A “Guerra” do Algodão

Publicado em 01/04/2010 09:57
As commodities são como enfeites decorativos de bolo de aniversário, aumentam o volume das exportações, mas não agregam valor. Os adeptos do neologismo, que adoram o modismo, resolveram dar conotação sofisticada a essa palavra (commodity) tentando, com isso, emprestar-lhe um caráter de excepcionalidade e imponência. Na verdade, o termo commodity significa literalmente “mercadoria”, em inglês. Tratando-se das relações econômicas internacionais, essa expressão inglesa é utilizada para designar um grupo particular de mercadorias, em estado bruto, oriundas do setor primário da economia. No caso brasileiro, temos como exemplo as exportações de café, soja, sal, algodão, minérios e outros tipos de matérias-primas do gênero.

Hoje, Brasil e Estados Unidos andam envolvidos numa briga em torno da commodity de considerável expressividade na pauta das exportações  –  o algodão. A história do algodão brasileiro é muito curiosa. Durante a primeira metade do século vinte, sobretudo nas décadas de quarenta e cinquenta, o Nordeste era o maior produtor do país, destacando-se o Rio Grande do Norte como o Estado mais importante pelo cultivo da variedade tipo “mocó”, a chamada “nobre fibra longa”. Entretanto, as inovações tecnológicas da indústria têxtil mundial levaram a Suíça a inventar os teares sem lançadeiras, o que fez duplicar a produtividade utilizando fibras mais curtas. São Paulo saiu na frente, deixando o Nordeste para trás, ao cultivar o plantio, em larga escala, de um tipo especial de algodão híbrido, denominado “americano”.

A causa da briga é porque os Estados Unidos, numa demonstração de prepotência, teriam desrespeitado o Acordo para retirar os subsídios concedidos aos produtores norte-americanos de algodão, fato que vem provocando a concorrência mundial desleal, entre os diversos países produtores de outros continentes. O Brasil encabeça a lista dos reclamantes e promete reagir energicamente. Os produtos americanos que entram no Brasil podem ser sobretaxados. Ao todo são 102 produtos, inclusive filmes, medicamentos e trigo, além do caso das patentes. Apesar da retaliação acarretar estragos de ambos os lados, a corda sempre se parte do lado mais fraco. Mas a briga é necessária, segundo o ex-ministro Delfim Netto. Vejamos o que ele declarou em recente entrevista: “É correta a posição do nosso governo de preparar medidas de retaliação nos negócios da área de patentes, devido à negativa do governo americano em retirar os subsídios aos seus produtores de algodão. Os Estados Unidos simplesmente se recusam a acatar a decisão da Organização Mundial do Comércio (OMC) no julgamento da queixa suscitada pelo Brasil, com a adesão de vários outros países produtores. Eles são submetidos à competição desigual de preços do algodão americano no mercado mundial. Além do prejuízo nas exportações, a indústria têxtil dos países sofre com a concorrência da manufatura subsidiada.”.

Ressalta ainda o ex-ministro que a retaliação não é bravata, nem é o melhor instrumento, mas ao Brasil não restou outro caminho, pois esgotaram-se todos os argumentos, ao longo de décadas, na vã tentativa de convencer os Estados Unidos a programarem a retirada ordenada dos subsídios. Ao concluir a entrevista, deixa no ar a seguinte pergunta: “Por que o Brasil terá de se mobilizar para negociar o cumprimento daquilo que passou a ser um direito adquirido? Os Estados Unidos detêm exclusivamente o privilégio da desobediência, e fica por isso mesmo?”

É muito estranho que o país-berço do neoliberalismo mundial esteja, agora, adotando medida inversamente oposta pela via do protecionismo estatal.
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Fonte:
Tribuna do Norte

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