Carro de boi, poesia e saudade, por Osvaldo Piccinin
Às vezes chego a pensar que fui um carreiro em outra vida, de tanto que gosto das histórias, causos, músicas e poesias referenciando nosso carro de boi.
Dia desses, numa centenária fazenda, tive o desprazer de ver um deles literalmente apodrecendo no relento. Um filme de longa metragem passou pela minha cabeça. Esquecerem seu passado – pensei! Ninguém mais se lembra que ele transportou sonhos e progressos, que abriu picadas e novas estradas onde se formaram vilas e povoados. Muitas delas, atualmente, grandes metrópoles e famosas rodovias.
Procurei identificar alguns de seus componentes, mas foi em vão. O tempo sempre o tempo... Ajudado pelo sol, pela chuva e pelo ataque dos cupins o transformou num cacareco abandonado e sem vida. Suas rodas de cabreúva e seu assoalho de ipê praticamente desapareceram.
Onde estão seus cocões rangedores feitos da madeira canelão, baraúna, capixingui e outras apropriadas? Indaguei-lhe em pensamento. Silenciaram-se para sempre, tive como resposta também em pensamento. Seu gemido era ouvido há muitas léguas de distância, bem antes que despontasse no espigão. Sua azeiteira, feita de chifre de boi, estava sempre cheia de óleo de mamona, porque seu canto não podia parar. Na verdade, carro de boi que não canta não presta! É uma carroça de duas rodas puxada por bois, assim diziam os velhos carreiros, personagens imprescindíveis desta história.
O canto do carro de boi é na verdade, sua alma, é a alma do carreiro. Enfim é o jeito que Deus deu para enfeitar a presença dos bois e dos carreiros pelos caminhos do sertão. Engana-se quem acha que o carro de boi canta de tristeza ou por boniteza, ele canta é por precisão. Sua cantoria é de berço, pois já nasce cantando. Quando encostado debaixo da figueira, sonha com seu próprio canto!
Seja qual for o tom da cantoria entoada, que a bem da verdade se resumem em três: pombo que é médio e macio, gaita que é fino e alto e o baixão que é grosso e grave. Os carros de bois possuem uma linha direta com Deus e com a pureza da alma cabocla. Uma pena que esta tradição tanto da construção como do seu uso não esteja deixando herdeiros. Aos poucos sua cantiga vai se tornado amarga e seus cocões rangedores chegando ao fim, silenciando-se para sempre na longa e poética estrada da vida.
Os nomes dados aos bois eram escolhidos com critério e muito amor: Fumaça, “Maiado”, Formoso, Barroso, Pitanga e por aí vai. Eram escolhidos pela sua raça, bravura, docilidade e cor. Enfim no jeitão de ser de cada um. Eram capados e amansados para carrear ao redor dos três anos e meio de idade. Sempre tratados com carinho e respeito. Carreavam mesmo quando não tinha serviço, senão engordavam, perdiam a força e o traquejo da lida pesada.
Meu avô costumava dizer que carreiro bom não espetava o boi até tirar sangue, apenas ponteava e depois o bicho se mexia só pelo barulho das argolas da vara do ferrão.
Carro de boi e seu carreiro, eu infelizmente não vivi o auge de seus apogeus, nem o glamour de suas serventias. Sinto inveja de quem teve este privilégio! Eu gostaria muito de ter tido a inspiração que tantos poetas e compositores sertanejos tiveram ao render-lhes singelas, mas sinceras homenagens. Mas este é um don concedido por Deus, à poucos.
Gostaria de ter encontrado palavras mais sábias e poéticas para lhes prestar tributos, mas isso também é para poucos iluminados. Mesmo assim deixo aqui meu respeito por tudo que fizeram para que nosso “Brasilzão” fosse o que é hoje - um grande celeiro do mundo ponteado de cidades e estradas por todos os cantos.
“Carro de boi já vai, gemendo lá no estradão, suas grandes rodas fazendo, profundas marcas no chão, vai levantando poeira, poeira vermelha, poeira do meu sertão”.
E VIVA O CARRO DE BOI E SEU CARREIRO!
Rogério Corrêa Brasília - DF
Parabéns pelo texto Osvaldo Piccinin!
