44%, senhor Luiz Inácio Lula da Silva, lhe disseram "Não!!!"

Publicado em 01/11/2010 08:10 e atualizado em 02/11/2010 02:24

Ah, a petralhada gostaria de me ver arrancando os cabelos, agora que os tenho, desesperado, a esmurrar as paredes! De fato, é não me conhecer. Trabalhei e produzi ontem normalmente, apesar de alguns percalços de ordem pessoal, quase inteiramente superados, e que nada tiveram a ver com as urnas. Ao contrário! Estou frio como uma lâmina para pensar e com o coração sempre quente para escrever, hehe. Morno, como disse no texto de ontem, jamais! Há dias, Lula, repetindo o seu blogueiro pançudo, dizia que os 3% que acham seu governo “ruim ou péssimo” deveriam estar no “comitê de certo candidato”. A isto Lula gostaria que a oposição estivesse reduzida: a 3%!!! Ele bem que tentou! Mas não! Nas urnas, ela se revelou 44% dos que foram votar. A oposição fez ainda 10 governos estaduais — 8 do PSDB (Paraná, São Paulo, Minas, Goiás, Tocantins, Alagoas, Pará e Roraima) e 2 do DEM (Santa Catarina e Rio Grande do Norte) . Governará 52,3% da população e bem mais da metade do PIB.

O presidente dos “83% de ótimo e bom” — que era, na verdade, quem disputava a eleição, já que Dilma fez questão de não existir — obteve 55% dos votos totais nas urnas, correspondentes a 41% do eleitorado. Como demonstrei em outro post e está historicamente provado, a esquerda leva sempre um terço do eleitorado pelo menos. Esses números dão conta do real poder mágico de Lula. O PT elegeu 5 governadores — Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Bahia e Sergipe. Os outros 12 “governistas” são do PMDB (5), PSB (6) e PMN (1). A oposição, se quiser ser oposição, está viva e pode respirar muito bem. Só precisa parar de errar — e alguém poderia dizer: “É aí que mora o problema!” Sim, é aí. Dilma Rousseff terá uma maioria folgada na Câmara e no Senado, garantida, como sempre, pelo PMDB — e é aí que mora o problema dela.

De saída, cumpre notar que este, definitivamente, não é um país que vota com a esquerda coisa nenhuma! Não é de esquerda o Congresso e não são de esquerda — nem mesmo essa esquerda petista — a esmagadora maioria dos governadores. O PT exerce a hegemonia na grande aliança em razão da força pessoal de Lula e do aparelhamento do estado e de sindicatos, base de sua, digamos, força material. Para levar adiante o “Projeto Dilma”, o partido teve de ceder os anéis em muitos estados, dividindo o poder com o PMDB e com o PSB. Os dois partidos logo estarão se batendo pela divisão do butim. Os ditos “socialistas” cresceram no Parlamento e elegeram seis governadores: 4 no Nordeste (Piauí, Ceará, Paraíba e Pernambuco), 1 no Norte (Amapá) e 1 no Sudeste (Espírito Santo). Lula está doidinho para fundir a legenda com o PT. Eduardo Campos, governador reeleito de Pernambuco e líder inconteste do PSB, não deve ser tolo: de chefe de um grupo com razoável poder de pressão, passaria a ser um não-petista no PT. Seu projeto presidencial já estará na rua no dia 2 de janeiro de 2011— no mínimo, para negociar.

Assim, o PT não sai das urnas como o partido que faz o que bem entende, nem Lula se sagra como o demiurgo palpiteiro que, mesmo fora da Presidência da República, decidirá os destinos da nação. Dilma poderá se aconselhar com ele quantas vezes quiser, mas sabe que sua influência será limitada. “Mas e a dos governadores, Reinaldo, é assim tão grande? Não é o Congresso que conta?” Mais ou menos.

Deputados federais paulistas e mineiros, para citar dois estados com bancadas grandes, ainda que petistas ou governistas, sabem que não convém entrar em choque com os respectivos governadores — essa questão será especialmente candente caso Dilma queira, de fato, fazer uma reforma tributária. Se os 10 da oposição conseguirem — e eu sei que é difícil — um consenso mínimo (em vez de ficarem se estapeando, o que Dilma adoraria) —, o tamanho da oposição no Congresso perde um pouco de importância. Desde logo, teriam de criar uma espécie de fórum permanente para discutir as questões que dizem respeito a seus respectivos estados.

Os 43,7 milhões
Outra questão muito relevante a ser considerada são as condições em que a oposição obtém esse número de votos, reduzindo em mais de 10 pontos a diferença na comparação com 2002 e 2006. O jogo, desta feita, foi muito mais pesado. Lula e a máquina que ele mobilizou no subjornalismo não tiveram limites. Ele despiu-se completamente do decoro — ainda ontem, falou mais um absurdo (veja abaixo). Seus aliados naquela variante do crime que se confunde com imprensa trilharam cada palmo da abjeção.  A estrutura do estado foi mobilizada para eleger a sua criatura eleitoral. Manifestou-se de diversos modos: quebrando sigilos e impedindo ou procrastinando a investigação; escalando ministros de estado e chefes de estatais para falar como líderes de facção; organizando a agenda do governo e das empresas públicas para produzir factóides eleitorais. O auge da manipulação foi o anúncio, obviamente apressado, da descoberta de uma “nova possível quem sabe provável é bem capaz” reserva de petróleo no pré-sal dois dias antes da eleição. Fez-se ainda profissão de fé na mentira, com o fantasma ressuscitado das privatizações — a que a campanha do PSDB, é fato, respondeu, de novo, de modo desastrado, o que não retira o caráter vigarista da acusação.

Pois bem, ainda assim, apesar de tudo isso, a despeito de toda sem-vergonhice, de um constrangedor endeusamento da figura de Lula, que tocou as raias do ridículo, nada menos de 44% dos eleitores que compareceram às urnas disseram “NÃO”. E esse “NÃO” FOI DITO A LULA, NÃO A DILMA. Os petistas confundiram — e, infelizmente, o marketing eleitoral da oposição também (e pela segunda vez) — a aprovação ao governo Lula com uma carta branca para ele falar o que bem entende, fazer o que entende, eleger quem bem entende. O petralha assanhado logo dirá: “Ué, mas elegeu Dilma, não foi?” Foi, sim! Mas a que expedientes recorreu para isso? Até onde teve de descer? Quanto teve de gastar de recursos públicos — arreganharam-se os cofres —  para lograr o seu intento?  E tudo isso para que, no fim, a campanha convergisse para o terrorismo. Lula teve de renunciar a todos os princípios do republicanismo e do decoro para que 6,05% dos eleitores lhe garantissem a vitória. A distância de 12 pontos numa polarização tende a esconder a margem relativamente estreita de seu triunfo.

Mar de votos. O que fazer?
Os oposicionistas saem desse pleito com um mar de votos. E votos, insisto, qualificados porque conseguiram resistir a todas as vagas da empulhação e à mais desonesta campanha eleitoral a que assisti desde a redemocratização — ou antes, desde a eleição direta para os governos de estado, em 1982. Muitos podem até apoiar o “Lula presidente”, mas não aprovaram o “Lula cabo eleitoral”.

Se as atuais oposições optarem por se opor apenas nos seis meses finais de 2014, serão jantadas de novo pelo petismo — afinal, Lula estará dando sopa, em busca de emprego. Pode-se apostar que dificuldades virão pela frente, inclusive no cenário internacional, e que Dilma acabará fazendo bobagem. Mas essa é sempre uma aposta arriscada. As oposições, nas democracias, devem se preparar para disputar com adversários bem-sucedidos. Opor-se não é sinônimo de dizer “não” apenas; também é sinônimo de alternativas, pelas quais se deve brigar, procurando mobilizar pessoas e correntes de opinião. Mais: precisa estabelecer uma agenda e um conjunto de valores em nome dos quais vai lutar.

