Por Regina Alvarez, no Globo:
Uma radiografia dos gastos públicos nos oito anos do governo Lula mostra que as despesas cresceram fortemente entre 2003 e 2010, além da expansão do PIB, que, em média, foi de 4% ao ano. Mas áreas como a saúde e a educação ficaram com uma pequena fatia desse bolo. As despesas correntes cresceram 2,47 pontos percentuais do PIB no período - mas só uma fatia de 2% do aumento foi destinada ao custeio da saúde, e 8%, ao custeio da educação.
Dentro da rubrica de despesas correntes, o crescimento de gastos com a Previdência e com outras despesas vinculadas ao salário mínimo - auxílio a idosos e deficientes, seguro-desemprego e abono - foi de 1,37 ponto percentual, abocanhando 55,4% do aumento das despesas correntes ocorrido no governo Lula, segundo levantamento realizado pela Consultoria de Orçamento da Câmara, com base em informações do Sistema Financeiro de Administração Financeira (Siafi).
Os gastos com a Previdência e demais benefícios vinculados ao mínimo pularam de 7,22% do PIB em 2003 para 8,59% em 2010. No caso de pessoal, o gasto passou de 4,51% do PIB em 2003 para 4,78% em 2010, diferença que corresponde a 11% do aumento total das despesas no período.
Já os gastos de custeio da saúde avançaram só 0,05 ponto percentual entre 2003 e 2010, passando de 1,35% para 1,40% do PIB. Se considerados os gastos totais da pasta, incluindo pessoal e investimentos, a despesa passou de 1,80% do PIB para 1,97%, informa o Ministério da Saúde.
Na educação, as despesas de custeio nos oito anos da gestão Lula passaram de 0,42% do PIB para 0,62%. A diferença de 0,20 ponto percentual, que equivale a 8% do aumento dos gastos correntes, é um pouco maior em relação ao percentual da saúde, mas ainda é muito pequena se comparada com as outras despesas que abocanharam a maior fatia dos novos recursos.
O levantamento mostra que outras despesas obrigatórias, como gastos com Legislativo, Judiciário e Ministério Público, cresceram mais de 30% nos últimos oito anos. Passaram de 0,16% para 0,21% do PIB. Destaque-se que no governo Lula a receita líquida de tributos - já descontadas as transferências a estados e municípios - cresceu 2,45 pontos percentuais, passando de 17,72% em 2003 para 20,17% em 2010.
Mas as despesas primárias - pessoal, custeio (despesas correntes) e investimentos - subiram ainda mais: o equivalente a 3,34 pontos percentuais, indo de 15,62% do PIB em 2003 para 18,96% em 2010. Para acomodar novas despesas além do crescimento da arrecadação, o governo reduziu o superávit primário, que é a economia destinada a pagamento dos juros e redução da dívida pública.
Escolaridade igual à do Zimbábue
Os gastos públicos com saúde no Brasil, de cerca de US$ 350 per capita por ano, são muito baixos, se comparados com aos de outros países, mas também há problemas sérios de gestão. A solução apontada por especialistas para avançar nessa área é uma combinação de aumento do financiamento público com uma gestão mais eficiente.
- O sistema precisa ser repensado. A saúde precisa de mais investimentos e de um novo modelo de gestão - afirma a professora Magda Scherer, do Núcleo de Estudos de Saúde Pública da UnB.
O próprio Ministério da Saúde reconhece os problemas: “Aliado a um sistema frágil de financiamento, temos um padrão de gestão arcaico, engessado, especialmente nos hospitais públicos, que continuam usando métodos, protocolos e mecanismos defasados. É necessário melhorar a qualidade do gasto, encontrar estratégias institucionais que permitam usar melhor os recursos existentes, criando estruturas mais dinâmicas, com remuneração por metas e avaliação de desempenho”, diz nota da assessoria da pasta.
Na educação, a defasagem do Brasil em relação a outros países emergentes ficou muito evidente na recente divulgação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) das Nações Unidas. A média de escolaridade para pessoas com mais de 25 anos no Brasil é de 7,2 anos, número igual ao registrado no Zimbábue, país com o pior IDH do ranking.
Outra dificuldade apontada está na expectativa de anos de estudo para crianças que ingressam nas salas de aula. No Brasil, esse indicador é de 13,8 anos, enquanto o considerado ideal para o desenvolvimento humano seria de 20,6 anos.
