Boi orgânico contribui com a conservação do Pantanal

Publicado em 08/07/2010 10:30
Apresentar pesquisas realizadas pela Embrapa Pantanal sobre pecuária sustentável na planície pantaneira. Este foi o objetivo de uma das atividades do projeto “Construção da Imagem da Pecuária Sustentável do Pantanal”, que levou em maio estudantes do curso de jornalismo da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), de Campo Grande, à fazenda Nhumirim, da Embrapa Pantanal (Corumbá-MS), Unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa, vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). Acompanhados pelo professor Marcelo Cancio, da disciplina de Comunicação Rural, eles viajaram e dois deles, Elton Gabriel e Maurem Fronza, produziram a matéria abaixo, sobre a pecuária orgânica.

Com um rebanho bovino em torno de seis milhões de cabeças, a partir da década de 1970 o Pantanal tornou-se importante produtor de carne para exportação. Nos últimos anos, a região perdeu peso econômico devido ao avanço da pecuária intensiva em outros locais. Hoje, a maior planície inundável do planeta retoma seu papel de destaque no cenário nacional por desenvolver uma criação de gado de baixo impacto.

A imprevisibilidade das cheias no Pantanal limita a quantidade de gado e o mantém dentro dos limites de uma economia ecologicamente sustentável. A pecuária tradicional pantaneira, praticada de forma extensiva, com o gado solto pelos pastos, não é considerada prejudicial ao meio ambiente. A baixa densidade de bovinos nas pastagens nativas, convivendo perfeitamente com a vegetação natural, provoca menor compactação do solo. Na ausência de outros mamíferos pastadores, exceto alguns cervídeos, o bovino não compete com a fauna original. Aliás, o gado já é parte integrante deste patrimônio natural da humanidade tombado pela Unesco em 2000.

A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) define sustentabilidade como “a conservação de recursos naturais e a transferência de tecnologias, de modo a garantir o alcance e a satisfação contínua das necessidades humanas para as gerações presente e futura”. Desta forma, desenvolvimento sustentável é o que degrada ao mínimo o meio ambiente, sendo tecnicamente apropriado, economicamente viável e socialmente aceitável.

O gado bovino, criado de forma extensiva em grandes propriedades rurais, representa a mais expressiva atividade econômica do Pantanal. Há mais de 200 anos, desde a chegada dos primeiros exemplares à região, este sistema de produção tem se mostrado compatível com a conservação do Pantanal e de baixo custo, já que boa parte da alimentação do rebanho é feita por pastagens naturais e pela água das salinas (lagos de água salgada em pleno continente, sendo o sal fundamental na alimentação bovina). Porém, a comercialização do gado é apontada como um dos maiores problemas enfrentado pelos pecuaristas locais. “Apesar do baixo custo de implantação e manutenção, a pecuária extensiva ainda não agrega valor, o que leva a uma menor lucratividade do produtor que adota o sistema tradicional de criação de bovinos no Pantanal”, afirma Walfrido Moraes Tomás, pesquisador da Embrapa Pantanal.

Compensação

Segundo o pesquisador, este é um dos entraves para o desenvolvimento socioambiental da região. “Defendo que o produtor que cria seu gado de forma tradicional receba, de alguma forma, um bônus pela contribuição prestada à preservação da natureza. Assim, ele não precisa vender seu imóvel para pessoas estranhas à realidade do Pantanal, a fim de sustentar sua família. É, também, uma forma de evitar que ele se entregue às ‘facilidades’ da pecuária intensiva”, comenta.

Estudo conjunto realizado pelas organizações não-governamentais WWF, Conservação Internacional, SOS Pantanal e SOS Mata Atlântica, além da Fundação Avina e da Embrapa, aponta que, entre 2002 e 2008, o Pantanal perdeu 12,4 mil km² de vegetação. Os dados mostram que o desmatamento avança mais na área de planalto do ecossistema e que 86,6% da vegetação na planície encontra-se preservada. Contudo, restam apenas 41,8% da cobertura original no planalto.

A transformação da vegetação nativa em pastagens exóticas é apontada como o grande vilão do desmatamento no Pantanal. A diferença entre o desmatamento no planalto e na planície reflete diferenças na forma de ocupação do ecossistema. Segundo a pesquisa, o planalto é fortemente ocupado pela agropecuária, enquanto na planície, a pecuária extensiva ocorre exclusivamente e isso evita a abertura de novas áreas de pastagens na região.

Apesar do crescimento do desmate verificado no período, a situação do Pantanal ainda é melhor que a de outros ecossistemas no Brasil. A Amazônia registra taxa anual de desmatamento de cerca de 7 mil km² e o Cerrado já perdeu metade de sua vegetação original.

