Cunha foi cassado com méritos, mas disse verdades incômodas no discurso final (REINALDO AZEVEDO)

Publicado em 13/09/2016 06:09
A mais importante de todas elas, para registro da história, e a que assegura que não houve pauta-bomba contra Dilma. E não houve mesmo (em VEJA.COM.BR + blog de JOSIAS DE SOUZA (no uol)

Vocês sabem o quanto defendi aqui a cassação de Eduardo Cunha. Mas sabem também que sempre falo tudo, ainda que muitos se aborreçam. Na era em que o jornalismo, especialmente na Internet, mas não só, tenta, para o mal, não se distinguir de postagens nas redes sociais, escreve-se muito, lê-se pouco, pensa-se quase nada. No post abaixo, segue o discurso final de Cunha.

Querem saber? Raramente um parlamentar falou tantas verdades naquela Casa. E, no entanto, ele o fazia a serviço de uma má causa: tentava salvar seu mandato. E raramente se mentiu tanto, a exemplo do que fizeram seus adversários, com destaque para os detestáveis deputados Jandira Feghali (PCdoB-RJ), Alice Portugal (PCdoB-BA) e Aliel Rocha (Rede-PR), um ex-PCdoB que deveria estar no PSOL, mas fica brincando com de clorofila no partido de Marina. Queriam a coisa certa: a cassação de Cunha. Só que era por maus motivos.

Então vamos botar os pingos nos is.

Cunha busca enrolar seus pares e a opinião pública quando tenta negar a natureza dos recursos que tem no exterior e quando tenta a embromar a história. Cumpre relembrar. O deputado Delegado Waldir (PSDB-GO) perguntou-lhe se ele tinha contas na Suíça. E ouviu a seguinte resposta: “Não tenho qualquer tipo de conta em qualquer lugar que não seja a conta que está declarada no meu imposto de renda”. Acho que isso liquida a questão. E o mesmo consideraram 450 deputados. “Ah, trust não é conta…” Quando se faz uma pergunta dessas, o que se quer saber é se existem recursos no exterior, pouco importa a forma.

O ex-deputado também errou feio ao sugerir que sua cassação reforçava a tese do golpe. Ao contrário: até poderia restar esse travo se ele tivesse sobrevivido. A ele coube o passo inicial que resultou no impeachment porque aquela era a atribuição da função que ocupava. Mas tal função não lhe dava licença para faltar com o decoro. E para encerrar o trecho das mentiras ou bobagens: é claro que ele sabe que os deputados levaram em conta tudo o que sabem sobre a sua atuação, revelado pelo Ministério Público.

Mas agora quero falar das verdades ditas por Cunha, que foi merecidamente cassado.

O denunciado
Cunha pergunta por que, até agora, só ele e o deputado Nelson Meurer são os políticos denunciados do mensalão — Lula está numa outra chave da investigação. Querem saber? Não tem explicação. Há um especial empenho da Procuradoria-Geral da República em pegá-lo? Há. Eu mesmo já apontei isso aqui. Seria bobagem negar o óbvio. Fica-se com a impressão de que ele é o chefão do mensalão. E não é, certo? Quem lidera o esquema criminoso é o PT. Ora, há uma denúncia contra Renan Calheiros, anterior ao petrolão, que já tem mais de três anos. Com efeito, no caso de Cunha, entre a denúncia e a aceitação, passaram-se 60 dias. Isso faz dele 99% anjo e apenas 1% vagabundo? Não! Mas negar o empenho de Rodrigo Janot em alvejá-lo é negar a Lei da Gravidade.

Pauta-bomba
Cunha negou que tenha havido pauta-bomba contra o governo Dilma. E não houve mesmo. Assistiu-se, isto sim, foi à rejeição de uma agenda, que era também a agenda da sociedade. As esquerdas não gostaram da redução da maioridade penal, do Estatuto do Nascituro, da PEC da Bengala, do enterro solene da reforma política do PT… Mas em que isso teria impedido Dilma de governar?  A dita pauta-bomba é uma invenção dos petistas, ora bolas! Digam qual foi o gasto extra que teve o governo em razão da gestão de Cunha. Mais: ele afirma ter feito uma gestão operosa, com 40% a mais de projetos votados do que a mais efetiva antes da sua, a de Arlindo Chinaglia. E isso é verdade.

Vingança
Afirmou Cunha sobre as esquerdas da Casa:
“Alguém tem dúvida de que, se não fosse a minha atuação, teria havido processo de impeachment? Alguém tem dúvida de que, se eu não houvesse autorizado, teria havido impeachment? Alguém tem dúvida de que, se eu não tivesse conduzido a votação, teria havido impeachment? Alguém tem alguma dúvida disso aqui nesta Casa? Duvido, duvido que a tenham! Essa é a razão da bronca do PT, dos seus assemelhados e dos seus asseclas, que vivem à sua órbita e que acabam tramitando nos Estados em função disso.”

