Paulo Guedes, da equipe de Bolsonaro, analisa o que está errado no Brasil: Quase tudo!!!

Publicado em 01/12/2017 09:49
por Rodrigo Constantino (na Gazeta do Povo)

O economista Paulo Guedes, apontado como futuro ministro da Fazenda de um eventual governo Bolsonaro, tem sido um crítico consistente da social-democracia brasileira desde os tempos de redemocratização, sem poupar, porém, o regime militar intervencionista. Sua metralhadora giratória liberal não poupa ninguém, à esquerda e à direita, e foca no cerne da questão: o excessivo tamanho do estado brasileiro.

Nesse vídeo do Instituto Millenium, divulgado pelo canal de Bolsonaro e que já conta com mais de 80 mil visualizações, é uma aula de economia sobre a lamentável trajetória antiliberal nacional. Guedes apresenta propostas de reformas concretas, o que deveria ser feito para tornar o Brasil um pais próspero, dentro do conceito de uma Grande Sociedade Aberta. Vale a pena o investimento de tempo:

Rodrigo Constantino

No Estadão: As ideias do economista Paulo Guedes em 35 ‘pérolas’ - Blog do Fucs

A afirmação do deputado Jair Bolsonaro, provável candidato à presidência em 2018, de que Paulo Guedes poderá ser seu ministro da Fazenda se ele vencer as eleições de 2018, colocou o economista sob os holofotes.

Presidente do conselho de administração e estrategista da Bozano Investimentos, do empresário Júlio Bozano, com Ph.D. na Universidade de Chicago, Guedes é um dos mais aguerridos defensores do liberalismo no País e um dos maiores críticos dos governos social-democratas do PSDB, do PT e do PMDB, que comandaram o Brasil desde a redemocratização, em meados dos anos 1980.

Para conhecer melhor suas ideias, confira a seguir 35 frases de Guedes, selecionadas de entrevistas que realizei com ele e de artigos que ele escreveu nos últimos anos.

1. “A morte da velha política em 2017, sob a guilhotina da Lava-Jato, é o nosso mais importante episódio de aperfeiçoamento institucional desde a redemocratização e a convocação da Assembleia Constituinte.”

2. “A morte da Velha Política agora em 2017 marca o fim de uma era, e as campanhas eleitorais em 2018 serão o anúncio do nascimento da Nova Política.”

3. “A Nova República morreu, porque manteve o Antigo Regime. Não fez a reforma da estrutura de Estado brasileiro.”

“O aperfeiçoamento das instituições de uma democracia emergente é hoje mais importante do que as obsoletas disputas ideológicas entre ‘esquerda’ e ‘direita’, conservadores e progressistas, liberais e socialistas.”

5.“A grande sociedade aberta está além da direita e da esquerda. Quem estiver preocupado com isso ainda está saindo da Revolução Francesa no século XVIII. Aliás, esquerda naquela época eram os liberais. Se eu vivesse naquela época, estaria lá, com o Tocqueville, lutando contra a Velha Ordem.”

6. “Mesmo candidatos do “centro” cujas biografias resistam às investigações terão poucas chances de derrotar nas urnas os ‘outsiders’ de um degenerado sistema político”

7. “Se as candidaturas à “esquerda” e à “direita” têm limites naturais de representatividade, e portanto de crescimento, e a maioria dos eleitores de centro será disputada com vantagem por “outsiders” diante dos candidatos convencionais, torna-se bastante provável a vitória eleitoral desses “outsiders” em 2018, não apenas para a Presidência da República, mas também para governadores e para uma avassaladora renovação parlamentar, como ‘nunca antes na História deste país.’”

8. “Os corruptos destroem muito mais do que escolas, hospitais e outros serviços essenciais não prestados pelos recursos que desviaram. Destroem também a crença da população nas instituições das modernas democracias liberais.”

9. “A classe política não representa mais o povo, e sim seus próprios interesses. E os empresários não criam mais riqueza, apenas dela se apropriam em negociatas com o poder político.”

