Mensalão: "Nos Estados Unidos, cadeia é para todos", por Augusto Nunes

Publicado em 14/10/2012 18:42 e atualizado em 27/05/2013 15:19
por Augusto Nunes, na coluna Direto ao Ponto, em veja.com.br

Direto ao Ponto

Nos Estados Unidos, cadeia é para todos

Os americanos sabem há muito tempo o que o Brasil está descobrindo graças ao julgamento do mensalão: cadeia é para todos, sejam quais forem o sobrenome, as dimensões da conta bancária, o círculo de amizades ou o currículo que precedeu a abertura do prontuário. Confira a reportagem de André Petry na seção O País Quer Saber

 

Outra grande aula de Marco Antonio Villa: ‘Os marginais do poder’

Leia o artigo publicado por Marco Antonio Villa no Estadão deste sábado. Mais uma vez, meu brilhante parceiro de debates sobre o julgamento do mensalão foi direto ao ponto. (AN)

Vivemos um tempo curioso, estranho. A refundação da República está ocorrendo e poucos se estão dando conta deste momento histórico. Momento histórico, sim. O Supremo Tribunal Federal, simplesmente observando e cumprindo os dispositivos legais, está recolocando a República de pé. Mariana ─ símbolo da República Francesa e de tantas outras, e que orna nossos edifícios públicos, assim como nossas moedas ─ havia sido esquecida, desprezada. No célebre quadro de Eugène Delacroix, é ela que guia o povo rumo à conquista da liberdade. No Brasil, Mariana acabou se perdendo nos meandros da corrupção. Viu, desiludida, que estava até perdendo espaço na simbologia republicana, sendo substituída pela mala ─ a mala recheada de dinheiro furtado do erário.

Na condenação dos mensaleiros e da liderança petista, os votos dos ministros do STF têm a importância dos escritos dos propagandistas da República. Fica a impressão de que Silva Jardim, Saldanha Marinho, Júlio Ribeiro, Euclides da Cunha, Quintino Bocayuva, entre tantos outros, estão de volta. Como se o Manifesto Republicano de dezembro de 1870 estivesse sendo reescrito, ampliado e devidamente atualizado. Mas tudo de forma tranquila, sem exaltação ou grandes reuniões.

O ministro Celso de Mello, decano do STF, foi muito feliz quando considerou os mensaleiros marginais do poder. São marginais do poder, sim. Como disse o mesmo ministro, “estamos tratando de macrodelinquência governamental, da utilização abusiva, criminosa, do aparato governamental ou do aparato partidário por seus próprios dirigentes”. E foi completado pelo presidente Carlos Ayres Brito, que definiu a ação do PT como “um projeto de poder quadrienalmente quadruplicado. Projeto de poder de continuísmo seco, raso. Golpe, portanto”. Foram palavras duras, mas precisas. Apontaram com crueza o significado destrutivo da estratégia de um partido que desejava tomar para si o aparelho de Estado de forma golpista, não pelas armas, mas usando o Tesouro como instrumento de convencimento, trocando as balas assassinas pelo dinheiro sujo.

A condenação por corrupção ativa da liderança petista ─ e por nove vezes ─ representaria, em qualquer país democrático, uma espécie de dobre de finados. Não há no Ocidente, na História recente, nenhum partido que tenha sido atingido tão duramente como foi o PT. O núcleo do partido foi considerado golpista, líder de “uma grande organização criminosa que se posiciona à sombra do poder”, nas palavras do decano. E foi severamente condenado pelos ministros.

Mas, como se nada tivesse acontecido, como se o PT tivesse sido absolvido de todas as imputações, a presidente Dilma Rousseff, na quarta-feira, deslocou-se de Brasília a São Paulo, no horário do expediente, para, durante quatro horas, se reunir com Luiz Inácio Lula da Silva, simples cidadão e sem nenhum cargo partidário, tratando das eleições municipais. O leitor não leu mal. É isso mesmo: durante o horário de trabalho, com toda a estrutura da Presidência da República, ela veio a São Paulo ouvir piedosamente o oráculo de São Bernardo do Campo. É inacreditável, além de uma cruel ironia, diante das condenações pelo STF do núcleo duro do partido da presidente. Foi uma gigantesca demonstração de desprezo pela decisão da Suprema Corte. E ainda dizem que Dilma é mais “institucional” que Lula…

Com o tempo vão ficando mais nítidas as razões do ex-presidente para pressionar o STF a fim de que não corresse o julgamento. Afinal, ele sabia de todas as tratativas, conhecia detalhadamente o processo de mais de 50 mil páginas sem ter lido uma sequer. Conhecia porque foi o principal beneficiário de todas aquelas ações. E isso é rotineiramente esquecido. Afinal, o projeto continuísta de poder era para quem permanecer à frente do governo? A “sofisticada organização criminosa”, nas palavras de Roberto Gurgel, o procurador-geral da República, foi criada para beneficiar qual presidente? Na reunião realizada em Brasília, em 2002, que levou à “compra” do Partido Liberal por R$ 10 milhões, Lula não estava presente? Estava. E quando disse ─ especialmente quando saiu da Presidência ─ que não existiu o mensalão, que tudo era uma farsa? E agora, com as decisões e condenações do STF, quem está mentindo? Lula considera o STF farsante? Quem é o farsante, ele ou os ministros da Suprema Corte?

