Por Leandro Colon, no Estadão:
Uma empresa do senador e ex-ministro Eunício Oliveira (PMDB-CE), a Manchester Serviços Ltda., assinou sem licitação contratos que somam R$ 57 milhões com a Petrobrás para atuar na Bacia de Campos, região de exploração do pré-sal no Rio de Janeiro. Documentos da estatal mostram que foram feitos, entre fevereiro de 2010 e junho de 2011, oito contratos consecutivos com a Manchester.
Os prazos de cada um dos contratos são curtos, de dois a três meses de duração, e tudo por meio de “dispensa de licitação”, ou seja, sem necessidade de concorrência pública. Eleito senador em outubro, Eunício é presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a mais importante da Casa.
Cerca de R$ 25 milhões foram repassados pela Petrobrás à Manchester em 2010, ano de eleições. A nove dias do segundo turno presidencial, por exemplo, Petrobrás e Manchester fecharam um novo contrato - via “dispensa de licitação” e pelo prazo de 90 dias - no valor de R$ 8,7 milhões. Desde então, já no governo de Dilma Rousseff, novos contratos foram celebrados sem concorrência pública com a empresa do senador, entre eles um de R$ 21,9 milhões (de número 4600329188) para serviços entre abril e junho deste ano.
A Manchester tem sede em Brasília, mas instalou filial em Macaé num sobrado de uma rua sem saída, a poucas quadras da sede da Petrobrás na cidade fluminense. A empresa é contratada para fornecer mão de obra terceirizada à estatal, incluindo geólogos, biólogos, engenheiros e administradores. O diretor da Área Internacional da Petrobrás, Jorge Zelada, e o diretor de Abastecimento, Paulo Roberto Costa, foram indicados no governo passado pelo PMDB, partido de Eunício, e mantidos no governo Dilma.
A Petrobrás confirmou ao Estado os valores e a “dispensa de licitação”. Informou que novos contratos foram feitos com a Manchester sem concorrência pública “em decorrência de problemas em processo licitatório”. Eunício se nega a falar sobre o assunto, sob a alegação de que está afastado das decisões da empresa. Ele escalou o sócio Nelson Ribeiro Neves para se manifestar à reportagem. O senador é dono de 50% da sociedade da Manchester, conforme informação dele mesmo à Justiça Eleitoral e confirmada na Junta Comercial.
Antes de virar senador, Eunício foi deputado federal e ministro das Comunicações do governo Lula. É membro da Executiva Nacional do PMDB. Em julho do ano passado, ofereceu um jantar em sua casa para Dilma com a presença de mais de 300 pessoas. A mesma casa foi palco de homenagem, em dezembro, ao então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
“Não vincule”. A empresa do senador fornece mão de obra para áreas estratégicas da Petrobrás, que, por ser estatal, não precisa publicar seus contratos no Diário Oficial da União nem no Portal da Transparência, mantido pela Controladoria-Geral da União (CGU). Segundo a gerente da empresa em Macaé, são pelo menos mil funcionários da Manchester atuando na gestão administrativa “on shore” (em terra) em Macaé. Procurada pelo Estado na quarta-feira, a gerente da empresa na cidade, que se identificou como Fabiane, fez um apelo para que a reportagem não fizesse a vinculação da Manchester com a Petrobrás. “Só não quero que mencione a empresa. Não vincule o nome da empresa neste momento.”
Os documentos da Petrobrás mostram que um contrato de R$ 4,3 milhões foi feito para prestação de serviços entre 23 de fevereiro e 29 de abril de 2010. Outro de R$ 8,7 milhões referiu-se ao período de 10 de maio a 26 de julho do mesmo ano. De 13 de agosto a 24 de setembro, Petrobrás e Manchester firmaram contrato de R$ 4,3 milhões, e logo depois, entre 22 de outubro e 22 de janeiro, a empresa do senador recebeu mais R$ 8,7 milhões.
O primeiro contrato fechado no governo Dilma com dispensa de licitação ocorreu no dia 26 de janeiro, com vigência até 22 de maio, pelo valor de R$ 8,7 milhões. Entre 18 de abril e 14 de junho, aparece o contrato de R$ 21,9 milhões. As duas empresas ainda assinaram um contrato menor, de R$ 872 mil, vigente de 11 de março a 11 de junho. Por “convite”, a Manchester receberá mais R$ 298 mil para prestar serviços administrativos até fevereiro de 2012. Aqui
Por Reinaldo AzevedoPor Fernanda Nascimento, Gabriel Castro e Adriana Caitano, na VEJA Online:
A criatividade dos governos estaduais na hora de declarar os gastos com saúde não tem limites. Para atingir o valor que, por lei, eles devem investir em ações e serviços públicos da área, vale tudo - despesas com pensões, assistência social, fundos habitacionais, reforma agrária e até compra de leite. Inflados, os gastos garantem que os estados cumpram as regras definidas em 2000 pela Emenda 29, que estipula a destinação de, no mínimo, 12% de suas receitas à saúde.