Desafios

As mudanças ocorridas no cenário internacional e a globalização da economia mostram que o Pantanal necessita ajustar seu modelo econômico às demandas da sociedade, levando-se em consideração seu potencial produtivo, com foco na conservação da biodiversidade. Para o pesquisador da Embrapa Pantanal, Luiz Marques Vieira, essa nova perspectiva de produção encontra respaldo na necessidade de se encontrar alternativas para aumentar a rentabilidade sustentável das propriedades rurais, tendo como objetivo à fixação do homem no campo, pois o modelo tradicional de criação de gado no Pantanal não mais atende aos anseios socioeconômicos do pecuarista. “Embora a pecuária extensiva de corte tenha se perpetuado por mais de dois séculos no Pantanal como principal atividade econômica, há fortes indícios de que esse panorama venha a mudar nos próximos anos. Aqueles que insistirem nesse modelo serão obrigados a vender suas terras e, como consequência, mudar de atividade”, complementa Vieira.

Do ponto de vista econômico, para que a criação de gado bovino no Pantanal seja viável e produza o mínimo de impacto ambiental, é necessário o uso de pastagens nativas e de práticas sanitárias alternativas, a fim de manter os animais saudáveis e com baixo custo de produção. O criador também deve se preocupar com a aplicação de tecnologias já desenvolvidas e validadas na região. Pensando nisso, a Embrapa Pantanal tem estudado a interação solo-planta-animal visando desenvolver métodos de avaliação e acompanhamento da sustentabilidade dos diferentes sistemas de produção, técnicas de manejo sustentável das gramíneas naturais, assim como definir medidas de manejo adaptado para sistemas convencionais e orgânicos, com base em indicadores ambientais, econômicos, sociais e de bem-estar do animal.

Nos últimos anos, a procura por carne de bovino criado a pasto (natural beef ou grass feed), tem possibilitado a alguns produtores desenvolver um nicho de mercado. “Isso aumenta a viabilidade econômica da criação de gado nas condições naturais do Pantanal, além do aumento de valor agregado [por ser orgânico, natural e alimentado somente com pasto], tornando-se atraente para os consumidores que estão dispostos a pagar por esse tipo de produto”, observa Sandra Aparecida Santos, pesquisadora da Embrapa Pantanal.

A pesquisadora observa ainda que se considerarmos o intenso uso de substâncias químicas no processo de produção de alimentos, o grande desafio do homem na atualidade é desenvolver tecnologias para a produção orgânica. “Esta preocupação, aliada à degradação ambiental e à vocação econômica do Pantanal, demanda o uso de tecnologias menos agressivas ao meio ambiente e mais adequadas à pecuária de corte orgânica, como o manejo sustentável das pastagens nativas.”

ABPO

Com o objetivo de se beneficiarem deste sistema natural de criação, alguns pecuaristas têm se associado valendo-se de certas tecnologias para aumentar a produtividade animal de forma sustentável. Exemplo disso é a Associação Brasileira de Pecuária Orgânica (ABPO), criada em 2001 por pecuaristas do Pantanal que identificaram na pecuária orgânica certificada uma atividade promissora do ponto de vista econômico, ambiental e social. Atualmente, a associação reúne 20 propriedades do Pantanal Sul-mato-grossense, ocupando uma área com mais de 110 mil hectares e um rebanho estimado em 55 mil cabeças de gado.

ONGs ambientalistas, como a WWF-Brasil, reconhecem na pecuária extensiva uma alternativa produtiva que contribui com a conservação do Pantanal. Uma propriedade rural somente é certificada como de produção orgânica se atender a determinados critérios. Entre eles, o cumprimento da legislação ambiental e do código florestal brasileiro. Todas as fazendas devem possuir áreas de reserva legal e de preservação permanente. O uso de agrotóxicos é proibido e a proteção dos recursos hídricos é obrigatória.

A implantação desta alternativa trouxe a possibilidade de agregação de valor à carne do Pantanal, por meio do aumento da rentabilidade da pecuária, associada a baixos impactos socioambientais, o que garante a manutenção da biodiversidade e a preservação da cultura pantaneira.

De acordo com a ABPO, no Pantanal Sul-mato-grossense, os criadores de gado orgânico são descendentes de famílias historicamente envolvidas com o desenvolvimento da região. Hoje, são um grupo de produtores rurais preocupados com a viabilidade econômica de seus empreendimentos e com a manutenção do equilíbrio ambiental e social da região.

A carne orgânica, quando produzida com responsabilidade socioambiental, respeito ao bem-estar dos animais e sem o uso de substâncias químicas, além de atender às demandas do, cada vez mais exigente, consumidor contemporâneo, é uma forma eficaz de conservação do meio ambiente e uma alternativa de renda para os pecuaristas locais. Hoje, estima-se que o mercado paga 10% a mais pela arroba de animais orgânicos.

“Se cada produtor buscar opções e estratégias de manejo, de forma sustentável, para as condições peculiares de sua propriedade, todos têm a ganhar: o produtor, o homem pantaneiro, o meio ambiente e a sociedade como um todo”, reflete a pesquisadora Sandra Aparecida, da Embrapa Pantanal.

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Fonte:
MS Notícias

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