Por mais estranha que possa parecer a proposta, e sei que parece, o primeiro passo do PSDB, reitero, é mergulhar na sua própria história para recolocar os fatos no seu devido lugar. Não pode mais continuar seqüestrado pelo PT. No ano que vem, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso faz 80 anos. As oposições, os 44 milhões que não se deixaram levar pela estupidez de que ele foi um mau presidente e os que têm apreço pela história devem-lhe mais do que um desagravo; devem-lhe a verdade: fundou as bases do Brasil viável. Sem esta “volta para o futuro”, quem não tem futuro é o PSDB porque fica sem passado.

Por Reinaldo Azevedo

Pronto! Começou! MST comemora vitória de Dilma quebrando a cabeça de um adversário

Vocês se lembram de Borebi, no interior de São Paulo? É aquela cidade dos laranjais derrubados pelo MST, entre outros vandalismos. Pois é… O “movimento” considera Antonio Carlos Vaca, o prefeito, um inimigo. Ontem à noite, militantes dessa “causa social” foram comemorar a vitória de Dilma Rousseff numa praça perto de sua casa. Alguns deles tentaram tirar cartazes em favor de Serra que ele havia colocado em sua propriedade. O MST, como sabemos, acha que essa conversa de propriedade é papo furado. É o que continua expresso, diga-se, no Programa Nacional-Socialista dos Direitos Humanos, aquele que foi gestado na Casa Civil, quando Dilma Rousseff, presidente eleita, era ministra. O prefeito se zangou e foi agredido por militantes do movimento. Está internado com traumatismo craniano.

Li vários relatos, de vários jornais. A coisa é noticiada mais ou menos assim: “O prefeito foi empurrado, caiu e bateu a cabeça”. Não aparece o agente da voz passiva. Logo será preciso mudar a língua portuguesa, transformando o verbo “empurrar” em pronominal, aplicando ainda um reiterativo para deixar tudo bem claro: “O prefeito empurrou-se a si mesmo, caiu e quebrou a própria cabeça só para culpar o MST”. Aliás, acho que é preciso mudar a Constituição: “Todo não-petista será culpado quando for agredido na cabeça”

O MST foi um dos temas que praticamente ficaram ausentes da campanha eleitoral do PSDB. O candidato José Serra criticou, sim, sua atuação em debates e em entrevistas, censurou as distorções do tal programa de direitos humanos, mas o tema mereceu uma menção não mais do que lateral nos programas de TV, o que é, evidentemente, um erro. Mais de 70% dos brasileiros rejeitam os métodos desses senhores. E não está claro, não o suficiente ao menos, que se trata de um movimento financiado com dinheiro do governo federal.

Como a agente ilustra esse post? Que tal assim?

dilma-bone-do-mstOu assim?


Dou as boas-vindas às afinidades eletivas da presidente eleita. Como ? “O que ela tem a vem com o movimento?” Até que não faça um mea-culpa por causa daquele boné, ela se torna co-responsável, moral ao menos, pelos males que a turma praticar. É o mínimo que se deve exigir de uma figura pública. O MST racha a cabeça das pessoas porque aposta na impunidade e obtém a impunidade. Presidentes da República e ministros de estado são porta-estandartes da Constituição, aquela que ela jurou respeitar ontem.

Por Reinaldo Azevedo

Dilma no Jornal Nacional: a Convertida. Ou: Uma fala contra os fatos

Dilma Rousseff, a presidente eleita, concedeu uma entrevista há pouco ao Jornal Nacional. Além da conversão ao catolicismo, converteu-se também à liberdade de imprensa, pela qual demonstrou apreço irrestrito. William Bonner poderia ter perguntado, mas talvez seja mesmo um pouco cedo, se ela vai, então, arquivar no lixo as “conclusões” da Confecom, de Franklin Martins. Teria a coisa ficado implícita?

O “Pelo Sinal” católico ela ainda não aprendeu a fazer. Vamos ver se aprende com mais rapidez os rituais da imprensa livre. Já defendeu a legalização do aborto e depois disse ter mudado de idéia. Como ministra chefe da Casa Civil, ajudou a elaborar o Programa Nacional-Socialista dos Direitos Humanos, que extinguia a liberdade de imprensa, e enviou ao TSE um programa de governo, devidamente rubricado, que fazia o mesmo. Das duas uma: ou mudou de idéia também nesse caso, e isso é boa notícia, ou acha que não estava defendendo censura antes, e isso é uma má notícia.

O primeiro tema sobre a qual foi convidada a perorar disse respeito a seu passado na luta armada — com o testemunho de um “companheiro” que sustentou que ela mesma nunca pegou no berro. Pode ser. Jacob Gorender, historiador de esquerda e autor do livro Combate nas Trevas, afirma que o Colina (Comando de Libertação Nacional), um dos grupos a que Dilma pertenceu, foi um dos poucos a fazer a defesa clara do terrorismo. Talvez ela pertencesse à facção lítero-musical do grupo, que organizava chás beneficentes com as senhoras respeitáveis da sociedade mineira. Enquanto alguns pegavam na metranca, outros pegavam no cabo da xícara.  Depois ela fez parte da VAR-Palmares, uma organização também com alto índice de letalidade — pelo bem da humanidade. Mas ela resistiu. Que bom! Nem queria falar sobre isso propriamente. Veio só a título de ilustração. O que me chamou a atenção foi outra coisa.

Dilma, claro!, mudou porque o Brasil “se transformou” numa grande democracia. “Se transformou”? Geração espontânea? Ah, não! Foi a construção de muita gente — na contramão das apostas das companheira, que iam no outro sentido. Segundo ela, a sua geração “não imaginava” que isso pudesse acontecer. Pois é. Mas houve os que imaginaram. E foram devidamente combatidos por aqueles que pensavam como Dilma.

Ainda fazendo digressões sobre os sonhos de sua geração, afirmou que eles só se cumpriram, calculem vocês, com o governo do presidente Lula,  quando o Brasil cresceu e distribuiu renda. Há aí uma dupla empulhação. Antes de Lula, a economia brasileira saiu da lama foi mesmo no período Itamar/Fernando Henrique Cardoso. O Real distribuiu renda, sim, e tirou pelo menos 15 milhões da miséria. E a outra mistificação? A turma de Dilma nunca quis democracia ou distribuir renda; queria ditadura comunista. Por que escrevo essas coisas? Como se nota, não é para que a petista não seja eleita. Escrevo porque uma presidente da República tem a obrigação de dizer a verdade — e o mesmo vale para este blog.

Surrealismo
A expressão máxima do surrealismo viria em seguida, quando Dilma, imaginem, admitiu que os primeiros anos da redemocratização foram muito difíceis por causa da inflação, muito mesmo… E se falou depois de como foi bom ter superado aquele tempo. E ela não disse uma vírgula sobre o Real, citado de passagem por William Bonner. Dilma não precisou corrigir a sua fala de havia segundos, quando afirmou que o “sonho” do Brasil justo só foi vivido mesmo com… Lula!

Na seqüência, como uma grande homenagem, certamente involuntária,  à ironia, vimos o presidente em palanque a afirmar que o eleitor não permitiria que o Brasil voltasse ao passado. Qual passado? O da inflação descontrolada de Sarney? Não, né? Sarney hoje é Lula. O do destrambelhamento  colorido? Não, né? Collor hoje é Lula. O Brasil não voltaria ao passado de FHC, aquele do Plano Real, que consertou a economia e pôs fim justamente à inflação.

Mais uma vez, provocada por Bonner, voltou a fazer o elogio da imprensa livre, de que aquela entrevista, acordou-se ali, seria exemplar. Que bom! Que Dilma a defenda mesmo, não?, inclusive quando chegar a hora de ser confrontada com suas contradições, um “risco” jornalístico a que também autoridades, e não só candidatos, devem ser expostos.

