiu. “Foi José Dirceu quem idealizou o esquema ilícito de formação da base parlamentar de apoio ao governo mediante o pagamento de vantagens indevidas a seus integrantes e comandou a ação dos demais acusados para a consecução desse objetivo”, disse ele.

O relatório de Roberto Gurgel afirma que Dirceu, José Genoino (então presidente do PT), Delúbio Soares (tesoureiro do partido à época) e Sílvio Pereira (então secretário-geral do PT) se associaram ao grupo do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza "de forma estável permanente para o cometimento de crimes contra o sistema financeiro nacional, contra a administração pública, contra a fé publica, bem como crimes de lavagem de dinheiro".

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O chefe do MP listou depoimentos de denunciados tomados ao longo da instrução da ação penal que comprovariam a ascendência de Dirceu sobre os demais participantes do esquema do mensalão. As oitivas, segundo ele, implodiriam a tese de que o ex-ministro não sabia da compra de votos de deputados federais. “Não há como se pretender que Dirceu estivesse alheio aos fatos”, afirmou. Ele exemplificou com um caso específico em que o tesoureiro informal do PTB, Emerson Palmieri, disse em juízo que após reuniões com os petistas José Genoino e Delúbio Soares “sempre era feita uma ligação a José Dirceu”.

“José Dirceu tinha conhecimento de todos os acordos para a construção da base aliada”, resumiu Gurgel. “Dirceu sabia da cooptação de políticos para a compra de base parlamentar de apoio ao governo, sabia que essa base estava sendo forma a custa de vantagens indevidas e, acima de tudo, sabia de onde vinha o dinheiro”, argumentou o procurador-geral. 

Ao afastar a suposta tese de que não haveria provas de que o ex-ministro da Casa Civil coordenou o esquema de pagamento sistemático de parlamentares, o procurador-geral defendeu o argumento de que o “autor” também é o chefe da quadrilha que planeja as atividades criminosas, mesmo sem as executar.

“O autor dos chamados crimes organizados agem a quatro paredes. O autor intelectual quase sempre não fala ao telefone, não envia mensagens, não assina documentos e não movimenta contas”, disse. “A prova que instrui os autos dessa ação penal é contundente quanto à atuação de Dirceu como líder do grupo”. 

Em sua acusação, Roberto Gurgel ainda se valeu de perícias do Instituto Nacional de Criminalística (INC) para demonstrar a manipulação de dados como simulação de empréstimos no Banco Rural. A liberação de recursos pela instituição financeira foi utilizada por petistas e pelo empresário Marcos Valério Fernandes de Souza para tentar dar veracidade ao fluxo de recursos que abastecia o mensalão.

Ao longo de sua sustentação oral, o procurador-geral também ironizou as críticas sobre a fragilidade do conjunto de provas contra a quadrilha. Ele disse ser “risível” a tese de alguns advogados de que o esquema de compra de votos seria um “delírio do Ministério Público”.

Provas - Gurgel, que começou a falar por volta das 14h30, utilizará cinco horas nesta sexta para pedir a condenação de 36 dos 38 réus que integram a ação penal do mensalão. No início de sua exposição, no plenário do STF, o chefe do MP resumiu: “A robustez da prova colhida faz risível a assertiva de que mensalão é ficção ou delírio do MP”.

“O Ministério Público está absolutamente convencido de que a prova colhida nos autos, associada aos elementos de autoria e materialidade dos delitos, não deixa dúvidas quanto à procedência da acusação”, disse ele. Assim como fez no memorial entregue aos ministros do Supremo, Roberto Gurgel voltou a classificar o mensalão como “o mais atrevido e escandaloso caso de corrupção e desvio de dinheiro público flagrado no história do Brasil”.

Ao expor seus argumentos, o procurador-geral recorreu ao intelectual Norberto Bobbio para refutar a tese de que, no mensalão, seria “justificável” construir, por meios escusos, uma sólida base parlamentar no Congresso. “Não se justifica o injustificável à luz dos parâmetros normativos de funcionamento do estado”, disse ao cita Bobbio.

Denúncia inicial - A denúncia do então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, apresentada em 2006, classifica o esquema do mensalão como “uma sofisticada organização criminosa, dividida em setores de atuação, que se estruturou profissionalmente para a prática de crimes”. 

Para o então chefe do Ministério Público, sucedido por Gurgel, os mensaleiros petistas, com o objetivo de formar uma base parlamentar sólida no Congresso, atuaram em “conluio” com outros partidos e “estabeleceram um engenhoso esquema de desvio de recursos de órgãos públicos e de empresas estatais e também de concessões de benefícios diretos ou indiretos a particulares em troca de ajuda financeira”.

Todo o esquema, descreve a Procuradoria, era feito “sob as ordens” de Dirceu, que “tinha o domínio funcional de todos os crimes perpetrados, caracterizando-se, em arremate, como o chefe do organograma delituoso”.

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