Governo edita MP para regularizar 600 mil posses rurais até 2022

Publicado em 10/12/2019 17:59
MP moderniza e simplifica a regularização fundiária e incentiva a preservação ambiental. Medida Provisória foi assinada nesta terça-feira (10) no Palácio do Planalto

BRASÍLIA (Reuters) - Com uma meta de regularizar pelo menos 600 mil propriedades até 2022, o governo federal divulgou hoje a medida provisória que altera o sistema de regularização fundiária, facilitando a apresentação de documentos eletronicamente e restringindo as vistorias in loco, exigidas hoje, a casos em que há dúvidas sobre limites, legalidade da propriedade ou disputa de terras.

De acordo com o presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Geraldo de Melo Filho, a MP não altera os documentos exigidos atualmente, agrega a necessidade de inclusão da propriedade no Cadastro Ambiental Rural, mas permite que o material seja entregue em formato eletrônico.

Entre as exigências está a planta e memorial descritivo da propriedade assinada por profissional habilitado, o georreferencimento com as coordenadas da propriedade, assinado por profissional habilitado, o CAR e a comprovação de que a propriedade é produtiva, o que produz e de que foi ocupada "mansa e pacificamente" nos últimos cinco anos.

Além disso, não pode ter denúncia de trabalho escravo, embargo ambiental e nem ter disputa de áreas em terras indígenas, quilombolas ou de conservação ambiental, além do proprietário não ter outra propriedade.

A diferença, explica o presidente do Incra, é que as vistorias da documentação e das informações serão feitas por cruzamento de dados e imagens de satélite. Vistorias prévias e presenciais, no entanto, só serão exigidas em propriedades acima de 15 módulos fiscais --que podem ser de 400 hectares a 1.500 hectares, a depender da região do país.

Dentro desse limite, as visitas só serão feitas nos casos em que houver dúvidas ou disputas sobre o território, ou indícios de ilegalidade. A não ser nesses casos, a verificação de questões como se a propriedade está cumprindo as questões relacionadas à produção, por exemplo, devem ser feitas por imagens de satélite.

"O que você tinha (com a exigência de vistoria presencial) era uma legislação para não ser cumprida", diz Melo. "Era algo que ficava em uma mesa esperando um fiscal conseguir chegar até uma propriedade, muitas vezes remota. E mesmo lá ele possivelmente conseguiria ver menos do que por uma imagem de satélite."

A estimativa do Incra é de que o passivo hoje para titularização seja superior a 1,2 milhão de propriedades --pouco mais de 970 mil em assentamentos e outras 300 mil propriedades diversas. Até hoje, apenas 50 mil propriedades em assentamentos teriam sido regularizadas, segundo o presidente do Instituto.

O gargalo da titularização hoje ainda é o georreferenciamento, que precisa ser feito para cada propriedade para determinar a sua localização, limites e extensão. Hoje, em todo país, 147,3 mil propriedades já foram georreferenciadas, o equivalente a 10,5 milhões de hectares --10,2 milhões na Amazônia Legal. Mais de 3 milhões ainda precisam passar pelo mesmo processo.

 

AUTODECLARAÇÃO

A MP da regularização fundiária foi uma das metas apresentadas pelo governo Bolsonaro nos seus 100 dias, mas levou quase um ano para ser apresentada e chegou a ficar dois meses na Secretaria de Assuntos Jurídicos do Palácio do Planalto, enquanto o governo discutia uma versão do texto que não levasse a uma judicialização da questão.

Isso porque o texto inicial, preparado pelo secretário de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Nabhan Garcia, previa uma "autodeclaração" --um sistema em que o proprietário simplesmente apresentasse sua posse, recebesse o título e depois o governo fosse verificar se a declaração era verdade.