Como bem apontou o ministro Joaquim Barbosa, relator do processo, o desprezo pelos valores republicanos chegou a tal ponto que ocorreram reuniões clandestinas no Palácio do Planalto. Isso mesmo, reuniões clandestinas. Desde que foi proclamada a República, passando pelas sedes do Executivo nacional no Rio de Janeiro (o Palácio do Itamaraty até 1897 e, depois, o Palácio do Catete até 1960), nunca na História deste país, como gosta de dizer o ex-presidente Lula, foram realizadas na sede do governo reuniões desse jaez, por aqueles que entendiam (e entendem) a política motivados “por práticas criminosas perpetradas à sombra do poder”, nas felizes, oportunas e tristemente corretas palavras de Celso de Mello.

A presidente da República deveria dar alguma declaração sobre as condenações. Não dá para fingir que nada aconteceu. Afinal, são líderes do seu partido. José Dirceu, o “chefe da quadrilha”, segundo Roberto Gurgel, quando transferiu a chefia da Casa Civil para ela, em 2005, chamou-a de “companheira de armas”. Mas o silêncio ensurdecedor de Dilma é até compreensível. Faz parte da “ética” petista.

Triste é a omissão da oposição. Teme usar o mensalão na campanha eleitoral. Não consegue associar corrupção ao agravamento das condições de miséria da população mais pobre, como fez o ministro Luiz Fux num de seus votos. É oposição?

 

O Brasil Maravilha que Lula criou quer ser Venezuela quando crescer

A mais recente nota oficial da direção do PT informa que a reeleição de Hugo Chávez e o crescimento do partido nos grotões compensaram amplamente o suado segundo lugar em São Paulo, o fiasco em Belo Horizonte, o naufrágio no Recife e outros desastres entalados na garganta de Lula. Por exemplo, a vergonhosa performance em São Luiz do Maranhão do bando que juntou a Famiglia Sarney ao que há de pior na seitalulopetista. Ou a derrota do companheiro Claudinho da Geladeira em Rio Grande da Serra, cujo eleitorado resolveu ignorar as ordens do palanque ambulante.

Confiram um trecho do palavrório: “O desempenho do PT no primeiro turno das eleições municipais brasileiras, assim como a vitória do Grande Polo Patriótico nas eleições presidenciais venezuelanas igualmente realizadas no dia 7 de outubro, confirmam a força da esquerda democrática, popular e socialista latinoamericana e caribenha”. Confiram agora o vídeo publicado na seção História em Imagens. É mais uma prova contundente de que, na democracia bolivariana, os eleitores podem votar em qualquer um, desde que se chame Hugo Chávez.

Os devotos sabiam que o Brasil parido e criado por Lula é uma maravilha. Agora sabem que, aos 10 anos, resolveu ser Venezuela quando crescer.

 

Direto ao Ponto

Mostra de Caravaggio no Palácio do Planalto: Dilma Rousseff, crítica búlgara, analisa o mestre do claro-escuro com uma visão inédita e complexa: “Ele é, sem sombra de dúvida, um grande pintor”

CELSO ARNALDO ARAÚJO

A expertise da presidente como monitora de artes já tinha sido demonstrada na visita da finada Hebe ao Palácio do Alvorada – durante a qual, por muito pouco, ela não convocou o Inspetor Clouseau para investigar o súbito aparecimento do nome de uma certa Elenira num quadro da pintora Djanira ali exposto.

Ok, qualquer um pode tomar Djanira como Elenira ─ esta nunca existiu, a não ser na leitura apressada de Dilma, mas Djanira não é inconfundível. Agora estamos falando de Caravaggio, Michelangelo Merisi da Caravaggio, patrimônio da humanidade, membro do olimpo supremo de pintores de todas as eras, criador de estilo absolutamente próprio, revolucionário a seu tempo e para sempre.

