Operação da PF atinge 'coração financeiro' do sistema eleitoral do país

Publicado em 15/11/2014 16:53 e atualizado em 16/11/2014 21:56
Nove empresas envolvidas em desvios da Petrobras doaram 610 milhões de reais nas eleições de 2010 e 2014; faturamento em contratos com o governo mostra que a prática compensa. Por Gabriel Castro e Marcela Mattos, de Brasília. (Em VEJA desta semana: Nova fase da Lava Jato atinge o clube do bilhão).

O escândalo de corrupção que levou à prisão de executivos de grandes construtoras e tornou mais evidente a estreita relação entre esse ramo empresarial e políticos de todos os partidos. Levantamento feito pelo site de VEJA mostra que as nove construtoras implicadas nessa etapa da Operação Lava Jato da Polícia Federal desembolsaram mais de 610 milhões de reais nas campanhas de 2010 e 2014. Foram 310, 6 milhões no pleito de quatro anos atrás e, de acordo com os dados preliminares do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 301,3 milhões neste ano – todas doações legais.

 

A lista das empresas é composta por Odebrecht, Camargo Corrêa, Queiroz Galvão, Iesa, UCT, Andrade Gutierrez, OAS, Engevix e pela Galvão Engenharia. Historicamente, os empreiteiros mantêm uma proximidade com o poder – no plano federal e estadual, independentemente de partidos. Operações como a Lava Jato ajudam a explicar os motivos. No caso da Petrobras, contratos firmados com a estatal – que, por um decreto presidencial, não precisa respeitar a lei de licitações – eram superfaturados. Isso permitia que recursos desviados alimentavam uma engrenagem financeira do doleiro Alberto Yousseff, responsável por distribuir recursos para políticos. PT, PP e PMDB faziam o rateio da propina.

As eleições são parte do calendário financeiro das grandes empreiteiras. Em um mercado com alto grau de competitividade, nenhum empresário aplica milhões de reais em um investimento se não tiver perspectiva de obter ganhos ainda maiores. E os números deixam claro que o apoio financeiro aos candidatos compensa: apenas em 2013, e levando em conta somente as obras contratadas pelo governo federal (o que exlui estatais como a Petrobras), essas nove empreiteiras receberam mais de 3 bilhões de reais de dinheiro público.

Especialmente em áreas mais técnicas e de maiores empreendimentos, é consenso que não bastam bons serviços e um custo adequado para firmar contratos com o governo: é preciso ter intermediários – que, por sua vez, não costumam agir por interesses republicanos. Apesar da infindável lista de escândalos envolvendo obras pública, os corruptores normalmente escapavam ilesos e aptos a firmar novos contratos milionários com o governo. Nesse sentido, a Lava Jato pode estabelecer um marco positivo ao levar acusados de corrupção para a cadeia.

Leia também: MPF rastreia dinheiro da Petrobras no exterior
O que dizem as empresas investigadas

Os custos eleitorais elevados e o papel do Estado como maior tocador de obras no país tornam possível o escambo promíscuo: as empresas dependem do governo para ter grandes lucros e os partidos não conseguem manter suas campanhas sem as vultosas doações empresariais.

O cientista político Rubens Figueiredo, da Universidade de São Paulo, diz que uma medida estrutural teria um efeito benéfico imediato: diminuir o poder dos governantes. "Os políticos brasileiros do alto escalão estão entre os mais poderosos do mundo. Somos a sétima economia do planeta, temos uma carga tributária de 38%, uma concentração fantástica de recursos no governo federal e um controle pequeno. Esse é ambiente que mais favorece esse tipo de prática de corrupção", analisa.

Para Figueiredo, a difusão de parcerias público-privadas (PPPs) ajudaria a combater a corrupção: "Seria uma medida espetacular para diminuir drasticamente a possibilidade de corrupção e os valores envolvidos. Porque o Estado seria quase uma agência reguladora dos investimentos privados", diz ele. Problema: Os políticos que têm poder para alterar esse sistema foram eleitos por ele. E abrir mão do próprio poder não é uma tarefa das mais fáceis para um governante.