Por Reinaldo Azevedo

Aqui e ali se diz que a mensagem de José Serra, ontem, depois de conhecido o resultado das urnas, foi dura. Pois eu gostei, é evidente! Não gosto é das coisas mornas, lembram-se? Não foi, de fato, aquela fala usual, típica da gramática da derrota. Ao contrário. Ele a refugou: “Pode parecer estranho para um candidato que não ganhou a eleição, mas vim aqui não para falar de minha frustração, vim falar da esperança. Nesses meses duríssimos, quando enfrentamos forças terríveis, você alcançaram uma vitória estratégica. Cavaram uma grande trincheira, construíram uma fortaleza, consolidaram um campo político em defesa da liberdade e da democracia no Brasil. Em defesa das grandes causas econômicas e sociais do país.”

É isso aí! Uma fala inusual para uma campanha inusual. Não dá para fazer de conta que Serra enfrentou forças típicas de numa eleição. As franjas do estado policial mobilizadas para fazer dossiês, invadindo direitos protegidos pela Constituição, não são corriqueiras. Um presidente da República que, por meio de uma fala irresponsável, beirando a chacota, condescende com a violência de uma horda cujos líderes ele abraçara pouco antes, não faz uma disputa convencional. Ter como âncora de uma campanha uma rematada mentira, como a história da privatização, não deve ser recebido como expediente aceitável.

Por isso, nesse caso, o decoroso é ser sincero!

E Serra deixou claro que seus quase 44 milhões de votos não lhe permitem pendurar a chuteira: “Para os que nos imaginam derrotados, saibam de uma coisa: apenas começamos a lutar de verdade. Vamos dar nossa contribuição ao país em defesa da pátria, da liberdade, da democracia, do direito que todos têm de falar e serem ouvidos. Da integridade da vida pública. Essa será nossa luta nos próximos anos. Por isso, minha mensagem de despedida para vocês não é um adeus, é um até logo. A luta continua.”

Vai disputar isso ou aquilo? Parece um tanto cedo para esse tipo de questão.

Há quem queira que a fala convencional teria sido melhor. Discordo obviamente! Horas antes, ninguém menos do que Lula afirmava que “Serra havia saído menor da disputa”. Decoro? Para quê? Marco Aurélio Top Top Garcia, este monumento moral, reiterava que “Serra terá um final melancólico”, mesmo com a vitória de sua candidata já consolidada. Tarso Genro, governador eleito do Rio Grande do Sul, fingindo que o PT teve uma vitória esmagadora, o que é falso, atribuía o resultado à suposta agressividade da oposição. São esses os petistas, a começar de Lula, decorosos?

O PT não sabe nem perder nem ganhar. Chegou a hora, parafraseando Marina Silva, de a oposição ganhar perdendo! Até porque sai das urnas muito mais forte do que a prancheta dos petistas previa. E a hora de fazer oposição, nas democracias,  sempre é já tanto quanto nas ditaduras é nunca.

Por Reinaldo Azevedo

Abaixo, segue trecho do primeiro discurso de Dilma Rousseff, falando já como presidente eleita do Brasil. Comentarei mais tarde.
*
Minhas amigas e meus amigos de todo o Brasil,

É imensa a minha alegria de estar aqui. Recebi hoje de milhões de brasileiras e brasileiros a missão mais importante de minha vida. Este fato, para  além de minha pessoa, é uma demonstração do avanço democrático do nosso país: pela primeira vez uma mulher presidirá o Brasil. Já registro portanto aqui meu primeiro compromisso após a eleição: honrar as mulheres brasileiras, para que este fato, até hoje inédito, se transforme num evento natural. E que ele possa se repetir e se ampliar nas empresas, nas instituições civis, nas entidades representativas de toda nossa sociedade.

A igualdade de oportunidades para homens e mulheres é um principio essencial da democracia. Gostaria muito que os pais e mães de meninas olhassem hoje nos olhos delas, e lhes dissessem: SIM, a mulher pode!

Minha alegria é ainda maior pelo fato de que a presença de uma mulher na presidência da República se dá pelo caminho sagrado do voto, da decisão democrática do eleitor, do exercício mais elevado da cidadania. Por isso, registro aqui outro compromisso com meu país:

- Valorizar a democracia em toda sua dimensão, desde o direito de opinião e expressão até os direitos essenciais da alimentação, do emprego e da renda, da moradia digna e da paz social.
- Zelarei pela mais ampla e irrestrita liberdade de imprensa. 
- Zelarei pela mais ampla liberdade religiosa e de culto.
 
- Zelarei pela observação criteriosa e permanente dos direitos humanos tão claramente consagrados em nossa constituição.

- Zelarei, enfim, pela nossa Constituição, dever maior da presidência da República.

Nesta longa jornada que me trouxe aqui pude falar e visitar todas as nossas regiões. O que mais me deu esperanças foi a capacidade imensa do nosso povo, de agarrar uma oportunidade, por mais singela que seja, e com ela construir um mundo melhor para sua família. É simplesmente incrível a capacidade de criar e empreender do nosso povo. Por isso, reforço aqui meu compromisso fundamental: a erradicação da miséria e a criação de oportunidades para todos os brasileiros e brasileiras.

Ressalto, entretanto, que esta ambiciosa meta não será realizada pela vontade do governo. Ela é um chamado à nação, aos empresários, às igrejas, às entidades civis, às universidades, à imprensa, aos governadores, aos prefeitos e a todas as pessoas de bem.
Íntegra aqui

Por Reinaldo Azevedo

No dia de hoje, os eleitores falaram e nós recebemos com respeito e humildade a voz do povo. Quero aqui cumprimentar a candidata eleita Dilma Rousseff (PT) e desejar que ela faça bem para o nosso país.

Eu disputei com muito orgulho a Presidência da República. Quis o povo que não fosse agora. Mas digo, aqui, de coração, que sou muito grato aos 43,6 milhões de brasileiros e brasileiras que votaram em mim. Sou muito grato a todos e a todas que colocaram um adesivo, uma camiseta que carregaram uma bandeira com Serra 45.

Quero agradecer também aos milhões de militantes que lutaram nas ruas e na internet por um Brasil soberano, democrático e que seja propriedade do seu povo.

Eu recebi tanta energia nessa campanha, foram sete meses de muita energia, de muita movimentação e de muito equilíbrio também, que foi necessário. E eu chego hoje, nesta etapa final, com a mesma energia que tive ao longo dos últimos meses. O problema é como dispender essa energia nos próximos dias e semanas

Ao lado desses 43,6 milhões de votos, nós recebemos, também, votos que elegeram dez governadores que nos apoiaram. Dos quais, um está presente. Um companheiro de muitas jornadas, Geraldo Alckmin. Ele se empenhou na minha eleição, mais do que se empenhou na dele

A maior vitória que nós conquistamos nessa campanha não foi mérito meu, mas foi de vocês [imprensa]. Nesses meses duríssimos, onde enfrentamos forças terríveis, vocês alcançaram uma vitória estratégica no Brasil. Cavaram uma grande trincheira, construíram uma fortaleza, consolidaram um campo político de defesa da liberdade e da democracia do Brasil

Vi centenas e milhares de jovens que me lembraram o jovem que eu fui um dia, sonhando e lutando por um país melhor, como eu faço até hoje. Onde os políticos fossem servidores do povo e não se servissem do nosso povo

Para os que nos imaginam derrotados, eu quero dizer: nós apenas estamos começando uma luta de verdade. Nós vamos dar a nossa contribuição ao país, em defesa da pátria, da liberdade, da democracia, do direito que todos têm de falar e de serem ouvidos. Vamos dar a nossa contribuição como partidos, como parlamentares, como governadores. Essa será a nossa luta

Por isso a minha mensagem de despedida nesse momento não é um adeus, mas um até logo. A luta continua. Viva o Brasil

Por Reinaldo Azevedo

Como escrevo em outro texto — e jamais vou perder isso de vista —, assistimos nessa campanha a uma truculência inédita do poder federal. Lula aviltou as instituições para eleger a sua criatura eleitoral. Isso não nos deve impedir, no entanto, de apontar erros essenciais na campanha do PSDB, em especial no horário eleitoral.