10. “O político que enriqueceu na vida pública e o empresário que tem muito poder político são aberrações de um capitalismo de Estado que degenerou para um capitalismo de quadrilha.”

11. “Não me sensibiliza dizer que a Lava Jato destruiu 300 mil empregos no Comperj (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro). Eu pago dois anos de crise para ter um país decente.”

12. “A concentração de poder político e recursos financeiros no governo federal explica muito de nossa degeneração sistêmica”

13.  “A ‘direita’ brasileira afundou com a redemocratização por estar associada ao autoritarismo político e à insensibilidade social do regime militar. A ‘esquerda’ brasileira afunda agora com a morte da velha política por estar associada à roubalheira, ao colapso do crescimento econômico e à insegurança nas ruas de uma decrépita Nova República.”

14. “O baixo crescimento e a corrupção sistêmica marcaram a transição do capitalismo de Estado do regime militar para um capitalismo de quadrilhas sob a obsoleta e despreparada social-democracia”

15. “O PT, o PMDB e o PSDB são partidos social-democratas que dirigem há mais de três décadas a política e a economia brasileiras, desde o nascimento da Nova República, em 1985, aos dias de hoje, em que se anuncia a morte da Velha Política. Devem explicar a degeneração de nossas práticas políticas e o medíocre desempenho econômico no período.”

16. “Os partidos social-democratas, que desde a redemocratização moldaram a Velha Política, estão feridos de morte pela corrupção, pelo baixo crescimento e pela insegurança nas ruas. O PMDB, o PSDB e o PT se revezaram no desfrute de um disfuncional aparelho de Estado com o mesmo apetite pelo poder, a mesma inapetência por reformas e a desfaçatez dos papas renascentistas.”

17. “O coração do problema do Brasil está no gasto público. Só que não existe capacidade de formulação suficiente no governo para tornar isso politicamente interessante, economicamente potente.”

18. “A Dilma foi um dos mais importantes fatores de destruição do tripé macroeconômico, baseado no câmbio livre e nas metas de inflação e fiscal. Ela participou do início, do meio e do fim do crime do desequilíbrio fiscal.”

19. “O programa de uma campanha presidencial para as eleições de 2018 terá de enfrentar os temas que descredenciaram candidatos e partidos da Velha Política. O enigma que devorou a classe política e degenerou a democracia emergente é que o governo gasta muito e gasta mal.”

20. “O caminho para a recuperação da dinâmica de crescimento econômico e a regeneração da classe política passa pelo aperfeiçoamento das instituições republicanas e pelo aprofundamento das reformas.”

21. “Políticas econômicas ineptas, como os esforços de estabilização sem a mudança do regime fiscal, derrubaram o crescimento do país, enquanto alianças políticas espúrias pela ocupação de um obsoleto aparelho de Estado promoviam a roubalheira sistêmica. Precisamos agora superar a farsa política das repetidas disputas entre correntes da mesma social-democracia.”

22. “Em 30 anos, a social-democracia, hegemônica, dominante politicamente desde meados dos anos 1980, não conseguiu fazer o que tinha de ser feito. A esquerda não tem coragem de enfrentar corretamente, tecnicamente, o problema. O que eles sabem fazer? Aumentar gastos até serem chamados à realidade.”

23. “Um erro fundamental da social-democracia em suas mais de três décadas governando o país foi a ininterrupta expansão dos gastos públicos sob todas as formas, dos meritórios programas sociais de transferência de renda inerentes a uma democracia emergente aos reprováveis subsídios a grandes empresas agora configurados como práticas de um capitalismo de quadrilhas.”

24. “Essa incapacidade de controlar gastos e de promover reformas trouxe como subproduto uma tragédia de dimensões épicas: os esforços de estabilização sem apoio da política fiscal elevaram as taxas de juros por décadas, causando um endividamento interno em bola de neve.”

25. “Acelerar as reformas, particularmente a do Estado, é o caminho para asfixiar a corrupção e recuperar nossa dinâmica de crescimento.”