Apesar da pressão de Nabhan, ele foi derrotado. A conclusão teria sido de que a autodeclaração pura era juridicamente inviável. A análise chegou às cortes superiores, e a informação repassada ao governo é que nem o Superior Tribunal de Justiça (STJ) nem o Supremo Tribunal Federal iriam aceitar uma autodeclaração, o que levaria a uma enorme judicialização das decisões.

"Alguém pode ter usado isso em algum momento, mas não é o que apresentamos. Não existe autodeclaração. É um modelo robusto de legislação, melhoria de processo com uso de tecnologia", disse o subchefe de Articulação e Monitoramento da Casa Civil, Antônio José Barreto.

Uma das alterações do novo texto é a extensão do prazo-limite de ocupação da terra para que seja pedida a regularização. O programa anterior, Terra Legal --criado em 2008-- deu como data-limite aquele mesmo ano. A nova MP altera o prazo para maio de 2014. Segundo Melo, para que seja o mesmo do CAR.

Questionado como o governo iria identificar casos de terras ocupadas irregularmente, o subchefe de articulação da Casa Civil afirmou que a intenção é poder responsabilizar quem comete ilegalidades, o que não era possível fazer antes. Não respondeu, no entanto, o que será feito para evitar que terras griladas possam acabar sendo regularizadas.

O presidente do Incra esclareceu que o processo de titularização pode ser revertido até 10 anos depois de emitido o título no caso de descoberta de fraudes e outras irregularidades no processo, e o proprietário, processado.

Titulos definitivos serão distribuidos em 3 anos

O presidente Jair Bolsonaro assinou hoje (10), em cerimônia no Palácio do Planalto, a Medida Provisória (MP) que institui um novo programa de regularização fundiária do governo federal. O objetivo é conceder, ao longo dos próximos três anos, cerca de 600 mil títulos de propriedades rurais para ocupantes de terras públicas da União e assentados da reforma agrária. 

O número representa cerca de metade de uma estimativa de 1,2 milhão de posses precárias, incluindo cerca de 970 mil famílias assentadas que ainda não obtiveram título de propriedade e outros 300 mil posseiros em áreas federais não destinadas, segundo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), autarquia responsável pela execução do programa. 

A íntegra do texto deverá ser publicada na edição desta quarta-feira (11) do Diário Oficial da União (DOU), e entra em vigor de forma imediata, mas precisará ser aprovado pelo Congresso Nacional em até 120 dias para não perder a validade.

A ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina, durante a cerimônia de assinatura da medida provisória de regularização fundiária.
A ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina, durante a cerimônia de assinatura da medida provisória de regularização fundiária. - Carolina Antunes/PR

"Estamos colocando em prática, por meio dessa MP, uma medida de enorme alcance social. É uma medida importantíssima, porque responde a uma dívida que o Brasil tem com a sociedade. São pequenos produtores, em sua imensa maioria. A área média a ser regularizada por essa MP é de cerca de 80 hectares", afirmou a ministra da Agricultura, Teresa Cristina

Segundo o governo, a MP altera o marco temporal para a comprovação do exercício de ocupação e exploração direta. Pela redação anterior, para proceder a regularização, o ocupante precisaria comprovar que sua ocupação antecedia a data de 22 de julho de 2008. Com a alteração, o marco temporal passa a ser 5 de maio de 2014, que coincide com a data de publicação do Decreto nº 8.235/2014, que estabelece normas gerais complementares aos programas de Regularização Ambiental dos Estados e do Distrito Federal.

Em um breve discurso, em que recordou o trabalho de colonização agrícola promovido pelos governos militares, o presidente Jair Bolsonaro disse que a MP é uma forma de liberdade para que os produtores rurais possam empreender no campo. "Cada vez mais nós viemos fazer com que o Estado venha a sair da perseguição a quem produz, que ele ajude quem quer empreender em nosso país", disse. 

Análise informatizada

A Medida Provisória estabelece requisitos para a regularização fundiária de imóveis rurais de até quinze módulos fiscais, que é um unidade fixada para cada município, que pode variar de 180 hectares, em localidades da região Sul do país, até 1,5 mil hectares na Amazônia, por exemplo. 