 
OPERAÇÃO LAVA JATO
OPERADOR DO PMDB NÃO VAI SE ENTREGAR, AFIRMA DEFESA

NO EXTERIOR HÁ MESES, ‘FERNANDO BAIANO’ MANDA DIZER QUE SEGUIRÁ FORAGIDO

fernando baiano by veja

Fernando Baiano, lobista do PMDB, mandou avisar que não cogita se entregar à polícia (Foto: Reginaldo Lima/revista Veja)

O empresário Fernando Antonio Falcão Soares, o Fernando Baiano – procurado pela Polícia Federal por suspeita de atuar como lobista e operador do PMDB no esquema de corrupção e pagamento de propinas na Petrobras – não pretende se entregar às autoridades da Operação Lava Jato.

Segundo o criminalista Mário de Oliveira Filho, que defende Fernando Baiano, a estratégia é ingressar com pedido de habeas corpus perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) para tentar derrubar o decreto de prisão expedido pela Justiça Federal em Curitiba, base da Operação Juízo Final, sétima fase da Lava Jato.

Fernando Baiano está sob suspeita da PF porque teria distribuído propinas a agentes públicos e valores para partidos políticos sobre porcentuais de contratos bilionários da estatal petrolífera. O PMDB teria o controle da Área de Internacional da Petrobras. A prisão de Fernando Baiano em regime temporário foi ordenada dia 10. A PF vasculhou o endereço do empresário, no Rio, e apreendeu documentos e computadores. A PF lançou o nome de Fernando Baiano na difusão vermelha, índex dos mais procurados do planeta, segundo registros da Interpol – a Polícia Internacional que mantém conexões com quase 200 países.”Minha orientação é para (Fernando Baiano) não se entregar, vamos tentar o habeas corpus”, declarou Oliveira Filho.

O criminalista está hoje em Curitiba e sua meta é apresentar três habeas corpus simultaneamente ­- um em favor de Fernando Baiano, outro em favor do presidente da Iesa Óleo e Gás, Valdir Lima Carreiro, e outro em favor de um diretor da empresa, Otto Sparenberg. Estes dois, Carreiro e Sparenberg, estão presos. Fernando Baiano está foragido.

Os pedidos de habeas corpus são subscritos pelos advogados Oliveira Filho, Edson Silvestrin e Manoel César Lopes. Os pedidos serão apresentados ao Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF4). Oliveira Filho reafirma que não vai entregar Fernando Baiano. “A prisão do sr. Fernando é absolutamente desnecessária”, protesta Oliveira Filho. “Em duas oportunidades anteriores ele se ofereceu espontaneamente para prestar quaisquer esclarecimentos. Aceitou até receber intimação pelo telefone.”

Oliveira Filho destacou que Fernando Baiano já estava com depoimento marcado para a próxima terça feira em Curitiba, base da Operação Lava Jato. “Por isso não havia a menor necessidade de sua prisão. Na terça feira ele iria se apresentar para depor.”(Fausto Macedo e Ricardo Brandt/AE)

Contagem regressiva, POR JOÃO BOSCO RABELLO, em O Estado de s. Paulo

A etapa da Operação Lava Jato que cumpriu anteontem dezenas de ordens de prisão contra executivos de grandes corporações marca o início da contagem regressiva das investigações em direção à classe política.

Por isso está sendo muito utilizada entre parlamentares a analogia com o naufrágio do Titanic, cujo choque com o iceberg corresponde à fase atual do processo conduzido pelo juiz Sérgio Moro. A ela se segue a lenta agonia do afundamento do navio.

Lembra o deputado Miro Teixeira (PROS-RJ), autor da iniciativa de trazer para o Brasil o instituto da delação premiada, que as prisões da sexta-feira representam o baque da embarcação contra o gelo, que desperta os participantes da festa na primeira classe, inebriados pelo clima de onipotência que os fazia sentir-se inatingíveis.

Na vida real, antes ainda do início do calendário formal do segundo mandato, abre-se o ciclo que determinará se a presidente Dilma Rousseff terá as condições políticas para impor-se à crise, tendo ela participado de toda a fase dos governos do PT em que a pilhagem da Petrobrás se desenvolveu e se consolidou, sob alertas seguidos e insistentes do Tribunal de Contas da União (TCU).