Em cinco anos, no período de 2004 a 2008, vinte estados camuflaram um montante de 13,4 bilhões de reais em investimentos em saúde. Minas Gerais lidera o ranking: declarou 4,6 bilhões de reais a mais do que efetivamente gastou na área. Avaliação feita pelo Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde (SIOPS), órgão do Ministério da Saúde, encontrou entre as despesas gastos com a Polícia Militar, com o Corpo de Bombeiros e até com o Fundo de Apoio Habitacional da Assembléia Legislativa. Os dados coletados entre 2004 e 2008 são os mais recentes analisados pelo Ministério da Saúde.
Em nota, o governo de Minas Gerais afirmou ao site de VEJA que “cumpre regularmente suas despesas com a saúde, obedecendo aos critérios definidos pela Instrução Normativa 19/2008 do Tribunal de Contas do Estado (TCE)”. Logo atrás de Minas vem o Rio Grande do Sul que, em cinco anos, colocou 2,9 bilhões na conta da saúde indevidamente. Procurado, o governo do estado alegou que os baixos repasses para a saúde são herança de governos anteriores e afirmou que vai aumentar gradativamente os repasses na área para alcançar o patamar exigido por lei.
Acesso universal - A avaliação do Ministério da Saúde se baseia em uma resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) que, em 2003, determinou o que são gastos na área. O entendimento beira o óbvio. São despesas em saúde aquelas destinadas às ações e serviços de acesso universal, igualitário e gratuito. Ou seja, investimentos ligados a servidores públicos ou policiais, por exemplo, não compõem o patamar mínimo. Aposentadorias e pensões, frequentemente incluídas pelos estados no orçamento da saúde, também ficam de fora.
Só em 2008 foram declarados pelos estados como investimentos na área cerca de 30 bilhões de reais. Deste valor, 7% não eram despesas com saúde de acordo com o Siops. “O Brasil é um país que gasta pouco com saúde. Mais dinheiro não vai resolver o problema, pois existe uma enorme ineficiência na utilização da verba que vai para a saúde”, avalia o economista José Márcio Camargo, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). “O sistema deveria ser alterado para melhorar a utilização da verba”.
O problema é que, por enquanto, os estados estão livres para interpretar o que são gastos na saúde. A discussão sobre a regulamentação da Emenda 29 se arrasta há onze anos. Só com a aprovação da proposta que está na Câmara dos Deputados é que a resolução do CNS passa a ter valor de lei, tornando os governos alvo de investigações caso sejam constatadas irregularidades na declaração.
Longe do mínimo - As consequências das irregularidades não são pequenas. O orçamento inflado fez com que, entre 2004 a 2008, dezessete estados não cumprissem o patamar mínimo de 12% destinado à saúde. Se descontados os gastos não considerados pelo Conselho Nacional de Saúde, apenas os estados da região Norte, São Paulo, Distrito Federal e Rio Grande do Norte atingiram a parcela estipulada por lei.
Rio Grande do Sul e Minas Gerais figuram mais uma vez entre as maiores defasagens, em primeiro e segundo lugar, respectivamente. O estado do Sul destinou apenas 4,5% do orçamento do período para ações e serviços de acesso universal, igualitário e gratuito, segundo a análise do Ministério da Saúde. Já o governo mineiro gastou 7,5% da receita total do estado nestes cinco anos com a saúde. Aqui
Por Reinaldo AzevedoQueridos, é um daqueles textos um tanto longos, mas que, acredito, toca em algumas questões essenciais. A avaliação, como sempre, é de vocês.
