Britânicos estão em dúvida sobre as mudanças climáticas

Publicado em 27/05/2010 08:36
No mês passado, centenas de ambientalistas se espremeram dentro de um auditório em Londres para avaliar uma questão angustiante: se o consenso científico com respeito às mudanças climáticas não mudou, por que tanta gente se afastou da ideia de que a atividade humana é a responsável pelo aquecimento do planeta?

Em nenhum outro lugar tem sido mais palpável a mudança na opinião pública do que na Grã-Bretanha, onde o câmbio climático até pouco tempo foi uma prioridade tão popular que o Parlamento definiu, em 2008, uma lei nacional com o objetivo de reduzir emissões.

Desde então, o país evoluiu até se converter em centro para um próspero grupo de céticos do clima, que dominam os programas jornalísticos. Eles parecem convencer muita gente que a ameaça do aquecimento é extremamente exagerada.

Uma pesquisa feita em fevereiro pela BBC concluiu que somente 26% dos britânicos acreditavam que "as mudanças climáticas estão ocorrendo e atualmente se sabe que a maior parte o aquecimento é de responsabilidade do homem". Em novembro, este porcentual era de 41%. Outra pesquisa, conduzida pela revista alemã Der Spiegel registrou que 42% dos alemães temiam o aquecimento global, abaixo dos 62% que tinham a mesma opinião quatro anos antes.

O Museu da Ciência de Londres anunciou que uma exposição permanente que será inaugurada este ano levará o nome de Galeria da Ciência do Clima e não Galeria das Mudanças Climáticas, como estava planejado. "Antes eu pensava 'oh, meu Deus, esse problema do clima é simplesmente aterrador'", disse o músico Jillian Leddra, de 50 anos. "Mas agora tenho dúvidas e me pergunto se exagerei na dose."

Talvez percebendo que o clima hoje é uma ideia sem muita chance de êxito em termos políticos, David Cameron, o novo primeiro-ministro conservador da Grã-Bretanha, esteve "estranhamente calado" com respeito ao tema na recente campanha eleitoral, nas palavras do jornal Daily Telegraph, ainda que tempos atrás a questão fosse uma de suas paixões.

De forma parecida, em uma pesquisa levada a cabo em janeiro sobre as prioridades pessoais de 141 candidatos do Partido Conservador, considerados capazes de vencer em seus distritos nas últimas eleições, se descobriu que a "redução da pegada de carbono da Grã-Bretanha" era um tema de importância menor.

Políticos e ativistas dizem que esse tipo de atitude dificultará a aprovação de uma legislação que inclua aumento de impostos sobre a gasolina ou para convencer a população que são necessários sacrifícios para reduzir as emissões de gases do efeito estufa. "A legitimidade passou para o lado dos céticos e isso é um grande, grande problema", disse Ben Stewart, porta-voz do Greenpeace, na reunião de ambientalistas em Londres. "Isso está ocorrendo em um contexto de um consenso abrumador da comunidade científica no sentido de que as mudanças climáticas são reais e nos ameaçam."

No Reino Unido, a notável mudança recebeu o impulso da intensa cobertura dos meios de comunicação sobre uma série de polêmicas sobre a ciência do clima, desenterradas e destacadas pelos céticos a partir de novembro do ano passado. Entre elas estão a divulgação não autorizada de mensagens de e-mail de proeminentes climatologistas britânicos da Universidade da Anglia Oriental, citados como prova pelos céticos de que os investigadores estavam exagerando a evidência do aquecimento global, e a descoberta de erros em um relatório sobre o clima das Nações Unidas.

Tempos depois, dois revisores independentes não encontraram evidências de que os pesquisadores da Anglia Oriental tivessem intencionalmente distorcido dados sobre o clima, mas a intensa cobertura da imprensa já havia deixado a impressão de que os cientistas haviam confabulado para manipular dados. Depois disso, o inverno foi excepcionalmente frio no norte da Europa e nos Estados Unidos, o que pode ter reforçado a percepção que a Terra não está se aquecendo. (Dados da Administração Nacional de Oceanos e da Atmosfera americana, NOAA, mostram que este inverno foi o quinto mais quente da história em todo o mundo.)

Quando lhe perguntaram sobre suas opiniões sobre o aquecimento global em noite recente, Brian George, um construtor de 30 anos do sul de Londres, respondeu de primeira: "Fez muito frio em janeiro, ou não?" Em uma entrevista por telefone, Nicholas Stern, ex-chefe dos economistas do Banco Mundial e especialista em clima, disse que a mudança de opinião "não era útil" para os esforços visando formular uma política firme em vários países. No entanto, prognosticou que isso seria superado, pois a ciência é muito clara a respeito da tendência de aquecimento global. "Esse não é um problema a longo prazo", disse. Em sua opinião, pelo menos na Grã-Bretanha os políticos "estão à frente da população". De fato, tão logo se tornou primeiro-ministro, David Cameron prometeu que faria "o governo mais verde da história do país", além de propor projetos como uma rede nacional de energia mais eficiente.

Ceticismo - Nesse ínterim, grupos de cientistas atentaram para as dúvidas da população e estão devolvendo as estocadas dos céticos com frequência cada vez maior. Um editorial publicado na prestigiosa revista científica Nature dizia que os céticos do clima estavam recorrendo "a todos os meios à disposição para minar a ciência e os cientistas", exortando aos pesquisadores que partissem para o contra-ataque.

No mês passado, Simon Lewis, especialista em bosques tropicais da Universidade de Leed, no Reino Unido, registrou uma queixa de 30 páginas na Comissão de Queixas da Imprensa, acusando o diário The Times de publicar "informação imprecisa, enganosa e distorcida" sobre as mudanças climáticas: sua própria investigação e comentários que ele havia feito a um repórter.

Não está claro se tais ações são suficientes para conquistar de novo um segmento da opinião pública que consumiu com impaciência uma série de revelações publicadas de forma destacada em jornais como o Times de Londres e o Telegraph e depois reproduzidas pelo mundo todo. Por exemplo, em janeiro, o Times criticou com dureza o painel das Nações Unidas sobre o clima por causa de uma projeção aventureira e sem sustentação pela qual os glaciares do Himalaia poderiam desaparecer no ano 2035.

No final das contas, a ONU pediu desculpas por haver incluído a projeção, mencionado de passagem dentro de um relatório de 3 mil páginas, divulgado em 2007. Depois surgiram artigos argumentando que o relatório era impreciso com respeito a diversos outros temas, incluindo secas na África, o risco de Holanda e Bélgica terem partes do território tragadas pelo mar, assim como o impacto econômico de tempestades. Funcionários do painel do clima disseram que as afirmações nos artigos eram ou falsas ou refletiam erros menores com referências equivocadas, que, de forma alguma, diluiriam a evidência de que as mudanças climáticas são reais e causadas pela atividade humana.

Stefan Rahmstorf, catedrático do Instituto Postdam de Investigação sobre o Impacto Climático, exigiu, com sucesso, em fevereiro, que alguns jornais alemães eliminassem artigos enganosos em seus sites na internet. No entanto, tais informes se tornaram tão comuns que agora não perderia meu tempo em expor a maioria dos casos, afirmou. A opinião pública está sozinha para lutar com as explosões entre os dois lados da questão. Ainda me preocupo com as mudanças climáticas, mas confesso que estou bastante confusa, disse Sandra Lawson, de 32 anos, enquanto passeava pelo Hyde Park.

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