Comecemos do básico: Lula será mesmo esse demiurgo, que pode eleger quem bem entender — daí a necessidade de a oposição fazer uma campanha que evite o confronto, abstendo-se tanto de falar bem de si mesma como de falar mal do governo? Pois é. Estamos diante de uma doxa. Contra todas as evidências aparentes, a resposta é “não”. Querem ver?

Em 1989, quase um terço dos eleitores que foram às urnas votou na esquerda: 16,08% em Lula e 14,45% em Brizola. Em 1994, a mesma coisa: 27,04% em Lula e 3,18% em Brizola. Em 1998, idem (31,71% em Lula). Em 2002 e 2006, com discurso novo e política agressiva de alianças, o PT saiu daquele terço tradicional: Lula obteve, respectivamente, 46,44% e 48,61% no primeiro turno, índice quase igual ao de Dilma em 2010: 46,91%.

A seqüência de números nos indica algumas coisas: um terço do eleitorado pertence à esquerda e ponto final. Um terço vota contra a esquerda e ponto final. E é sempre aquele terço intermediário que está em disputa. Qualquer que fosse o candidato do PT, com ou sem as bênçãos de Lula, esse potencial está garantido. O resto tem de ser conquistado. Por três eleições seguidas, o PT fez a sua maioria naquele grupo — desta vez, bem menos do que nas duas anteriores.

O eleitorado brasileiro tem 135 milhões de pessoas — e é nessa base que os institutos avaliam a popularidade do presidente. Se ela for mesmo de 83%, estamos falando na aprovação de quase 113 milhões de pessoas. Dilma se elegeu presidente com 55,7 milhões de votos. Compareceram às urnas 106.050.082 pessoas, 78,55% do eleitorado. O candidato da esquerda levaria um terço disso ainda que fosse um poste — logo, não haveria por que Dilma não levar: 35,35 milhões.  O real poder de transferência de votos de Lula é, pois, de 20,35 milhões de pessoas no máximo — 15% do eleitorado total, ou, contando com generosidade, 19% do que compareceu para votar. É rigorosamente disso que se trata. É histórico e é matemático.

Medos
Foi com medo desses 15% ou 19%, na prática, que a campanha da oposição — e sempre se deve relevar o jogo sujo, reitero — tomou o caminho errado, repetindo, diga-se, o erro de 2006. Alguém dirá: “Pô, mas somem-se esses 15% ou 19% àquele terço, e se tem praticamente mais da metade, Reinaldo”. Pois é. Eu me referi ao potencial máximo de transferência. Não quer dizer que ele se realizasse fatalmente e que pessoas desse grupo não pudessem ser convencidas. Mais ainda: a abstenção passou de 20%. É gente pra chuchu, que tem de ser chamada a votar. Como?

Eis o busílis. O PSDB passou boa parte do primeiro turno dedicado à maximização do minimalismo administrativista, sem uma mensagem política clara aos eleitores. Aquele que é sabidamente o homem público mais preparado do país — e isso não é chavão ou clichê, mas fato — foi convencido, deixou-se convencer ou foi tragado pelo argumento de que a política era um mau caminho: o confronto haveria de se dar no terreno da administração, da gestão, da comparação de biografias (a dele é infinitamente mais rica) e das obras realizadas. A questão seria esta: “Quem é mais competente para dar seqüência à obra de Lula: a Dilma ou o Zé?” A intenção de voto murchava.

Não por acaso, esse era a escolha do PT. Também o partido de Lula deixou a política de lado — a não ser para fazer comparações falsas, vigaristas, entre os oito anos do PT e os oito anos do PSDB. Obreirismo contra obreirismo, o do PT se mostrava mais festivo; promessa contra promessa, o lulismo será sempre imbatível.

Quem politizou?
A diferença entre Dilma e Serra é bem menor do que apostavam os petistas. Não tenho dúvida de que ela se deve à politização havida na reta final do primeiro turno, que QUASE teve seqüência no segundo. E é bom deixar claro: não foi uma escolha do PSDB, não! Foi uma escolha da sociedade. Questões como o aborto e a liberdade de expressão — às quais Dilma se viu obrigada a se referir em seu primeiro pronunciamento — serviram para aproximar mais o PT de si mesmo; criaram uma justa sombra desconfiança. Justa porque ninguém atribuía ao partido e à candidata nada que não fosse de sua natureza e de sua história. A sociedade levou a disputa para o segundo turno. E a primeira pesquisa  feita depois do dia 3 indicava uma diferença de apenas 8 pontos entre os dois candidatos — acabou sendo de 12.

Aquela primeira semana era decisiva. As ruas respiravam um certo clima de virada — e se esperava que ao cruzado no queixo se seguissem outros golpes firmes da oposição. A PT ficou visivelmente aparvalhado. Antes mesmo que pudesse se reorganizar, a campanha do PSDB, reiniciada na sexta seguinte, dia 8, voltava a oferecer aquele mais do mesmo do primeiro turno: a tal maximização do minimalismo administrativista, em que o homem preparado para ser estadista se dedicava a propostas pontuais para resolver a saúde, a educação, o transporte. Em vez de a campanha embarcar na onda que estava nas ruas, quase fez o contrário: mandou todo mundo pra casa para esfriar a cabeça.

Privatização
No seu segundo programa na TV, o PT decidiu partir, ele sim, para a politização aberta e para o escracho. Não só passou a acusar os tucanos de desvios éticos por causa de Paulo Souza — se isso contou, contou pouco — como passou a pespegar nos adversários a pecha de privatistas, inventando a mentira de que, se eleito, Serra privatizaria o pré-sal e a Petrobras. A reação tucana, como escrevo num texto abaixo, foi tardia e falha. Exibiu as suas reais conquistas na área de telefonia quase com preguiça e praticamente aderiu à tese do PT de que concessão em petróleo corresponde a privatização, tentando inverter a acusação. Ora, quem consegue ser mais verossímil, mesmo mentindo, ao atribuir este suposto “defeito” ao adversário? É evidente que o caminho era outro. O PSDB foi vítima duas vezes da mesma vigarice, da mesma patacoada. Teve uma reação errada em 2006. Teve uma reação errada agora. Na segunda semana da campanha do segundo turno, o PT havia estancado o que poderia ser a sangria de votos de Dilma Rousseff.

Temas essenciais para os brasileiros — cito um óbvio: a baderna que o MST promove no campo, por exemplo — entraram na campanha na reta final, como mera ilustração de uma crítica que Serra fez ao MST em um dos debates. A politização tinha levado ao segundo turno e àquele clima de virada. E a possibilidade de vitória estava em oferecer mais política, não menos, como se fez. O administativismo tinha quase conduzido à derrota no primeiro turno. Era improvável que ajudasse a conquistar a vitória no segundo.

Para encerrar
Lula, Tarso Genro e Marco Aurélio Top Top Garcia comentaram o resultado das eleições — o presidente ainda antes do fim da votação. Foram brutais, como de hábito. Para eles, Serra perdeu porque partiu para o ataque. Bem, se é petista falando sobre tucano, então deve ser o contrário. Faltou dureza e faltou política, issso, sim! O presidente dos 83% de popularidade ganhou uma disputa, num eleitorado de quase 136 milhões de habitantes, por uma diferença pouco superior a 12 milhões de votos: menos de 9%!

Ele não imbatível, intocável ou incriticável. Com mais política, desde o começo, talvez se tivesse conseguido chegar lá. Teria chegado fatalmente? Como é que eu vou saber.  Sei o que a política fez em benefício da democracia: levou as eleições para o segundo turno e deu às oposições um oceano de votos.  Dilma e o PT já  perceberam isso. O seu discurso da vitória já incorporou o recado das urnas (comentarei a seua fala). Que a oposição tenha claro: sempre será a política!