As estatísticas brasileiras também são negativas quando se observa o índice de repetência nas escolas. No país, aos 9 anos de idade, 16% das crianças não estão na série adequada. Já aos 16 anos, esse percentual sobe para 40%.
O professor Mozart Neves Ramos, do Movimento Todos pela Educação, destaca que o gasto per capita do Brasil em educação básica, em torno de R$ 2,9 mil, está bem abaixo das despesas realizadas por países vizinhos como a Argentina e o Chile, que têm uma despesa em torno de US$ 2,1 mil per capita. Assim como acontece na saúde, o diagnóstico dos especialistas em educação aponta para dois problemas na área: carência de recursos e falhas na gestão.
- O Brasil precisa fazer dois deveres de casa: aumentar os recursos para a educação e profissionalizar a gestão. Não basta fixar um limite mínimo de gastos para a área, é preciso saber como estão sendo aplicados esses recursos - afirma Ramos.
O aumento da verba para educação e saúde passa por um crescimento dos investimentos nessas áreas. Mas a radiografia das contas do governo Lula mostra que, apesar de ter havido aumento substancial nos gastos com investimentos (que cresceram 0,9 ponto percentual de 2003 a 2010), a parcela destinada a essas despesas no Orçamento ainda é muito pequena, comparada com outras despesas. Em 2003, era de 0,48% do PIB; em 2010, está em 1,38%.
IGP-M dispara e economistas dizem que BC terá de subir a taxa de juros
Por Fernando Dantas e Jacqueline Farid, no Estadão:
Pressionada por uma onda de aumento de preços de commodities, a segunda prévia do Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M) divulgada ontem avançou de 0,89% para 1,20% de outubro para novembro. Analistas aguardavam uma taxa de, no máximo, 1,17% para a prévia do indicador, usado para reajustar aluguéis.
Agora, especialistas começam a revisar para cima as projeções de inflação para o ano. Eles alertam que os reajustes que pressionam os preços no atacado e varejo devem continuar, conduzindo ao endurecimento da política monetária e à elevação de juros.
Em seminário no Rio, os economistas-chefes de dois grandes bancos brasileiros previram que o Banco Central (BC) terá de subir a taxa de juros (Selic) para controlar a inflação. Para Ilan Goldfajn, do Itaú Unibanco, e Alexandre Schwartsman, do Santander, ex-diretores do BC, a inflação caminha para superar 5% em 2011 e deve chegar a 5,5% ou mais em 2010. O economista Affonso Celso Pastore, ex-presidente do BC, também vê necessidade de alta de juros em 2011.
Goldfajn e Schwartsman preveem ainda que o superávit primário real não vai atingir 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2011, como foi indicado pela equipe de transição da futura presidente Dilma Rousseff. Para todos esses analistas, a necessidade de apertar a política monetária será tão mais forte quanto menor for o esforço para elevar o superávit fiscal primário, que exclui juros. A razão é que o impulso fiscal do governo também aquece a demanda e provoca pressões inflacionárias.
Goldfajn acredita que a inflação oficial chegará a 5,5% em 2011, “com esforço, ou seja, com a política monetária apertando um pouco mais”. Ele alertou que “os sinais de aquecimento estão aí, não totalmente fora de controle, mas será necessário algum ajuste”. O economista prevê alta de 2 pontos porcentuais na Selic (hoje em 10,75%) em 2011. Para Goldfajn, “todos os sinais clássicos de aquecimento” estão presentes na economia brasileira hoje. Ele citou a alta das expectativas de inflação e do déficit em conta corrente, que - na sua visão - pode chegar a 5% do PIB em 2012.
Os economistas participaram do seminário “O Brasil no novo Governo”, organizado pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), na da Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio. Eles deixaram claro que, ao falar do superávit primário efetivo, referiam-se ao resultado sem os truques contábeis que o elevaram artificialmente nos dois últimos anos.