26. “Se eu tivesse que fazer uma única mudança seria a reforma da Previdência, porque o déficit sobe de R$ 50 bilhões para R$ 80 bilhões num ano, para R$ 130 bilhões no outro, é uma bola de neve que vai explodir o Brasil inteiro.”

27. “Além de melhorar a qualidade de suas políticas públicas, o País precisa fazer uma reforma fiscal e previdenciária. Temos que baixar impostos e principalmente, descentralizar os recursos para Estados e municípios.”

28. “O Brasil é o paraíso dos rentistas e dos empresários escolhidos e o inferno dos trabalhadores, dos empreendedores e dos empresários que acreditam numa economia de mercado. É uma associação entre criaturas do pântano político e de piratas privados.”

29. “Prefiro 30 milhões de empregos porque baixaram os encargos trabalhistas do que ganhar alguns empregos porque meia dúzia de empreiteiras estava corrompendo o governo. Isso não é nem capitalismo de Estado, que é quando as práticas morais são sérias, é capitalismo de quadrilha.”

30. “Na selva do dirigismo de quadrilhas, evoluem há décadas as criaturas do pântano — os piratas privados, os servidores públicos desonestos e os políticos corruptos.”

31. “Depois de 40 anos de expansão de gasto público, não posso dizer que o teto de gasto público não é algo excelente. Ter um teto de gastos para os próximos vinte anos é excepcional. É a primeira vez que alguém fala em corte de gastos desde o Tancredo.”

32. “As forças da modernização, que se organizam em torno de novos eixos, exigem do Estado o cumprimento de suas funções clássicas de segurança e Justiça, assim como uma eficiente execução de suas modernas atribuições na construção de redes de proteção social, focalizadas nos pobres e operadas de forma descentralizada por Estados e municípios. A democracia emergente precisa de mais recursos para prefeitos e governadores, e menos de dez ministros em Brasília.”

33. “As classes médias das economias ocidentais tiveram seus ganhos salariais travados ao longo das últimas décadas pelo mergulho de bilhões de eurasianos que escaparam da miséria socialista nos mercados globais de trabalho.”

34. “A prosperidade dos trabalhadores depende do aumento de sua produtividade, o que exige permanente acumulação de capital e incessantes investimentos em educação.”

35. “A educação é libertadora e transforma vidas… É o maior fator de criação de riqueza.”

Na Folha: A “nova política” produziu só atraso; já a “velha” tirou o país do atoleiro petista (por REINALDO AZEVEDO)

Leiam trecho:

Aqui e ali leio e ouço reclamações sobre a “velha política”. Da extrema esquerda à extrema direita, reivindica-se a novidade como valor em si, como categoria política ou de pensamento. Até conservadores fazem dela um fetiche, o que é coisa de hospício.

Jair Bolsonaro, por exemplo, quer-se o novo, especialmente agora que arrumou um Paulo Guedes para chamar de seu, uma fórmula que, segundo o economista e financista, junta a “ordem” (suponho que seja o militar reformado) com o “progresso” (acho que se refere, com modéstia peculiar, a si mesmo).

A facilidade com que nossos “sedizentes” liberais se juntam a autoritários é já uma tradição. Lembrando um poema-piada de Oswald de Andrade, a um liberal à moda brasileira ocorreria vestir o índio, mas nunca despir o português.

Ao se referir ao rebento que nasceria do casamento (“hétero”, o deputado frisou; Deus do céu!) de Bolsonaro com Guedes, Elio Gaspari lembrou a suposta resposta de Bernard Shaw a Isadora Duncan quando esta lhe teria proposto que tivessem um filho, que nasceria, então, com o cérebro dele e o corpo dela. Teria declinado do convite alertando para o risco de a criança ter o corpo dele e o cérebro dela.