Por Reinaldo Azevedo

Começo este texto pela ressalva: qualquer comentário que não leve em conta a truculência oficial no processo eleitoral será sempre manco. Nunca se viu uso tão descarado da máquina pública em favor de uma candidatura. O desassombro com que o presidente Lula renunciou a qualquer resquício de decoro, à tal liturgia do cargo, para se entregar ao bate-boca eleitoral é certamente inédito. Nunca se viu uma agenda administrativa tão colada à agenda eleitoral e partidária. Até mesmo o anúncio de uma possível nova reserva gigante de petróleo no pré-sal - que pode conter “x” bilhões de barris ou “5x” - se fez de acordo com as exigências do calendário político: dois dias antes da eleição. E assim se fez quando a peça da resistência da campanha eleitoral petista era justamente a suposta, porque falsa, intenção dos tucanos de privatizar a Petrobras e o pré-sal. A ressalva se estende por mais um parágrafo ainda, antes que retome o fio da primeira linha.

Nunca antes nestepaiz se viu tanta sujeira numa campanha. Já na largada, descobriu-se um verdadeiro bunker montado em Brasília destinado à produção de dossiês. Constatou-se, o que endossou as acusações de Serra, que o sigilo fiscal de tucanos e de familiares do candidato havia sido violado. Em todos os casos, as digitais do petismo se fizeram presentes. No bate-boca eleitoral, atribuiu-se, com a colaboração de setores da imprensa - o que é fabuloso -, o jogo bruto à vítima. Isso também é inédito Feitas as ressalvas, retomemos o fio.

Há pelo menos oito anos, esta que se chama hoje oposição é refém da narrativa que o PT inventou para ela. As três campanhas eleitorais tucanas - 2002, 2006 e 2010 - mostraram-se incapazes de responder à vaga de desqualificação do petismo. Nem mesmo se pode dizer que consegue ser apenas reativa porque nem a isso chega. Ao contrário até: faz um enorme esforço para mudar de assunto. E a estratégia tem falhado reiteradamente. Disputou com candidatos ruins? De jeito nenhum! José Serra e Geraldo Alckmin eram personagens eleitoralmente viáveis. O problema é de outra natureza. Parece haver um erro básico de leitura da realidade.

Tenho pra mim que há três eleições pelo menos os tucanos se tornaram reféns também de pesquisas qualitativas: em 2002, o fantasma era a “impopularidade” de FHC, o que fez com que a campanha da oposição tentasse se descolar do governo - governo que tinha, sim, passado pela crise energética em 2001, mas que reunia méritos gigantescos, muitos deles então frescos na cabeça do eleitor. Mas as pesquisas diziam: “Não toquem no nome de FHC pelo amor de Deus!”. E o governo que havia estabilizado a economia, domado a inflação, tirado muitos milhões da miséria, inaugurado os programas sociais que viraram o Bolsa Família, bem, aquele governo parecia um anátema.

Em 2006, com Geraldo Alckmin candidato, o PSDB insistiu no mesmo erro básico - medo de sua história. Às mistificações do lulo-petismo, respondeu com o que chamo “maximização do mínimalismo administrativista”, erro, entendo, reiterado desta vez. O fantasma da privatização, brandido de novo pelo petismo, é um bom emblema. O marketing tucano caiu duas vezes no mesmo truque, tropeçou duas vezes na mesma pedra, permitiu que João Santana risse duas vezes da mesma piada.

Ora, é falso, mentiroso, mistificação barata, sustentar duas coisas, a saber: a) que a concessão de áreas para a exploração de petróleo seja privatização; b) que os tucanos queriam privatizar a Petrobras e o pré-sal. Mas qual foi a reação, TARDIA, da propaganda do PSDB na TV? Agasalhar a tese de que concessão é privatização; tomar a privatização com um  malefício e depois devolver a acusação: “Quem fez, sei lá, 108 ‘privatizações’ foi a Dilma”. Ou seja: tentou falar a linguagem do inimigo, aderir à sua racionalidade vigarista, para tentar inverter o jogo. Em nenhum momento os programas eleitorais do PSDB se lembraram de INFORMAR aos eleitores que, quando FHC chegou ao poder, o Brasil produzia 700 mil barris de petróleo por dia; quando ele deixou o governo, em 2002, o país produzia 1,4 milhão de barris - o dobro. No governo Lula, o aumento da produção foi de 50%.

Não quero me ater neste texto aos muitos erros do horário eleitoral. Até porque esses poucos que citei servem apenas para ilustrar uma tese: se quer voltar ao poder federal, a oposição terá, em primeiro lugar, de se tonar senhora de sua própria história, recolocando os fatos em seu devido lugar. E terá de enfrentar o lulo-petismo sem receio - terá de enfrentar, inclusive, o mito do “Lula intocável”. Porque os números,ao contrário do que rezam as aparências, demonstram que isso também é falso, o que fica para outro texto.

Desde já
Se as atuais oposições pretendem voltar ao poder em 2015, vencendo, pois, as eleições de 2014, têm de começar a enfrentar o governo desde já - ou, vá lá, a partir de 2 de janeiro de 2011.Assim se faz nas grandes democracias do mundo. Barack Obama estava no poder havia 15 dias, e o odiado Dick Cheney deu o grito de guerra. Alguns chegaram a dizer que ele estava enterrando o Partido Republicano. É mesmo? Pois os republicanos estão prestes a tomar de Obama a maioria no Senado e na Câmara. E olhem que, em matéria de mito, o presidente americano dá surra em qualquer um.

De fato, foram oito anos de quase não-oposição - essa é a verdade. E não se consegue despertar para esse mister nos quatro ou cinco meses que antecedem uma eleição. Nesse tempo, o PT contou a história como bem quis. “Então você sugere que os tucanos digam ‘não’ ao governo mesmo quando a proposta é boa, seguindo o modelo petista?” Não! Eu sugiro que os tucanos, democratas e quantos se oponham ao PT - desde que não seja optando pela extrema esquerda, claro! - tentem apresentar sempre propostas MELHORES. E que não tenha receio de ter a sua agenda. É difícil? Claro que sim! Mas precisa ser feito.

Dilma, agora, vai procurar a conciliação. É da natureza do jogo. A conversa é a de sempre: “Os interesses do país pedem etc e tal”. O próprio Lula se lembrará de ser um “conciliador”, convocando os homens que querem o bem do Brasil… Até a próxima disputa. Se os oposicionistas caírem na conversa da tal “agenda comum”, serão jantados de novo daqui a pouco.

Agenda comum?
Como sempre, o começo do governo será pautado pela urgência da reforma política, da reforma tributária, da reforma trabalhista - as reformas, enfim, que todos dizem querer fazer e que acabam não sendo feitas. O governo Dilma terá maioria esmagadora na Câmara e no Senado. Mas sabemos todos que essa maioria nominal não diz muita coisa a depender do tema. Sim, a oposição tem de ter as suas próprias propostas e brigar muito por elas no detalhe, comparecendo para o debate.

Quem quer que vá liderar esse trabalho tem de se mostrar como uma alternativa de poder, não como linha auxiliar do governo, o que o PSDB demonstrou ser muitas vezes. Isso não impediu, como se viu em 2006 e 2010, o eficiente trabalho de satanização promovido pelo PT. Considerados os governos dos estados, e ainda escreverei mais a respeito, as oposições governarão praticamente a metade da população e, vou fazer as contas, mais de 60% do PIB. Têm um base formidável para traçar as coordenadas de seu futuro. E, curiosamente, o seu futuro tem de começar por não ter medo do seu passado, que tem de ser libertado do cativeiro em que o prendeu o PT.

Por Reinaldo Azevedo

O caminho da perdição

Leiam o que informam Eduardo Kattah e Amanda Romanelli, no Estadão Online. Comento em seguida:

Com derrota de Serra, PSDB mineiro aposta no fim da hegemonia paulista

Fortalecido pela vitória na eleição majoritária estadual, capitaneada pelo ex-governador e senador eleito, Aécio Neves, o PSDB mineiro aposta que a prática irá evidenciar o fim da hegemonia paulista no partido. Aécio já articula apoios visando estabelecer uma agenda própria do Congresso, para tirar o Parlamento do que considera um papel de submissão em relação ao Executivo. A intenção é fazer com que o Legislativo tome a iniciativa de discutir reformas estruturantes para o País.