O ocupante de uma área passível de regularização deverá, segundo o governo, apresentar uma série de documentos, entre os quais a planta e o memorial descritivo da área assinada por profissional habilitado, o Cadastro Ambiental Rural (CAR), além da comprovação de ocupação direta e pacífica anterior à data de 5 de maio de 2014, que poderá ser feita por meio de sensoriamento remoto (imagens de satélite). Nesses casos, após análise dos documentos, por meio de um sistema integrado que cruza informações de diversas bases de dados, o Incra poderá dispensar a realização de vistoria prévia na área. 

"Ele [ocupante] vai ter que provar que está há cinco anos, desde 2014, nesse imóvel. Terá que juntar imagem de satélite, juntar comprovante da sua inscrição de produtor rural. São inúmeros os documentos. Quando ele for apresentar lá no cartório de registro de imóveis, para ele obter seu título, sua escritura, sua matrícula, ele vai ter que apresentar a anuência dos confrontantes, tem que apresentar o georreferenciamento, tem uma série de exigências, mas que estão interligadas em um sistema informatizado, que vai ser muito mais rápido", explicou o secretário especial de regularização fundiária, Nabhan Garcia.

De acordo com o governo, o texto da MP vai prever vistoria obrigatória para os imóveis que sejam objeto de algum embargo ou infração ambiental, que tenham indícios de fracionamento fraudulento ou estejam envolvidos em algum conflito registrado na Ouvidoria Agrária Nacional. Também será obrigatória a vistoria para imóveis que sejam maiores do que 15 módulos fiscais.

Amazônia Legal

Na região da Amazônia Legal, a prioridade do governo é acelerar a titulação do programa Terra Legal, que soma cerca de 55 mil processos em andamento.  "Especificamente, a gente tem que tratar a demanda que a gente já tem, que tá colocada no Terra Legal, que são 55 mil processos aguardando análise, que a gente precisa carregar no sistema e fazer uma análise", disse o presidente do Incra, Geraldo Melo Filho.

O presidente do INCRA, Geraldo José da Camara Ferreira de Melo Filho,durante a cerimônia de assinatura da medida provisória de regularização fundiária
O presidente do INCRA, Geraldo José da Camara Ferreira de Melo Filho,durante a cerimônia de assinatura da medida provisória de regularização fundiária - Isac Nóbrega/PR

O novo programa de regularização fundiária também poderá receber cerca de R$ 175 milhões do fundo da Lava Jato. Criado para receber valores recuperados da Petrobras pela Operação Lava Jato, em acordo com os Estados Unidos, o fundo tem R$ 2,5 bilhões. O repasse dos recursos está em análise no Supremo Tribunal Federal (STF). 

"Serão R$ 35 milhões para o Incra, que vai investir na parte de tecnologia e equipamentos para esse procedimento, e R$ 140 milhões já vêm destinados para ser repassados para os estados, em ações voltadas à regularização fundiária no seus institutos estaduais de terra", afirmou o presidente do Incra. 

Parte dos títulos será concedida para assentados da reforma agrária

O Governo Federal deu início ao processo para regularização definitiva das ocupações em terras da União. Nesta terça-feira (10), foi assinada, no Palácio do Planalto, a Medida Provisória (MP) que simplifica e moderniza a análise necessária para a concessão de títulos, destinados, em sua maioria, a pequenos produtores - com destaque para os assentados. Ao mesmo tempo, a MP determina que os beneficiados cumpram o Código Florestal, transformando-os em parceiros no combate ao desmatamento ilegal.

A MP da Regularização Fundiária deve beneficiar cerca de 300 mil famílias instaladas em terras da União há pelo menos cinco anos. A área média dos terrenos a serem regularizados é de 80 hectares, considerados pequenas propriedades. Além de toda a documentação necessária para a regularização, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) utilizará ferramentas de georreferenciamento e sensoriamento remoto para concluir processos de titulação, garantindo eficiência na análise de documentos e rigor no cumprimento de normas fundiárias e ambientais.

