Soja: O que esperar da China? Contínua demanda forte, inclusive, pela necessidade política

Publicado em 07/04/2021 15:42 e atualizado em 08/04/2021 08:19

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Com a China menos presente neste momento fazendo novas compras de soja entre os seus principais fornecedores - Brasil e Estados Unidos - o mercado se pergunta o que esperar da demanda neste momento. Analistas e consultores já afirmaram que o "pé no freio" do momento é, de fato, pontual e que a tendência é de que as compras voltem a se intensificar entre o terceiro e quarto trimestres do ano para garantir seu abastecimento adequado. 

A garantia, todavia, vem também de outro lado, como explica Roberto Dumas Damas, economista especializado em economia internacional e professor do Insper. "A China continua comprando alimentos (ou matéria-prima para produzi-los) para garantir que sua população esteja bem alimentada e para evitar tensões sociais. Política, comida e sociedade andam muito juntas", diz.

O governo, ainda segundo Dumas, não vai permitir qualquer falha neste setor, por menor que seja, "porque se trata de uma questão de legitimidade do partido". E "informações como estas que também temos que fazer chegar aos produtores rurais", complementa o economista com larga experiência sobre a nação asiática. 

E essa continuidade das compras, mesmo que não de soja neste momento, se deve também a outros fatores fundamentais, como novos casos de Peste Suína Africana e de outras zoonoses que estão sendo identificados na China. O cenário tem diminuído o alojamento de matrizes no país, e comprometeu o ritmo da recuperação dos planteis como estava inicialmente previsto depois do surto mais agressivo da PSA. 

"Segundo levantamentos da consultoria Yongyi, a população de matrizes de suínos na China registrou queda de 4,99% em janeiro na comparação mensal e queda de 4,68% em fevereiro, números consistentes com o movimento dos preços do leitão (+30%), da carne (-22%) e do farelo de soja (-13%) no mercado chinês nos últimos dois meses. A consultoria também tem observado redução de 25% no peso médio das carcaças para 90 Kg", informa a Agrinvest Commodities

Ainda assim, como disse com exclusividade ao Notícias Agrícolas o trader do Ramax Group, Gabriel de Freitas, que trabalha na China, tais condições não deverão limitar o potencial importador do país. 

"É difícil que o país atinja a autossuficiência desejada para a produção de carne suína, e jamais estará bem abastecido no curto e médio prazo no estoque de soja e milho", diz. 

Reveja a íntegra de Gabriel de Freitas:

+ China segue com espaço para importação de carnes, soja e milho, diz especialista

E isso se dá mesmo diante de um pedido recente do Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais da China aos especialistas em nutrição animal que busquem formulações de ração que utilizem menos milho e farelo de soja. 

Para o atual ano comercial, o USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) estima importações de soja da China em 100 milhões d toneladas, enquanto analistas e consultores de mercado esperam mais do que isso. 

Para o milho, o departamento já sinaliza um aumento de suas vendas externas para 67,3 milhões de toneladas, motivado, principalmente, pela continuidade da demanda chinesa pelo cereal. No entanto, alguns fatores poderiam sinalizar a não repetição das importações da China na casa das 24 milhões de toneladas, ainda de acordo com a Agrinvest. 

"A China está fazendo um esforço interno a fim de substituir o uso do milho", explica a consultoria. O país asiático, no acumulado de 12 meses até fevereiro, já registra um recorde de importação de outros cereais que chega a 24,7% milhões de toneladas, volume que é 162% maior se comparado ao ano anterior. E paralelamente, há ainda a atuação no mercado interno através de leilões. 

O movimento impacta também o consumo do farelo de soja. "A maior utilização de cereais com maior percentual de proteína está reduzindo o uso de farelo de soja. A prova disso vem através do maior uso de óleo de soja nas rações por conta do balanço energético", complementa a Agrinvest. 

Dessa forma, com a necessidade latente, o que esperar da China quando o assunto é demanda por grãos? O Notícias Agrícolas consultou alguns analistas de mercado para chegar a um denominador comum, sempre levando em conta que a demanda da maior consumidora global de commodities agrícolas e de alimentos de uma forma geral é ainda muito forte, crescente, e fundamental para o bom andamento político e econômico da nação. 

Matheus Pereira, Diretor da Pátria Agronegócios 

"Vivemos um momento sazonal, onde batemos os picos de compra entre março e maio, provavelmente com os maiores picos em abril. Estamos passando agora o pico das exportações da soja brasileira, com o maior volume em direção à China. Temos que lembrar que, somente em 2021, foram embarcadas mais de 15 milhões para a China, que continua sendo a maior compradora, a principal, nada muda. Mas, a cada dia que nos aproximamos da virada de ano (comercial) há um arrefecimento da demanda chinesa pela soja brasileira, se voltando ao produto norte-americano", diz.

Atualmente, a oleaginosa brasileira ainda é a mais barata do mundo para embarque de curto prazo, com a demanda ainda concentrada aqui no Brasil. O cenário começa a mudar a partir de julho, agosto, com produto mais barato começando a ser ofertado pelos EUA. 

"Nosso lineup está no limite do que é capaz de colocarmos pra fora do Brasil de soja e traçando com um paralelo com o mercado de milho, vemos que há três ou quatro semanas, pouco se embarca de milho nos portos brasileiros, com toda nossa capacidade logística concentrada no escoamento de soja", complementa.

Sobre os impactos da PSA, Pereira afirma que o mercado vê o governo chinês muito mais ágil no controle e combate de novos possíveis surtos da doença do que no passado, dado seu conhecimento maior sobre os casos depois da epidemia de 2019. 