O secretário-geral do PSDB, deputado federal Rodrigo de Castro (MG), admite que a perda de espaço no Congresso “é um dificultador a mais para a oposição”, especialmente em relação ao Senado, mas diz que o objetivo é fazer uma “oposição de qualidade”.

“Vai ser sempre uma oposição firme, uma oposição serena, é claro, sempre visando o bem do Brasil, dialogando quando tem de dialogar, mas também mostrando os pontos fracos e mostrando os caminhos. Com certeza será uma oposição de qualidade”, afirmou Castro, ao comentar o resultado da eleição presidencial, no fim da noite de domingo, 31.

Um dos mais importantes aliados de Aécio, o secretário-geral considera agora fundamental a união do partido. “Não se faz um projeto presidencial pensando numa hegemonia de quem quer que seja, ou de um estado em relação ao outro.”

Em São Paulo, o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), esteve na residência do candidato derrotado José Serra. Ao chegar, o senador afirmou a repórteres que, ao contrário de 2006, o PSDB esteve unido durante a campanha. Por isso, condenou o comentário que Xico Graziano, coordenador do programa de governo de Serra, fez no Twitter. O ex-secretário do governo paulista e coordenador do programa de governo de Serra questionou a surpreendente derrota do tucano em Minas Gerais, um ataque indireto ao senador eleito Aécio Neves.

“O Xico é um companheiro nosso, um grande quadro, mas está completamente equivocado. Não falei com ele, mas ele está errado. Todos trabalhamos pela eleição do Serra, inclusive o governador Aécio Neves, e com muita força e muita determinação. Acho que ele cometeu uma injustiça”, disse.

Balanço. O senador afirmou também que um balanço sobre o resultado do pleito deverá ser feito apenas no fim da próxima semana, em uma reunião da diretoria executiva do partido. Guerra, porém, adiantou que o PSDB considerou a disputa “desequilibrada”, visto que, na sua opinião, Serra precisou enfrentar não só a adversária, mas também a máquina pública.

“Nossa estrutura era infinitamente menor que a do PT e a da candidata deles. Só um cego não viu (o uso da máquina administrativa). Mesmo assim, tivemos 45% dos votos, elegemos oito governadores, além de dois do DEM, e elegemos deputados e senadores consistentes. Crescemos como partido.”

Comento
Pois é… Qualquer solução que comece pelo anúncio prévio do “fim” disso ou daquilo já começa mal. No post seguinte, comentarei um pouco a bolsa de futuros para 2014. Quero me ater neste post ao PSDB.

Quando Lula começou a ganhar para valer a eleição de 2002? Quando o PSDB e o então PFL racharam. Dissensões surdas, que ganharam volume especialmente depois das mortes de Sérgio Motta e Luiz Eduardo Magalhães, explodiram nas disputas pelo comando do Congresso e dali evoluíram para a separação litigiosa. Vieram a candidatura Roseana Sarney (à época no PFL, hoje lulista radical), o caso Lunus — que os pefelistas jogaram no colo de Serra, o que ele sempre negou, claro; não faz tempo, uma personagem daquele episódio confessou: foi armação do PT —, e a perdição. Se bem se lembram, os pefelistas então acabaram apoiando a candidatura de… Ciro Gomes!!! As portas se abriam para o PT.

Em 2006, já se investia na divisão “Minas x São Paulo”, e os próprios paulistas acabaram batendo cabeça. Neste 2010, muitos fatores explicam a derrota (apesar de um desempenho que acabou surpreendendo muita gente), mas é evidente que a novela para definir quem seria o candidato, que acabou resultando na outra novela, a definição do vice, acabou deixando Minas onde Minas já estava na eleição presidencial de 2006: no colo do PT, apesar da vitória expressiva de Antonio Anastasia e Aécio Neves.

Estar esse debate nos jornais, nestes termos (fim da hegemonia de um; inicio da hegemonia de outro…), um dia depois da eleição — quando os tucanos deveriam é estar comemorando, dadas as circunstâncias, o excepcional resultado que tiveram nas urnas — , é de deixar qualquer um estupefato.

Chega a ser desrespeitoso com os quase 44 milhões de votos depositados nas urnas contra os abusos praticados por Lula. Eis aí acima, de um lado e de outro, uns bons primeiros passos para uma nova derrota.

Por Reinaldo Azevedo

Um post essencial - O “Golpe da Legitimidade”. Ou: o dia em que Tarso Genro cobrou um golpe de estado!

Um bobalhão, metido a pensador — até sabe pontuar um texto, o que é raro por lá —, me envia uma longa peroração, acusando-me de estar tratando a eleição de Dilma Rousseff como “ilegítima”. Não cheguei a tanto. Acusei e acuso o uso de expedientes ilegais, imorais, e indecorosos para alcançar esse objetivo. O debate sobre a legitimidade é um pouco mais complexo, mas eu o faço com gosto!

Quebrar sigilo bancário sem autorização judicial e usar a máquina oficial em favor de uma candidatura são práticas criminosas. Casar a agenda da administração pública com a agenda eleitoral é imoral. Um presidente abrir mão de seu papel de magistrado maior das disputas políticas para atacar adversários de seu partido, fazendo-o, diga-se, em horário de expediente, é indecoroso. E não me peçam para fazer de conta que nada disso aconteceu. Não aqui! A razão é simples: caso se assumam tais práticas como aceitáveis ou se as ignore, passarão a ser corriqueiras. E vejam que o que vai nesse parágrafo se restringe aos crimes ligados propriamente à eleição. Há os outros, relacionadas à estratégia de tomada do estado.

Huuummm… Na letra da lei, poderia, sim, dar cassação de candidatura. No Brasil, dir-se-ia ser um escândalo contra a democracia. É por isso, a rigor, que o país tem mais escândalos do que democracia… Ainda ontem, Lula saiu atirando contra o Ministério Público Eleitoral, que pediu para Tiririca provar que é alfabetizado. O Babalorixá de Banânia, pelo visto, acredita que se trata de um abuso. “Onde já se viu alguém tentar afrontar 1,5 milhão de votos com a lei?” E sugeriu que o investigado deva ser aquele que está defendendo o que vai no texto legal. Um mimo de seu ideal totalitário! Mas volto.

A eleição de Dilma é “legítima”? Não duvido de que a maioria dos que foram votar, com efeito, acreditam que ela seja a melhor resposta para o país. Nesse particular sentido, é. Mas que partido é esse, o maior do pais, que consegue criar essa oposição entre legítimo e legal? Uma certa tensão entre essas duas categorias é até desejável: a sociedade tende sempre a propor problemas que a lei nem sempre alcança no detalhe. Já a oposição entre esses dois conceitos só é fabricada por quem tem más intenções. Então ficamos assim: o PT conseguiu eleger uma “presidente legítima” afrontando a lei. Tá bom para você, petralha ilustrado?

Tio Rei não gosta de facilidades; gosta é de dificuldades. Alguém poderia indagar: “Mas foi a ilegalidade praticada que determinou a sua (dela) eleição?” Não sei! Tendo até a achar que não, mas isso é irrelevante. Um crime não deixa de ser um crime porque o criminoso não logrou os objetivos almejados. É uma questão de lógica da civilização — a outra, a contrária a essa, é a da barbárie. E sempre me conforta a perspectiva de que um petralhinha ou outro, ou ainda candidato (a) a tanto, com os hormônios em ebulição, possa avançar um tantinho na fronteira do pensamento. Faço blog também como agente civilizador.

Tarso Genro, o golpista
Sabem quem já quis dar um golpe, defendendo a tese em jornal? Tarso Genro! Ele mesmo! O governador eleito do Rio Grande do sul, ex-ministro da Justiça do governo Lula! Não fosse a minha memória, o PT perderia boa parte da sua, não é mesmo? No dia 19 de janeiro de 1999, este senhor escreveu um artigo na Folha de S. Paulo cobrando a renúncia de FHC, que assumira havia 19 dias o seu segundo mandato. Pouco tempo depois, o PT lançaria o grito de guerra “Fora, FHC”, com manifestações na Esplanada dos Ministérios e tudo! Lula, então, não teria endossado o movimento… Como a gente sabe, o PT costuma realmente atuar contra a vontade do chefe… Tenham paciência!