Em cooperação com o governo da Itália, seis telas de Caravaggio, depois de expostas com grande sucesso em São Paulo e Belo Horizonte, agora fazem escala em Brasília ─ mais precisamente no Palácio do Planalto. E não é para menos: a anfitriã, detentora de uma alentada penacoteca ─ uma pinacoteca num pendrive ─ se diz caravaggista de carteirinha. Coube a ela, é claro, inaugurar a mostra, aberta ao público até domingo, dia 14.

Esperem: entre os presentes não está Carlinhos Brown? Sim, Caravaggio é do timbau. É a ele que Dilma se dirige, inicialmente:
“Sabe, Carlinhos, eu tô muito feliz de te receber aqui. Uma exposição dessa ela…”

Pausa. Construções sintáticas como “uma exposição dessa ela” já estão a merecer uma “instalação de dilmês” no Museu da Língua Portuguesa. Sigamos.

“Uma exposição dessa ela exige certos cuidados. Nós vamos ver seis obras de um grande, mas um dos maiores pintores, é, não só, que a Itália deu pro mundo”.

É a primeira vez que vêm à tona, no discurso de inauguração, as únicas três coisas que Dilma sabe dizer sobre Caravaggio: ele não só é um grande, mas um dos maiores pintores; e veio da Itália. Isso será repetido logo diante, para não deixar dúvidas e esgotar o assunto.

Mas por que Caravaggio no Planalto? É fácil explicar ─ menos para Dilma:
“Eu queria dizê que pra mim é um momento especial porque nós estamos aqui numa obra moderna, original, que é o Palácio do Planalto. E ao mesmo tempo estamos recebendo seis telas dum dos maiores pintores”.

Hum. Certamente terá a fã número 1 de Caravaggio tentado estabelecer uma dicotomia temporal entre a obra contemporânea do mestre Niemeyer e as seculares, do mestre italiano. Uma espécie de “chiaroescuro” entre dois momentos da história das manifestações artísticas humanas. Sabe um quadro de Velázquez no Masp da Avenida Paulista? De nada, presidente. Mas esse “estamos aqui” e “ao mesmo tempo” ficou muito esquisito.

Já está achando que Dilma entende tanto de Caravaggio quanto Carlinhos Brown? Você se surpreenderá ao ouvir a porção Robert Hughes da presidente, desafiando até o state-of-the-art da história da arte:
“Que tem gente que diz que (Caravaggio) é do barroco. E eu, pessoalmente, acho que ele é maneirista”.

Hum, hum. Esse “é do barroco” já soa como a versão barraco de quem não sabe o que é ser barroco. E o “gente que diz” inclui aí os maiores críticos de arte do mundo. Bem, se Dilma não quer que Caravaggio seja barroco, azar dos barrocos e de Caravaggio. Agora, se a crítica búlgara “acha” que ele é maneirista, ou seja, um representante do maneirismo, existe aí um pequeno problema cronológico. O dia foi corrido, ela não deve ter conseguido decorar bem a ordem dos termos. Como se ensina nas aulas de arte do ensino médio – se bem que isso pode ter mudado, não sei ─ Caravaggio foi justamente quem deu nova vida à pintura italiana rompendo os artifícios da velha escola maneirista. Ele opôs corpos reais, na bicromia claro-escuro, aos fantasmas maneiristas ─ figuras etéreas, ectópicas. Nas pinturas dele, santos ─ como o São Jerônimo exposto no Planalto ─ ganharam cara de gente comum. É o caso de dizer, Dilma: Caravaggio não foi, de maneira alguma, maneirista. Ao contrário.

Mas a aula de nossa guia não terminou. Depois de desafiar os historiadores, ela retorna ao conceito inicial, desta vez com um trocadilho sábio sobre o mestre do claro-escuro.
“Ele é, sem sombra de dúvida, um grande pintor”.
Perceberam o alcance do jogo de palavras? Claro, escuro, sem sombra, sem dúvida…

Faltava, porém, o toque mais pessoal da admiradora ─ ponto alto da apresentação. Sim, críticos também podem ter suas preferências:
“Eu queria dizê que ele é um dos pintores que na minha vida mais me impressionaram”, como se fosse possível que Caravaggio tivesse impressionado Dilma na vida de Marco Aurélio Garcia. Prossegue, mas vai complicar um pouco:

“Acho que ele tem um, uma própria, a vida dele é altamente dramática e, pra não dizer, em alguns aspectos, trágica”.
Dilma poderia estar falando de 98% dos pintores e artistas do milênio passado, sobretudo entre os séculos 15 e 19. Caravaggio tem algo especial:
“Mas ele foi sempre um grande, um grande (pausa dilmística)… degustador da vida. E isso tá expresso em cada pintura que ele nos legou”.

