No sertão nordestino, celular faz sucesso mesmo sem sinal
O celular não funciona em Calumbi, cidade do sertão pernambucano com 7 mil habitantes, a 408 quilômetros do Recife. Mas isso não impede que um dos itens recordistas de vendas no maior mercado da cidade sejam os cartões de recarga de celular. "Vendo mais do que molho de tomate. São R$ 3 mil por mês", diz Ivo Nunes da Silva, dono do Opção. Em Flores, a 20 quilômetros dali, apesar de a telefonia móvel também não ter chegado ainda, duas lojas da cidade têm celulares em suas vitrines. Elas vendem 30 aparelhos por mês para os 22 mil florenses que, assim como os vizinhos calumbienses, estão ávidos pela chegada do sinal.
Hoje, segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel ), 1.190 dos 5.564 municípios brasileiros não contam com o serviço de telefonia móvel. São cidades pequenas, com menos de 30 mil habitantes, mas que juntas abrigam 12,1 milhões de pessoas, o equivalente à soma das populações de Pernambuco e da Paraíba. Mas até abril de 2010, florenses, calumbienses e tantos outros "enses" conseguirão falar pelo aparelho. Esse é o prazo máximo que o órgão regulador deu para as operadoras de telefonia móvel chegarem aos grotões do Brasil.
Para cumprir a missão de alcançar cidades fincadas em lugares quase inacessíveis, as operadoras TIM, Vivo, Claro e Oi estão explorando percursos que lembram aventuras de rali, safari e alpinismo. "A maior dificuldade é de logística. Já tivemos de alugar balsa, trator e até jegue. Em certos lugares, esses são os únicos meios possíveis de se transportar equipamentos para a construção das torres", diz Leonardo Capdeville, diretor de redes da Vivo. A operadora tem 458 municípios para atender, sendo metade deles neste ano, segundo exigência da Anatel.
Outro empecilho é a transmissão. Cada antena que recebe o sinal de telefonia está conectada às redes das operadoras por meio de fibra ótica, geralmente já usada pelas concessionárias de telefonia fixa. Entretanto, há lugares sem comunicação fixa ou com capacidade de tráfego inferior à necessária. "Nesses casos, temos de recorrer à transmissão via satélite, que é mais difícil e cara", afirma Christian Wickert, gerente de planejamento da Claro. Nenhuma operadora quis dizer o quanto está investindo no projeto.
Vencidos os obstáculos, porém, as empresas têm sido recebidas de braços abertos nos lugares aonde chegam. Prefeitos solícitos, por exemplo, ajudam no transporte das antenas. E não são raros os casos em que a operadora precisa marcar horário para falar com o alcaide no orelhão, já que a prefeitura não conta com telefone fixo. "A demanda existe. Essas pessoas estão sedentas por comunicação", avalia Rogério Takayanagi, diretor de marketing da TIM.
"Aqui na cidade quase ninguém tem telefone fixo porque é muito caro", explica Daniela Santana de Sousa, gerente da loja Movelar, que vende celulares em Flores. Entre os clientes estão pessoas que se locomovem pela região, passando por municípios com sinal, como Serra Talhada, a 30 quilômetros dali, ou Triunfo, a 20 quilômetros.
Esse é o caso do comerciante Argemiro Moura, que mora em Itapetim (PE), onde o sinal não chega. "O celular faz muita falta porque, sem ele, meus clientes e fornecedores não podem me encontrar a toda hora. Por isso, quando viajo, levo o telefone comigo", diz ele, dono de uma loja de material de construção.
Em Solidão (PE), os telefones móveis só funcionam em poucas partes da cidade, o que não impede que moradores tenham um aparelho. "É assim: o Claro pega na parte alta da praça, e o TIM, na entrada da cidade. É só ficar com o braço erguido procurando o sinal", explica a professora Maria Aparecida da Silva, que não tem telefone em casa, só um celular.
A novidade é tão esperada pelos sertanejos pernambucanos que virou promessa política. Em caravana pelo sertão, no mês passado, o governador Eduardo Campos afirmou que estava concedendo incentivos para que as operadoras antecipassem suas metas. Os deputados federais Gonzaga Patriota e Ana Arraes, ambos do PSB, também subiram no palanque de Campos para dizer em Itapetim que trabalharam para que o serviço se tornasse obrigatório em cidades com menos de 30 mil habitantes.
Mas será que quando o sonho e as promessas políticas virarem realidade o uso dos celulares nos rincões engordará o lucro das operadoras? Ninguém se arrisca a dizer que sim. O Produto Interno Bruto per capita das cidades pernambucanas citadas nesta reportagem, por exemplo, fica entre R$ 2 mil e R$ 3 mil, enquanto no Recife alcança R$ 12 mil. "O impacto social desse tipo de serviço é inegável, mas é normal que em alguns municípios não seja rentável", diz Wicket, da TIM.
A Anatel só conseguiu fazer as operadoras levarem o serviço tão longe porque associou o leilão da telefonia de terceira geração (3G) à cobertura das cidades com menos de 30 mil habitantes. É essa tecnologia que deve cobrir os custos da telefonia nos rincões. Por isso, no fim de 2007, Vivo, Claro, TIM e Oi tiveram de dividir cerca de 1,8 mil cidades, com o compromisso de servir metade delas até abril deste ano e o restante até abril de 2010.
Em diversas rodadas, cada empresa podia escolher apenas 5% dos municípios. Como num primeiro momento apenas uma operadora funcionará em cada cidade, as empresas buscaram assumir municípios que fossem um próximo ao outro. "Além de aumentar o tráfego de uma região, isso reduz o custo de implantação", diz Capdeville, da Vivo.
As operadoras também estão de olho na oferta de outros serviços, além do esperado celular. É o caso da internet em alta velocidade. A TIM também analisa vender telefone fixo com a estrutura montada para celular. Para a professora Neide Souza Barbosa, moradora de Quixaba (PE), nem precisa de tudo isso. Basta um celular para ela conseguir falar com os dois filhos que transitam pelas redondezas sem dar notícias.
Fonte: Carolina Mandel, de Flores e Calumbi (PE)
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