Na quarta-feira, o ex-governador de São Paulo José Serra apresentou umdocumento para ser debatido pelos demais membros do Conselho Político do PSDB, presidido por ele. Com algumas costelas e um braço fraturados, o senador Aécio Neves (MG) não compareceu à reunião, em Brasília. Estavam presentes, além de Serra, os governadores Geraldo Alckmin (SP) e Marconi Perillo (GO), o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o deputado Sérgio Guerra (PE), presidente da legenda. O texto foi enviado a Aécio. Não se tratava de um abaixo-assinado, resolução ou linha oficial de conduta a ser adotada pelo partido a partir daquele encontro - infelizmente para a oposição, não era nada disso. Tratava-se tão-somente de documento de uma de suas lideranças. Mesmo assim, deu-se um pequeno sururu. No dia seguinte, uma solenidade no Senado, a que compareceram políticos de diversas legendas - inclusive do PT (aquele evento em que Nelson Jobim lamentou ter de suportar alguns “idiotas” imodestos) -, comemorou os 80 anos de FHC, completados no último dia 18. Serra discursou. Falou inequivocamente como homem de oposição. Novo sururu. Nos dois casos, acusou-se um Serra acima do tom, inadequado àquele que seria um clima de cordialidade entre governo e oposição. As circunstâncias em que uma avaliação como essa prospera, com o auxílio luxuoso de certa imprensa que estupidifica o debate político, dizem bem da miséria política que experimentamos.
Tornado público o documento, Sua Excelência o “Off” - vocês o conhecem? - começou a dar declarações à imprensa afirmando que o texto não representava um consenso, mas apenas a visão de seu autor. Era uma meia-verdade - e, portanto, uma meia-mentira. Como meia-verdade, com efeito, tratava-se de uma avaliação do ex-governador posta em debate, que não buscava a adesão formal dos conselheiros. Como meia-mentira, ignora-se o fato de que os presentes acharam que o documento era bom e retratava com correção o momento. Ao fim do encontro, indagado sobre as críticas, FHC chegou a afirmar: “Eu sigo o Serra”.
Antes que continue, uma nota à margem: editores e diretores de jornal deveriam rediscutir o estatuto do off. Antigamente, ele servia para que fontes denunciassem falcatruas ou dessem algumas dicas preciosas aos jornalistas, colocando-os na pista certa numa determinada apuração. Hoje em dia, com a proliferação da chamada “cobertura política de bastidores”, tornou-se um instrumento do político que cai nas graças do repórter, do editor ou do colunista. Ele pode falar o que bem entende, mandar o seu recado, e não tem como ser contestado ou contraditado. Ou por outra: quem publica uma avaliação política “em off” está fazendo assessoria de imprensa. Sigamos.
Diante da celeuma armada em torno do documento, no sábado à noite, Sérgio Guerra divulgou a seguinte nota:
“O governador José Serra apresentou ao Conselho Político do PSDB um documento sobre a conjuntura brasileira e também comentários sobre as ações do partido. Serra nunca pretendeu que sua proposta fosse assumida como do Conselho ou do Partido. É um texto de qualidade, como são as manifestações do governador, e será discutido no ambiente partidário e político. Esse era e é o propósito do governador Serra.”
Em seu site, Serra escreve:
“O texto é de minha autoria. Levei-o à primeira reunião do Conselho Político do PSDB, o qual presido, no dia 29 de junho, em Brasília, para servir de base ao debate sobre a conjuntura política e o partido. Fiz o elenco daqueles que considero os problemas do país, as dificuldades do governo, a missão do nosso partido e os riscos que podem rondar a legenda. Trata-se de um texto extenso e com temas muito diversificados. Não tinha a pretensão, nem propus - todos os presentes à reunião sabem disso - transformá-lo em um documento formal do PSDB, subscrito por todos.”
Mas o que Serra disse de tão grave?
Mas, afinal, o que disse Serra de tão grave? Apontou o que chamou de “herança maldita” de Lula - especialmente a crise na área infraestrutura no país; apontou as hesitações e falta de rumo do governo; criticou com ênfase o novo regime de contratação de obras para a Copa, que vai facilitar a corrupção, e alertou o partido para o risco de divisões internas. No discurso em homenagem a FHC, lembrou que o ex-presidente não é do tipo que passa a mão na cabeça de aloprados. Havia petistas presentes. Algumas normalistas, inclusive da imprensa, consideraram a fala uma descortesia. Daqui a pouco estaremos proibidos de falar mal do Marcola para não ferir susceptibilidades.
Começou uma impressionante gritaria na imprensa. Serra estaria cometendo o grave erro de investir no confronto (ó, meu Deus! Que coisa feia!), quando o momento é de concórdia. Alguns chegaram a lembrar, imaginem vocês!, que Dilma enviara, não faz tempo, uma mensagem simpática a FHC, reconhecendo seus méritos. Como o ex-governador ousa, dado esse fato, acusar erros, desvios, desmandos e incompetências do petismo? Não sei se notam a armadilha intelectual e moral que há nessa consideração. Sua síntese é a seguinte: enquanto Dilma - ou petistas graúdos - não reconheciam os méritos do ex-presidente, tudo bem haver algum confronto etc e tal. Agora que ela se rendeu, ao menos parcialmente, aos fatos, então os tucanos ficam proibidos de criticar petistas. Corolário: o PT é que determina quando seu adversário pode ou não atacá-lo. E exercerá esse poder regulando a sua própria disposição para elogiar os desafetos.