Não! Eu não sou golpista, não! Eu sou um legalista! E repudio que venham pra cima de mim com essa cascata do “golpe da legitimidade”, um mimo das flores do mal da cultura política gramsciana. Conforme-se, rapaz! Meu compromisso é com a democracia! Não é só uma questão de biografia. Também é uma questão de bibliografia!

Vocês estão percebendo, petralhas, dados os posts abaixo, como a eleição de Dilma me deixou realmente prostrado no sofá, sem coragem nem para ir tomar um Chicabom na esquina? Ora… Eu até lhes diria que, sob certo ponto de vista, agora é que começa a ficar bom!

Por Reinaldo Azevedo

Com dono, não

Uma pesquisa qualitativa sobre as eleições encomendada por banco de investimentos entre o primeiro e o segundo turnos detalhou o que pensa a classe C emergente sobre o processo eleitoral. Em geral, essa turma gosta de Lula, como era de se imaginar. Mas não quer ser tutelada. Não aceita que o Brasil tenha um “dono”.

Por Lauro Jardim

De olho grande

O PMDB já começa a prospectar novos cargos no governo. Mangabeira Unger procurou Michel Temer buscando apoio para ser o ministro das Relações Exteriores de Dilma Rousseff. A chance de tal desejo tornar-se realidade é próxima de zero.

Por Lauro Jardim

Dilma e Deus

No discurso da vitória, ontem à noite, Dilma Rousseff não citou Deus em nenhum momento. Seria impensável deixar de fazê-lo em determinado instante da campanha, entre o final do primeiro turno e o meio do segundo turno pelo menos. Deixar de agradecer a vitória a Deus nào se trata de algo bom nem ruim. Significa apenas que a campanha acabou.

Por Lauro Jardim

Nem onda nem marola

Na eleição que acabou ontem, a “onda Dilma” deu-se no entre o início do ano,quando a petista passou de um dígito nas intenções de voto para cerca de 40%. A segunda onda foi a de Marina Silva e ocorreu nos últimos dez dias do primeiro turno.  Parecia que a “onda Serra”  viria justamente no início do segundo turno.  Não veio. Ninguém vence uma eleição sem surfar numa onda.

Por Lauro Jardim

Tiririca no lugar de Dilma

Em vez de levar ao ar o primeiro discurso de Dilma Rousseff, Silvio Santos preferiu passar em seu programa dominical um quadro com Tiririca. Foi a única TV aberta que não transmitiu ao vivo o discurso da presidente eleita.

Por Lauro Jardim

O caso Acre

Quem terá que se explicar a Lula e Dilma Rousseff são os irmãos Vianna – Jorge, eleito senador, e Tião, novo governador do Acre. Num estado em que tradicionalmente o PT vence e onde é governo desde os anos 90, José Serra deu um banho em Dilma Rousseff: 67,5% contra 32,5%. No primeiro turno, Serra terminou com 52% dos votos. Significa, no final das contas, que os votos de Marina Silva migaram para Serra no Acre.

Por Lauro Jardim

Estresse pós-eleitoral

Magno Malta não gostou do tratamento que recebeu dos seguranças do Hotel Nahoum, o QG de Dilma Rousseff. Gilberto Carvalho tentava acalmar o senador capixaba, que protestava:

- Agora que acabou a eleição ninguém precisa de ninguém.

Por Lauro Jardim

Conversa tucana

Como está o clima entre Aécio Neves e José Serra? Aécio ligou para Serra ontem à noite, logo após o discurso de Serra, em que o candidato derrotado deu um “até logo” e agradeceu o empenho de Geraldo Alckmin para elegê-lo – e não fez qualquer referência a Aécio.

Na conversa, não se sabe se com sinceridade ou não, Serra agradeceu Aécio pelo esforço que demonstrou no segundo turno.

A um interlocutor, Aécio desdenhou o “até logo” de Serra, que seria um indicador de que o ex-governador paulista não abandonará a política:

- O que mais ele poderia falar numa situação daquelas?

E o “esquecimento”  de Serra, que não o citou no discurso? Aécio, mais uma vez, contemporiza:

- O Serra falou do Geraldo porque estava ali, ao lado dele. Se me citasse, teria que falar de todos os governadores, não faria sentido.

Por Lauro Jardim

Quem escreveu o discurso de Dilma

O discurso de ontem à noite de Dilma Rousseff foi escrito a quatro mãos. Pela própria Dilma e por Antonio Palocci – o que reforça, para quem tivesse alguma dúvida, o tamanho que Palocci adquiriu nesta campanha.

Por Lauro Jardim

Ele foi

Recebido pela militância petista com gritos de “Dirceu guerreiro do povo brasileiro”, José Dirceu chegou há pouco ao QG dilmista montado em um hotel de Brasília. Cercado por jornalistas, recebeu a ajuda do ator José de Abreu para entrar no edifício.

Por Lauro Jardim

A oposição precisa de um discurso coerente – e sedutor

No último dia da propaganda eleitoral gratuita de José Serra, na sexta-feira passada, havia uma passagem esdrúxula que diz muito sobre o futuro do derrotado PSDB e das oposições em geral.

Lá pelas tantas, o locutor acusava “Dilma e sua turma” de venderem “o pré-sal para empresas privadas”. Não bastasse a vergonha que tem de defender uma bandeira histórica do PSDB, a privatização, a campanha de Serra pegou carona numa das piores bandeiras do PT — o discurso estatista.

Serviu apenas para confundir o eleitor. Além de ter soado falso. O discurso dúbio de Serra sobre o assunto deixou órfão o eleitor tradicional do PSDB e não convenceu o eleitor mais à esquerda. Pela segunda vez consecutiva numa eleição presidencial o partido cometeu o mesmo erro — nem o efeito surpresa havia.

Esse é um dos desafios que o PSDB e as oposições de modo geral terão que enfrentar a partir de amanhã: criar um discurso próprio, coerente e que tenha força para (re)conquistar o eleitor. Não será tarefa fácil. A máquina de propaganda do PT opera com eficiência a bandeira do estatismo e do “nós defendemos os pobres e vocês as elites”.

Para além do ideário, é preciso saber quem comandará a tropa. Ainda que não se deva desprezar Geraldo Alckmin – nunca é prudente descartar o governante do estado mais poderoso do país — o nome de Aécio Neves surge naturalmente como o novo sol em torno do qual girarão o PSDB e a oposição.

Aécio possui pelo menos duas qualidades que o tornam imbatível para a missão. Primeiro, ele é a cara nova que o PSDB poderá oferecer ao Brasil. Fez um governo bem avaliado, sem escândalos e é um vencedor de eleições. E tem carisma. Mesmo não sendo conhecido nacionalmente, é um bom “produto” para ser vendido aos brasileiros. Em segundo lugar, não há ninguém com sua capacidade de articulação política.

A possibilidade de Aécio deixar o PSDB para criar um novo partido, como aqui e ali se cochicha, é pequena: a vitória do partido em estados importantes, como São Paulo, Minas Gerais e Paraná, por exemplo, abortaram uma ideia que até poderia fazer sentido.

Não é improvável, contudo, que Aécio trabalhe para engordar o PSDB – e ele tem capacidade de costura para tocar a tarefa. As primeiras iscas devem ser lançadas ao DEM, que sai baleado da eleição. Mas outras poderão ser arremessadas em direção de líderes políticos estaduais em conflito com companheiros do mesmo partido.

No Senado, Aécio sonha também com uma missão difícil, quase impossível: eleger-se presidente da Casa. Não já: agora é a hora de quem venceu as eleições – e tem maioria no Senado – dar as cartas.