A história é boa, mas não aconteceu. Shaw a desmentiu. No máximo, admitiu que ela se ofereceu para dançar para ele sem véus. Segundo disse, esqueceu-se de comparecer ao encontro. Para Oswald, tudo indica, ela dançou ao passar por Banânia…

A minha metáfora é um pouco mais rural, caminhando também ela para o clichê. É a história do caipira que cruzou a vaca com o jumento para extrair de ambos o melhor. O híbrido nem dá leite nem puxa o arado. Pior: baba como um ruminante e dá coice como um asinino. O caipira do Mazzaropi, que, de tonto, só tinha o andado, não cairia nessa.
(…)

Foi a fantasia autoritária e dita modernizadora do “ilegalismo” militante da Lava Jato que conduziu o país, até aqui ao menos, a uma escolha entre Lula e Bolsonaro.
(…)
Já a “velha política” se encarregou de se articular com o Congresso para aprovar teto de gastos; mudança no marco do pré-sal; reestruturação do setor elétrico; reforma trabalhista; reconstrução do ensino médio e, quem sabe?, alguma reforma da Previdência.
(…)
Para ler a íntegra, clique aqui

"Progressistas" se revigoram na tragédia moral do País

Por Percival Puggina

Ontem, 27 de novembro, zapeando na TV a cabo, passei pela Globo News exatamente quando a apresentadora do Estúdio I, Maria Beltrão, perguntou aos universitários que completam a mesa do programa: “Qual o estreito limite entre o conservadorismo e a extrema-direita?”. De saída, Maria já entendia tratar-se de um limite “estreito”. E não o conseguia definir. Foi o mais parecido que ela encontrou para evitar o vocábulo “inexistente”, que era, este sim, seu estreito entendimento.

Maria está satisfeita com o Brasil que vê. Está convencida de que pessoas conservadoras, com princípios e valores, cumpridoras de suas obrigações, respeitadoras dos demais e da lei, são a parte pior da tragédia nacional. Ela acha que nosso país precisa derrubar mais e mais valores morais, tornar-se mais e mais permissivo, debilitar mais e mais os laços familiares, extinguir mais e mais interditos e proibições. Maria está convencida da relatividade do bem e do verdadeiro. Maria não conhece o “estreito limite” entre liberdade e libertinagem. Maria queria o Queermuseu cheio de crianças. Maria sorria deslumbrada para aquele casal que dava nome neutro ao bebê que iria nascer para não intervir na escolha de sua identidade sexual. Maria acha aquilo lindo. Maria incorporou a intelligentzia de algum Centro Acadêmico e ficou assim, “progressista” para o resto da vida.

Hoje, 28 de novembro, o time de “progressistas” do programa Timeline da Rádio Gaúcha ensaiou o linchamento público de um vereador de Bento Gonçalves que foi salvo pela firmeza de sua posição em defesa do projeto que cria lugar especial na biblioteca pública municipal para obras impróprias a menores. A impropriedade ou não do catálogo do Queermuseu foi mote da entrevista. A fumaça de uma censura (ainda que meramente etária e legal, em conformidade com o ECA) pairava sobre os microfones. Os “progressistas” pareciam querer um catálogo daqueles na mão de cada criança do Brasil. Davi Coimbra chegou ao cúmulo de indagar se as conhecidas referências bíblicas a relações incestuosas dariam causa a interdição do Livro Sagrado de judeus e cristãos.

Na percepção dos “progressistas”, à medida em que avança sua luta “politicamente correta”, libertadora dos instintos, e à medida em que tombam os limites, em que são obtidas vitórias no combate à autoridade, à repressão policial, à posse de armas, à religiosidade, à moral cristã (mas nem uma tênue palavra sobre a sharia), o país vai tomando o jeito que eles gostariam que tivesse. Só pode ser isso. Talvez digam que a insegurança, a violência, a criminalidade, a degradação cultural, professor apanhando de aluno, sejam consequência do “fenômeno das drogas”. E novamente se enganam porque transformam em causa aquilo que é consequência.

As drogas, senhores e senhoras “progressistas”, são efeito da sistemática desconstrução dos valores morais; da libertinagem e da procriação irresponsável, com a decorrente ruptura dos laços familiares e sumiço da missão educadora dos pais. As drogas são consequência de se estar mais preocupado com quem põe um livro aqui ou ali do que com a necessidade de proteger a inocência infantil. As drogas são decorrência da repulsa a toda autoridade, do império dos sentidos, da perda da noção de limites e da omissão de quem os deve estabelecer. Tanto assim é que os dependentes químicos, quando se percebem no ápice de seu holocausto pessoal, procuram uma dessas benditas fazenda de recuperação onde vão encontrar o que perderam: valores, autoridade, disciplina, trabalho, ordem e espiritualidade com os que redescobrem o bem e fortalecem sua vontade para enfrentar as tentações do vício. E só assim dele se libertam.