Olhem aqui: eu não tenho a menor dúvida disso. Até porque os petistas podem, se necessário, de juntar a pessoas bem piores do que Cunha — desde que isso interesse ao partido. O que o deputado faz acima? Confessa um golpe? Não! Ele atuou no limite das suas funções, o que foi reconhecido, diga-se, por duas decisões do Supremo, uma de Rosa Weber e outra de Teori Zavascki.

O agora ex-deputado lembrou muito bem. Recusou 40 pedidos de impeachment, deixou de deliberar sobre 12 e aceitou apenas um. Mas é evidente que esse seu ato inaugural não teria prosperado, já se disse aqui tantas vezes, fossem outras as circunstâncias. E não venha Dilma bater no peito e dizer, como fez, que só caiu porque se negou a negociar. Não! A verdade nua e crua é que ela só caiu porque não acreditou que pudesse cair. E o mesmo, diga-se, aconteceu com Cunha.

Erro fatal
O erro fatal de Cunha nesse processo foi ignorar que seus juízes não se ateriam apenas às peças do processo no Conselho de Ética — e não que elas não fossem suficientes. Mentir numa CPÌ é quebra do decoro. Ponto. Mas essa quebra, por óbvio, foi maximizada pela metralhadora giratória que foi permanentemente disparada contra ele pelo Ministério Público Federal, com uma eficiência e uma presteza que não se veem nos outros casos.

Sim, cassado está e bem cassado. Fez-se justiça. Mas isso não significa que ele não tenha dito algumas verdades incômodas em seu discurso de despedida.

Cunha cai do cavalo sem tirar a mão no coldre (JOSIAS DE SOUZA)

Heroi de sua própria ficção, Eduardo Cunha migrou da posição de Durango Kid, uma espécie de cowboy fora da lei da Câmara, para a condição de anão-político. Excluídas as ausências e as abstenções, restaram-lhe míseros 10 aliados. Empurrado pelos votos de 450 deputados, Cunha caiu do cavalo sem tirar a mão do coldre. (aqui, a íntegra da lista de votação) Na sua primeira entrevista como ex-deputado, distribuiu rajadas de insinuações. Levou à alça de mira inclusive o governo. Ao notar o timbre de ameaça, Michel Temer e seus auxiliares reagiram com estrondoso silêncio.

Cunha fez propaganda do livro que planeja escrever sobre os bastidores do impeachment. Anunciou que contará em detalhes as conversas secretas que manteve antes de levar Dilma Rousseff ao cadafalso. Uma repórter quis saber: Quando o senhor abriu o impeachment, conversou com Michel Temer, ele pediu para o senhor abrir? E Cunha, enigmático: “Leia o meu livro que você vai ver.”

Além de falar do impeachment, vai expor o que sabe de políticos?, indagou outro entrevistador. “Ao tempo em que eu for me lembrando de qualquer coisa, pode ficar tranquilo que eu falo com vocês”, respondeu Cunha, borrifando na atmosfera envenenada a ameaça de sofrer a qualquer momento surtos de indiscrição.

Estalando de pureza moral, Cunha voltou a protelar as suas culpas. “Eu cometi muitos erros, sou um ser humano. Mas não foram os meus erros que levaram à minha cassação. Fui vítima de uma vingança política perpetrada no meio do processo eleitoral.”

Sem exibir nenhuma dúvida ético-existencial, Cunha atribuiu a perda do seu mandato a uma aliança que o Planalto, já sob Temer, firmou com o PT e outras forças que apoiavam Dilma para acomodar na presidência da Câmara o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). Citou nominalmente seu companheiro de PMDB fluminense Wellington Moreira Fanco, sogro de Maia e um dos mais chegados auxiliares de Temer.

De acordo com Cunha, o Planalto se meteu na disputa pela presidência da Câmara para derrotar o candidato que ele apoiava, Rogério Rosso (PSD-DF), e eleger Rodrigo Maia. Nessa versão, Moreira Franco, tachado de “eminência parda” do governo Temer, teria agido para favorecer o genro. “O sogro do presidente da Casa comandou uma articulação e fez com que fosse feita uma aliança com o PT. A minha cassação estava na pauta. Era óbvio que isso iria acontecer se fosse votado antes da eleição.”

Fará delação premiada? “Só faz delação quem é criminoso”, desdenhou Cunha. “Eu não sou criminoso, não tenho que fazer delação. Eu vou escrever o livro do impeachment. Vou contar, obviamente, tudo o que aconteceu no impeachment, diálogos com todos os personagens que conversaram. Esses serão tornados públicos na sua integralidade. Todos, todos, todos… Todo mundo que conversou comigo.”