Luiz Fernando Gutierrez, Analista de Mercado da Safras & Mercado

Gutierrez também destaca o impacto limitado da Peste Suína Africana sobre a demanda chinesa de soja. "Estamos com compras chinesas fortes, bastante soja para embarcar em abril, maio, embora ainda sem os registros tudo indica o mês muito forte. Então, não vemos grandes problemas com a demanda chinesa".

Caso a situação se agrave, piore, o impacto poderia vir, porém, não há perspectivas de que probelmas possam ser observados a partir dessas condições sobre as aquisições de soja por parte dos chineses. 

"A demanda chinesa está estacionada nos portos brasileiros, não estão comprando nada dos EUA praticamente, e isso pode ser visto nos nossos lineups, que estão bastante fortes e vamos continuar a ver nas próximas semanas e meses porque estamos no auge das nossas exportações".  

Victor Martins, Analista Chefe da AgResource Brasil

"O mercado está olhando, basicamente, os focos de peste suína, sobretudo, no sul da China, que é o grande polo dos planteis. E já estamos ouvindo relatos de aumentos de focos em províncias mais pobres da China que trouxe um pouco de pavor ao mercado, fazendo com que os futuros do farelo caíssem na Bolsa de Dalian, as margens ficassem muito negativas,  mas na prática não é isso que estamos vendo", explica. 

As margens também estão negativas, segundo Martins, porque se comprou soja mais cara, os estoques de farelo estavam mais altos - e já estão se exaurindo - os estoques de soja da China são os menores desde 2015 e o país já está sentindo essa ausência do produto brasileiro em função dos atrasos que vinham sendo registrados nos embarques. 

"Olhando o G3 - Brasil, Argentina, Estados Unidos - temos um acumulado de soja embarcada para a China de 50,3 milhões de toneladas, um recorde histórico. A China nunca importou tanta soja de outubro ao início de abril, um aumento no desempenho de 16% em relação à temporada passada, o que equivale a 7 milhões de tonelada, e o que corresponde a 50% do programa de importação chinês estimado pelo USDA em apenas seis meses", afirma o analista. 

FLUXO DA SOJA BRASILEIRA

O mapa de navios carregados com soja, origem Brasil, mostra a intensidade do fluxo da oleaginosa nacional com a maior parte das embarcações com destino China. E esse incremento na quantidade de graneis carregando soja para os chineses neste momento se deve a um melhor ritmo de embarque de se deu nos portos do país em março, quando o Brasil embarcou uma quantidade recorde de soja para o mês. 

Foram quase 13,5 milhões de toneladas, de acordo com os números da Secex (Secretaria de Comércio Exterior). E os lineups sinalizam que, em abril, o volume pode ser ainda maior, já que muito foi 'rolado' para este mês dados os atrasos observados no início do ano. 

Mapa de navios - Soja Brasil

Fonte: Refinitiv - LSEG

O gráfico abaixo da Refinitiv - LSEG (London Stock Exchange Group) mostra que os embarques da commodity poderiam superar 15 milhões de toneladas (barra amarela) ao seguir o ritmo em que estão acontecendo. Confirmado, o total pode superar o registrado em abril de 2020. 

Gráficos fluxo da soja BR x EUA

Fonte: Refinitiv - LSEG

Na terceira imagem é possível observar as exportações de soja do Brasil divididas por destinos e a China destacada nas barras amarelas. O volume também supera o registrado há um ano e deixa claro os picos das compras da nação asiática nos primeiros meses do ano no mercado brasileiro. 

Gráficos fluxo da soja BR x EUA

Fonte: Refinitiv - LSEG

FLUXO DA SOJA AMERICANA

Em fevereiro, as exportações de soja norte-americana foram de 4,56 milhões de toneladas, volume 5% maior do que a média dos últimos cinco anos para o mesmo mês. Do total, 30% teve a China como destino e, em contrapartida, o total que foi para outros destinos bateu recorde. 

Gráficos fluxo da soja BR x EUA

Fonte: Karen Braun

Assim, o total de 1,39 milhão de toneladas embarcadas ao chineses em fevereiro (indicado na linha preta do gráfico abaixo) marca o segundo menor volume desde 2004 para o período, segundo informa a especialista internacional em commodities agrícolas, Karen Braun. "No entanto, essa 'redução' chega depois de um espetacular intervalo de dezembro a janeiro de embarques de 12,25 milhões de toneladas, 22% mais do que a máxima anterior para o período", diz. 

Exportações soja EUA - China Fev21

Fonte: Karen Braun

No intervalo de setembro de 2020 a fevereiro de 2021 - primeira metade do ano comercial 2020/21 dos EUA -, o país  exportaram 54,05 milhões de toneladas, com 64% deste total com destino a nação asiática. O total supera em 21% sobre a safra 2016/17.

Gráficos fluxo da soja BR x EUA

Fonte: Karen Braun

E na primeira metade da temporada comercial dos EUA - setembro a fevereiro -, as exportações norte-americanas para a nação asiática somaram um recorde de 34,7 milhões de toneladas, superando a máxima anterior, registrada na safra 2016/17, em 9%. Até 25 de março, a China já tinha comprometidas 36,05 milhões de toneladas da oleaginosa 2020/21 dos EUA, ainda segundo explica Karen Braun. 


Acumulado China-EUA - Exportações de soja 2020/21

Fonte: Karen Braun

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Por:
Carla Mendes | Instagram @jornalistadasoja
Fonte:
Notícias Agrícolas

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