Mas de que adianta falar dessas coisas a “progressistas” comprometidos com tudo que leve à gandaia geral? (Percival Puggina).

A HISTÓRIA, A ECONOMIA E A REALIDADE

Por Hiago Rebello, publicado pelo Instituto Liberal

O que é a História? A História é o passado, aquilo que ficou marcado pelo tempo, embora o termo também possa ser usado para tratar do passado do meio em que vivemos e seu estudo pode ser feito de diversas maneiras. Com o estudo historiográfico, por exemplo, podemos apreender como um povo, ou uma pessoa, agia em determinada época, sofrendo pressão de uma determinada situação. A arqueologia é outra faculdade que também ajuda a investigar a História, esquadrinhando o passado em seus sítios (literais) de pesquisa intensa.

Outra faculdade humana que pode ser utilizada para investigar o passado é a memória. A memória é o que fundamenta todo o estudo – qualquer que seja – do que já passou. Sem o ato de memorizar, sequer poderíamos construir uma sociedade. Aristóteles, como diria Hegel, um dos maiores mestres do gênero humano, ou “o mestre daqueles que sabem”, segundo Dante, já demonstrou com maestria a importância da memória para os seres-vivos:

Ora, enquanto os outros animais vivem das imagens e recordações, mas participam pouco da experiência, o gênero humano vive também da arte e dos raciocínios.

Assim, nos homens, a experiência nasce da memória, pois das muitas recordações de uma mesma coisa constituem a prática de uma experiência. E a experiência parece um pouco semelhante à ciência e à arte” – Metafísica, Livro I, cap. 1 980b-981a.

A memória é o que nos proporciona a recordação de nossas ações, de nossas práticas, ações e vivências de qualquer tipo. Sem o memorizar, não é possível constituir nenhuma arte, nenhuma ciência. Sem suas memórias, homens como São Gregório de Tours, Nênio, Plutarco, Xenofonte, Suetônio, etc., jamais poderiam escrever a História dos povos da Antiguidade e do medievo sem a memória que a História oral e seus próprios testemunhos de outros escritos e eventos.

Mas nos firmemos, por enquanto, em Aristóteles: a memória (do que os sentidos captam) é uma necessidade epistemológica para a inteligência e o conhecimento humano. Sem esta, sociedades humanas não existiriam e seríamos animais bem limitados em nossa organização, não importando de que tipo seja.

E como a memória envolve a atualização do passado em um presente, uma volta mental ao que já se passou, e dado que temos uma dependência desta para a criação de qualquer sociedade ou qualquer coisa mais complexa em nossas ações, isso significa que o passado não tem apenas uma grande valia para o presente e nossas ações futuras, mas também para todo nosso entendimento, qualquer que este seja. O processo Histórico, malgrado seja incrivelmente plural e instável, possui a característica de, como um ato já passado, poder constituir nosso presente com a sua atualização.

Não somos átomos temporais, cronocêntricos e absolutos. Nossas ideias, nossas crenças, nossos valores e ações dependem muito do passado acumulado em nossa memória coletiva. Mesmo que o corpo social não funcione como um indivíduo, ele, por conta de suas redes de interações, imprime nos indivíduos todo um arcabouço cultural, com cargas históricas e antigas muitíssimas vezes imperceptíveis para os membros dessa sociedade. O resgate do nosso passado, em nossas tradições, é o que nos impulsiona para o futuro.