Gravou as conversas?, cutucou um repórter. “Não, não. Eu tenho uma boa memória”, desconversou Cunha. “Eu não gravo conversa e não compactuo com quem grava conversa.”

Sem mandato, Cunha assistirá nos próximos dias à migração dos seus processos do foro privilegiado do STF para a primeira instância da Justiça Federal de Curitiba. Teme o juiz Sérgio Moro? “Não tenho que temer ninguém”, disse Cunha, tentando manter a pose. “Eu só temo a Deus”, acrescentou. “Eu me sinto inocente. Como inocente, vou me defender. O ônus da prova é de quem acusa.”

Acha que vai ser preso? “Não acho nada. A instrução dos meus processos já foi à fase de denúncia [da Procuradpria-Geral da Repúblia]. Eu vou responder, provavelmente em outro foro.”

O que pretende fazer agora? “Primeiro, vou procurar uma editora, para ver se consigo ter uma boa renda com o livro”, afirmou Cunha, que perdeu o mandato, não o faro para a pecúnia. “Depois, vou pensar no que vou fazer.” O livro já estava em seus planos. “Só que, agora, vou escrever mais rápido. Tenho mais tempo.”

Por ironia, Dilma Rousseff já informou aos amigos que também escreverá um livro sobre o impeachment. Graças à ajuda de Cunha, ela dispõe, igualmente, de muito tempo livre.

No dia cassação de Cunha, a indignidade gritante e gritada das esquerdas

Jandira Feghali, Aliel Machado, Alessandro Molon, Ivan Valente... Era um verdadeiro Parque dos Dinossauros

A indignidade das viúvas do PT na sessão que cassou o mandato de Eduardo Cunha era mesmo algo fabuloso, estupefaciente. Em momentos assim, parece-me claro que a deputada Jandira Feghali (PCdoB), candidata à Prefeitura do Rio, é daqueles que não têm concorrência. Não que o neoclorofilado da Rede Aliel Machado (PR), ex-camarada de Jandira no “comunismo do Brasil”, não lhe tenha tentado tomar o posto da impostura, se me permitem o gracejo. Alessandro Molon (RJ), outro que também andou se engaçando com os troncos da floresta de Marina, vindo do PT, brilhou nessa plêiade de vigarices intelectuais.

A que me refiro? Os três decidiram praticamente ignorar a razão por que Cunha estava sendo cassado. E olhem que nem tomaram o cuidado de dar tanto relevo às informações oriundas do Ministério Público. Não estavam em julgamento, claro!, mas é evidente que as falcatruas de que o peemedebista é acusado estão presentes, não é?  Que nada! Não deram a menor bola para isso.

Esses foram os destaques, sim, mas, em uníssono, os esquerdistas, acreditem, decidiram atacar a dita “agenda conservadora” de Cunha, acusando-o de ter sido, assim, uma espécie de instrumento da reação. E Jandira vociferava: “os progressistas ainda vão voltar ao poder”. E martelava a tese do golpe contra Dilma.

A seu modo, faz sentido. Ali estava uma “comunista do Brasil”, aquele partido cujas ONGs se metem, de vez em quando, em relações bastante suspeitas com dinheiro público.

No fim das contas, aquela turma estava pouco se lixando se Eduardo Cunha tinha ou não dinheiro no exterior; se havia ou não se locupletado com maracutaias na Petrobras. Ora, por que esquerdistas dariam bola para questões dessa natureza? Isso, convenham, eles também fazem. Não! Os arautos do governo deposto, inclusive os dois representantes do partido de Marina Silva, estavam lá para falar em nome de uma tal agenda progressista.

E assim fizeram muitos dos vermelhinhos. Senti falta de Jean Wyllys (PSOL-RJ) — não apareceu para cuspir em ninguém? Que coisa! Os comunas não estão nem aí se há roubalheira ou não desde, como é mesmo, que possam falar em nome da libertação do povo e das sinecuras que esse discurso rende.

E, claro, como sempre, ninguém gritava mais do que Ivan Valente (PSOL-SP), um deputado notório por pensar quando berra e berrar quando pensa. Na cabeça desses mistificadores, a cassação de Cunha representava, como é mesmo?, a derrota do que eles chamam “projeto conservador”.

Os mistificadores só não se deram conta de que, entre os 450 votos que cassaram Cunha, estavam a quase totalidade dos 367 que votaram em favor do impeachment de Dilma. Cunha só obteve uma rejeição ainda maior porque, por óbvio, a esquerda votou a favor de Dilma e contra ele.

Quem cassou Cunha foram aqueles que os comunas consideram “reacionários”. Eles, sozinhos, não tinham votos para isso. Como não tiveram para salvar Dilma.

A exemplo da cassada Dilma, o cassado Cunha acusa a imprensa — no caso, a Globo!