Dilma dá sinais de que não parece disposta a dividir o protagonismo da corrupção na Petrobrás com o partido - e nem com o ex-presidente Lula, que começa a ter a sua versão de desconhecimento do que se passava na estatal gradualmente desconstruída pelos fatos.

Essa determinação da presidente, que lhe custa hoje a oposição do PT, já estava sinalizada na versão que atribui à sonegação de informações pela diretoria da Petrobrás a aprovação pelo Conselho da compra da refinaria de Pasadena.

Com essa versão, embora frágil, excluiu-se de responsabilidade sobre a diretoria nomeada por Lula e agora completa o processo afirmando não ser a presidente do PT, mas do País, e prometendo que se juntará ao esforço de esclarecimento da corrupção na empresa, para que não fique "pedra sobre pedra".

Resta saber se sua versão antecipada a blindará da possível omissão sobre o que aparentemente sabia e contra a qual sugere que nada podia, mas ainda assim permaneceu no governo que sustentava o esquema. Parafraseando o ministro José Múcio, ao herdar a relatoria de José Jorge sobre a Petrobrás no TCU, o compromisso de Dilma agora é com seu CPF. Múcio usou essa imagem para dizer que, a essa altura, o compromisso de cada um é com sua biografia.

A própria presidente, porém, conspira contra seu êxito, ao sinalizar que pretende dobrar a aposta no modelo responsável pela crise econômica, agravando o quadro político cuja instabilidade só se viu no governo Fernando Collor.

 

CPI da Petrobras vai tirar a máscara do governo e da oposição

por Ricardo Noblat, em O Globo

Quem politiza as investigações sobre o desvio de bilhões de reais da Petrobras? A oposição, que cobra do governo que ajude a Polícia Federal a desbaratar a mais poderosa e sofisticada organização criminosa jamais vista na história do país? Ou o governo, que começou a acusar a oposição de não querer descer do palanque com a intenção de disputar o terceiro turno da eleição presidencial?

Os dois, oposição e governo. Natural. Política se faz assim. Quem está fora do poder entrega a mãe, se for necessário, para alcançá-lo. Quem tem o poder se mata vivo, mas não abre mão dele.

No caso brasileiro, o distinto público é convocado a cada quatro anos para dizer quem deverá tocar o poder nos quatro anos seguintes. A democracia é um regime imperfeito. Mas não há regime mais perfeito do que ela.

Nesta terça-feira, a CPI mista da Petrobras se reunirá mais uma vez. Seu prazo de funcionamento foi prorrogado até o início do recesso de fim do ano do Congresso. Até aqui, a CPI não serviu para nada.

Ou melhor: serviu para confirmar o desinteresse do governo e da oposição na descoberta de qualquer coisa capaz de incriminar corruptos e corruptores. Dilma fala em apurar tudo “doa em quem doer”. Mas orienta os políticos que a apoiam a não apurar nada.

A oposição fechou um acordo com a tropa do governo para que se deixe o escândalo da Petrobras por conta unicamente da Polícia Federal e do Ministério Pública. A desculpa: a CPI não tem como competir com delegados e procuradores. O que é fato.

A verdade verdadeira: assim como o governo, a oposição não quer correr o risco de se denunciar, nem às fontes tradicionais de financiamento de campanhas. Ninguém é trouxa, ora.

Estão presos 20 donos e executivos das nove maiores empreiteiras do país. Oito delas, juntas, doaram para as campanhas eleitorais deste ano algo como R$ 182 milhões. Doações declaradas à Justiça. Certamente doaram outros tantos milhões por debaixo do pano.

A CPI do bicheiro Carlinhos Cachoeira acabou no ano passado quando esbarrou no primeiro dono de empreiteira, Fernando Cavendish, da Delta Construções. Esta agora? Faça sua aposta. Desconfio que ela custará as máscaras do governo e da oposição.

Reunião da CPI mista da Petrobras (Foto: Pedro França / Agência Senado)Reunião da CPI mista da Petrobras (Imagem: Pedro França / Agência Senado)
 
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Fonte:
veja.com + Estadão

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