Venda antecipada vira seguro diante da crise
A maior parte dos negócios firmados até o momento é referente a operações de custeio de safra. Nessa modalidade de venda, o produtor troca com uma trading ou cooperativa parte da produção que será colhida no próximo ano por insumos para o plantio. Ao estabelecer essa relação de troca, faz uma espécie de hedge (proteção), na qual trava seu custo e fica sabendo, em sacas, quanto vai lucrar lá na frente, observa José Vicente Ferraz, diretor-técnico da Informa Economics FNP.
“O produtor esteve antenado e soube aproveitar os bons preços praticados no primeiro semestre. Preferiu abrir mão de lucros excepcionais para garantir seu custo, o que, na minha opinião, é uma excelente estratégia”, declara o analista. Ele explica que, diante da crise econômica, o mercado da soja vive um momento de incerteza e diz que “quem tiver oportunidade de reduzir riscos de mercado deve fazer isso correndo”.
Se, por um lado, os fundamentos apontam para cima, sinalizando que o balanço entre oferta e demanda de soja vai continuar apertado no ano que vem, por outro não se sabe ao certo como os preços das commodities agrícolas podem responder se o mundo mergulhar em um novo período de recessão econômica.
“Não acredito em uma queda forte, mas acho que as cotações vão se estabilizar em níveis um pouco inferiores aos atuais. Este é um bom momento para fazer hedge para o ano que vem”, recomenda o engenheiro agrônomo Mauro Ulian, diretor da corretora Futura em Maringá.
No Paraná, o mercado oferece atualmente ao produtor cerca de R$ 5 a mais pela saca de soja do que há um ano. No interior do estado, negócios para entrega em abril de 2012 são reportados perto de R$ 45, enquanto o mercado exportador no Porto de Paranaguá paga R$ 50 por saca de 60 quilos.
“O preço já chegou a R$ 55 neste ano. Recentemente, caiu a R$ 48 e agora voltou a subir. Mas o produtor ainda está esperando para ver se sobe mais. Até porque já vendeu bastante quando a soja estava acima de R$ 50”, relata Carlos Alexandre Gallas, operador de commodities da Intertrading, de Curitiba.
“A previsão de que o preço continuaria firme fez muitos produtores segurarem as vendas no mês passado. Em julho, previa-se que o mercado poderia explodir”, lembra o analista da Informa. Para Ferraz, os fundamentos da soja, de fato, apontam para cima. Ele diz que, “se fosse um ano normal, a chance de os preços subirem seria de 80% a 90%”. Mas alerta que, se a crise for forte, pode fazer o mercado tomar o caminho inverso.
“Só uma depressão poderia tirar totalmente a sustentação dos preços agrícolas”, ameniza. Ele avalia que as cotações da soja tendem a continuar firmes mesmo diante de uma recessão. “Neste momento, não dá nem para saber quão grave é a crise e, muito menos, para prever qual vai ser a resposta coletiva dos agentes do mercado caso ela se aprofunde”, pondera Ferraz.
Participação do produtor ainda é pequena
Os dados oficiais da Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros (BM&F Bovespa) mostram que os investidores pessoa física – produtores rurais, cooperativas ou investidores individuais, por exemplo – são minoria no mercado de derivativos agrícolas no Brasil. Na virada do mês, esse grupo detinha apenas 20% dos contratos vendidos de soja e 15% dos de milho. Na outra ponta, a de compra, participavam com 13% na oleaginosa e 38% no cereal.
“Produtor individual mesmo, acredito que não passe de 10%”, calcula Mauro Ulian, diretor da corretora Futura em Maringá. Ele revela, contudo, que muitos agricultores acabam participando do mercado indiretamente, por meio de tradings, cooperativas, cerealistas, abatedouros de frango ou indústrias de fertilizantes e adubos, por exemplo.
“O número de agricultores que atuam diretamente na Bolsa realmente é baixo. Geralmente, são produtores maiores, mais estruturados, que contam com ajuda de um técnico”, confirma Carlos Alexandre Gallas, operador de commodities da Intertrading, especializada em derivativos agropecuários. Ele confirma que apenas cerca de 10% dos clientes da empresa têm esse perfil.
Nos Estados Unidos, perto da metade dos produtores rurais usam a Bolsa para travar preços e a mesma safra de soja chega a ser negociada 12 vezes. “Percebemos que os agricultores são mais ativos aqui do que no Brasil. Mas também temos muitas estruturas de hedge feitas por elevadores e compradores, que são personagens muito mais agressivos em volume de negociação”, explica Tatiane Miglorini, analista do Price Futures Group, de Chicago.
No Brasil, segundo dados da BM&F Bovespa, menos de 1% da safra anual de milho passa pela Bolsa. Por dia, são negociados de 2 a 4 mil contratos, entre 50 e 100 mil toneladas do grão. Movimentação ainda menor é registrada na soja, que gira entre 200 e 400 contratos por dia, o equivalente a 5,4 a 10,8 mil toneladas/dia.
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