Também sou mais um apaixonado pelo carros de boi, sua história e festividades com esse nobre transporte que quase foi extinto. Recentemente lancei o livro “Festas de Carros de Boi” que vem de encontro a uma lacuna existente quanto aos assuntos abordados, a paixão pela nossa cultura e pelo carro de boi. Pois, muitos pensavam que, com os meios de transportes modernos e evolução tecnológica, os carros de boi e as suas cantigas peculiares iriam desaparecer, e só os encontrariam em museus, telas de pinturas ou esquecidos em fazendas antigas. Contudo, ocorreu uma reinvenção para o uso dos carros de boi, saíram do labutar para o festejar. Neste trabalho o autor mergulha na sua história, na cultura de um povo, e com riqueza de detalhes e fotografias, mostra o porquê das Festas de Carros de Boi fazerem parte do calendário cívico de algumas cidades Brasileiras. Especialmente, por encantar todos os participantes e visitantes de vários lugares do Brasil e do exterior, independente do sexo e idade. É paixão a primeira vista, seja pela cultura, pela tradição, por curiosidade, pelo festar e por ter se tornado um acontecimento histórico. Para divulgar festas de carros de boi e pesquisá-las criei alguns blogs, convido você e seus leitores para conhecê-los: Rogério Corrêa http://rogerioscorrea.blogspot.com/ http://festadocarrodebois.blogspot.com/ http://carrodebois.wordpress.com http://ocarrodeboi.blogspot.com/ [email protected]alexandre São José dos Campos - SP
pois bem eu hoje há 15 anos longe desse que pra me era o premeiro trasnporte
na minha infancia, moro na cidade, com vivo todos os dias com este transito de são paulo, pra me e mais que sastifastorio, e um orgulho ver que por muito tempo os que conhecero o carro de boi, aimda comenta com saudades pois todas as vezes que vou visita meu pai que mora na roça. faço questão de bota uma boa pareia de boi no velho carro de boi, só para matar as saudades. abraços a todos que poderão um dia comviverão com essa maravilha..JADER LUIZ TOLOTTI Sorriso - MT
Dificil ler esta mensagem e nao lembrar do passado nao,por incrivel que pareça tive alguns anos da minha vida um contato direto, com o verdadeiro carro de boi la naquelas regioes montahosas do rio grande do sul, onde faziamos toda a lavoura a base ´da famosa junta de boi´.sendo isso a mais ou menos 20 anos a tras.Dificil e nao arepiar, meus parabens pelo texto maravilhoso.
juscelino valadares Belo Horizonte - MG
Só mesmo em poesia o carro de boi vai fazer poeira. Eu sou muito jovem ainda, só 47, mas cheguei a ser o candieiro ou o guia dos bois, segurei o cabo do arado, serviço dos mais pesados, e lotei muito carro de boi a balaio de milho e sacas de feijao. Mas nao vi a poeira de carro de boi nenhum.Isso tudo lá em Pompeu-MG, aqui pertinho de BH.
Abraços sr Osvaldo.Marcos Flávio de Oliveira Souza Teixeira de Freitas - BA
Bonita mensagem e apesar de não ter convivido com o carro de Boi, meu sogro viveu muito isto e me contava belas histórias de sua vida de carreiro...
Ao Osvaldo amigo e colega da Assodeere, meus sinceros aplausos!!! Marcos Flávio Souza - Lipetral - Teixeira de Freitas - BA.MISAEL DELIO DA SILVA Unai - MG
- Muito bonita sua mensagem, sou Presidente da Associacao dos Carreiros e Candeeiros do Noroeste de Minas, com sede em Unai-MG, onde realizamos a 13 anos a nossa tradicional festa do Carro de Bois e Moagem de Cana, temos um site www.carrodeboi.com.br, onde divulgamos nossa tradiçao. Parabens pela sua mensagem.
Jose Roberto Pereira da Silva Uberlândia - MG
Esse é meu amigo Osvaldo, para nós íntimos da ESALQ, mais precisamente a F73, o Ibaté. Com seu linguajar simples conta histórias e causos que nos remetem a nossa infância e adolescência, deixando-nos hipnotizados. É impossível só ler, sem voltar ao passado e imaginar aquilo que está nas palavras tão bem escolhidas na narrativa. É uma viagem ao tempo e a cada volta rejuvenescemos. Voce está acima dos poetas, faz isso por prazer, tirando do coração o que escreve. Parabéns.
Luiz Carlos Lopes Ferreira Campo Grande - MS
Meu colega Osvaldo, parabéns mais uma vez, que beleza!!!!!
Ricardo A. A. Gonçalves Maringá - PR
Parabéns pelo texto, muito bom... sou um apaixonado pelas coisas do sertão também. Apesar de ser jovem e não ter vivido muito essas coisas do caboclo, me recordo do meu avô (José Gonçalves) que sentado envolta de uma mesa de madeira bruta, me contava todas essas história já vivida por ele. Isto me fez adimirar e principalmente valorizar as coisas simples e dura que o sertão tem, hoje em tudo que vou fazer tento colocar as coisas de antigamente e esse jeito de ser, principalmente para não deixar essa cultura morrer.
Paulo Roberto Castro de Carvalho Foz do Iguaçu - PR
Carro de boi, poesia e saudade.
Aqueles que tiveram o privilégio de escutar de perto o canto de um velho carro de boi, ou de aguentar seus solavancos agarrado sobre sua mesa, como fiz em minha infância nos gotões sul mineiros, derramam lágrimas de saudade após ler esse texto. Paulo Roberto - Foz do Iguaçu - PR