A palavra tradição vem do latim traditio, um termo derivado de tradere, “passar a diante”. Nós só conseguimos viver imbuídos e rodeados de tradições. Tradições são os sustentáculos-mor da humanidade. Sem uma tradição científica, por exemplo, toda a ciência atual não faria sentido, pois não teria embasamento, um chão, para se sustentar. Pensemos o que teria ocorrido com o método científico se, em sua época de nascimento, não tivesse sido legado, passado a diante, por uma tradição? Ele teria morrido. Assim também ocorrem com as monarquias, as democracias, os direitos civis, a ideia de dignidade humana, a metafísica. Dentro do conhecimento humano, se algo não for constantemente rememorado do passado Histórico, este algo desaparece com as marés do tempo.

Na economia, o mesmo ocorre. Pensemos no liberalismo e suas raízes com os padres de Salamanca, ou com John Locke. No caso de Salamanca, a tradição foi minguada até ser esquecida – tanto que foi redescoberta no século XX –, mas o mesmo não ocorreu no caso inglês. O liberalismo inglês floresceu e se expandiu. Adam Smith, David Hume, Edmund Burke, David Ricardo, John Stuart Mill, Lord Acton, etc., deram continuidade e contribuições para o crescimento e desenvolvimento teórico do liberalismo econômico. O que seria da Escola Austríaca, por exemplo, sem esse legado de séculos atrás? Sem a tradição liberal econômica, a Escola Austríaca sequer seria.

Esqueçam as contribuições que ocorreram nos governos de Reagan e Tatcher, na década de 80. Esqueçam, até mesmo, a Escola de Chicago, que também não existiria. Nada de homens como Friedman e suas influências nos governos acima citados. O mundo seria outro. Mesmo a prática econômica liberal, exercida por muitos empresários, não existiria. Como se legaria o costume econômico, sem uma memória do passado?

Mesmo os mais avessos ao Livre Mercado, ou ao passado, necessitam de uma tradição. Não existiria nenhuma Escola de Frankfurt sem um Rousseau e sua ideia de Homem bom e Sociedade má; de fato, o marxismo tem um débito natural para uma tradição marxista também. Mesmo a atual New Left, com seus Michel Foucault, Jean-Paul Sartre, Jacques Derrida, Michel de Certeau, E. P. Thompson, Perry Anderson e afins não existiriam sem um Marx e um Engels, ainda que quebrem (e muito) com ambos os esses pensadores em várias questões – de fato, nem o próprio Rousseau foge a essa regra. Em seus escritos, como o Contrato Social, buscava a imagem de homens do passado, fortes legisladores e ordenadores de nações. Sólon e Licurgo eram usados e abusados por Rousseau para sua ideia de Estado justo.

Aristóteles, ainda em sua Metafísica, diz: “Não passa de justiça mostrar gratidão não apenas com aqueles cujos pareceres podemos partilhar, como também com aqueles que exprimiram opiniões um tanto superficiais. Estes também contribuíram com alguma coisa. Foi graças ao seu trabalho preliminar que o exercício intelectual foi desenvolvido. Se não tivesse nenhum Timóteo, não possuiríamos muito de nossa música. E se não houvesse existido nenhum Frinis, não teria havido nenhum Timóteo. O mesmo ocorre com os que teorizaram acerca da verdade: extraímos certos pontos de vista de alguns deles e ele, por sua vez, estavam em débito com outros” – Metafísica, Livro II, 1, 993B1: 15.

Gratidão é o que devemos aos nossos antepassados. Sem suas conquistas, nada seríamos, sem a conservação das mesmas conquistas, nada somos. A percepção da realidade, através dos sentidos, da memória e, por fim, de nossa inteligência, como dependente de nossa memória individual, também depende de uma memória coletiva, de uma tradição que nos lega as conquistas do passado.

Sem o que o passado nos trouxe, sem os avanços anteriores, o que somos? Nossas percepções da realidade se esfacelariam. Nada de ciências, nada de filosofias, nada de economia. Seríamos como um cérebro vazio, um deserto sem água.

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Fonte:
Blog Rodrigo Constantino (GP)

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1 comentário

  • dejair minotti jaboticabal - SP

    Entendi as idéias do Paulo Guedes,o Brasil e a Namíbia não tem jeito,por lá ditadores e por aqui a classe politica.

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