Para a ministra Tereza Cristina (Agricultura, Pecuária e Abastecimento), a MP transforma os produtores rurais em parceiros na recuperação ambiental, pois todos terão de aderir às exigências do Código Florestal para garantir a titularidade da terra. “Se não cumprir o CAR [Cadastro Ambiental Rural], que exige de 20% a 80% de preservação, caso da Amazônia, perde o título. Então nós certamente teremos mais e mais aliados contra o desmatamento ilegal. É um ‘combo’: titulação e preservação”.

Ela também destacou que, com o título, os assentados são colocados em um novo patamar de inclusão produtiva, pois passam a ter acesso ao crédito e à tecnologia. “O pequeno produtor não estará mais condenado a produzir apenas para a subsistência; terá condições de prosperar e de vender sua produção para o mercado interno e até para o externo. Terá enfim oportunidade de fazer parte da pujança que o agro trouxe para a nossa economia.  Este é um compromisso que temos no Ministério da Agricultura e do qual não abro mão”, disse a ministra.

O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, ressaltou que a titulação da terra é a "Lei Áurea dos produtores rurais brasileiros". Segundo ele, a regularização fundiária da Amazônia foi um dos primeiros compromissos assumidos pelo presidente Jair Bolsonaro. "É isso que o governo Bolsonaro está entregando para Amazônia, para o Brasil e para o mundo. Esse é um momento histórico de mais de 100 anos", afirmou.

Ao apresentar as regras da MP, o presidente do Incra, Geraldo de Melo Filho, destacou que a regularização fundiária inicia o reconhecimento do direito de milhares de produtores rurais. "O nosso país sempre foi de cada brasileiro, mas hoje graças a determinação de Vossa Excelência começamos a reconhecer o direito de tantas pessoas de serem oficialmente donas do seu pedaço de Brasil”.

Para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), a MP traz três benefícios básicos: resolve definitivamente antigos problemas fundiários, regulariza a questão ambiental e coloca os assentados em um patamar de inclusão produtiva, permitindo que os agricultores ampliem sua produção além da subsistência. 

Segundo o Incra, há no país 9.469 assentamentos ocupando uma área de quase 88 milhões de hectares. Do total de assentamentos, implantados desde 1970, com a criação do instituto, apenas 5%  foram consolidados neste período e somente 15% dos assentados receberam o título definitivo da terra. Mais de 700 mil famílias não possuem a titulação e, por isso, não têm acesso a políticas públicas de estímulo à produção, como crédito rural.

A regularização coloca os produtores como parceiros na recuperação de áreas de preservação ambiental, pois serão obrigados a cumprir as exigências do Código Florestal para garantir a titularidade da terra. Para isso, terão que aderir ao Cadastro Ambiental Rural (CAR), que determina a preservação de até 80% da propriedade na Amazônia Legal, por exemplo, e aderir ao Programa de Regularização Ambiental (PRA), se comprometendo a recuperar áreas degradadas de sua terra.

A MP também impede a concessão da terra caso o terreno esteja em áreas específicas, como unidades de conservação, terras indígenas e quilombolas, e coloca outras restrições à posse, como não ser proprietário de outro imóvel, fracionamento fraudulento, conflito de fronteira (terras sobrepostas), ou haver denúncia de trabalho escravo.

CCIR Digital

A ministra anunciou também a criação do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) Digital, desenvolvido em parceria com o Serpro. A ideia é que o processamento da Declaração de Cadastro Rural passe a ser automática pelo sistema, com a emissão digital do CCIR no final do processo. 

A CCIR é o documento que comprova o cadastramento do imóvel rural junto ao Incra, e é indispensável para transferir, arrendar, hipotecar, desmembrar, partilhar e obter financiamento bancário.  

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Fonte:
Reuters/Agencia Brasil/Mapa

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