Para Schwartsman, o BC “está atrasado do ponto de vista da política monetária” e vai ter de elevar os juros diante do cenário de inflação em alta. Ele considera que o aumento dos juros será inevitável, já que não há perspectiva de um ajuste fiscal de magnitude que evite uma intervenção mais forte da política monetária. O economista criticou o fato de a política fiscal ainda ter como foco apenas a sustentabilidade da dívida pública. “O ajuste fiscal deve sair da dimensão de controlar dívida e conciliar instrumentos de política econômica, monetária e fiscal.” Segundo ele, não há nenhum sinal de melhoria do desempenho fiscal. “Com um superávit primário elevado, é possível manter a inflação na meta sem elevar juros, mas é muito remota a chance de que haja um ajuste primário dessa magnitude.”Aqui
Por Fabio Graner, no Estadão:
O governo reduziu, na prática, a meta de superávit primário das contas públicas de 2011 para 3% do Produto Interno Bruto (PIB), em lugar dos 3,3% do PIB utilizados no modelo matemático do Banco Central (BC) que projeta a inflação e ajuda a definir os juros. A alteração indica gastos maiores, o que aumenta a pressão do mercado financeiro para a elevação da taxa básica de juros, a Selic, e tornou mais complicado o cenário para o BC decidir os rumos da política monetária.
A redução da meta de superávit primário (economia de recursos públicos para abater a dívida pública) é resultado da revisão dos parâmetros da economia divulgada ontem pelo Ministério do Planejamento e pela retirada dos investimentos da Eletrobrás do cálculo do superávit. O governo projetou um crescimento de 7,5% em 2010 (previa 7,2% na avaliação do quarto bimestre) e de 5,5% em 2011.
Na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) do próximo ano, a meta de superávit está definida em reais (R$ 117,9 bilhões). Por isso, o valor da meta em porcentual do PIB vai depender do crescimento da economia. Com os números apresentados pelo governo, a meta do próximo ano fica em 3% do PIB.
O BC contava com a colaboração de quase 1 ponto porcentual do PIB a mais de esforço fiscal em 2011 - em relação ao resultado deste ano, desconsiderando-se as manobras fiscais do governo - para manter a inflação na meta sem elevar os juros. Mas como o governo cortou um terço do aperto fiscal adicional - 0,3 ponto porcentual do PIB - , o argumento do BC perde força.
Com a nova meta fiscal de 2011 em 3% do PIB, o modelo do BC deverá apontar uma inflação um pouco mais elevada. No último relatório de inflação, IPCA projetado pelo BC para 2011 foi de 4,6%, considerando juros constantes em 10,75% ao ano e o cumprimento da meta fiscal de 3,3% do PIB.
Mudança fiscal
“A necessidade de subir os juros existe já há algum tempo, mas, de fato, ao colocar no modelo agora um número menor de superávit as projeções do BC vão apontar uma alta de fato da inflação. A questão é saber se o BC vai se sensibilizar com mais essa mudança fiscal”, diz o economista da MB Associados, Sérgio Vale.
Recentemente, o BC divulgou pesquisa com o mercado sondando o impacto da política fiscal na inflação. Em média, os analistas indicaram que uma contração fiscal de 1% do PIB reduz a inflação em torno de 0,3 ponto porcentual. Os mais otimistas, enxergaram um efeito de 0,5 ponto porcentual a menos no IPCA. O BC dá sinais de estar na ponta mais otimista. Aqui
Por Adriana Fernandes e Fabio Graner, no Estadão:
Na direção oposta ao discurso da presidente eleita Dilma Rousseff, que é preciso “apertar o cinto”, o governo federal abriu ainda mais a torneira do gasto e ampliou em R$ 18,6 bilhões as despesas previstas para este ano. É o terceiro desbloqueio de gastos do orçamento feito pelo governo em 2010.
O pé no acelerador das despesas federais no apagar das luzes do governo Lula veio acompanhado de redução da meta de superávit primário das contas do setor público em 2010 e 2011, numa sinalização que haverá mudanças mais profundas na política fiscal no primeiro ano do governo Dilma.
A Eletrobrás, estatal que conta com forte ingerência do PMDB, principal partido aliado do governo, será retirada do cálculo do superávit primário, permitindo a redução da meta de 3,3% para 3,1% do PIB deste ano. Em 2011, de acordo com os parâmetros econômicos atuais, a meta será ainda menor: 3% do PIB. A reação ontem às três medidas foi de desconfiança. As apostas de alta nos juros subiram no mercado futuro, diante de evidências de que a moderação das despesas ainda é apenas discurso.
Nas últimas semanas, os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Paulo Bernardo (Planejamento) deram declarações de que o momento era de redução de gastos. Mantega chegou a criticar a Comissão de Orçamento do Congresso Nacional por ter aumentado em quase R$ 20 bilhões a previsão de arrecadação na proposta de Orçamento de 2011, o que, segundo ele, só serviria para ampliar a pressão por mais despesas. Aqui