Nunca vi isso. Aliás, nunca antes na história do mundo democrático alguém viu algo parecido.
Leio no Estadão deste domingo, na coluna de João Bosco Rebello, a seguinte nota, intitulada “Inércia aparente”:
Há outra interpretação para o comportamento da oposição, que explica sua criticada inércia como uma aposta nos efeitos do enfrentamento do governo com sua base. A síntese, defendida pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG), é a de que o conflito na base dispensaria a oposição, por ora, de ações mais agressivas.Prova disso seria a ponte lançada pela presidente Dilma ao PSDB, materializada no reconhecimento do legado de Fernando Henrique Cardoso. No espaço de um semestre, Dilma passou da crítica ao elogio à maior expressão tucana, no mínimo para arrefecer o ânimo oposicionista. Não conseguiu isso de José Serra, seu adversário derrotado nas eleições, que divulgou à revelia do partido um documento com pesadas críticas ao governo na busca de afirmar-se candidato do partido em 2014, condição que disputa com Aécio.
Heeeinnnn?
Eu entendi errado, ou o senador Aécio Neves está a dizer que, por enquanto, a tarefa de fazer oposição a Dilma é da própria base aliada, cabendo à oposição pegar leve, não criar tensão. Olhem, eu até entendo o que alguns petistas querem dizer quando afirmam que a imprensa - ao menos aquela que se preza - é o verdadeiro partido de oposição do Brasil. Embora seja uma mentira estúpida, uma vigarice, uma afirmação canalha, ela é compreensível. É o jornalismo que informa o patrimônio fabuloso de um Antonio Palocci, o esquema corrupto armado no Ministério dos Transportes, o fabuloso faturamento de uma empresa de Eunício oliveira, que fornece serviços à Petrobras sem licitação. É… Faz sentido! Em muitos aspectos, a imprensa faz o papel que caberia à oposição, mas não porque seja oposicionista e queira o poder, mas porque defende as instituições, vigia o poder e cobra o respeito às leis.
O governo tem uma base de tal sorte gigantesca que é razoável que ela se divida e que haja uma pressão danada para ocupar cargos. Mas isso não quer dizer que a oposição deva se acomodar, deixando de cumprir o seu papel, esperando que os próprios governistas batam cabeça. O que propõe Aécio? Silenciar diante de um Palocci? Calar-se diante dos descalabros do Ministério dos Transportes? Não dizer uma vírgula sobre a empresa do patriota Eunício Oliveira? E só para reiterar: o documento de Serra, como atesta a nota de Guerra, não foi divulgado à revelia do partido.
Teoria da ponte
A que ou quem serve “a ponte” que Dilma teria lançado, seguindo o pensamento de Aécio, relatado por João Bosco Rebello? Bem, se ela tinha a intenção de desarmar e de desarticular a oposição, a serem as coisas como quer Aécio, então Dilma estaria sendo muito bem-sucedida, não é mesmo? Depois de ter passado 17 anos esculhambando os tucanos, bastaria um elogio para que a oposição se derretesse. Compreende-se, nesse contexto, que seja considerada inadequada e fora de tom a fala de um político que lembra que a oposição existe e que, na democracia, é ela que legitima o governo , uma vez que só há oposição livre… na democracia!
Não estou criticando a coluna de João Bosco. Registra o pensamento de um senador da oposição, um dos pré-candidatos do PSDB à Presidência da República. O que me espantou foi certo colunismo, que se revelou quase ofendido com o documento e com o discurso de Serra. Na sexta, o deputado Mendes Ribeiro (PMDB-RS), nomeado líder do governo no Congresso, revelou a recomendação que lhe fizera a presidente Dilma no exercício do cargo: “desarmar os espíritos”, “buscar o entendimento” e “ter paciência”.