O deputado não percebeu que, quanto mais esticava a corda e retardava o processo, mais o Ministério Público se ocupava de expor a sua biografia

Que coisa, né? Todos os cassados têm a mesma retórica. Ficam indignados com a imprensa. Foi o caso, como se sabe, de Dilma Rousseff. Até naquela sua malfadada carta, a tal “mídia monopolizada” levou umas porradas.  Esses governantes brasileiros devem ter uma inveja danada daquele anão com cara de tarado que governa a Coreia do Norte. Kim John-un não precisa se preocupar com a imprensa. Seu pai, Kim Jong-Il também não precisava. E o mesmo se diga do pai do pai: o Kim il-sung. É sem imprensa que se faz um pais faminto, com bomba atômica e armado até os dentes. Nas democracias, a coisa é diferente.

Também Eduardo Cunha resolveu atacar a imprensa — no caso, voltou-se particularmente contra a Rede Globo. Sugeriu que a emissora praticamente exigiu que os deputados votassem contra ele. Não ficou claro de que modo isso teria sido feito. A exemplo de Dilma, ele também não disse o que gostaria que a imprensa fizesse.

É claro que está apenas buscando um bode expiatório. Sim, ele mentiu numa CPI, e isso caracteriza a tal “quebra de decoro”. Mas é evidente que não caiu só por isso. Assim como Dilma não foi defenestrada só por causa do crime de responsabilidade. Nos dois casos, estamos diante da chamada “condição necessária, mas não suficiente”.

Sem o crime, Dilma não teria caído. Só com ele, também não. Sem a grana no “trust”, Cunha não teria caído. Só com ela, também não. Ocorre que, contra a petista, há as maracutaias do petrolão, lideradas pelo seu partido,  e o desastre na economia e na gestão. Nada disso entra nos autos. Mas entra na consciência de quem julga, ora bolas. Contra o agora ex-deputado, havia aquela “coisa do trust”. Não houvesse mais nada, também teria sido salvo. Mas e as múltiplas delações premiadas que o colocam como uma máquina de fazer o interesse público render benefícios privados?

Cunha acusa a imprensa, mas ele não entendeu que a desgraça de Dilma sempre foi a sua própria, ora bolas! Não havia chance de ela ir para o cadafalso, e ele se salvar. E não porque haveria a hora da vingança, como ele sugeriu em seu discurso. Mas porque a metafísica que tornou impossível a permanência dela no poder também tornaria impossível a dele.

Sabem quem percebeu isso antes de todos? Luiz Inácio Lula da Silva. Este, sim, é o rei do “salvemo-nos todos, e o povo que se dane”. Lula, lembrem-se, queria que Cunha fosse o candidato do governo à Presidência da Câmara. Lula queria que Dilma se entendesse com o PMDB. Mas ela tinha ideias muito próprias sobre economia, política e estratégia… E Cunha também.

Como num filme de Tarantino, morreram todos no fim.

Ainda bem!

Agora é esperar que os fantasmas saiam do armário.

Já segue nosso Canal oficial no WhatsApp? Clique Aqui para receber em primeira mão as principais notícias do agronegócio
Tags:
Fonte:
Blog REINALDO AZEVEDO (veja)

RECEBA NOSSAS NOTÍCIAS DE DESTAQUE NO SEU E-MAIL CADASTRE-SE NA NOSSA NEWSLETTER

Ao continuar com o cadastro, você concorda com nosso Termo de Privacidade e Consentimento e a Política de Privacidade.

1 comentário

  • Paulo Roberto Rensi Bandeirantes - PR

    Por que muitos lutam para assumir o Poder de Estado?

    O individuo comum da sociedade quando assume o Poder de Estado deixa de ser individuo e passa a ser uma Instituição.

    A Instituição na cultura brasileira é reconhecida como a "dona do Belo e do Feio", ou seja, a "Dona da Verdade".

    Vejam as gravações telefônicas entre o Lula e os chamados "donos do poder" e, quais eram as verdadeiras intenções dessas conversas.

    Quando os repórteres perguntam aos mesmos "donos do poder" a "verdade do dono do poder" nos humilha, quando o som da resposta chega a nossos ouvidos.

    Ouso afirmar que eles não são só os guardiões da verdade, são sim, OS GUARDIÕES DA IRRESPONSABILIDADE !!!

    Os frutos de todas as irresponsabilidades de governos sucessivos é o quadro da realidade brasileira em todos os momentos de sua história.

    TENHO DITO !!! (sei que esta "minha verdade" nada vai mudar, mas é o máximo das minhas possibilidades)...

    1
    • Paulo Roberto Rensi Bandeirantes - PR

      continuação... No caso a "instituição" seria em ordem crescente: vereador, prefeito, deputado estadual, governador e todos os cargos em empresas estatais.

      0