Laranja de mesa ganha terreno com inovações

Publicado em 04/04/2011 07:53
A década de 60 chegava ao fim quando Gilson Lucato desembarcou em São Paulo para estudar e trabalhar. Seu pai tinha uma pequena produção de laranja em Limeira, onde vivia, e logo ele conseguiu emprego no box que os tios tinham acabado de montar na Ceagesp, que nasceu em 1969 a partir da integração entre as estatais paulistas Ceasa e Cagesp.

Gilson trabalhou durante dez anos com os tios, até que eles desistiram do box e voltaram a se concentrar apenas na produção da fruta, também em Limeira. Era a oportunidade de assumir o box, e com as condições favoráveis oferecidas pelos parentes um novo ramo dos Lucato assumiu o ponto na Ceagesp.

Hoje "seu" Gilson passa mais tempo no interior que na capital. O box continua no mesmo lugar, mas suas laranjas não cabem mais nele. As vendas já alcançam 25 mil toneladas por ano, e a partir de investimentos em tecnologia, distribuição e marketing a Citrícola Lucato tornou-se exemplo de que é possível crescer mesmo focada na venda de laranja para mesa, um mercado desarticulado e que há décadas vive à sombra da cadeia exportadora de suco, que absorve cerca de 70% da produção nacional da fruta.

Definidas pelo empresário, as mudanças na Lucato começaram em 1979, com a construção de um barracão em Limeira, e nos últimos anos passaram a ser conduzidas por seus três filhos. Foram eles - Gilson Lucato Junior, Carlos Alberto Lucato e Paulo Henrique Lucato - que receberam o Valor na semana passada, no mesmo terreno em que o antigo barracão há algum tempo foi substituído por um moderno "packinghouse", atualmente em fase de ampliação.

Mas a história não é assim tão linear, e por pouco a Citrícola Lucato não teve vida curta. Em 1984, "seu" Gilson, cansado da ponte terrestre Limeira-São Paulo, resolveu alugar o box na Ceagesp e passou a se dedicar a negócios em outras áreas, sobretudo a venda de combustíveis. Mas também iniciou sua própria produção de laranja, e quando voltou ao comércio da fruta, reassumiu o box e reativou o barracão, em 1995, deu prosseguimento às transformações.

Naquela época, o filho mais velho, Junior, então com 18 anos, seguiu o caminho do pai e também trocou Limeira por São Paulo para estudar e trabalhar. Batia ponto na Ceagesp, e teve voz na guinada que tempos depois abriu as portas do grande varejo à Lucato. "A questão era como voltaríamos ao mercado. Sabíamos das dificuldades em se trabalhar pensando em volume, que é o foco da cadeia exportadora de suco, e decidimos apostar em frutas de qualidade para o mercado de mesa", lembra Junior, que se formou em administração.

A primeira missão foi prospectar bons fornecedores, já que grande parte da laranja vendida pela Citrícola era - e continua sendo - produzida por terceiros. Foi preciso superar inclusive a concorrência de indústrias exportadoras nesse processo, e muitas vezes a disputa foi ganha com o pagamento de preços superiores aos praticados no mercado da matéria-prima.

Carlos Alberto explica que a colheita de laranja já era direcionada a caixas plásticas, não a silos - "não era gasto, era investimento" -, a comercialização era realizada em caixas de madeira maiores que as usuais e as estratégias de venda foram sendo sofisticadas. As caixas de madeiras depois também foram trocadas por caixas de plástico e as vendas começaram a ser fechadas por quilo, não por caixa.

"Nessa época [entre 2003 e 2004], o mercado interno estava difícil, mas a demanda por produtos de qualidade era forte", diz Junior. Nesse cenário, e com forte influência de Carlos Alberto, que é engenheiro, começaram os investimentos em tecnologia e maquinário. Carlos foi para a Califórnia em meados da década passada para conhecer as novidades, já que em 2006 começariam as vendas para supermercados e ao varejo focado em produtos de qualidade superior e público de alta renda.

A primeira máquina, importada da Nova Zelândia por US$ 500 mil, chegou em 2008. Para quem não conhece, ver o calibrador eletrônico Compac modelo 5000 em operação impressiona. Ele identifica todas as frutas descarregadas em uma esteira e as seleciona a partir de critérios como tamanho, aparência, cor e peso. Mesmo frutas secas, de difícil identificação, são descartadas. As que estão no padrão são encaminhadas ao cliente, com rastreabilidade total; os descartes são vendidos no mercado spot para as indústrias de suco.

Antes disso, e também por conta do aumento da clientela e de suas exigências, a Lucato começou a produzir laranja em Madre de Deus de Minas, em Minas Gerais, em uma fazenda que hoje tem 200 mil pés em produção, toda ela irrigada pelo sistema de gotejamento - o mesmo implantado em outra unidade em Fernando Prestes, em São Paulo, adquirida em 2008 e onde há cerca de 100 mil pés.

E outras melhorias vieram, como a aplicação de novas tecnologias para o pós-colheita, câmaras frias para ampliar a durabilidade das frutas, frota própria de caminhões, investimentos em marketing em pontos-de-venda e embalagens modernas, como as encontradas na Califórnia e na Espanha - principal referência europeia em laranja de mesa. Para embalar as frutas, outra máquina foi comprada em 2009 e duas chegarão em 2011, e a etiquetadora automática foi trocada recentemente.

Nas gôndolas do Pão de Açúcar na capital paulista, por exemplo - a Lucato também está e é possível encontrar pacotes de 2, 3 ou 5 quilos de laranjas lima ou pêra, com preços que variam de R$ 6 a R$ 14. E vem aí a laranja bahia, a ortanic (híbrido de laranja pêra com tangerina) e o limão, já cultivados nas fazendas da empresa, como adianta Paulo Henrique, o filho mais novo de "seu" Gilson.

Como no caso de concorrentes que trilham estratégias similares e também despontam no grande varejo com frutas de qualidade superior, a Citrícola Lucato, que vem crescendo 20% ao ano e emprega mais de 100 pessoas, tem suas vendas concentradas em São Paulo, mas 20% delas já são direcionadas aos Estados de Minas Gerais, Santa Catarina e Paraná. E se as vendas da empresa ao varejo cresceram 90 vezes de 2006 para cá, os tradicionais feirantes, que compravam 90% das frutas no passado, hoje não representam mais do que 2%.

"Muitos consumidores ainda não reconhecem a qualidade diferenciada de uma fruta tratada dessa maneira, mas aos poucos esse comportamento está mudando. O mercado doméstico é forte e vale a pena trabalhar com laranja de mesa". Palavras dos irmãos Lucato, para orgulho de "seu" Gilson.

Já segue nosso Canal oficial no WhatsApp? Clique Aqui para receber em primeira mão as principais notícias do agronegócio
Tags:
Fonte:
Valor Econômico

RECEBA NOSSAS NOTÍCIAS DE DESTAQUE NO SEU E-MAIL CADASTRE-SE NA NOSSA NEWSLETTER

Ao continuar com o cadastro, você concorda com nosso Termo de Privacidade e Consentimento e a Política de Privacidade.

0 comentário