Entende-se, pois, que o espíritos andam armados, que o entendimento inexiste e que a pressão é grande. Sim, em um aspecto ao menos Aécio está certo: o governo encontra alguns severos problemas em sua base de apoio. Deve, por isso, a oposição renunciar à sua tarefa? Deve, então, deixar de dizer o que tem de ser dito para ficar assistindo à confusão da base, enquanto transita na “ponte”? Ora… Não custa lembrar que Luiz Inácio Lula da Silva, que é quem manda no PT e quem vai comandar as alianças dos petistas já neste 2012, não enviou nem mesmo simples “parabéns” a FHC. Sei lá… Talvez ache injusto até mesmo algo de que o tucano certamente não faria a menor questão: completar 80 anos primeiro!
Oposição é parte da construção democrática
Atenção para uma questão essencial! Uma oposição não tem nem mesmo a obrigação de ser justa! Fosse essa uma exigência para que alguém pudesse se opor ao poder, estaríamos numa tirania, ainda que eventualmente virtuosa, em que um tribunal julgaria de antemão os motivos dos adversários do governo. Imaginem, então, quando as razões abundam, e a sua evidência está nas recomendações que a própria mandatária dá a seu líder no Congresso!
Mais ainda: oposições justas não conseguem, muitas vezes, lograr o seu intento. E pode acontecer de as injustas serem bem-sucedidas. Isso tudo é parte do jogo democrático, daquele sistema que, como bem observou Churchill, no que já é um clichê, mas de verdade intrínseca ainda insuperável, é “a pior forma de governo, com exceção de todas as outras que têm sido tentadas de tempos em tempos”. A propósito: Churchill venceu Hitler, mas foi derrotado pelos britânicos, que o apearam do poder. Foi justo? Não importa! Foi democrático! Qualquer outro regime que impedisse o povo de fazer a sua escolha seria pior, com o que o próprio Churchill concordava.
Vão fazer outra coisa!
Se os tucanos consideram que o PSDB não suporta um discurso como o de Serra ou um documento como aquele, que, então, mudem de ramo ou mudem de lado. Num caso, devem parar de fazer política; no outro, devem se juntar a Dilma Rousseff na esperança tola, estúpida, de que, quem sabe?, ela se desgrude um tantinho de Lula e do PT. O Brasil tem jabuticaba, tem pororoca, Tiririca, mulher-melancia; tem até bandido-filósofo, que lê Nietzsche na cadeia - e tem filósofos-bandidos também, que justificam o terrorismo, por exemplo. Não nos faltam exotismos. Mas uma coisa é certa: não conseguimos um outro feito único no mundo, que seria transformar uma oposição governista em algo virtuoso para a democracia.
Não há uma só democracia do mundo em que o direito de fazer oposição - ou melhor: A OBRIGAÇÃO - seja contestado por setores da própria imprensa e até por líderes da oposição. Num editorial deste domingo, o Estadão escreve algo que certos oposicionistas hoje talvez considerem de um radicalismo insuportável:
“Tudo fica ainda pior quando a essa dificuldade estrutural se soma a inexperiência, ou a inaptidão, do presidente da República para manter sua maioria no Congresso sob relativo controle. É o que se tem visto, uma vez e outra e outra ainda, no governo Dilma Rousseff. Não se lhe fará a injustiça de ignorar que ela procura dar o melhor de si no desempenho da função. Mas tampouco se pode imaginar que ela desconhecesse, ao tomar posse, as realidades do exercício do poder no País, das quais faz parte a disposição dos políticos de pagar para ver a mão de quem, conforme o seu patrimônio de liderança, ou aprenderão a respeitar ou insistirão em chantagear (…).O episódio dos restos a pagar é, por baixo, o terceiro tropeção do governo em assuntos relevantes, depois da votação do Código Florestal e do zigue-zague de Dilma no caso do sigilo eterno (ou limitado a 50 anos) dos papéis oficiais considerados ultrassecretos. A repetição não deixa dúvidas: a presidente governa por ensaio e erro, e o seu governo é a coisa mais parecida que existe em Brasília com uma sanfona. Não adianta culpar por isso o disfuncional sistema político. Dilma é que tarda a assumir a sua responsabilidade primária: encarnar na Presidência.”
Quem quer chegar ao poder tem de se preparar para vigiar o governo, apontar as suas falhas, debater caminhos, propor alternativas - e olhem que, a exemplo do que fez o PT, nem precisa necessariamente cumprir as promessas. O conteúdo do documento de Serra foi deixado de lado para privilegiar, mais uma vez, o racha interno, a picuinha, as fofoquinhas, os “offs” plantados… Em suma: a base de Dilma Rousseff, como evidencia a reportagem de VEJA desta semana sobre o PR, causa-lhe muita dor de cabeça. Não é que há tucanos se oferecendo para um namorico na ponte?
E o que há do outro lado da ponte? O PT! Ou seja: a derrota!