Ele pensa em candidatar-se a presidente do Senado em 2013. De lá sairia para ser o candidato das oposições à presidência do Brasil no ano seguinte. Por isso, mais do que nunca, é hora de pensar num discurso coerente e sedutor para apresentar aos brasileiros a partir do ano que vem.

No processo eleitoral deste ano, Serra enfrentou o mais poderoso dos adversários. Não se trata de Lula e de sua popularidade acachapante, mas da razão principal dos seus 80% de sua aprovação: o bom momento da economia. Em 2014, Aécio – ou quem for o candidato – poderá ter que lidar com a mesma maré a favor na economia. E o tempo estiver chuvoso na economia? Terá que enfrentar Lula querendo voltar e garantindo que consertará qualquer estrago feito por Dilma Rousseff.

Por Lauro Jardim

Dilma e Serra trocaram cumprimentos chochos, formais. Mas lembra-se do que McCain disse ao reconhecer a vitória de Obama, nos EUA?

Achei chochas, formais, secas — e, portanto, vazias –, as manifestações que trocaram entre si publicamente, na noite passada, os dois candidatos à Presidência, a presidente eleita Dilma Rousseff e o candidato derrotado, o tucano José Serra.

Ah, como eu gostaria de ver, um dia, “neste país”, o que acontece nos países civilizados.

Fico só num exemplo marcante: a reação do candidato republicano à Presidência dos Estados Unidos, senador John McCain, do Arizona, quando ficou clara que a vitória nas eleições de 2008 caberia ao então senador democrata por Illinois Barack Obama.

McCain, conservador, filho e neto de almirantes de quatro estrelas, ex-piloto de combate da Marinha americana durante a guerra do Vietnã que teve seu caça-bombardeiro abatido em 1967 perto de Hanói, no então Vietnã do Norte, foi capturado e gramou oito anos de prisão e torturas — um durão de almanaque, portanto — fez uma leal, mas dura campanha contra Obama.

Opôs-se ao adversário em praticamente tudo: a estratégia de Obama para as guerras do Iraque e do Afeganistão, a criação de um seguro-saúde estatal, o programa sobre mudanças climáticas, a questão dos suspeitos de terrorismo presos na base militar de Guantánamo, em Cuba… A lista é longa.

Na noite de 4 de novembro de 2008, porém, quando ficou claro que a maioria do eleitorado americano optara pela renovação que Obama significava — 69,4 milhões de votos (52,9%) contra 59,9 milhões (45,7%) –, McCain, o rival implacável, proferiu a célebre frase:

– Até agora, ele era meu adversário. Agora, ele é meu presidente.

Vejam bem, ele não reconheceu simplesmente a vitória do oponente, nem disse que a partir daquele momento ele era o “presidente dos Estados Unidos”. A expressão foi: “Ele agora é meu presidente”.

Quando atingiremos esse nível de civilidade e de espírito democrático?


A reforma política esbarra no voto distrital

O cientista político Leôncio Martins Rodrigues

A reforma política – tida por muita gente como a “mãe de todas as reformas”, por tratar, afinal de contas, da crucial maneira de escolher quem governa – vai ser uma pedreira, quando e se a presidente eleita Dilma Rousseff resolver enviar algum projeto ao Congresso, o que não parece muito viável no momento.

Muitos políticos reclamam de alguma coisa do atual modelo, e com razão. Mas a falta de consenso em torno de pontos fundamentais é tal que não foi por acaso que FHC (1995-2003) nem Lula se arriscaram a propor ao Congresso mudanças de vulto. E não adianta fugir de um ponto: no Brasil, uma reforma desse quilate não anda se não partir do presidente da República.

TEMA SUMIU NA CAMPANHA — Fidelidade partidária, financiamento público das campanhas, cláusula de barreira (para barrar a existência de partidos inexpressivos, sem representatividade social, que acabam vendendo literalmente seu tempo na TV), a questão dos suplentes de senador (muitos deles parentes ou financiadores dos candidatos), voto distrital, até mesmo a obrigatoriedade ou não do voto…

Os pontos são muitos e, se nas campanhas de 2002 e 2006 Lula e os adversários José Serra e Geraldo Alckmin (PSDB) se mostraram dispostos a enfrentá-los, em maior ou menor grau, na recém-encerrada campanha entre Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) o tema sumiu do mapa, engolido por assuntos como o aborto e a fé em Deus de cada candidato.

A questão do voto distrital é tida como uma espécie de alicerce de uma eventual reforma política. Mas os políticos entusiastas desse sistema – e são muitos – podem ir tirando o cavalo da chuva, diante de dificuldades práticas virtualmente insuperáveis para implantá-lo nos níveis federal e estadual, segundo um especialista no assunto, o cientista político Leôncio Martins Rodrigues, ex-professor das universidades de São Paulo (USP) e Estadual de Campinas (Unicamp), em São Paulo.

Em suas diferentes formas, o sistema, como se sabe, inclui algum tipo de divisão do país em áreas (os distritos) com aproximadamente o mesmo número de habitantes. Dentro de cada distrito, seria eleito o candidato a deputado mais votado. Isso, teoricamente, permitiria de um lado uma aproximação maior entre o eleitor e o “seu” deputado, e, de outro, propiciaria ao deputado um maior conhecimento de seu eleitorado e respectivos problemas.

PRESSÃO E PRESTAÇÃO DE CONTAS — Haveria um mútuo processo de pressão e cobrança por parte do eleitor e, de parte do deputado, um fluxo de prestação de contas. (O sistema distrital puro reza que todos os deputados sejam eleitos por distrito. O sistema misto, defendido por muitos, prevê que uma parte dos deputados seja escolhida assim, e que as demais vagas preenchidas pelos integrantes das listas de candidatos dos partidos, proporcionalmente à votação obtida por cada legenda).

Pois bem, Martins Rodrigues – autor, em meio a vasta obra, do excelente livro Partidos, Ideologia e Composição Social (Edusp, 2002, 242 páginaas) – debruçou-se sobre como ocorreria, na prática, essa divisão do Brasil em distritos, e divisou pelo menos dois grandes problemas.

O primeiro é uma confusão territorial: dentro de cada Estado, a divisão da área por distritos esbarraria no fato de que são diferentes os números de vagas que cada Estado tem na Câmara dos Deputados e na respectiva Assembléia Legislativa (o Rio de Janeiro, por exemplo, tem 46 deputados federais e 70 estaduais; São Paulo, 70 federais e 94 estaduais).

O JEITO É COMEÇAR PELOS MUNICÍPIOS — Problemas: como fazer coincidir o mesmo número de distritos para a eleição dos deputados? Haveria dois tipos de distrito – um federal e um estadual? Como realizar, materialmente, as eleições, com seções eleitorais, urnas, mesários?

E a infernal confusão que haveria nas campanhas – já que os candidatos a deputado estadual, em número maior, fariam campanha em mais de um distrito federal?

Mais que tudo, como explicar isso ao eleitor?

A segunda dificuldade está ligada ao tamanho do Brasil.

Feitas algumas contas, Martins Rodrigues verificou, por exemplo, que o Estado do Amazonas, com seus gigantescos 1,5 milhão de quilômetros quadrados (mais que uma Argentina e meia) e apenas oito deputados federais, teria pelo menos um de seus distritos com território equivalente aos de Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul somados.

A saída, para alguns, seria começar sem a ambição de resolver o problema de uma só vez. Pelos municípios, por exemplo. Assim, a maior cidade do Brasil, São Paulo, com 11 milhões de habitantes e quase 7 milhões de eleitores, teria tantos distritos quantos são seus vereadores: 55. População e/ou eleitores se distribuiriam de forma semelhante por cada distrito. Ganha a eleição, em cada distrito, o eleitor que tiver mais votos, independentemente dos votos recebidos pela legenda, como é hoje.

Seria um começo. Mas é preciso, como se diz, ter “vontade política”. Aguardemos.

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Fonte:
Blog Reinaldo Azevedo (Veja)

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