José Rainha (ex-líder do MST) lança novo movimento e promete carnaval vermelho
O ex-líder do Movimento dos Sem-Terra (MST), José Rainha Junior, promete estrear sua nova organização, a Frente Nacional de Luta Campo e Cidade (FNL), com invasões de fazendas em vários Estados brasileiros durante o Carnaval deste ano.
A meta do ''Carnaval Vermelho'', como denominou a mobilização, é ocupar cem propriedades rurais em São Paulo e em outros Estados. A frente foi lançada na sexta-feira, 21, em Presidente Venceslau, no Pontal do Paranapanema, oeste paulista, durante a assinatura de convênio entre o Governo do Estado e a União para arrecadar terras para a reforma agrária na região.
Estavam presentes o ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, e o presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Carlos Guedes, além de representantes do governo estadual. Para mostrar força, Rainha levou três mil militantes vestindo camisetas e bonés vermelhos com a marca da frente e ganhou direito a um discurso no evento. "Saímos com os motores aquecidos para fazer um grande Carnaval vermelho", afirmou. Segundo ele, o objetivo é mostrar para o governo da presidente Dilma Rousseff que a reforma agrária precisa avançar.
Apenas no oeste paulista, incluindo o Pontal do Paranapanema, três mil famílias estão acampadas por um lote de terra, segundo ele. Um dos motes do ''Carnaval Vermelho'' será: "Dilma, estamos na lona. Volta Lula". Apesar das críticas ao governo, Rainha disse que o convênio assinado sexta-feira é um avanço. Serão investidos R$ 55,8 milhões para assentar 700 famílias no Pontal num prazo de dois anos. O governo vai retomar fazendas em terras consideradas devolutas, mas pagará pelas benfeitorias. O convênio anterior terminou no primeiro governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e só agora foi retomado.
A nova organização dos sem-terra reúne o MST da Base, dissidência do MST liderada por Rainha, a Confederação Nacional de Agricultores e Empreendedores Familiares (Conafer), que representa 17 federações e centenas de sindicatos, além de outros movimentos sociais. A frente terá o apoio de movimentos urbanos, como os sem-teto. "A luta é pela conquista de uma nova sociedade", disse Rainha.
O líder sem-terra tem um histórico pontuado por processos judiciais envolvendo a questão agrária e coleciona 13 prisões. Na última delas, foi acusado pela Polícia Federal de desviar recursos da reforma agrária. Preso em junho de 2011 pela Operação Desfalque, da PF, ficou nove meses na prisão e foi solto graças a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele se diz inocente, mas ainda responde ao processo.
Assentados vendem terra ao agronegócio
Posse definitiva da terra e valorização dos lotes estimulam comercialização de áreas rurais, segundo estudo de pesquisador da Unesp
ANDRADINA - Após assentar 1,2 milhão de famílias em sucessivos programas de reforma agrária, o Brasil agora enfrenta o desafio cada vez maior de segurá-las na terra. A nova realidade agrária do País, com a crescente valorização do preço da terra, ao lado das persistentes dificuldades dos assentados para elevar o seu nível de renda, torna cada vez mais atraente a venda do lote obtido com a reforma.
A Fazenda Primavera, em Andradina, na região noroeste de São Paulo, a 630 quilômetros da capital, é um exemplo do que está ocorrendo. No início da década de 1980, aquela propriedade tornou-se um símbolo da luta pela reforma agrária, com intensa mobilização de famílias de trabalhadores rurais, sindicatos e setores da Igreja Católica.
Pertencente ao grupo J.J. Abdalla, ela acabou sendo desapropriada pelo presidente João Baptista Figueiredo. Seus 3.676 hectares foram divididos entre as 346 famílias que viviam na área. Elas também receberam na mesma época o título de propriedade.
Passados 34 anos, resta pouca coisa do assentamento e da proposta original de desconcentrar a terra. Segundo estimativa feita pelo pesquisador Rafael de Oliveira Coelho dos Santos, que está concluindo uma dissertação de mestrado na Unesp sobre aquele projeto, 70% dos lotes originais já foram vendidos às três usinas de cana-de-açúcar que operam na região e disputam palmo a palmo novas áreas de plantio.
Em decorrência dessa pressão, o preço da terra não para de subir. Em dez anos, o valor do alqueire (24,2 mil m²) saltou de R$ 8 mil para R$ 50 mil.
Com esses preços, a pressão é cada vez maior. "Até a esposa, os filhos, os genros caem em cima do dono e ele não resiste à pressão do dinheiro", diz o assentado Valdeci Rodrigues Oliveira, de 67 anos, do grupo dos que ainda não venderam o lote em Andradina.
Na semana passada, ao rodar pelas estradas de terra vermelha que cortam a área, a reportagem do Estado só viu canaviais. Entre os que ainda não negociaram a terra, é comum a prática de arrendá-la, integral ou parcialmente, para as usinas.
O caso de Andradina chama a atenção de estudiosos da reforma agrária, movimentos sociais e órgãos do governo. Teme-se que o ocorrido ali se repita em outros assentamentos, numa escala capaz de comprometer toda a reforma.
O temor é inflado por causa do envelhecimento das áreas de reforma e do aumento da concessão de títulos de propriedade. De acordo com normas legais, quando chega ao lote, o beneficiário da reforma agrária tem apenas uma concessão de uso. Após um período de dez anos, porém, passa a ter direito ao título de propriedade, podendo então negociar a terra.
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) diz não ter números sobre esse tipo de negócio. Sabe-se, no entanto, que 640 assentamentos já estão emancipados ou em fase de emancipação. A área emancipada é aquela em que mais da metade dos ocupantes do lote já tem o título de propriedade.
O número não é alto, considerando a existência de quase 9 mil assentamentos. O que preocupa é que deve aumentar rapidamente a partir de agora, uma vez que grande parte dos assentamentos do País nasceu nos últimos 15 anos. Outro fator preocupante é que a renda dos assentados continua baixa. Na avaliação de Santos, o pesquisador da Unesp, esse fator é decisivo.
Legislação. Foi por causa disso que líderes do Movimento dos Sem Terra (MST) foram pedir à presidente Dilma Rousseff a mudança da lei. No encontro que mantiveram com ela, dias atrás, no Planalto, sugeriram que o assentado tenha apenas a cessão de uso da terra. Pode repassá-la para os filhos, mas nunca vender. "Sem isso haverá certamente uma reconcentração da propriedade", diz Alexandre Conceição, da direção do MST.
Dilma mostrou interesse, mas não há movimento no governo para mudar a lei.
A fórmula sugerida pelo MST já é usada em São Paulo, em assentamentos em áreas de terras devolutas, nos quais os assentados recebem apenas a permissão de uso. A pressão para a mudança dessa lei, porém, aumenta. No ano passado, durante um seminário sobre o tema, promovido pelo Instituto de Terras de São Paulo (Itesp), parte dos participantes defendeu a concessão do título de propriedade.
O presidente do Itesp, Marco Pilla, é contrário à mudança. "É preciso dar garantia jurídica às famílias, mas sem repetir o erro da Fazenda Primavera."
Segundo o MST, um dos principais focos de pressão para a venda de terras está na Amazônia, que concentra metade das famílias da reforma. Isso ocorre, na avaliação de Conceição, por causa da questão ambiental. Sem espaço para desmatar, empresas voltam a atenção para assentamentos emancipados.
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