Claro, o homem inconvivível, que andava de cidade em cidade procurando briga, agredindo e sendo espancado, e que morreu aos 39 anos, da soma dos flagelos que recebeu, era um “degustador” da vida, na visão de Dilma e em “cada pintura que ele nos legou”. Veja apenas o “São Jerônimo que escreve”, exposto no Planalto: a caveira pousada sobre o livro faz parte do menu-degustação de Caravaggio, que também foi fio-condutor de outro submovimento, o tenebrismo.

No fim, apesar do momento festivo, não podia faltar uma bronca da dona da casa:
“Lamento,viu embaixador, que a que eu mais gosto não tenha vindo, que é o Cupido Adormecido”.

Taí, título fácil de ser decorado. O quadro, de fato, é uma beleza ─ se bem que quem realmente gosta e entende um tantinho de arte nunca usaria um “mais gosto” em relação à pintura de um grande mestre.

Atenção: a esplendorosa mostra Caravaggio no Palácio do Planalto só vai até domingo. Antes de sair de casa, certifique-se de que o horário escolhido não cai no plantão da guia Dilma.

PS: Acabo de me dar conta, numa segunda leitura da transcrição do video (sim, o dilmismo exige pesados sacrifícios), de um detalhe que confirma a absoluta e categórica falta de intimidade entre a crítica búlgara e Caravaggio: durante todo o discurso de inauguração da mostra de “um dos maiores pintores”, ela não menciona uma única vez o nome de Caravaggio. Nem certo, nem errado. Nenhuma vez.

Tenho a impressão de que, na história da República, em qualquer campo da atividade humana, jamais um presidente da República tenha inaugurado alguma coisa ou homenageado alguém sem mencionar o nome próprio da coisa ou da pessoa.

Ou não decorou ou não sabe como se pronuncia Caravaggio — ou é um fenômeno de elisão, próprio do dilmês.

 

Direto ao Ponto

28º debate sobre o julgamento do mensalão

Quem não acompanhou a transmissão ao vivo pelo site de VEJA do 28° debate sobre o julgamento do mensalão pode conferir o vídeo na seção Entrevista.

 

Direto ao Ponto

O ex-seminarista que caiu na vida acha a morte política muito pior que a morte física

Terno pretinho-Kirchner, expressão compungida de quem acaba de chegar do velório, Gilberto Carvalho caprichou na pose de viúvo inconsolável para chorar a perda do companheiro José Genoino. “Ele prestou grandes serviços ao governo”, murmurou nesta quinta-feira o secretário-geral da Presidência da República.  Inconformado com a partida do assessor especial do Ministério da Defesa, repetiu o bordão que estreou no adeus a João Paulo Cunha: “Isso dói”.

Essa espécie de dor, sabe-se agora, só assalta Gilberto Carvalho quando ocorrem mortes políticas impostas pelo Supremo Tribunal Federal a mensaleiros de estimação. A morte física de algum companheiro é coisa de rotina, demonstrou a reação do secretário do Planalto ao assassinato de Celso Daniel. O afastamento provisório de João Paulo e Genoino, que terão de trocar o gabinete em Brasília por uma cela de presídio, pareceu-lhe infinitamente mais doloroso que o desaparecimento definitivo do prefeito de Santo André.

“Todos gostam muito do Genoíno”, contou o seminarista que nunca decorou a segunda parte do Credo, caiu na vida e gostou do sabor do pecado. “Tanto assim que o ministro Nelson Jobim recomendou ao Celso Amorim que o mantivesse no cargo. Ele fez um trabalho de aproximação com os militares muito bom. É por isso que é querido entre os generais. Podem perguntar a qualquer um”.

Se loquacidade e simpatia interesseira fossem atenuantes, não haveria na população carcerária um único integrante da grande tribo dos 171. Mas Gilberto Carvalho está convencido de que não pode ser castigado um meliante bom de prosa.  “Vamos sentir muita falta da conversa dele”, choramingou a carpideira federal. Em contrapartida, Genoino terá tempo e gente de sobra para conversas no pátio da cadeia. É sempre um consolo.

 

Direto ao Ponto

O manifesto do pai é tão verdadeiro quanto o palavrório da filha

Condenado por 9 ministros a 1 pelo crime de corrupção ativa, o mensaleiro José Genoino revidou com o deslocamento da imprensa golpista para o banco dos réus. No manifesto endossado por uma carta assinada pela filha, o ex-presidente do PT garante que é vítima do ódio dos jornalistas.

O palavrório da filha foi desmontado pelo texto reproduzido na seção Feira Livre. Respondi ao pai no comentário de 1 minuto para o site de VEJA. Jornalistas sérios não se orientam por sentimentos menores nem perdem tempo com políticos medíocres. Não são movidos pelo ódio, mas pelo amor à verdade.

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Fonte:
Blog de Augusto Nunes (VEJA)

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